UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

ROGERIO LEITE GONZALES

ORGANIZAÇÕES HÍBRIDAS E O DESAFIO DE CONSTRUIR SENTIDO COMPARTILHADO.

PORTO ALEGRE

2023

ROGÉRIO LEITE GONZALES

ORGANIZAÇÕES HÍBRIDAS E O DESAFIO DE CONSTRUIR SENTIDO COMPARTILHADO.

TESE apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Orientador: Prof. Dr. Luis Felipe Nascimento

PORTO ALEGRE

2023

LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Estágios da consciência humana e organizacional 23

Figura 2 – Espectro das Organizações Híbridas. 37

Figura 3 – Dimensões do organizar híbrido. 48

Figura 4 – Primeira geração da teoria da atividade. 52

Figura 5 – Segunda geração da teoria da atividade. 58

Figura 6 – Terceira geração da teoria da atividade. 60

Figura 7 – Contradições que podem ser apresentadas pelos sistemas de atividades. 62

Figura 8 – Ciclo de aprendizagem expansiva. 66

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Estágios de consciência. 24

Quadro 2 – Tipologia das organizações híbridas. 40

Quadro 3 – Estrutura hierárquica da atividade e níveis de funcionamento em sistemas de atividade  59

Quadro 4 – Teoria da atividade. 67

  1. SUMÁRIO

TESE apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 2

1.            CONTEXTUALIZAÇÃO.. 1

1.1         De organizações para times: 28

1.2.       Não se constroem times autônomos sem indivíduos autônomos. 30

2.            organizações hibridas.. 35

2.1.       ORIGENS.. 39

2.2.       MULTIPLAS IDENTIDADES E CONFUSÃO.. 40

2.3.       DESAFIOS DE MULTIPLAS IDENTIDADES.. 41

3.            Lente teórica.. 50

3.1.       Das abordagens baseadas em prática até a CHAT: Erro! Indicador não definido.

3.2.       Um olhar sobre a CHAT e sua história: 50

3.3.       As três gerações da CHAT.. 51

3.4.       Princípios da teoria da atividade.. 61

3.5.       Aprendizagem expansiva.. 64

3.6.       O aspecto do poder na CHAT.. 71

3.7.       Consultoria ou pesquisa?. 72

4.            PERCURSO METODOLÓGICO.. 74

4.1.       A cartografia.. 80

4.1.1.        Pista 1 – A cartografia como método de pesquisa-intervenção   82

4.1.2.        Pista 2 – O funcionamento da atenção no trabalho do cartógrafo   83

4.1.3.        Pista 3 – Cartografar é acompanhar processos.. 84

4.1.4.        Pista 4 – Movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia.. 85

4.1.5.        Pista 5 – O coletivo de forças como plano de experiência cartográfica.. 86

4.1.6.        Pista 6 – Cartografia como dissolução do ponto de vista do observador.. 88

4.1.7.        Pista 7 – Cartografar é habitar um território existencial.. 90

4.1.8.        Pista 8 – Por uma política da narratividade.. 90

4.2.       Estratégias de produção de conhecimento.. 91

4.3.       Análise.. 92

4.4.       Território.. 94

4.4.1.        Teal Brasil – Plataforma de conexão.. 99

4.5.       O pouso.. 104

4.5.1.        Que empresa é essa?.. 104

4.5.2.        Desenvolvimento de pessoas.. 108

4.5.3.        Cultura de cultivo.. 109

4.5.4.        A segurança psicológica e permissão para não saber.. 111

4.5.5.        Uma organização em rede.. 112

4.5.6.        Formação de times.. 114

4.5.7.        Fix the system not the people (ajuste os sistemas não as pessoas) 115

4.5.8.        Como é que vocês dão lucro?.. 116

4.5.9.        ### RECORTES INDIVIDUAIS – SEGUINDO FIOS.. 117

4.6.       ANÁLISE DO CAMPO (MIX + INTRO) 119

4.6.1.        PREMISSAS.. 119

4.6.2.        Resultados.. 120

4.6.3.        CULTIVO DA AUTONOMIA.. 120

5.            PROPOSIÇÃO FRAMEWORK.. 122

5.1.       Introdução.. 122

5.2.       Framework.. 125

5.2.1.        Integrar – Premissa I: Competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio. 125

5.2.2.        Incluir – Premissa II: Dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento. 128

5.2.3.        Instrumentalizar – Premissa III: Intervenções curtas e práticas mantém engajamento. 130

5.2.4.        Implementar.. 132

5.2.5.        Interpretar – Premissa IV: Reflexão estruturada pavimenta espaço para Aprendizagem Expansiva. 133

5.3.       Discussão.. 136

5.4.       Conclusão.. 140

6.            APLICAÇÃO DO FRAMEWORK.. 144

6.1.       Briefing.. 144

6.1.1.        Setup de um novo conteúdo utilizando o Framework. 144

6.1.2.        Conectando o objeto ao Sistema de Atividade.. 145

6.1.2.1.         Alinhamento da demanda: 146

6.1.2.2.         Co-construção do conteúdo e da trajetória.. 147

6.1.2.3.         Construção da autoavaliação.. 149

6.1.2.4.         Engajamento é tudo.. 151

6.1.2.5.         Macro visão do processo de autoavaliação: 156

6.1.2.6.         A Talk interativa.. 157

6.1.2.7.         A premissa da transparência.. 160

6.1.2.8.         ### A Palestra Interativa.. 163

6.1.2.9.         ### Conectando com a teoria.. 164

6.1.2.10.      ### Palestra interativa – continuidade.. 170

6.1.2.11.       ### Mentoria.. 172

6.1.2.12.      ### Interações assíncronas.. 172

6.2.       Overview sobre o campo: 173

7.            RESULTADOS.. 174

8.            RESULTADOS.. 176

1.2. 176

9.            CONTRIBUIÇÃO.. 177

10.         BIBLIOGRAFIA.. 178

1.    CONTEXTUALIZAÇÃO

Sempre foi assim,

Um pouco por convicção um pouco por teimosia.

Esta que parecia ser uma jornada

Em busca da forma correta de se fazer.

Eu e o tempo a significamos de forma distinta.

Já haviam falado sobre isso,

Já haviam trilhado esse caminho

Cada um à sua forma, com seu motivo

Em sua possibilidade…

Última opção?

Surpreendido balbuciava

Também não era claro

Última alternativa? Um fim? Um recomeço?

Talvez não haja real diferença….

Sempre foi assim

Um pouco por curiosidade, um pouco por prepotência

Adaptamo-nos pela observação e convicção

Voar, pousar e zarpar. Não há opção.

Repetia, em busca de conforto

Não há o que não se possa

Chamávamos de sincronicidade

O aleatório da intuição


Sempre foi assim

Um pouco por cuidado, um pouco por medo

Presença sútil pronta a se inflamar

Além da coerência, Integridade

Um pouco por conforto, um pouco por ignorância

Pintar a interdependência

Uma possibilidade a ser construída

Seguir em equilíbrio vacilante

Sempre foi assim,

Um pouco por convicção um pouco por teimosia…

PESQUISAR PARA QUEM?[1]

Reflexividade, uma daquelas palavras que entendemos o significado, mas a cada experiência e exercício de observar-se e questionar-se mais camadas ela ganha, e assim vem sendo durante toda a trajetória deste pesquisador.

A escrita do projeto de tese é um desafio, não só pela teoria e pelo tema, mas especialmente pela metodologia. Espera-se que no doutorado o pesquisador consiga estruturar de forma mais rápida seu projeto de pesquisa, assim como a sua execução já que se dedicou dois anos no mestrado a aprender e evoluir estes quesitos.

Porém, quando a Cartografia se apresenta como escolha metodológica tudo é posto em xeque. A forma de escrever, o objeto, o objetivo, o público a quem se destina o texto. Há uma multiplicidade de teses e dissertações que fazem uso da cartografia, muitas relatam o seu percurso metodológico detalhadamente, a experiência da pessoa pesquisadora em transitar por ele, suas dúvidas e seu exercício de reflexividade.

Mas como relatar o início da jornada? Como relatar o projeto, como projetar um percurso em uma metodologia que tem por característica a abertura e a construção com o campo? Como traduzir esse olhar, esse cuidado, essa reflexividade em um projeto de tese?

Nesse sentido me questiono: para quem estou escrevendo esse projeto de tese? Para além de cumprir um requisito do programa de doutorado, quais são meus objetivos nessa escrita? Quem é o público que lerá? Escrevo para os 3 professores que irão participar da banca apenas? Escrevo para que eu avance em meu projeto? Escrevo para alguém que possa se interessar?

Se a tese será escrita com os atores da pesquisa e para pessoas que se interessem pelo tema, me parece que esse projeto de tese deveria ser escrito para eles. Um convite, uma explicação, um descritivo, um compilado de algumas das leituras organizadas de forma a ajudar a dar sentido ao momento que vivemos, aos desafios que enfrentamos, as contradições presentes.

Uma narrativa que seja capaz de informar, compartilhar uma visão de mundo e convidar para uma jornada de aprendizagem e transformação da realidade.

Movimiento

Jorge Drexler fala de uma espécie em viagem sem pertences, Dylan se pergunta sobre quanto ainda precisaremos caminhar, Cartola alerta para o pouco da vida que se escapa em cada esquina. Seja pelo tic-tac “Pink-Floydiano”, pelo abacateiro de Gil, rodas de Chico, e tantos outros que por aí já passaram. Fato é que, inexoravelmente, estamos sendo arrastados pelo espaço-tempo.

Bowie em “Changes”, Lennon e McCartney em “Strawberry Fields Forever” falaram das infinitas possibilidades, das realidades que ocorrem ao mesmo tempo modificadas pelo ponto de vista do observador. As conexões do acaso e a serendipidade são elementos fundamentais nas construções literárias de Dostoievski, ou nas extrapolações de Kafka e Borges. Evidenciada na visão total de “O Aleph”, mas Borges a destaca especialmente na grande contradição de “Funes, el memorioso”.

Funes, personagem magistral criado por Borges, possui uma característica especial: sua memória total, capaz de lembrar de tudo, cada segundo, cada detalhe. Aprendeu facilmente inglês, francês, latim, contudo há a suspeita de que não era muito capaz de pensar, ao que complementa no livro: “Pensar é esquecer diferenças, é generalizar, abstrair. No mundo abarrotado de Funes não havia senão detalhes, quase imediatos.”

Para além da genialidade artística, esse preambulo foi feito para traçar o paralelo sobre os desafios de viver em um mundo complexo, inundado de informações e possibilidades. Em que a abundância pode, paradoxalmente, paralisar, e induzir à busca por formas de anestesia para evitar o desconforto da incerteza.

Posso dizer que esta tem sido minha questão geradora de movimento[2]:

Como abarcar a complexidade sem paralisar-me?

Figura 1[3] – Representação livre da uma linha do tempo que inclui esse estudo

Tabela

Descrição gerada automaticamenteFonte: Autor

1.1 Transformando “ou” em “e”

A complexidade de uma situação pode ser vista como sendo maior quanto mais elementos ou variáveis ela tiver. Mas não é só a quantidade de elementos que importa, mas também como eles se relacionam ou interagem entre si. É a diferença entre somar coisas, multiplicá-las ou elevá-las à potência. Ou seja, não é só o que temos, mas também como essas coisas se combinam ou se influenciam que torna uma situação mais complexa.

Traduzindo para a linguagem natural, poderíamos dizer que é a diferença entre reconhecer a influência de múltiplos fatores sobre uma realidade e usar a conjunção “e” em vez da disjunção “ou”. Isso implica uma abordagem que não apenas reconhece a multiplicidade de influências, mas também a interconexão e interdependência entre elas.

Essa compreensão se solidificou durante minha experiência de um ano de imersão na Team Academy Finlandesa em 2009. Foi lá que vivenciei a realidade de poder aprender e trabalhar simultaneamente, diversão e seriedade, pesquisar e aplicar o conhecimento adquirido, de evoluir individualmente através do coletivo, de colaborar e ser pragmático. A lista continua, mas o ponto principal é que essas experiências me mostraram que a complexidade não precisa ser paralisante. Pelo contrário, pode ser uma fonte de riqueza e diversidade.

Falhando miseravelmente

Em 2010 os planos de continuidade na Finlândia são interrompidos para voltar ao Brasil e apoiar a empresa familiar que mantinha sociedade, uma indústria de reciclagem de plásticos.

Convicto da experiência recém vivenciada, apliquei uma tentativa atabalhoada de algo parecido com o vivido com as equipes de produção da empresa. Falhamos miseravelmente, quatro anos depois do meu retorno encerramos as atividades da empresa.

Entre movimentos de sobrevivência, testes e descobertas profissionais, durante dois anos implementei um projeto de aprendizagem por projetos para alunos do ensino médio de uma escola de Porto Alegre, juntamente com treinamentos em organizações e para docentes do ensino superior.

Em 2016[4], em busca de referencial teórico, estrutura e método pesquisei no mestrado qual o impacto da implementação de aprendizagem baseada em projetos para ensino de sustentabilidade aos alunos do curso de administração da UFRGS.

Em um tuíte, posso dizer que o método é um alavancador de potencial para pessoas já convertidas. Ainda que 85% dos participantes tenham destacado a necessidade de ter metodologias de aprendizagem ativa e práticas no processo de ensino aprendizagem no currículo do curso. Pudemos verificar um alto impacto do método em 25% dos participantes, 50% passaram pelo processo e tiveram algum tipo de transformação em suas práticas e visão de mundo, e 25% foram resistentes à proposta(GONZALES, 2018).

Nesta pesquisa utilizei o olhar da aprendizagem experiencial (KOLB, 1984a), em uma pesquisa-ação (TRIPP, 2005), onde olhei para os indivíduos e sua experiência de aprendizagem. O resultado foi o questionamento sobre qual o papel da cultura organizacional e a história dessas pessoas antes de entrar em contato com o método proposto.

Quando analisado em comparação com métodos passivos de aprendizagem, leia-se exposição de conteúdo, houve um grande impacto e a preferência de aproximadamente 80% pelo novo método. Dessa forma, o estudo indica adoção de metodologias ativas, e em especial baseada em projetos reais (GONZALES, 2018).

Às vezes, melhor não é suficiente

Quando algo muito ruim é melhorado, não se torna, necessariamente, bom. Quando o desafio é influenciar as futuras gerações de profissionais a serem protagonistas na construção de um futuro mais sustentável e justo. É necessário, além do acesso à informação, habilitar as pessoas a reconfigurar os sistemas em que atuam, e por conseguinte, constituem nossa sociedade.

Alinhado com a literatura, observamos o mesmo se repetir nas organizações, pessoas convencidas que precisam mudar, organizações com altos investimentos enfrentando grandes dificuldades de transformar a forma como as coisas realmente acontecem (ARGENTI et al., 2021; REEVES et al., 2018).

Continuamos focados em transmitir conteúdo e, quando muito, “capacitamos” as pessoas em como aplicar esse conteúdo por meio de métodos e ferramentas. Seja em ESG (Environmental, Social, and Governance), saúde mental, colaboração ou gestão de stakeholders, as premissas são muito semelhantes. Mesmo com a adoção de tecnologia e metodologias ativas, será que isso está sendo suficiente? Suficiente para o aprendiz, para as organizações e para o planeta?

Figura 2 – Particionamento do conhecimento


Fonte: Autor

1.2 De pontos para nós – “From dots to knots”

Essa história de dividir as cosias começou com Newton e Galileu[5] na chamada Revolução Científica do século XVII, quando começaram a descrever o mundo natural em termos de leis físicas universais. Essa abordagem foi extremamente importante para a humanidade, desde então o PIB mundial tem crescido de forma constante ao longo dos últimos três séculos. De acordo com o site Our World in Data (“Economic Growth – Our World in Data”, 2023), o PIB per capita aumentou mais de 20 vezes desde a independência dos Estados Unidos em 1776 até 2018.

Figura 3 – Crescimento do PIB per capta por países

Gráfico

Descrição gerada automaticamente com confiança média
Fonte: Our World in Data

Em um tempo em que a capacidade computacional era limitada, era necessário dividir os problemas para torná-los mais gerenciáveis. Hoje, com a evolução da tecnologia, temos a capacidade de criar modelos mais complexos que respeitam a interdependência entre sistemas e suas variáveis. Mais importante ainda, podemos repensar o papel das pessoas nesse contexto.

Na era da mecanização, especialmente quando a tecnologia ainda era incipiente, as pessoas eram vistas como substitutas das máquinas[6] que ainda não existiam. A ideia de tratar pessoas como recursos, conforme proposto por Taylor e Fayol na administração científica, era predominante.

Nesse contexto histórico, as teorias e metodologias de pesquisa foram moldadas por uma visão de mundo que via as pessoas como recursos. Elas eram classificadas, categorizadas como objetos de estudo e consideradas substituíveis (Engeström, Sannino & Virkkunen, 2014). O pensamento era guiado por diretrizes amplas que deveriam ser desdobradas e implementadas na organização.

Hoje, embora ainda vejamos a influência dessas correntes de pensamento, temos a oportunidade de repensar essas premissas. Podemos valorizar o papel único e insubstituível das pessoas, tanto na lógica organizacional quanto nas premissas das pesquisas que são conduzidas. Isso representa uma mudança significativa na forma como abordamos a gestão e a pesquisa, colocando as pessoas no centro.

Uma das abordagens que se alinha com o ressignificar do papel das pessoas é a Cartografia[7]. A Cartografia, metodologia de pesquisa inspirada em Deleuze e Guattari e desenvolvida por pesquisadores como Virgínia Kastrup e Regina Benevides de Barros, é uma abordagem que busca mapear territórios e entender processos. Concentra-se na experiência subjetiva do indivíduo e entende a realidade como em constante mudança e fluxo. Ao invés de buscar verdades universais, a cartografia explora a multiplicidade e a complexidade das situações(KASTRUP; PASSOS, 2013).

Em minha interpretação pessoal ela funciona como um sistema operacional[8], passível ter aplicativos (ferramentas e estratégias) acopladas a ela de acordo com as necessidades da pesquisa e as condições do território que se está encontrando. Um sistema operacional que entende o mundo como complexo, interconectado e interdependente e de conhecimentos situados.

1.3 Tecendo uma rede

Incluir muitos elementos em uma análise pode ser desafiador, em especial quando essas variáveis são subjetivas, interpretáveis e em constante mudança, como parte das capturadas através da cartografia.

Figura 4 – Representação gráfica da tese

Uma imagem contendo luz, estrela, escuro, verde

Descrição gerada automaticamente
Fonte: Autor

Na Figura 4, apresentamos uma representação gráfica de 816 arquivos, que incluem referências, transcrições, documentos, figuras e textos de diversas naturezas e funções. Esses elementos, quando ordenados, classificados e relacionados entre si, formam caminhos, conexões e nós de uma rede específica. Essa rede é visualmente representada na Figura 5.

Figura 5 – Representação gráfica da tese com conexões

Teia de aranha em fundo escuro

Descrição gerada automaticamente com confiança média
Fonte: Autor

1.4 Recursividade e reflexividade

A sequência de tópicos apresentadas nesta seção, segue uma formatação lógica e não cronológica. Podemos entender o processo de construção da tese conforme a Figura 6.

Na Figura 6, podemos observar áreas de interesse em destaque. Estas foram exploradas de forma teórico e empírica de forma recursiva. Assim as conexões particulares deste estudo foram estabelecidas: entre Organizações Híbridas, Cartografia (metodologia) e Teoria da Atividade Histórico-Cultural (lente teórica).

Figura 6 – Meta processo Tese parte 1

Diagrama, Esquemático

Descrição gerada automaticamente
Fonte: Autor

A recursividade permite a construção do conhecimento situado e em camadas. Possibilitando a constituição de conexões, conteúdos e construções teóricas que funcionam como pontes entre os pontos de partida.

Figura 7 -Meta processo Tese parte 2


Fonte: Autor

Depois de passar pelo contexto e histórico, assim como o porquê da metodologia escolhida, é hora de conhecermos as lentes usadas para “ordenar o caos”.

1.5  Muitas “coincidências” me aproximaram da Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT)

É sabido e notório nos corredores acadêmicos os efeitos que uma teoria pode exercer em um pesquisador. Alguns sintomas dessa paixão acadêmica podem incluir: a) a tentativa de justificar tudo com a teoria escolhida; b) a necessidade de falar sobre ela o tempo todo; c) a tendência de criticar outras teorias.

Pode-se dizer que esses comportamentos são característicos de uma paixão, a qual pode surgir por diferentes motivos. No entanto, uma coisa é certa: uma paixão não é compreendida através, apenas, da razão. No nosso caso, fomos apresentados durante o mestrado. Ao projetar uma possível aproximação, fui prontamente alertado da sua complexidade, dificuldade de aplicação e profundidade. Movido pela razão e pelos prazos apertados do mestrado, nos evitamos.

Ao iniciar o doutorado, e vivendo os resultados do doutorado descritos antes, a CHAT aparecia novamente como um desafio pessoal, e possibilidade de incutir robustez teórica na nova exploração. Algumas coincidências interessantes sobre a CHAT e a Team Academy.

O principal teórico e expoente da CHAT se chama Yrjö Engeström, pesquisador finlandês que nos anos 90, frente à crise econômica que a Finlândia passava, construiu um modelo de aplicação da Teoria da Atividade para Organizações, chamado Laboratório de Mudança(ENGESTROM, 2014).

O fundador da Team Academy, se chama Johannes Partanen, professor de marketing finlandês que nos anos 90, frente à crise econômica que a Finlândia passava, construiu um modelo de aprendizagem pela prática, aplicada no ensino de Administração de Empresas, chamado Tiimiakatemia[9].

O aspecto que mais me chama a atenção são as influências cruzadas nas proposições. Enquanto a Team Academy propõe juntar empreendedorismo com cooperativismo, influências vindas de escolas de pensamento bem distintas[10].

Engeström, buscou na psicologia social russa o olhar para o coletivo através do conceito de Atividade[11] e a adoção da dialética marxista[12]. Seu livro “Learning by expanding” onde propõe as bases da Teoria da Atividade usada hoje é de 1987, dois anos antes da queda do muro de Berlim.

A CHAT entende que um Sistema de Atividade é parte de uma rede interconectada e interdependente de Sistemas de Atividade. A teoria pode ser aplicada em um recorte restrito, mas também é capaz de incluir outros níveis de análise, e as relações entre si. Destaco mais 3 pontos com base em Engeström (2014):

  1. A CHAT é capaz de capturar, ordenar, traduzir e analisar processos, com uma representação visual simples;
  2. Valoriza a multivocalidade, o fluxo constante e considera a aprendizagem como um processo social
  3. Entende a pessoa pesquisadora como uma agente de influência e transformação, adota a abordagem de pesquisa intervencionista

1.6  Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) para ordenar o caos

A velocidade das mudanças, aceleradas pela tecnologia é vertiginosa, o VUCA, o BANI, as Startups, Starlink, Realidade Virtual, Unicórnios, “farialimers” … e o ChatGPT[13].

Vou usar o ChatGPT como ferramenta revolucionária de um Sistema de Atividade para exemplificar o uso da CHAT para a leitora. Vamos usar analisar o impacto do ChatGPT no Ensino Superior, especificamente na forma como a Academia[14] é avaliada e recompensada, e os impactos dessa nova ferramenta.

Breve preâmbulo:

Existe uma crítica recorrente à maneira como a academia, especialmente os estudos organizacionais – que englobam pesquisas em administração dentro da grande área das ciências sociais aplicadas – é conduzida. A crítica se concentra na busca pelo produtivismo acadêmico, onde os pesquisadores são pressionados pela quantidade de artigos publicados e seu impacto(SILVA, 2019).

Para simplificar para o leitor não acadêmico: os acadêmicos são avaliados pela quantidade dos artigos que produzem e pelo impacto desses artigos, que deveria ser uma métrica de qualidade, mas tem sido amplamente debatido se é a melhor abordagem. O objetivo dessas métricas é tornar a produção acadêmica mais relevante, com a premissa de que a alta produção resultará em qualidade. Talvez haja a intenção de tornar visível o trabalho dos pesquisadores, que muitas vezes é invisível aos olhos da sociedade(DE FARIAS JÚNIOR, 2020).

As métricas são usadas para avaliar os professores, os cursos e as universidades. Elas influenciam nos recursos destinados a cada instituição, e aos pesquisadores. Sendo assim, com a definição de que produzir era necessário, os processos internos das Universidades se ajustaram para esse fim. Em alguns casos, gerando formas criativas de produção de artigos(VIEIRA; CASTAMAN; JUNGES JÚNIOR, 2021).

Em dezembro de 2022 foi lançado o ChatGPT, um modelo de inteligência artificial capaz de produzir textos complexos e contextualmente relevantes. Foi treinado em uma ampla gama de dados da internet, e é capaz de realizar tarefas como responder perguntas, escrever ensaios, resumir textos, traduzir idiomas e até mesmo gerar ideias criativas(DWIVEDI et al., 2023).

Rapidamente uma série de aplicativos, plugins e funcionalidades foram lançadas, e demonstraram o potencial da ferramenta em substituir muitas das tarefas realizadas por humanos hoje. Tal qual a automação fez com o trabalho repetitivo nas indústrias e a mecanização retirou os trabalhadores do campo, a inteligência artificial tende a impactar os profissionais do conhecimento e o mundo acadêmico(BERG, 2023).

1.7  A introdução de uma nova ferramenta (artefato) é capaz de desestabilizar o Sistema de Atividade[15]

Quando nos falta uma lente teórica para examinar um fenômeno, é comum simplificarmos excessivamente a discussão ou aumentarmos a complexidade até a paralisia ou incompreensão. Vemos isso ocorrendo frequentemente nas redes sociais, e infelizmente a simplificação é muito mais fácil de ser absorvida e replicada.

Figura 8 – Múltiplas variáveis na análise de um fenômeno

Gráfico, Gráfico de radar

Descrição gerada automaticamente
Fonte: Autor

A Teoria da Atividade Cultural-Histórica (CHAT) propõe que um Sistema de Atividade é composto por seis componentes interconectados:

  1. Sujeito: O indivíduo ou grupo que está realizando a atividade. No contexto da academia, o sujeito seria o pesquisador ou o grupo de pesquisa.
  2. Artefato: As ferramentas ou signos que o sujeito usa para realizar a atividade. No caso do ChatGPT, o próprio software seria o artefato.
  3. Objeto: O objetivo ou propósito da atividade. Na academia, o objeto poderia ser a produção de conhecimento ou a publicação de um artigo de pesquisa.
  4. Regras: As normas ou diretrizes que governam a atividade. No contexto acadêmico, as regras poderiam incluir as diretrizes de publicação ou os critérios de avaliação da pesquisa.
  5. Comunidade: O grupo social que compartilha o mesmo objeto. Na academia a instituição acadêmica e as partes envolvidas.
  6. Divisão do Trabalho: A maneira como as tarefas são distribuídas entre os membros da comunidade. Na pesquisa acadêmica, a divisão do trabalho pode variar bastante a depender do tamanho e da estrutura do grupo de pesquisa.

Estes seis componentes interagem para criar um sétimo elemento: o Resultado. O resultado é o produto final da atividade, que, no caso da pesquisa acadêmica, poderia ser um novo conhecimento ou uma publicação de pesquisa.

Ao aplicar essa estrutura para analisar a situação atual da academia com a introdução do ChatGPT, podemos começar a entender como essa nova ferramenta está afetando cada componente do Sistema de Atividade (SA) e, por extensão, o resultado final. Primeiro vamos construir um SA representando, de forma simplificada e geral, como está configurado o processo de produção acadêmica hoje em uma Instituição de Ensino Superior no Brasil.

Figura 9 – Sistema de Atividade do fazer acadêmico pré ChatGPT
Diagrama

Descrição gerada automaticamente
Fonte: Autor adaptado de Engeström (2001)

Este exercício[16] desempenha algumas funções importantes:

  1. Ilustra que a produção de um Sistema de Atividade (SA) é uma interpretação da pessoa pesquisadora sobre o fenômeno em estudo
  2. Revela a fragilidade do equilíbrio dos SAs


Figura 10 – Sistema de Atividade do fazer acadêmico pós ChatGPT
Fonte: Autor adaptado de Engeström (2001)

Na Figura 10[17], observamos um novo quadro chamado “Contradições”, e linhas vermelhas pontilhadas indicando algumas áreas de destaque. Esta análise destaca as contradições presentes no SA. As contradições são o motor de desenvolvimento e evolução de um SA. Em muitos casos, elas já estão presentes, mas não tem a força suficiente para mudar o sistema. No caso em questão, por exemplo, a insatisfação com a forma de medir a produtividade já existia entre os pesquisadores, mas até agora não teve força suficiente para forçar uma evolução no SA (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010).

Esta é potencialmente a situação em que um novo artefato desestabiliza o equilíbrio do SA e exige uma evolução. Neste caso, forçando uma revisão completa da prática acadêmica, desde o Objeto (a razão de ser deste sistema), passando pelos artefatos que serão utilizados, as regras que serão redefinidas, a divisão do trabalho que será reconfigurada, e assim por diante (DWIVEDI et al., 2023).

A CHAT, neste caso a Teoria da Atividade, entende os SA como partes interconectadas de outros SA´s. Essa visão nos permite aumentar ou diminuir o “zoom” de análise de um SA, dependendo do fenômeno a ser pesquisado, para uma melhor compreensão do objeto de pesquisa e de suas interrelações (VIRKKUNEN; KUUTTI, 2000).

Figura 11 – Exemplo de um (SA) com interrelações

Fonte: Engeström (2001)

Na Figura 11[18], temos um SA com interrelações, pois podemos representar partes do SA como um SA independente. Por exemplo, o processo de revisão de um artigo, que pode ser representado como um artefato, pode ser investigado como um SA completo. Essa capacidade de aproximação e distanciamento do objeto de estudo permite à Teoria da Atividade construir uma compreensão mais sistêmica dos fenômenos, mantendo uma estrutura de análise comum.

1.8 Reflexões da “mini prática”   

Fizemos um pequeno ciclo de etapas que teve por objetivo de orientar o leitor não acadêmico, especialmente em relação às premissas adotadas por mim. Usei uma estrutura didática para ilustrar a natureza recursiva da pesquisa, que ganha profundidade à medida que os elementos se aproximam e novas conexões se tornam possíveis, tudo isso sustentado pela reflexividade do pesquisador.

Destacamos o papel crucial da contextualização clara, apoiada por uma metodologia robusta e artefatos que fornecem as condições necessárias para a operacionalização da pesquisa. Além disso, enfatizamos a importância da lente teórica na organização de um fenômeno que, de outra forma, poderia ser considerado excessivamente complexo para estudo.

Como é comum em qualquer estudo, chegamos ao fim com mais perguntas do que quando começamos, cada uma delas nascendo da reflexão sobre a jornada que percorremos. Neste caso, não é diferente. Concluo esta introdução construtiva com uma questão que surge naturalmente:

As universidades precisarão redefinir seu papel na Era da Inteligência Artificial? Se sim, qual será esse novo papel?

Acredito[19] que uma das frentes que deve ganhar força é relativo ao papel de auxiliar, pessoas, grupos, organizações a criar significado e aplicação situada ao conhecimento produzido em conjunto com a Inteligência Artificial. Que alinha-se com o posicionamento da Teoria da Atividade e da Cartografia de entender o pesquisador como um intervencionista (CASAGRANDE; GODOI, 2013; PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015).

Talvez essa seja a chance, ameaçados pelos “cérebros de silício”, implodir a torre de marfim e se aproximar dos fenômenos e da intervenção para transformação.

1.9 SUSTENTABILIDADE E O PAPEL DAS ORGANIZAÇÕES

A busca por formas de organizar e aprender, que possibilitem um futuro mais sustentável e possam desenvolver o potencial humano dos colaboradores de uma organização é um caminho urgente e sem um final conhecido, essencialmente por serem dois conceitos (ou objetos de atividade) baseados em propósito e não em metas.

Ainda que tenhamos dificuldade de olhar para essas questões de forma analítica, pois nos dá um sentimento de incapacidade de ação, é sabido que vivemos em um mundo em desequilíbrio de forma insustentável (ONU, 2015). Nos encaminhamos para uma catástrofe de nossa espécie, onde a questão ambiental é a que mais ganha notoriedade, porém também enfrentamos crises: na justiça internacional (comércio e imigração); justiça global (pobreza e direitos humanos) e toda a questão ecológica (extinção das espécies, acidificação do oceano, aquecimento global, etc..)(SHOVE, 2010; WHITE, 2018).

Shove (2010) defende que a transição para a sustentabilidade não depende de legisladores forçando a população a transformar seus hábitos através de sacrifícios, ao invés disso a transição se dá quando “as regras” do jogo deixam de valer e o status quo é questionado. Talvez seja cedo para afirmar que é este movimento que estamos vivendo, porém alguns sinais de que uma redefinição está em curso são aparentes, como por exemplo o reposicionamento da linha editorial do Financial Times, pedindo que o modelo capitalista como o conhecemos seja repensado[20].

As organizações tem papel fundamental na construção de soluções viáveis para que sejamos capazes de enfrentar os desafios que temos pela frente enquanto humanidade(ONU, 2015). Esse chamado da ONU (2015) está ainda mais explicito a partir da agenda 2030, que organiza os desafios e metas relacionadas a sustentabilidade nos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS´s).

Nos últimos anos temos visto alguns movimentos empresariais promovendo um novo olhar para nossa forma de viver, produzir e organizar e neste trabalho me concentrarei nas formas de organizar. Pode-se destacar o Capitalismo Consciente, as Empresas B, Empresas Humanizadas, Culturas Restaurativas entre outros movimentos organizacionais que buscam uma transformação do papel das organizações. Em agosto de 2019, um grupo de 200 CEO´s de grandes organizações foi a público fazer uma declaração de que é necessário redefinir o propósito das corporações para “uma economia que sirva todos americanos”(SANDLER, 2019).

 É relevante olharmos para esses movimentos, não de forma isolada, porém como parte de processo de redefinições que estão ocorrendo em diferentes frentes, formas, intensidades e grupos sociais. Nosso modelo de desenvolvimento é insustentável ambientalmente[21] (WWF, 2019), a forma como ele se dá, promovendo a concentração de recursos, e a proliferação da miséria é um crime contra a humanidade (BBC, 2019). Porém, discussões decorrentes dos mencionados movimentos espelham o pensamento mecanicista, polarizando e radicalizando o debate com o intuito de manter o status quo (WHEATLEY, 2011). Ou se é azul ou vermelho; ou A, ou B. Como levantado pelo Jornal El País, “não temos capacidade de discutir política” (EL PAIS, 2019).

Estamos vivendo uma onda populista/conservadora e não sabemos como lidar com isso, o exemplo emblemático é a negação das mudanças climáticas e a inabilidade da comunidade científica e da mídia em responderem a esse fenômeno (COOK; COOK, 2016), sem mencionar a politização em torno da pandemia do novo corona vírus (COVID 19). Junte-se a isso nossa incapacidade, enquanto sociedade, de aceitar a contradição e a falta de respostas definitivas para problemas complexos (SCHNEIDER, 2015). Schneider (2015) destaca que a negação de paradoxos é um aspecto generalizado na nossa sociedade, pela incapacidade de sentir-se “sem chão”.

O autor usa a expressão “sem chão” para explicar momentos em que perdemos nossas referências, ou entendimentos de verdades absolutas. E enquanto sociedade, acabamos por comprar soluções simplistas e confortantes (SCHNEIDER, 2015).

Engeström (2014) relata um fenômeno parecido em processos de aprendizagem expansiva[22], onde os indivíduos incapazes de construir uma proposta para a contradição enfrentada em uma atividade, acabam por desqualificar a problemática e retroagir no processo evolutivo.

Não sabemos, enquanto sociedade, como tratar o assunto e tampouco as organizações. O livro Reinventando Organizações de Frederick Laloux se tornou uma referência na busca por novas formas de organizar. A partir dos estudos de Ken Wilber, o autor apresenta um modelo de entendimento dos diferentes níveis de maturidade dos indivíduos que se refletem em modos organizacionais correspondentes. Buscando oferecer clareza de sua intenção pedagógica,  Laloux propõe um adjetivo e uma cor para cada estágio evolutivo de seu modelo(LALOUX, 2017).

Figura 12- Estágios da consciência humana e organizacional

Fonte: LALOUX (2017, p.34).

Laloux (2017) detalha em seu livro os estágios de consciência, sua relação com os tipos organizacionais e características de cada um desses tipos de organização. Segue-se a lógica de que as formas de organizar puderam evoluir e ressignificar os papéis dos participantes dessas organizações. No quadro abaixo sistematizo as principais características das organizações conforme classificação do autor.

Quadro 1 – Estágios de consciência

 Exemplos atuaisPrincipais avançosMetáfora orientadora
Organizações Vermelhas
Constante exercício do poder pelo chefe para manter tropas na linha. O medo é a liga da organização. Altamente reativa, foco no curto prazo. Prospera em ambientes caóticos.
– Máfia – Gangues de rua – Milícias tribais– Divisão do trabalho -Autoridade de comandoAlcateia
Organizações Âmbares
Papéis altamente formais em uma pirâmide hierárquica. Comando e controle de cima para baixo (o que e como). Estabilidade valorizada acima de tudo por meio de processos rigorosos. Futuro é repetição do passado.
– Igreja Católica -Forças Armadas -Maioria das agências governamentais -Sistemas de escolas públicas-Papéis formais (hierarquias estáveis e escaláveis) -Processos (perspectivas de longo prazo)Forças armadas
Organizações Laranjas
O objetivo é vencer a concorrência; atingir lucro e crescimento. Inovação é a chave para ficar à frente. Gestão por objetivos (comando e controle no quê; liberdade no como).
-Companhias multinacionais -Escolas autônomas– Inovação -Responsabilização – MeritocraciaMáquina
Organizações Verdes
Dentro da estrutura da pirâmide clássica, foco na cultura e no empoderamento para alcançar extraordinária motivação dos funcionários.
– Organizações direcionadas pela cultura (Exemplos: Southwest Airlines, Ben & Jerry´s)– Empoderamento – Cultura direcionada por valores – Modelo de stakeholdersFamília


Fonte: LALOUX (2017, p.34).

A ordenação por cores e estágios de evolução não é relacionada às pessoas, mas sim a cultura organizacional presente, “Se olharmos para a estrutura de uma organização, suas práticas e seus elementos culturais, geralmente podemos discernir de que visão de mundo elas derivam.(LALOUX, 2017, p. 40)”.

Não há particularmente nada novo em sua proposição, mas compila e traduz de forma acessível e didática, estes estágios de consciência organizacional. Propondo uma série de modelos caricaturados facilita a compreensão e absorção de suas ideias ao grande público, o autor lançou o livro em 2014 e se tornou uma referência na difícil tarefa dos indivíduos conseguirem expressar o tipo de transformação necessária nas organizações. Mais que mudança de discursos e ações isoladas(DIGNAN, 2019), é necessário uma transformação das práticas e da forma de enxergar o mundo (LALOUX, 2017).

A principal bandeira do “paradigma TEAL[23]” é a expressão do potencial humano de todos os colaboradores de uma organização. Esse ideal é expresso em três valores: propósito evolutivo, integralidade e autogestão (LALOUX, 2017).

1.10             VISUALIZANDO A PROPOSIÇÃO DE LALOUX A PARTIR DA CHAT

No Quadro 2, podemos ver uma exploração dos níveis de consciência propostos por Laloux, vistos a partir da lente da Teoria da Atividade, importante destacar alguns pontos:

  1. Organizações podem gerar o mesmo produto a partir de lógicas e processos muito distintos
  2. O Objeto é o motivo de existir do Sistema de Atividade, o Objeto evolui junto com o aumento da complexidade da Organização
  3. Sujeito e Artefatos também evolui em direção à uma maior inclusão e autonomia dos atores do Sistema da Atividade
  4. A Comunidade se expande, incluindo clientes, cadeia produtiva e a sociedade como um todo
  5. A Divisão do trabalho também se reconfigura, ajustando-se ao Objeto, os Artefatos, as Regras, a Comunidade e os Sujeitos envolvidos

Podemos entender que, mesmo que o resultado ou produto se mantenha aparentemente o mesmo, o Sistema Operacional todo se reconfigura. A evolução de consciência de uma organização não é uma mudança superficial, ou que possa ser definida por um grupo e uma simples chave seja virada. Ao decorrer dessa Tese vamos explorar essa jornada.

Observamos a transição necessária das organizações de estruturas hierárquicas para a formação de times autônomos como uma estratégia essencial para lidar com a complexidade do sistema (organização) e do ambiente que está inserida. À medida que as organizações avançam para os estágios verdes e TEAL de consciência, eleva-se a autonomia e poder de decisão conferido às equipes. A razão para isso é que, em um ambiente complexo e em constante mudança, as decisões muitas vezes precisam ser tomadas rapidamente e no nível onde o trabalho está sendo realizado, o vulgo “na ponta”.

A estrutura baseada em times permite que as organizações sejam mais ágeis e resilientes, adaptando-se rapidamente às mudanças e respondendo efetivamente às novas demandas. Isso também capacita os membros da equipe a usarem seu conhecimento e habilidades para a tomada de decisões, aumentando o engajamento e a satisfação no trabalho.

Quadro 2 – Sistemas de Atividade de uma Organização em diferentes níveis de consciência

Estágio de consciênciaResultadoObjetoSujeitoArtefatosRegrasComunidadeDivisão do trabalho
Organizações VermelhasProdução de MóveisMóveis simples, produção em massaOperários/ TrabalhadoresFerramentas manuais, equipamentos rudimentaresHierarquia imposta pelo chefe, controle rígido, disciplinaChefe e trabalhadoresTrabalho dividido pelo chefe de forma autoritária
Organizações ÂmbaresProdução de MóveisMóveis de melhor qualidade, variedade limitadaSupervisores, OperáriosMáquinas industriais simples, processos de produção padronizadosRegras formais, procedimentos padrão, comando e controleSupervisores, operários, fornecedores, clientesTrabalho dividido segundo funções bem definidas, seguindo hierarquia
Organizações LaranjasProdução de MóveisMóveis personalizados, linha diversificadaGerentes, Operários, Equipes de inovaçãoMáquinas industriais avançadas, ferramentas digitais para inovação e eficiênciaMetas e objetivos claros, meritocracia, inovação incentivadaGerentes, equipes de inovação, operários, fornecedores, clientesTrabalho dividido por competências, incentivo à inovação e responsabilização
Organizações VerdesProdução de MóveisMóveis ecológicos, sustentáveis, produção com baixo impacto ambientalTodos os membros da organizaçãoTecnologias verdes, processos ecoeficientes, ferramentas de gestão colaborativaValores éticos e sustentáveis, democracia no local de trabalho, empoderamento dos trabalhadoresTodos os membros da organização, fornecedores éticos, clientes conscientesTrabalho dividido de forma colaborativa, papéis flexíveis e adaptáveis, priorizando a satisfação do trabalho
Organizações TEALProdução de MóveisMóveis transformacionais que agregam valor à vida das pessoas, criam bem-estar social e minimizam impactos ambientaisTodos os membros da organizaçãoTecnologias avançadas, processos adaptáveis, inteligência coletivaAusência de regras fixas, flexibilidade e adaptação, orientação por propósitoTodos os membros da organização, toda a cadeia de valor, sociedadeAuto-organização, papéis fluidos e rotativos, baseado nas necessidades e potencialidades individuais

Fonte: Autor

1.11              De organizações hierárquicas para times:

A orientação do trabalho por times vem ganhando mais atenção, não só nas proposições de Laloux, como também é a lógica organizadora das metodologias ágeis[24] (LEMAY, 2019). Sendo aplicado de muitas formas em diferentes situações, em publicação recente o World Economic Forum aponta como os métodos ágeis estão sendo adaptados para os boards das grandes corporações (WORLD ECONOMIC FORUM, 2018).

É bem comum que se confunda o que é um time com um grupo de trabalho, a diferença fundamental reside na forma como o trabalho é medido, que por sua vez influencia em toda a dinâmica empregada. Um grupo de trabalho é composto por um grupo de pessoas e compartilham um objetivo e são coordenadas por um líder, porém tem suas performances individualmente acompanhadas e avaliadas. Por outro lado um time é “composto por um pequeno número de pessoas com habilidades complementares comprometidas com um propósito em comum, definição de metas e a abordagem e métricas que os farão mutualmente responsáveis” (KATZENBACH; SMITH, 1993, p. 112)

A adoção de times não é uma prática nova, apenas foi remodelada com as novas ferramentas tecnológicas, técnicas de modelos de gestão de projetos, e organização do fluxo de trabalho. Até mesmo o conceito de times autogerenciáveis ou autodirigidos não é novo, o primeiro estudo com times autodirigidos que se tem notícia foi realizado no Reino Unido e publicado em 1951, na ocasião era um time autodirigido para extração de carvão no método longwall (TRIST; BAMFORTH, 1951).

Assim como o experimento de Elton Mayo em Hawthorne, considerado o fundador da escola das relações humanas, a adoção de times autogerenciáveis é muito aplaudida e, ao mesmo tempo, muito criticada. Druskat e Pescolsolido (2002) mostram que o movimento de empoderamento dos times, possibilita o desenvolvimento de novas lideranças, a expressão da capacidade técnica dos integrantes do time, avanço nas capacidades de comunicação e tomada de decisão das equipes, assim como também mostram a redução dos cargos de gestão e o aumento da responsabilidade e responsabilização dos indivíduos na execução de suas tarefas.

Com a exclusão dos cargos de supervisão a organização se apoia no processo de peer pressure, ou seja a pressão dos pares passa a garantir o desempenho e qualidade dos integrantes do grupo, dessa forma podendo suprimir os níveis hierárquicos intermediários sem prejuízo de performance(DRUSKAT; PESCOSOLIDO, 2002). Os autores apontam o modelo mental dos integrantes do time como ponto preponderante para o sucesso da empreitada, assim como a cultura organizacional presente uma vez que os times têm um caminho de mão dupla em suas trocas com a organização.

A centralidade do usuário e a alta velocidade na evolução tecnológica e de mercado fazem com que as organizações precisem aproximar seus times – autônomos e multidisciplinares – dos processos de desenvolvimento e de tomada de decisão. Justificando-se a adoção de times como modelo de divisão do trabalho, principalmente em organizações de caráter mais tecnológico (DIGNAN, 2019).

Quando são necessárias múltiplas capacidades, os times são os mais adequados devido a sua capacidade de cooperar, por serem autônomos e por serem capazes de aprender rápido e de mudar rápido. A sua capacidade de análise e crítica, que vai além dos aspectos técnicos, os torna capazes de inovar através da tomada de decisões em situações paradoxais e por caminhos desconhecidos. Precisam ter proatividade e rebeldia de um empreendedor, mesmo estando dentro de uma organização (DIGNAN, 2019).

O processo de construção de times autônomos é um projeto desafiador de transformação radical, com grandes conflitos de interesses, relações de poder envolvidas no processo e normalmente não tratadas de forma transparente. Dignan (2019) destaca algumas dimensões como: a) autonomia; b) combinados para distribuição e fluxo do trabalho; c) formas de compartilhamento do poder e tomada de decisão; d) processos de aprendizagem e atualização de processos claros; e) definições de valores e diretrizes norteadoras; f) como nos reunimos e coordenamos; g) métricas e indicadores; h) meios e práticas de compartilhamento de informação; i) reconhecimento e remuneração; j) cultivo de nossas relações; l) utilização de recursos (tempo e dinheiro).

A literatura mostra que é incomum times e organizações terem clareza de como decisões são tomadas nestas dimensões (BREIDENBACH; ROLLOW, 2019; DIGNAN, 2019; LALOUX, 2017). Entender a forma como os combinados e as práticas realizadas para além do que é declarado e idealizado é chave para uma possível transformação da realidade presente e a possibilidade de construir combinados e formatos de trabalho de forma consciente, processual e coletiva(BREIDENBACH; ROLLOW, 2019; DIGNAN, 2019).

Somos incapazes de viver a tensão criativa do embate de ideias contrastantes sem a intermediação de uma figura com poder para decidir o caminho a seguir (BILLETT; HARTEIS; GRUBER, 2010). Organizações estão adotando metodologias e estruturas organizacionais a partir do discurso da autonomia e do pressuposto que essas capacidades são inerentes aos seus colaboradores, como reflexo vemos altos níveis de stress e proliferação de discursos simplistas para tratar essas dores, representados pelo fenômeno do coaching (LAANTI, 2013; STRAY; MOE; HODA, 2018).

O discurso da autonomia é um dos conflitos que existe entre aquilo que a organização gostaria de fazer e as práticas que ela está preparada para implementar. Será que uma organização e seus líderes realmente querem que um grupo de pessoas que possa decidir sozinho, produzir sem supervisão e estarem felizes e satisfeitos no trabalho?

1.2.       Não se constroem times autônomos sem indivíduos autônomos.

Autonomia tem sido um tema bastante discutido no campo da psicologia, e psicologia social, uma das questões é como o discurso da autonomia reforça o individualismo, já bem destacado no modelo econômico liberal vigente (CHRISTMAN; ANDERSON, 2005). Esse olhar da autonomia está baseado na agência do indivíduo sobre suas decisões, e tem o ponto de partida em duas capacidades principais, a reflexão crítica e a escolha racional dirigida(MEYERS, 2005).

Meyers (2005) apoia sua argumentação em cinco conceitos envolvidos na construção da autonomia do indivíduo: o ser unitário, o ser social, o ser relacional, o ser dividido e o ser incorporado. A autora defende que o entendimento destas distintas dimensões do ser são o primeiro passo para que se possa fazer uso delas com objetivo de desenvolver sua capacidade pessoal de autodescoberta, autodefinição e autodireção.

 Enquanto nos mantivermos presos no entendimento que a construção de times é uma capacidade técnica a ser desenvolvida através de combinados, processos e sistemas e seguirmos ignorando a necessidade de desenvolvimento do indivíduo de forma integral seguiremos fadados ao fracasso em transformar a forma como trabalhamos e vivemos(DIGNAN, 2019).

O processo de desenvolvimento dos indivíduos precisa ser apoiado pelas organizações, pois os indivíduos isolados não conseguem se manter atualizados, sendo portanto relevante o tema da aprendizagem organizacional (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016). As ferramentas que dão suporte para a aprendizagem organizacional estão contidas em um paradigma mecanicista conteudista, de transmissão de conteúdo e padronização das rotinas a partir de melhores práticas que devem ser seguidas como modelo de sucesso (BILLETT; HARTEIS; GRUBER, 2010).

Teorias como a da Aprendizagem pela Experiência (KOLB, 1984b) ou a Teoria da Criação do Conhecimento na Empresa (NONAKA; TAKEUCHI, 1995) contribuem na discussão da aprendizagem organizacional, mas especificamente com relação à necessidade de reflexão sobre a prática/experiência. Porém, partem de um cenário onde já se tem clareza do problema a ser resolvido, ou há uma tarefa a ser executada (ENGESTRÖM, 2008).

Dessa forma a identificação do problema é deixado de lado de suas teorias, apoiados ainda na divisão do trabalho defendida pela administração científica de Taylor, onde o planejamento e desenho dos processos era feito pela alta gestão e corpo técnico e a execução pela massa de operários(ENGESTROM, 2014; ENGESTRÖM; SANNINO, 2012).

Em um ambiente onde a capacidade de leitura do entorno e discussão de possibilidades ainda não pensadas é urgente, ou seja, a aplicação de velhas respostas para perguntas já conhecidas já não supre as necessidades que vivemos, esse papel está sendo ocupado por inteligências artificiais (IA) e robôs. Nesse sentido as propostas de Engeström e Sannino (2010) reforçam a importância do saber situado apoiando-se nos saberes presentes para construção de soluções e aprendizagens[25].

Essa tese busca entender como as organizações que estão trilhando esse caminho de construção de uma sociedade mais justa e em maior equilíbrio, sem perder a viabilidade financeira, estão construindo estruturas menos hierárquicas, mais autônomas e com maior possibilidade de desenvolvimento do potencial humano.

Desenvolvimento do potencial humano está relacionado com os processos de aprendizagem que são instigados e proporcionados pela organização. Nesta tese o potencial humano é tratado como o processo de evolução e ressignificação de suas concepções pessoais e significados atribuídos ao mundo em que vive, para isso me apoiarei em Engeström novamente e na Teoria da Aprendizagem Expansiva[26] para identificar e entender quando eles ocorrem.

O campo pesquisado é delimitado pelo conceito de Organizações Híbridas[27], são aquelas que buscam equilibrar interesses econômicos, sociais e ambientais (os três pilares da sustentabilidade).

Como já apresentado, o estudo utiliza a Teoria da Atividade Histórico-Cultural[28] como lente teórica e a Cartografia[29] como percurso metodológico.

Ao que nos leva a pergunta de pesquisa norteadora do trabalho, e os objetivo do mesmo:

Quais estratégias e práticas são empregadas pelas Organizações Híbridas para promover o desenvolvimento organizacional e o potencial humano de seus membros simultaneamente?

Objetivo Geral:

Investigar e compreender as estratégias e práticas adotadas por Organizações Híbridas para harmonizar o desenvolvimento do potencial humano de seus membros e a realização dos objetivos organizacionais.;

Objetivos específicos

  • Identificar e compreender o contexto organizacional, os elementos analíticos (artefatos, sujeito, objeto, regras, comunidade e divisão do trabalho) e compor sistemas de atividade das organizações estudadas;
  • Construir e analisar os sistemas de atividade de cada micro-prática realizada pelas organizações para este fim, constatando as contradições inerentes a estes sistemas;
  • Compreender se ocorrem e como se dão os processos de Aprendizagem Expansiva nas micro-práticas analisadas;
  • Propor um framework teórico-analítico destas práticas baseado na teoria da atividade.

Assim na próxima sessão apresentarei as Organizações Híbridas, logo em seguida exploraremos a lente teórica entrando no âmbito das abordagens baseadas em prática, para posteriormente explorar a Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT). Na sequência descreverei os caminhos metodológicos escolhidos, e finalmente o cronograma desenhado para o restante da construção da tese.

Como apresentado na introdução da tese, há uma grande necessidade de conexão e fechamento de lacunas entre as diversas entidades da sociedade para que possamos avançar em direção a um futuro mais sustentável, humano e que permita o desenvolvimento do potencial humano.

Desde o início da minha trajetória acadêmica, minha motivação sempre foi diminuir a distância entre a academia e as organizações. Infelizmente, essa relação ainda é estigmatizada e, em alguns casos, com razão. Meu objetivo é apresentar uma proposição autoral, embasada em teoria e evidências, que possa ser aplicada por pessoas não acadêmicas e aprimorar a forma como trabalham.

Um dos aspectos principais desse trabalho é a possibilidade de usar dados para apoiar caminhos e opções de desenvolvimento, juntamente com a construção coletiva de conhecimento. Sabemos que o progresso das organizações depende de construções autorais que expressem seus valores e objetivos e evoluam juntamente com os desafios em que estão inseridas. No entanto, essa evolução não pode ser sustentada apenas por atores externos; é necessária a capacitação de profissionais das organizações para que possam operacionalizar pesquisas e aprimorar suas organizações.

Por fim, acredito que essa pesquisa contribuirá para a construção de pontes entre a academia e as organizações, capacitando os profissionais a utilizar evidências e teorias para aprimorar suas organizações e, assim, torná-las mais eficientes e sustentáveis em um mundo em constante mudança.

 

2.    organizações hibridas

RESUMO PARA LEITORES NÃO ACADÊMICOS:

Organizações híbridas são empresas com um objetivo bem interessante: elas querem resolver algum problema social ou ambiental enquanto continuam a ganhar dinheiro. É como juntar o melhor de dois mundos, só que não é tão simples como parece(HOFFMAN; BADIANE; HAIGH, 2012).

A ideia é criar um equilíbrio entre o impacto positivo na sociedade, no meio ambiente e a saúde financeira do negócio. Isso significa que elas buscam combinar lucro com benefício à sociedade e meio ambiente. Existem vários tipos de organizações híbridas, elas estão distribuídas em um espectro entre Organizações sem fins lucrativos e Organizações “tradicionais” com fins lucrativos (BATTILANA; DORADO, 2010).

Um ponto importante é que todas essas organizações têm objetivos sociais e financeiros. As metas sociais podem variar de empresa para empresa, dependendo do que elas querem focar. Pode ser criar oportunidades para pessoas pobres, promover a inclusão de minorias, defender direitos humanos ou cuidar do meio ambiente. Já os objetivos financeiros são voltados para a criação de valor econômico e a sustentabilidade financeira (ALTER, 2007).

Mas nem tudo são flores. Organizações híbridas enfrentam um grande desafio: equilibrar a necessidade de ser financeiramente viável e ao mesmo tempo ter um impacto social significativo. Às vezes, esses dois objetivos entram em conflito, e as empresas precisam tomar decisões difíceis (BATTILANA; DORADO, 2010).

Organizações híbridas necessitam de uma cultura organizacional que sustente o ideal. Isso inclui ter líderes que dão o exemplo, sistemas de incentivo que reforçam comportamentos e valores desejados, e uma estrutura organizacional que ajude a manter um equilíbrio entre os objetivos sociais e econômicos (BATTILANA; LEE, 2014).

No fim das contas, cada organização híbrida é única em suas necessidades e desafios. Não existe um modelo perfeito que funcione para todos. Há o desafio adicional de ser capaz de conviver com as contradições de forma muito intensa. Em modelos organizacionais hierárquicos essa capacidade fica restrita à poucas pessoas responsáveis por criar estratégias e tomar grandes decisões. Porém, em estruturas organizacionais menos hierárquicas, onde espera-se que os times sejam capazes de tomar decisões com agilidade e alinhamento aos valores e propósito da organização o desenvolvimento das pessoas colaboradoras ganha uma grande importância, como apontamos na seção anterior (BATTILANA; LEE, 2014).

TEXTO ACADÊMICO:

Organizações hibridas são empresas que constroem seu modelo de negócios baseado no alivio de uma questão social ou ambiental específica (HAIGH et al., 2015). O número de organizações aderentes a este formato vem crescendo nos últimos anos, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento. Ainda que os termos utilizados para descrever esse movimento variem todos eles focam na dualidade entre o impacto social/ambiental e sua viabilidade financeira, assim como as iniciativas destas organizações para combinar atividades com e sem fins lucrativos (GARCIA, 2016; HAIGH et al., 2015).

A forma como as organizações constroem a sua essência constituídas de um foco em lucro e em “caridade” segue o racional de um contínuo ao invés de uma dicotomia. Atividades de Responsabilidade Social Corporativa antes vistas como estranhas as atividades da organização, tem sido cada vez mais entendidas como essenciais para a organização e para os colaboradores na conexão do trabalho com o propósito organizacional (ALTER, 2007).

Figura 13 – Espectro das Organizações Híbridas

Fonte: ALTER (2007, p.23).

No espectro das Organizações Híbridas temos dois tipos opostos e muito distintos de organizações, tendo o seu propósito primário como o ponto de diferenciação.

Organizações Sem Fins Lucrativos, Organizações Sem Fins Lucrativos com Geração de Receita e Empresas Sociais compartilham o propósito de impacto social e se diferenciam pela forma como viabilizam financeiramente seu impacto social.

 Já as Organizações com Fins Lucrativos[30], Corporações Praticando Responsabilidade Social e Negócios Socialmente Responsáveis tem seu propósito primário o retorno do investimento dos seus acionistas, viabilizado pelos lucros esperados de sua operação.

As Nonprofit existem para criar valor social/ambiental e precisam encontrar formas para atingir sua viabilidade financeira para sua manutenção. As For-profit existem para criar valor econômico, ainda que possam contribuir socialmente para sobreviver no mercado. As Organizações Híbridas buscam a criação de valor duplo para se manterem em um equilíbrio sustentável.

Objetivos sociais tem o foco em cumprir sua missão que pode variar de acordo com seu foco de atuação, podendo passar por criar oportunidades para pobres, inclusão de minorias, direitos humanos, fortalecimento da sociedade civil, questões relacionadas ao meio ambiente etc.

Objetivos financeiros se focam na criação de valor econômico e na sustentabilidade financeira. Suas estratégias podem variar conforme as possibilidades de cada atuação, geração de receitas vinculadas ou desvinculadas com o seu objeto social, programas autofinanciáveis, geração de receita complementar com eventos, treinamentos, conferências etc.

Organizações Sem Fins Lucrativos com Geração de Receita: atividades geradoras de receita são integradas as suas atividades sociais. Normalmente não são suficientes para cobrir todos os custos de operação da organização. A Gastromotiva[31] é um exemplo de organização que financia parte de suas atividades com cursos.

Empresas Sociais: essa definição é objeto de longa controvérsia e nesta tese adotarei o entendimento de que empresas sociais se diferenciam dos Negócios Socialmente Responsáveis pelo fato de não distribuírem lucro para os seus acionistas, Grameen Bank é um exemplo desse grupo (ALTER, 2007).

Negócios Socialmente Responsáveis: São organizações com objetivos de gerar distribuição de lucro para seus acionistas e contribuir para um bem social maior. Bem & Jerry´s e Body Shop são exemplos desse grupo (ALTER, 2007)

Corporações Praticando Responsabilidade Social: São empresas que tem sua motivação direcionada para o lucro, porém se envolvem em filantropia. “Filantropia estratégica” (ALTER, 2007) que ajuda a empresa a maximizar seus lucros e auxilia a sociedade em um bem comum. Responsabilidade Social Corporativa não é classificada como uma inciativa social, ainda que sua atividade possa causar um impacto positivo para a sociedade e auxiliar o bem comum. Podemos ver exemplos em organizações que criam práticas internas de apoio a comunidade, ou através de fundações (Grupo RBS, Gerdau, etc…)[32].

2.1.       ORIGENS

Podemos rastrear o início do movimento de organizações híbridas nos anos sessenta[33], juntamente com o crescimento de organizações (sem fins lucrativos) que começaram a ocupar o vácuo governamental em uma série de temáticas como direitos humanos, questões ambientais, movimentos antiguerra e da libertação das mulheres (HAIGH et al., 2015). A busca por viabilidade financeira e a independência destas organizações criaram as condições para que organizações híbridas começassem a surgir nas condições que hoje podemos observar(GARCIA, 2016).

Já o resguardo legal destas organizações demorou para começar ser contemplado pelos legisladores. Caso notório foi a aquisição da empresa americana de sorvetes Ben & Jerry pela multinacional Unilever em 2000. A multinacional ganhou nos tribunais o “direito” de comprar a empresa já que a legislação apontava que por ser pública a empresa era obrigada, ou a comprar a parte dos sócios pelo valor ofertado, ou aceitar a negociação presente e ser vendida para a maior proposta, pois atenderia o objetivo de maximização dos lucros dos sócios (PAGE; KATZ, 2010)[34].

Até então as organizações acabavam sendo obrigadas a escolher uma das polaridades, empresas com ou sem fins lucrativos. Nos últimos anos uma série de estados e países aprovaram legislações que possibilitam formações societárias e regras fiscais que possibilitam as organizações híbridas de cumprirem sua missão e atingir objetivos financeiros, também distribuindo lucros aos sócios.

No Reino Unido foi criada a figura da Community Interest Company (CIC); nos Estados Unidos a Benefit Corporation[35] e as Low-Profit Limited Liability Company (L3C)[36]adotada em 31 estados (HONEYMAN, 2014). Essas estruturas possibilitam atender objetivos sociais e econômicos das organizações, possibilitando contemplar não apenas os sócios/acionistas (shareholders), mas também as partes interessadas (stakeholders). Essa dualidade, porém, pode gerar confusão organizacional da dificuldade de equilibrar objetivos à primeira vista contraditórios, assim como para os membros dessas organizações em suas tomadas de decisão diárias.

2.2.       MULTIPLAS IDENTIDADES E CONFUSÃO

Na literatura encontramos um grande destaque para a dificuldade das organizações hibridas equilibrarem a contradição de manter um negócio economicamente viável e ao mesmo tempo ter um impacto positivo na sociedade ou meio ambiente (BATTILANA; DORADO, 2010). Encarado como um sinal duplo a contradição de prioridades organizacionais se reflete em uma série de comunicações ineficientes, conflitos internos, e na potencial perda de eficiência da organização.

Seria esse realmente um ponto de dissonância impeditivo ou uma oportunidade de aprendizado e desenvolvimento para que toda a organização? Seria possível abraçar o entendimento e crença das contradições/tensões como oportunidades de desenvolvimento e não como pontos de fraqueza (da organização, dos times e dos indivíduos)?

As organizações híbridas por abraçarem as contradições no nível organizacional estariam facilitando o trabalho dos líderes, times e indivíduos de desenvolverem suas capacidades de criar sentido e tomar decisões equilibradas em um ambiente paradoxal (LUSCHER, 2018)?

Essas contradições são explicitadas na tabela seguinte, mostrando esse caminho do meio que as Organizações Híbridas se propõem em construir.

Quadro 3 – Tipologia das organizações híbridas

 Puramente filantrópicoHíbridoPuramente comercial
MotivosApelo à boa vontade e generosidadeMotivos múltiplosApelo ao interesse próprio
MétodosDirecionada pela missão.Equilíbrio entre missão e mercado.Direcionada pelo mercado.
ObjetivosCriação de valor social.Criação de valor social e econômica.Criação de valor econômico.
Destino dos recursos/ lucroDirecionado para as atividades relacionadas à missão da organização sem fins lucrativos (requerido por lei ou por política interna)Reinvestido em atividades relacionadas a missão ou despesas operacionais, e/ou reservado para o crescimento da organização e desenvolvimento (com fins lucrativos, distribui uma porção).Distribuído para os acionistas.

Fonte: Alter (2007) (tradução nossa).

2.3.       DESAFIOS DE MULTIPLAS IDENTIDADES

As Organizações Híbridas têm dinheiro e missão conectados diretamente, porém seguidamente estes objetivos entram em oposição ou competem entre si. Atender demandas sociais pode ser um bom negócio, produtos e serviços podem ter suas vendas ou gerar mais valor quando associados a questões sociais, projetos de aumento de eficiência nas cadeias de produção se conectam muito bem com os conceitos de sustentabilidade, a conexão de uma organização com a comunidade e com seus colaboradores é reforçada com inciativas de Responsabilidade Social Corporativa. Porém, não demorará muito e os líderes das Organizações Hibridas terão que tomar decisões difíceis, como por exemplo quando a geração de valor financeiro se opõe ao valor criado para a sociedade (HAIGH et al., 2015).

Não raro os líderes dessas organizações tratam essas decisões como trade-offs, ou se gera o lucro desejado ou se atende a expectativa pactuada em sua política ou projeto de responsabilidade social. Demandas sociais sendo vistas como restrições de como o negócio pode operar (BATTILANA; LEE, 2014).

Outra abordagem é evitar a dicotomia e abraçar o paradoxo, buscando soluções ganha-ganha, repensando o modelo de negócio e entendendo as iniciativas sociais como atividade entrelaçada aos objetivos do negócio. Desenvolver formas inovadoras de fazer negócios e de organizar alinhando lucro e impacto social é um desafio chave para o líder de Organizações Híbridas (ALTER, 2007). Organizações Híbridas combinam desafios sociais e econômicos já que precisam de ambos para que possam crescer e atingir seus objetivos organizacionais (SANTOS; PACHE; BIRKHOLZ, 2015).

Ainda que tenhamos exemplos de Organizações Híbridas e de grande impacto de suas atividades, como por exemplo os bancos focados em microcrédito que impactaram a vida de mais de 91 milhões de pessoas vivendo na pobreza, no mundo,  criando acesso a pequenos empréstimos e contribuindo para sua prosperidade econômica, ainda assim essas organizações são vistas como frágeis (BATTILANA; LEE, 2014).

Os principais riscos presentes nesse tipo de organização são as tensões internas que colocam o desvio de sua missão como um risco muito presente, devido a dificuldade de se manter objetivos incompatíveis em equilíbrio (lucro e impacto social) (PACHE; SANTOS, 2015). Devido às peculiaridades de cada organização é necessário adaptar seus sistemas de gestão, governança, desenvolvimento de pessoas, desenho de estruturas para que se possa dar conta dos desafios que cada organização encontra em sua realidade (BATTILANA; LEE, 2014). Fica presente o questionamento de quanto esse cuidado muda quando falamos de organizações “normais”, ou seja, não deveriam todas as empresas estar atentas para se adaptarem aos desafios específicos que encontram em suas realidades?

Como destacam Battilana e Lee (2014), o avanço na compreensão desta temática tende a contribuir com todos os tipos de negócios, já que cada vez mais as organizações estão sendo obrigadas a abraçar objetivos múltiplos e potencialmente competidores entre si. Seja pela adoção de práticas de RSC, pela adoção de metodologias de gestão e governança menos centralizadoras, ou ainda por uma expectativa de que as organizações comecem a transferir seu foco do retorno dos sócios (shareholders) para contemplação das necessidades das partes envolvidas (stakeholders).

Durante o século 20, negócios comerciais, organizações públicas e de caridades adotaram formas distintas de se organizar. Nas últimas 3 décadas, no entanto, os limites entre essas formas e seus setores correspondentes passaram a ficar cada vez mais nebulosos. (Battilana, Lee, Walker, & Dorsey, 2012; Billis, 2010; Weisbrod, 1998).(BATTILANA; LEE, 2014, p. 398, tradução nossa)

Essa mistura de combinação de múltiplas formas organizacionais são foco de desordem, e potencialmente de criatividade e inovação (HAVEMAN; RAO, 2006). As invenções são permutações do contexto, todas as formas organizacionais independentemente de quão novas possam parecer são derivações de formas já existentes.

A multiplicidade de formas e influências criam desafios únicos para a sustentabilidade dessas organizações, gerando uma multiplicidade de tensões internas. Construir um senso de identidade híbrida entre os membros da organização é particularmente desafiador quando há a combinação de objetivos de negócio e sociais em sua missão (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014). Essa tensão se faz presente nas atividades individuais de cada colaborador, porém sobretudo na definição da alocação de recursos limitados entre as atividades comercial e social (MOIZER; TRACEY, 2010).

Poderiam as Organizações Híbridas usar essas tensões em seu processo de evolução conseguindo combinar múltiplas formas de maneira sustentável? (HAIGH et al., 2015)

Battilana e Lee (2014) sugerem a utilização do conceito do “organizar híbrido”, entendendo-o como um processo de construção e não como a adequação a um modelo já conhecido, as autoras propõem um olhar de como as atividades, estruturas, processos e significados pelos quais as organizações criam sentido e combinam os aspectos de múltiplas formas organizacionais.

Segundo as autoras, o organizar híbrido está presente em 5 (cinco) áreas chave da vida organizacional: 1) atividades organizacionais centrais; 2) composição da força de trabalho; 3) design organizacional; 4) relações interorganizacionais; 5) cultura organizacional. Descrevo na sequência essas cinco áreas.

As Organizações Híbridas correm um risco constante de perder o foco duplo de sua atividade e centralizar-se em uma delas, normalmente devido às pressões de sustentabilidade financeira a atividade comercial tende a ser mais privilegiada com o objetivo de manutenção da organização.

Quanto menos integradas são as atividades sociais e comerciais maior o risco dessa desconexão (mission drift) ocorrer, forçando uma ruptura da alocação dos recursos humanos, financeiros e atencionais. Atividades comerciais segregadas das atividades sociais podem forçar uma situação de paradoxo onde atender uma parte da missão significa falhar em servir a outra parte (BATTILANA; DORADO, 2010).

Da mesma forma, quanto mais conectadas as atividades que geram recursos para a organização e compartilham custos com as atividades sociais menor a tensão interna pois as atividades não competem pelos recursos escassos, ao contrário se beneficiam dessa conexão (HAIGH et al., 2015). Ainda assim, mesmo em organizações com essas características há riscos no desvio de missão como relatado em organizações de micro finanças (BATTILANA; DORADO, 2010).

Entre os fatores que influenciam essa queda de braço constante, os colaboradores da organização desempenham um papel chave de criar sentido para as mudanças constantes e no equilíbrio da dicotomia em suas tomadas de decisão do dia a dia.

Battilana e Dorado(2010) fazem uso do conceito de Bourdieu (1977) de socialização para explicitar os indivíduos são influenciados por suas experiências profissionais e de formação (treinamentos). Influenciando e moldando sua visão de mundo, de forma a ser um obstáculo quando objetivos financeiros e sociais precisam coexistir.

Pela dificuldade de se preencher seus quadros com “pessoas híbridas”, as Organizações Híbridas precisam criar condições para que pessoas de cada um dos setores sejam capazes de trabalhar em conjunto e contribuir para o atingimento dos objetivos organizacionais.

O alinhamento entre identidade individual e organizacional tende a melhorar o compromisso organizacional, ajudando no alcance dos resultados esperados (PRATT; FOREMAN, 2000). Quando a organização espera que os colaboradores se engajem com a orientação para o negócio tanto quanto a social, é possível que enfrentem dificuldades quando um colaborador se identifica mais com uma do que com a outra.

Há, portanto, uma necessidade presente da organização criar espaço para o indivíduo ao mesmo tempo que também tem o desafio de ajudá-lo em sua preparação para equilibrar essa dualidade em algum momento, pois organizações que mantém as atividades sociais desconectadas de sua atividade comercial tendem a ter maior dificuldade de manter sua missão híbrida.

No processo de desenvolvimento de seus colaboradores a pessoa gestora tem uma influência definitiva. Em sua atividade essa pessoa tem o desafio de aproximar esses “dois mundos”, reforçar a cultura e missão da organização deixando espaço para que os colaboradores não sejam oprimidos por uma imposição. Essa capacidade é mais presente em pessoas gestoras pluralistas, que abraçam a natureza híbrida da organização (BATTILANA; DORADO, 2010).

[…] a influência dos gestores sobre a identificação dos colaboradores com a organização é mais forte quando há a presença de certas práticas, incluindo o desenvolvimento integrativo de soluções, remoção de referências ideológicas explícitas, e a construção e reforço das rotinas que afirmam a ideologia sem fazer referência direta a elas. Quando possível, a presença de indivíduos híbridos pode também ajudar a diminuir o risco de ambiguidades organizacionais que podem resultar de algumas características serem correlacionadas em indivíduos, criando condições para conflitos intraorganizacionais. (BATTILANA; LEE, 2014, p. 416, tradução nossa)

            A depender do histórico profissional os novos colaboradores precisam ser capazes de desaprender hábitos e crenças para que sejam capazes de se adequar a forma de trabalho da organização. Nesse processo é fundamental o papel do processo seletivo, assim como treinamentos, sistemas de incentivos e controles como meio de desenvolver profissionais híbridos capazes de equilibrar a ambiguidade em suas tomadas de decisão entre “negócios e caridade” (BATTILANA; LEE, 2014).

            Pode-se adotar diferentes estratégias em suas abordagens de contratação, indo da busca por colaboradores que tenham a capacidade e disposição de abranger as dimensões sociais e comerciais, como também pode-se separar candidatos com perfis distintos que tenham capacidades complementares e de colaboração para expressarem de forma coletiva ambas as dimensões.

A importância destes aspectos na constituição desta força de trabalho é proporcional ao nível de integração destas dimensões e quanto que organização e colaboradores precisaram se engajar nelas diariamente, veremos agora a importância do design organizacional na definição dessa integração.

Design organizacional pode ser entendido como a forma em que as lideranças da organização traduzem a estratégia em ação. Essa sessão é formada por três partes: a) estrutura organizacional formal; b) Sistemas de incentivo e controle; e c) governança.

A estrutura organizacional define se as atividades comerciais e sociais serão desempenhadas pelas mesmas pessoas ou compartimentalizadas em sub-unidades. Se as atividades serão perfeitamente integradas a separação estrutural não se faz necessária, mas quando são atividades separadas a organização precisa de clareza da independência de cada uma dessas estruturas e seus pontos de contato, assim como as atividades de coordenação entre as distintas unidades.

Situação similar é encontrada em organizações que utilizam a lógica de ambidestria em seus processos de inovação e/ou aprendizagem organizacional, requerendo coordenação entre as diferentes unidades que tem diferentes objetivos[37].

Quando há dúvida sobre quem está sendo servido (cliente vs comunidade), a organização pode optar por uma compartimentalização temporária para evitar que as equipes entrem em uma experiência de reflexividade paradoxal, com efeitos possíveis de paralisia e/ou desmobilização da força de trabalho(BATTILANA; DORADO, 2010).

Sistemas de controle e incentivo irão ditar como os comportamentos e resultados serão medidos e recompensados. São também uma expressão de como a organização consegue ou não fazer um link entre sua missão comercial e social.

Esses sistemas são usados para ensinar e reforçar comportamentos e valores desejados para os membros da organização. Podendo contribuir para uma compreensão compartilhada de como os múltiplos objetivos são conjuntamente avaliados e recompensados. São expressão dos valores da organização e uma forma de acompanhar resultados e necessidades de ajustes de processos ou de processos de tomada de decisão e/ou governança.

A governança, juntamente com a estrutura e os sistemas de controle e incentivo são ferramentas fundamentais para garantir que o compromisso com ambas as agendas (social e econômico) será mantido. Resistindo ou se adaptando as necessidades e pressões para tender para um dos lados as custas do outro.

A estrutura de governança e o papel do board será distinto a depender do nível de integração e riscos de desequilíbrio do papel híbrido da organização.

A aproximação entre organizações é mais comum em modelos de negócio “compre um, doe outro”. Organizações híbridas podem desenvolver relações de terceirização e parceiras com a finalidade de realizar sua missão. Tais estruturas são mais comuns em organizações onde o cliente compra um produto e automaticamente outro produto é doado a uma pessoa com em necessidade, exemplos de modelos de negócio desse tipo são as empresas Warby Parker que doa um par de óculos para uma pessoa em necessidade em um país subdesenvolvido. O mesmo modelo de negócios é adotado pela Tom´s Shoes, porém com calçados. Para viabilizar a logística e atendimento aos critérios dos beneficiados para a entrega dos produtos essas organizações firmam parcerias com organizações locais (BATTILANA; LEE, 2014).

A cultura organizacional é a expressão de quais atividade e como as pessoas as desempenham, ativando o design organizacional, a interação entre os membros da organização, definindo e reforçando padrões de valores, comportamentos e crenças que constituem a cultura organizacional (BATTILANA; LEE, 2014). Os autores destacam o fator da cultura na forma como os colaboradores significam suas experiências e consequentemente influenciando na capacidade de constituir e manter uma organização hibrida.

Sendo o desenvolvimento da cultura um processo emergente e contínuo, o papel das lideranças é de fundamental importância. Seja pelo exemplo, pela influência direta que podem exercer no comportamento de suas equipes, ou ainda pela possibilidade de mudar os sistemas e símbolos que influenciam a cultura.

A liderança em Organizações Híbridas tem um desafio específico, distinto das lideranças presentes em outras organizações. Essencialmente a presença constante de um paradoxo entre direções potencialmente opostas nos objetivos organizacionais (comercial e social). Sendo o papel esperado destas lideranças a capacidade de encontrar sinergias entre estes caminhos e influenciar e inspirar os membros da organização neste processo de construção de sentido (BATTILANA; LEE, 2014). É também um desafio das lideranças entender e agir quando é necessário fazer um processo de separação das atividades.

Figura 14 – Dimensões do organizar híbrido

Fonte: Adaptado de Battilana, Lee (2014).

A hibridização das organizações e sua manutenção requer o delicado equilíbrio entre as duas lógicas/objetivos (BATTILANA; DORADO, 2010). O caminho recomendado para essa construção é através da definição das atividades organizacionais, das políticas de contratação e socialização, de métricas de sistemas de acompanhamento de resultados e desempenho e da construção e evolução de uma cultura organizacional habilitante desta organização (SANTOS; PACHE; BIRKHOLZ, 2015).

No entanto, para essa construção as organizações híbridas não podem se apoiar em modelos prontos, pois o modelo híbrido não é sobre aplicar um plano pré-definido, mas sim construir um modelo adaptado e adaptando-o aos desafios presentes. E essa construção se dá através da aceitação das contradições, da desconstrução do ideal de um mundo controlado onde cada sinal de problema tem uma melhor solução a ser aplicada.

A construção das Organizações Híbridas se dá de forma orgânica, adaptativa e incluindo as diferentes partes interessadas na definição, experimentação e aprendizagem pela prática. No capítulo seguinte vamos explorar o referencial teórico adotado nesta tese, no primeiro momento mostrando suas conexões com as abordagens baseadas em prática para em seguida apresentar a Teoria da Atividade Histórico-Cultural.

3.    Lente teórica

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3.1.       Um olhar sobre a CHAT e sua história:

A CHAT tem seu surgimento na década de 20 no campo da psicologia a partir do trabalho de Lev Semenovich Vygotsky, tem um segundo impulso significativo a partir dos estudos de Leontiev, e a corrente que será explorada nesse trabalho tem Engeström como a principal referência e responsável pelas proposições que serão expostas e discutidas.

Tendo sua origem na psicologia da educação a CHAT baseia-se no entendimento de que o desenvolvimento psicológico do indivíduo tem constante e determinante influência das interações dele dentro dos contextos históricos e culturais com os quais este interage (VYGOTSKY, 1978).

Vygotsky no início do século XX busca em Marx o conceito de trabalho/atividade e o materialismo histórico para fazer o seu rompimento epistemológico com o materialismo mecanicista e o idealismo. Apoia-se primeiro em Marx com relação ao processo de florescimento da consciência a partir da atividade prática dos sujeitos, e depois em Rubinstein em declarar que os processos mentais e a consciência tem na prática da atividade não apenas sua manifestação mas também seu impulso, ou seja se formam a partir dela (PICCOLO, 2012).

Piccolo (2012) explica que em seu processo de construção teórica, Vygotsky se opõe ao dualismo vigente no campo da psicologia entre a psicologia subjetiva e a objetivista. Ambas as correntes não eram capazes de explicar a relação entre homem e realidade pois ignoravam os mediadores. Para ele é justamente a presença de signos ou ferramentas mediadoras que propiciam ao humano o aparecimento de “funções psíquicas superiores”.

Na Teoria da Atividade a relação é dialética, não mecânica, a partir do momento em que a atividade é criada por necessidades presentes na esfera cotidiana. Pode se descrever este processo recursivo da seguinte forma: contato com objeto; conversão do objeto em motivo de nova atividade, e por conseguinte, novas necessidades emergentes (PICCOLO, 2012). É por meio da atividade que os seres humanos desenvolvem suas capacidades, personalidade e consciência, transformam suas condições sociais, resolvem contradições, geram artefatos que transformam a cultura, e criam novas formas de viver e de ser (SANNINO; HARRY; KRIS D., 2009).

3.2.       As três gerações da CHAT

PRIMEIRA GERAÇÃO – AÇÃO INTERMEDIADA POR ARTEFATO

Conceitos importantes: a) artefatos carregam significado; ações e operações individuais são intermediadas por artefatos; b) é preciso considerar o contexto histórico-cultural para analisar uma atividade.

A primeira geração da teoria da atividade está centrada no trabalho de Vygotsky e está apoiada na ideia de mediação cultural da atividade, também conhecida pela tríade composta por sujeito, objeto e artefato mediador que representam a atividade mediatizada entre o homem e a realidade objetiva (ENGESTRÖM, 2001).

Atividade não pode ser entendida fora do contexto sociocultural: Vygotsky expande a análise, do indivíduo para a Atividade, que engloba os aspectos histórico-culturais e defende que a Atividade (conjunto de ações realizadas para alcançar um objetivo), não pode ser entendida fora de contexto sociocultural (PICCOLO, 2012).

Atividade tem um motivo amplo e muitas vezes abstrato, uma ação é um passo ou uma tarefa específica para atingir o objetivo de uma atividade. Por exemplo, a Atividade de preparar uma refeição, pode ter uma ação de cortar legumes(ENGESTRÖM, 2001).

Os artefatos[38], não apenas auxiliam na realização de uma atividade ou ação, mas também moldam a forma como a realizamos, no exemplo anterior o tipo da faca pode determinar como iremos cortar os legumes (ENGESTRÖM, 2001).

Portanto, artefatos são carregados de informação, conhecimento e história, que podem influenciar direta ou indiretamente a atividade (ENGESTRÖM, 2001).

Figura 15 – Primeira geração da teoria da atividade


Fonte: Engeström (2001).

Esta tríade nos permite estabelecer as relações essenciais para a compreensão da teoria, sendo importante conhecer a definição de cada um de seus elementos. Há uma evolução histórica nos conceitos de Vygotsky depois contribuições de Leontiev e Engeström contempladas nas definições dos elementos a seguir:

Sujeito – nesta proposição da Teoria da Atividade a unidade de análise é feita no âmbito individual, não havendo a integração da mediação de outros indivíduos e suas relações sociais (ENGESTRÖM, 2001). Leontiev contribui para a expansão do conceito de atividade e o sujeito passa do âmbito individual para o coletivo.

Artefato – após a inserção do artefato cultural e o rompimento do dualismo cartesiano entre indivíduo e sociedade, não era mais possível enxergar o indivíduo sem a influência da cultura e seus meios e, da mesma forma, a sociedade não pôde mais ser entendida sem a agência dos indivíduos que usam e produzem artefatos. Objetos se tornaram entidades culturais e a ação orientada a objeto passa a ser chave para o entendimento da psique humana (ENGESTROM, 2014).

Objeto – A definição de objeto é um desafio a depender da época e do autor, vamos tratar com quatro princípios fundamentais: a) o motivo, a existência de um objeto está relacionada a uma necessidade existente na sociedade. Assim os indivíduos se envolvem em atividades coletivas para produzir objetos, satisfazer necessidades e desenvolver uma atividade; b) objeto é epistêmico e objetivo, a transformação é mental e discursiva ao mesmo tempo que objetivada por humanos e artefatos; c) objeto em constante mudança, está sempre em negociação pois é invisível em sua totalidade pelos participantes[39] e d) objeto só pode ser alcançado de forma coletiva, individual e coletivo são vistos de forma dialética, para se compreender o coletivo é necessário levar em conta as ações individuais (QUEROL; CASSANDRE; BULGACOV, 2014).

Os Sistemas de Atividade são processos coletivos orientados ao objeto. O Objeto da Atividade é entendido como a finalidade do Sistema de Atividade, este por sua vez sofre a agencia de Sujeitos e é mediado por Artefatos, ou seja os artefatos possuem papel central (de mediação) na forma como os seres humanos interagem com a realidade, entendimento originado em Vygotsky (ENGESTROM, 2014).

É também através do conceito de mediação que Vygotsky cria o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal concebida como a distância entre o nível atual de desenvolvimento da criança, e o nível de desenvolvimento relativo a capacidade de solucionar problemas apoiado por pares com maior capacidade (ENGESTROM, 2014). Esse conceito também será expandido na proposição de Engeström para aprendizagem.

SEGUNDA GERAÇÃO – ATIVIDADE COMO UNIDADE DE ANÁLISE

Conceitos importantes: a) Introduz o conceito de Atividade, no sentido coletivo, entendendo-a como socialmente orientada; b) Atividade tem um motivo, expresso pelo Objeto da Atividade que existe para atender uma necessidade coletiva; c) introduz hierarquia entre: i) Atividade, ii) ação, e iii) operações; d) conceito básico de contradição

Leontiev parte do legado de Vygotsky, Rubinstein e Marx para junto com o grupo de Kharkov inspirar a construção da segunda geração da Teoria da Atividade. Tirando o foco no indivíduo, Leontiev mostra como a evolução histórica da divisão do trabalho se reflete na diferenciação entre uma ação individual e uma atividade coletiva. No entanto, suas proposições não foram expressas de maneira gráfica e os estudos na União Soviética se restringiam a aplicação no processo de aprendizagem de crianças, aspectos relacionados a contradições das atividades eram assuntos bem delicados de serem tratados (ENGESTROM, 2014).

Hierarquia da Atividade: As limitações da primeira geração foram superadas com o entendimento da atividade coletiva no modelo analítico dando forma ao sistema de atividade. Podemos destacar três aspectos chave no trabalho de Leontiev, no que se refere a influência na segunda fase da CHAT. Primeiro é sua proposição hierárquica da atividade, relacionando atividade/motivo, ação/objetivo, operação/condições. O segundo é o sistema de atividade como unidade central de análise. E finalmente, o foco no objeto e motivo, a compreensão de que o objeto é o real motivo da atividade.

Para explicar a gênese histórica de como a atividade passou a ser constituída por uma série de ações, Leontiev usa o exemplo de um grupo caçando, onde um dos indivíduos é responsável por espantar a caça (batedor), de forma orquestrada e intencional para determinada direção, onde o resto do grupo terá maiores chances de sucesso na atividade (caça). Sob o ponto de vista da ação, essa é uma ação  irracional, pois o batedor não será capaz de alcançar o animal e o abater, porém nas relações coletivas entre batedor e o restante do grupo a ação se justifica (DUARTE, 2003).

Atividade é dirigida norteada pelo objeto que tem um motivo inerente. A ação por objetivos, a forma como uma ação é realizada se chama operação. A operação é relacionada a condições que nem sempre são realizadas de forma consciente pelo sujeito. Finalmente, artefatos (ferramentas) são operações cristalizadas (padronizadas) (ENGESTROM, 2014).

A divisão do trabalho ao mesmo tempo que possibilitou os avanços extraordinários atingidos pela civilização, também distanciou o sujeito da construção de sentido de sua atividade laboral (DUARTE, 2003), o sentido e o motivo andam juntos, o sentido em âmbito da ação/individual e o motivo/coletivo no âmbito da atividade (ENGESTROM, 2014). Esse aspecto é constituidor e constituinte das dificuldades no processo de aprendizagem (que para Vygotsky e Engeström) está diretamente relacionada ao desenvolvimento, ou seja, uma aprendizagem que é capaz de criar novos instrumentos/artefatos indo do específico para o genérico (ENGESTROM, 2014).

A relação entre o objeto de cada ação e o motivo que justifica a atividade ficam interrelacionados. Também se justifica o significado da ação realizada pelo sujeito e o seu sentido. “O significado de uma ação diz respeito ao conteúdo da ação. O sentido da mesma diz respeito às razões, aos motivos pelos quais o indivíduo age.” (DUARTE, 2003, p. 286). Dessa forma o indivíduo trabalha com ações mediatizadas, neste caso não há relação direta entre a fome e a ação de espantar a caça, esta só se justifica pela ação do coletivo de caçar organizada em ações complementares (DUARTE, 2003).

Desconexão entre ação e atividade, contradição primária do capitalismo: Leontiev desvela a desconexão, em nossa sociedade capitalista, entre o significado do trabalho e o sentido dessa ação para o operário. O indivíduo trabalha em uma indústria, seu trabalho tem o significado de produzir um produto, porém devido a venda de sua força de trabalho o sentido da ação é receber o salário, o valor de troca de seu produto (commodity) que podevender, sua força de trabalho. Assim é possível a desconexão entre o significado e o sentido do trabalho (DUARTE, 2003). Esse, no entendimento de Leontiev, passa a ser a contradição básica dos Sistemas de Atividade, assunto que será abordado mais adiante.

Não existe atividade sem um objeto: A atividade é orientada a um objeto e o objeto é o real motivo da atividade, podendo ser material – humano ou não humano (um produto ou um paciente) – ou abstrato como uma teoria em desenvolvimento. Objeto é entendido na Teoria da Atividade como a coisa, ou projeto que as pessoas estão trabalhando para transformar, de forma coletiva e distribuída (BLACKLER; REGAN, 2009).

A atividade é sempre coletiva: Podemos falar da atividade do indivíduo, mas não de uma atividade individual, ações são individuais não atividades (ENGESTROM, 2014). Blackler e Regan (2005, p.164) explicam: “A teoria da atividade conceitualiza intenção coletiva e agência distribuída através dos termos ‘sistema da atividade’ e ‘objeto da atividade’. A CHAT segue uma abordagem dialética para a conceitualização da prática, que sugere uma abordagem para a intervenção.”

Objeto é mais que um objetivo ou um produto: São preocupações constantes que carregam motivos intrínsecos, geradores de atenção, esforço e significado. O objeto e o motivo dão coerência e continuidade a ação e ao mesmo tempo, por serem internamente contraditórios, geram uma instabilidade no Sistema de Atividade. Sendo assim a identificação de contradições no sistema de atividade ajuda os sujeitos a trabalharem nas causas do problema. Esse olhar colaborativo é necessário para que se possa criar uma visão compartilhada, fundamental, para a construção de uma solução expansiva das contradições (ENGESTROM, 2014).

Teoria da Atividade é o estudo do desequilíbrio: O sistema de atividade supre uma necessidade dos estudos baseados em prática em criar uma nova unidade de análise orientando o estudo ao objeto, coletivo e culturalmente mediado pela atividade humana (ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999). As ações ocorrem em contextos de constante desequilíbrio e desenvolvimento, desenvolvimento esse que molda, e é moldado, pelas ações que ocorrem (ENGESTRÖM, 2001).

Sistema de Atividade é multivocal: Quer dizer que o Sistema de Atividade é composto pelo coletivo através das suas múltiplas vozes. Essa multiplicidade, ou diversidade de pontos de vista traz riqueza para a forma como o Sistema de Atividade é constituído e sustentado ao longo do tempo. A diversidade reconhecida na multivocalidade é em sua natureza uma característica desestabilizadora do sistema. Pois, a todo momento está sendo influenciada pelo ambiente e potencialmente contestando a forma estabelecida (ENGESTROM, 2014)[40].

Multivocalidade é o motor do desenvolvimento: as contradições em sistemas de atividade são vistas como motores de mudança e desenvolvimento. As diferentes “vozes” podem apresentar contradições no sistema de atividade, as quais podem levar a mudanças e transformações quando resolvidas. Portanto, a multivocalidade é vista não apenas como uma característica do sistema de atividade, mas também como uma fonte potencial de evolução.

Contradições são fortaleza: As contradições internas e os debates são a fortaleza da teoria da atividade, justamente por seu caráter multivocal. Porém, para que se possa usufruir desse potencial é necessário que se construa um entendimento compartilhado do caráter da célula (ideia inicial), e uma busca por elucidar qual é a origem/raiz dessa célula, seguido de sucessivos passos de mediação para construção de um conceito em torno da célula (ENGESTRÖM, 2001). Ou seja, a evolução de um sistema de atividade requer um cultivo e apreciação das contradições do próprio sistema por seu coletivo. [41]

Aprendizagem Expansiva é resolver contradições: Na CHAT a resolução das contradições, ou evolução do Sistema de Atividade é entendido como o processo de Aprendizagem Expansiva. O desenvolvimento ou aprendizagem expansiva é visto como a resolução das contradições internas do sistema, por isso as contradições não devem ser sufocadas pois são conflito e possibilidade de evolução ao mesmo tempo (ENGESTROM, 2014).

O Sistema da Atividade, tem a intenção de, a partir de seus seis elementos básicos (sujeito, artefato, objeto, regras, comunidade e divisão do trabalho), servir de modelo analítico para a atividade humana (ENGESTRÖM, 2001). Os três primeiros elementos já foram descritos (Figura 15), seguimos para os três elementos adicionados na segunda geração.

Regras – são moldadas de forma implícita ou explicita, podendo ter a forma de convenções, combinados, contratos, leis, manuais que interfiram e interajam com o sistema de atividade;

Comunidade – é a representação dos indivíduos que estão envolvidos com o mesmo objeto, em terminologia atual podemos fazer um paralelo com stakeholders;

Divisão do trabalho tem duas características importantes de se levar em consideração, a primeira relacionada ao conceito de objeto/motivo e a influência no sentido do trabalho para os sujeitos, a segunda relacionada a divisão do trabalho entre os membros da comunidade (ENGESTROM, 2014).

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Figura 16 – Segunda geração da teoria da atividade

Fonte: Engeström (2001).

O sistema da atividade pode ser entendido como Figura 16, tendo os seis elementos interagindo entre si onde há sujeitos em interação com a comunidade atuando para a transformação do objeto, mediados por artefatos. As relações do sistema são regidas pelas regras que motivam e impedem determinadas ações, e finalmente a divisão do trabalho distribui as tarefas entre os membros da comunidade, assim como as divisões verticais de status e poder. Blackler explica da seguinte forma:

Objeto da atividade são parcialmente dados e parcialmente emergentes, Engeström sugere: a) a relação entre indivíduos e o objeto da atividade são intermediadas por conceitos e tecnologias; b) as relações entre comunidade e o objeto são mediadas pela divisão do trabalho; e c) as relações entre os indivíduos e as comunidades das quais são parte são mediadas por regras e procedimentos. Compondo uma co-relação entre o material, mental, social e cultural para a reflexão e para a ação (BLACKLER; CRUMP; MCDONALD, 2000, p. 281).

Quadro 4 – Estrutura hierárquica da atividade e níveis de funcionamento em sistemas de atividade

SujeitoArtefatoObjetoComuni-dadeRegrasDiv. do trabalhoNíveis sistemas de atividade
ColetivoMetodo-logia ideologiaNós no mundoRedes societais de atividadeSocietal (estado, regras, religião)Div. societal do trabalhoAtividade
IndividualModelosProblemas em tarefasOrganização coletivaRegras organizacionaisDiv. do trabalho organizacionalAção
Não conscienteFerra-mentasResistênciaPrimeiro grupo imediatoRegras interpessoaisDiv. trabalho interpessoalOperação


Fonte:  adaptado de ENGESTRÖM (1987, p. 154).

TERCEIRA GERAÇÃO – REDES DE SISTEMAS DE ATIVIDADE

Com a popularização da teoria, as críticas também ganharam força e dentre elas os aspectos de diversidade e diálogo entre diferentes tradições foram expostos enquanto uma lacuna importante. São justamente estes desafios que a terceira geração da teoria tenta dar conta ao desenvolver ferramentas e um olhar para as redes integradas de sistemas de atividade, diálogo e múltiplas realidades e vozes. Neste formato de pesquisa, o modelo é expandido para que se possa integrar ao menos dois sistemas de atividade em interação (ENGESTROM, 2014).

Figura 17 – Terceira geração da teoria da atividade

Fonte: ENGESTRÖM (2001)

A terceira geração opera o compartilhamento de objetos entre os sistemas de atividade, tratando assim de múltiplos sistemas de atividade, e suas interrelações. Os sistemas estão interconectados, e possuem seus objetos fragmentados, ou parcialmente compartilhados (ENGESTRÖM, 2008).

Em sua proposição Engeström situa o sistema da atividade como unidade de análise. Dessa forma os artefatos culturais assumem a centralidade da atividade coletiva, o objeto compartilhado da atividade é teorizado como um projeto coletivo que por sua vez é estabilizado pelas ferramentas, signos e procedimentos de um sistema de atividade. A mesma abordagem é usada em estudos de múltiplos sistemas de atividade em interação, que compartilham objetos de atividade (BLACKLER; REGAN, 2009).

 

3.3.       Princípios da teoria da atividade

Engeström (2001 p. 136) organiza a CHAT em cinco princípios, porém o quarto item necessita de maior detalhamento, este contém as questões relativas as contradições que são fundamentais para o quinto princípio:

  1. Sistema de Atividade(SA) é a unidade de analise: A unidade de análise primária é de um Sistema de Atividade, que deve ser coletivo, mediado por artefatos e orientado ao objeto. Ele é visto de forma relacional com outros sistemas em uma rede de atividade. Os sistemas de atividade se constroem e reproduzem através da geração de ações e operações;
  2. SA é multivocal: Sistema de Atividade tem múltiplas vozes. O sistema é composto por uma comunidade com múltiplos pontos de vista, tradições e interesses. A divisão do trabalho no sistema cria diferentes posições para os participantes, os sujeitos carregam suas histórias e o sistema carrega múltiplas camadas em suas regras, artefatos e convenções. As vozes múltiplas, são aumentadas quando olhamos para as redes de Sistemas de Atividade em interação. Requerendo movimentos de tradução e negociação, sendo ao mesmo tempo uma fonte de problemas e de inovação;
  3. SA é um processo histórico: Sistemas de atividade tomam forma e são transformados durante longos períodos. Seus problemas e potenciais só podem ser entendidos quando confrontados com sua história. A história precisa ser entendida como a história local da atividade e dos objetos, assim como a história teórica das ideias e das ferramentas que forjaram a atividade.
  4. Contradição é um conceito central: O quarto princípio posiciona as contradições como ingrediente central de mudança e evolução. As contradições não são o mesmo que problemas e conflitos. Contradições são acumulações históricas de tensão estrutural dentro e entre os Sistemas de Atividade. A primeira e cerne das contradições na abordagem da CHAT é a contradição das atividades no capitalismo, contida no valor de uso e no valor de troca das commodities.

Contradição primária: é um conflito dentro de um único “nó” do Sistema de Atividade.

Contradições secundárias: são conflitos entre nós do Sistema de atividade.

Contradições terciárias são ocasionadas pela adição de um elemento cultural mais avançado no sistema, causando conflitos em todos os elementos do sistema, no embate do antigo e do novo.

Contradições quaternárias são ocasionadas pela contradição da atividade central com as atividades vizinhas, haverá nova estabilização do sistema quando as contradições quaternárias forem resolvidas (ver Figura 18).

Figura 18 – Contradições que podem ser apresentadas pelos sistemas de atividades

Forma, Polígono

Descrição gerada automaticamente

Fonte: BECKER (2018)

Veremos esses conceitos aplicados na análise do campo na Seção 4.6. Essa leitura é similar a leitura das metodologias ágeis em mapear as tensões para poder evoluir através de experimentos (LEMAY, 2019).

  • Aprendizagem expansiva é resultado da resolução de contradições: O quinto princípio aponta a possibilidade de uma transformação expansiva no Sistema de Atividade. Assim que as contradições de um sistema são agravadas, alguns sujeitos começam a questionar e se desviar das normas estabelecidas. Em alguns casos esse processo pode resultar em uma visualização coletiva e um esforço conjunto para mudar. Uma aprendizagem expansiva ocorre quando o objeto e o motivo da atividade são reconceitualizados para se adequar a um horizonte mais abrangente de possibilidades do que o sistema de atividade anterior. Um ciclo completo de transformação expansiva pode ser entendido como uma jornada coletiva pela zona de desenvolvimento proximal[42] da atividade.

As contradições são mais que características inerentes do sistema de atividade, são elas que geram o movimento em que o desenvolvimento pode acontecer. Novos estágios da atividade tomam forma como uma solução para uma contradição do estágio anterior. Essa é a forma como a CHAT explica as inovações, um fenômeno que se torna universal começa como uma iniciativa individual, particular. Antes de uma nova forma se popularizar ela surge como um desvio de um padrão estabelecido, esse é o padrão da aprendizagem expansiva (ENGESTROM, 2014).

 

3.4.       Aprendizagem expansiva

A aprendizagem expansiva é peça fundamental na proposição da CHAT, ao fazer/explicar a conexão da evolução dos sistemas de atividade, construindo uma teoria de aprendizagem a partir dos aspectos histórico-culturais a uma mente humana que dialeticamente constrói a realidade (ENGESTRÖM, 2001). A teoria inspira-se no trabalho de Bateson (1972) ao se constituir a partir da ideia de múltiplas formas de aprendizado.

No livro Learning by Expanding (1987)[43] Engeström exercita a teoria em três caminhos, a aprendizagem escolar, no trabalho e a aprendizagem com arte e ciência. Evidencia-se a maior aplicabilidade de suas proposições para a adolescência e idade adulta, quando os sujeitos estão vivendo maiores momentos de contradição, tanto interna quanto em seus ambientes. A teoria se aplica muito bem para sistemas de atividade em transformação, Engestrom e Sannino (2012) apontam a conexão entre a emergência da teoria e o momento histórico de rápidas mudanças especialmente nas áreas da produção, negócios e organizacional.

Apoiando-se na Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) de Vygotsky, a Aprendizagem Expansiva entende que as novas formas históricas de atividade social são construídas pelos indivíduos de forma coletiva, com intuito de solucionar contradições presentes em sua forma anterior(ENGESTROM, 2014). Sem desconsiderar o aspecto cognitivo a teoria propõe abarcar os aspectos cognitivos e culturais do processo de aprendizagem.

É por dois principais processos que a aprendizagem se dá na teoria da atividade: internalização e externalização. A internalização se dá quando o indivíduo produz sentido a partir das relações sociais, pensamentos e ações. A externalização é a construção de conhecimento executada por uma pessoa ou grupo. Quando a aprendizagem engloba ambos processos ela é chamada de expansiva (ENGESTROM, 2014).

Na aprendizagem expansiva se aprende algo que ainda não está lá, ou seja, são os sujeitos/aprendizes que constroem o novo objeto, de forma coletiva e fazem a implementação. É sobre transformar os sistemas de atividade, criando novos padrões para os mesmos(ENGESTROM, 2014).

É em Bateson (1972) que Engeström apoia seus três níveis de aprendizagem: I, II e III. No nível I o aprendizado se dá apenas por repetição e memorização, ou seja, condicionamento. No nível II o indivíduo entende as regras e se torna capaz de aprende, o “aprender a aprender”. Já no nível três o indivíduo vai transformar sua forma de ver o mundo, uma mudança de consciência (este é um evento raro, que se produz pelas contradições do nível II da aprendizagem) (ENGESTROM, 2014).

No nível I tanto o objetivo quanto o resultado são dados, assim como os instrumentos para se sair do ponto A e chegar no B. É corrigindo a forma como o indivíduo faz uso das ferramentas que se constitui o processo de aprendizagem. Neste ponto o artefato de intermediação se chama ferramenta, a ferramenta é uma operação roteirizada que ganha forma própria. O caminho da aprendizagem I é a repetição automatizada sem reflexão, aprender é construir uma operação não-consciente(ENGESTROM, 2014).

O nível II pode ser descrito por um processo flutuante entre reflexão consciente e inconsciente. É uma oscilação entre dois modos de construir modelos e generalizações, é a capacidade de aplicação de um instrumento e de abstração dele. São definidos como dois aspectos, o aspecto de: a) reprodução e o de b) produção, que gera o uso por Engeström de Aprendizagem IIa e IIb, sendo a IIa a situação onde o objeto e objetivo são dados e a solução e construída por tentativa e erro, e o IIb é quando a solução é produzida/inventada (ENGESTROM, 2014).

Se poderia entender que a aprendizagem IIb é expansiva, porém ela só é potencialmente expansiva, porque é limitado ao nível da ação e ainda não se tem certeza de que o contexto do problema é uma contradição da atividade. Na aprendizagem II o indivíduo é apresentado a um problema para sua resolução, na aprendizagem III o problema ainda não existe, ele precisa ser constituído(ENGESTROM, 2014).

A aprendizagem III acontece para resolver as contradições apresentadas na aprendizagem II, o indivíduo, ou melhor, o seu self, é substituído pela busca de um objeto coletivo que seja capaz de representar a complexidade dos contextos, ou seja da divisão do trabalho, assim como as questões tecnológicas e mediações simbólicas. Esse tipo de aprendizagem é um esforço coletivo e muito raro de ocorrer, o objeto da atividade de aprendizagem expansiva é todo o sistema de atividade em que os sujeitos estão envolvidos.(ENGESTROM, 2014).

Para que a aprendizagem de nível II, se transforme em III as contradições precisam aparecer para que possam ser “tratadas”, ou seja que os sujeitos criem modelos, nova organização de contexto mudando assim o objeto da atividade.

No processo de aprendizagem expansiva, são quatro os tipos de contradição que podem ocorrer. Inicia-se com a contradição primária onde há um certo desconforto com a atividade e as pessoas falam disso, há uma necessidade posta, porém nada ainda é urgente. A contradição secundária é quando a situação fica insustentável, chama-se de vínculo duplo e o sistema precisa ser transformado.  Porém a contradição pode ser resolvida sem que se mude o objeto da atividade, talvez a adoção de uma nova tecnologia, ou a adaptação de uma regra seja o suficiente. Assim não seguindo o ciclo de desenvolvimento expansivo.

Caso os sujeitos resolvam modificar o objeto, o reformulando de forma expandida inicia-se a fase de construção de um novo motivo, o próximo passo é sua implementação, na fase de aplicação e generalização. Neste momento novas tensões podem ser criadas dentro do sistema, essas são chamadas contradições terciárias.

Figura 19 – Ciclo de aprendizagem expansiva

Fonte: CASSANDRE (2014)

Quadro 5 – Abordagem de pesquisa da CHAT 1/2

Abordagem de pesquisa da CHAT:
 Estudo dos detalhes da práticaEstudo das práticas no contexto do seu desenvolvimento histórico
O que as pessoas estão fazendo?O ‘objeto da atividade’ é fundamental para a análise teórica das práticas. Objetos da atividade são parcialmente dados e parcialmente previstos. São intimamente relacionados com os fatores mediadores através dos quais são construídos.Ações são discretas, possuem início e fim claramente definidos e existem por um curto período. São orientadas a objetivos. As atividades são padrões complexos de práticas que suportam longos períodos. Atividades sugerem metas e fornecem motivos.
Como eles estão fazendo e com quem?Atividades são culturalmente situadas e mediadas linguística e tecnologicamente. Elas são enactadas na comunidade e envolvem uma divisão de trabalho. Alguns fatores e suas interações são descritos como ‘sistemas de atividade’. Esta é a unidade de análise.Atividades desenvolvem-se ao longo do tempo. Como uma tendência geral, os sistemas de atividade em organizações de trabalho parecem estar se tornando mais complexos e independentes, e os objetos mais abstratos e emergentes.
Como eles relacionam-se com outros, formados em diferentes sistemas de atividades.Um grau de diferenciação interna é inevitável em sistemas de atividade de qualquer tamanho, mas organizações complexas podem facilmente se tornar segmentadas e fragmentadas. No entanto, mais do que analisar as organizações como sistemas únicos de atividade, é mais satisfatório analisá-las como redes de sistemas de atividades sobrepostosA expertise em redes complexas de atividade é (necessariamente) distribuída, emergente e ‘descentralizada’, isto é, o curso de seu desenvolvimento não é, e não pode ser, somente controlado pelo centro.
Qual é a natureza da aprendizagem coletiva?Sistemas de atividades são sistemas produtores de tensões. Distúrbios entre e dentro dos sistemas são a força motriz de seu desenvolvimento.Quando os sistemas de atividade tornam-se mais fluídos e improvisados, as prioridades estabelecidas e as relações de poder são afrouxadas e podem ser reformadas.

Fonte: BLACKLER, CRUMP e MCDONALD (2000, p. 294)

Quadro 6 – Abordagem de pesquisa da CHAT 2/2

Abordagem de pesquisa da TA:
 Apoio ao desenvolvimento das práticas que estão sendo estudadas
O que as pessoas estão fazendo?A pesquisa pode auxiliar as pessoas a tomarem consciência do objeto de sua atividade e do processo de construção do objeto.
Como eles estão fazendo e com quem?A pesquisa pode explorar a natureza e a dinâmica de sistemas particulares de atividade e seu desenvolvimento.
Como eles relacionam-se com outros, formados em diferentes sistemas de atividades.A pesquisa pode explorar a natureza variada das atividades (e as prioridades que elas implicam).
Qual é a natureza da aprendizagem coletiva?A pesquisa pode desencadear discussões acerca de perturbações entre e dentro de sistemas de atividades e como estes são e, talvez, até respondê-las

Fonte: BLACKLER, CRUMP e MCDONALD (2000, p. 294)

Ainda que de forma um tanto acanhada identifico nesta fala um direcionamento para ação, a partir de suas capacidades e práticas o pesquisador se coloca como multiplicador e possibilidade de ajudar as pessoas a transformarem “as realidades” a sua volta, Engeström se posiciona:

Esta abordagem[44] implica em um localismo radical. A ideia é que as relações sociais fundamentais e contradições da formação socioeconômica dada – e assim o potencial para uma mudança qualitativa – estejam presentes em cada uma das atividades locais da sociedade. Espero que assim até mesmo as estruturas sociais locais mais impessoais, possam ser vistas como sendo constituídas por seres humanos completos com a ajuda de artefatos mediadores. Ainda que isso ocorra nos escritórios de políticos de alto escalão e em conselhos de grandes corporações ao invés dos chãos de fábrica e nas esquinas da cidade. Neste sentido, pode ser útil tentar olhar para a sociedade mais como uma rede multicamadas de sistemas de atividade interconectados e menos como estruturas piramidais rígidas e dependentes de um único centro de poder(ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999, p. 36).

Nem toda mudança é transformação: Dayydov (1999) fala sobre problemas não resolvidos da Teoria da Atividade, ele explica que nem toda mudança é transformação, para que assim o seja, se faz necessário criar as condições para que seja possível mudar o objeto internamente, expondo sua essência e a alterando. Pode-se olhar sobre dois aspectos para os processos de transformação, “mudar a ordem existente dos objetos” ou através do entendimento da origem do sistema “concretizar seu potencial interior”.

Nós, sociedade, podemos viver de forma que não agrida a natureza e a sociedade, porém é provável que não encontremos as condições necessárias para exercer a atividade desta forma nos sistemas que fazemos parte. Assim se faz necessário o entendimento histórico-cultural da realidade vivida para que se possa transformar o sistema de atividade de dentro para fora, expondo sua essência, e construindo coletivamente possibilidades para que o sistema possa concretizar seu potencial interior(DAVYDOV, 1999). É uma visão muito estreita acreditar que precisamos apenas entender, explicar e nos sentirmos em casa ao invés de transformar nossa realidade.

Na década de 90 a pesquisadora, consultora e rebelde Margaret Wheatley mergulhou na nova ciência, entrando pela porta de Fritjof Capra e seu ponto de mutação, lançou um livro chamado A Nova Liderança. Aproximando as fronteiras da ciência, com as práticas organizacionais e nosso impacto social e ambiental. Rodou o mundo falando sobre a mudança de paradigmas e a necessidade de assumirmos a fluidez e fragilidade da realidade vivida para que pudéssemos construir realidades mais humanas e sustentáveis, em seu prologo da edição de 2011 do livro ela diz:

Quando nossa visão de mundo não funciona mais e nos sentimos afundados em confusão, com certeza nos sentimos aterrorizados. De repente, perdemos o chão em que nos mantínhamos. Soluções que não funcionam mais. O mundo parece incompreensível e caótico, sem racionalidade. Nós respondemos a essa incoerência aplicando velhas soluções mais desesperadamente. Nos tornamos mais rígidos sobre nossas crenças. Nos apoiamos no hábito ao invés de criar novas respostas. Acabamos nos sentido frustrados, exaustos e sem poder frente a tanto fracasso. Essas frustrações e medos criam mais agressão. Tentamos fazer as coisas funcionarem através da força ao invés da inteligência e da colaboração.

Foi apenas quando os cientistas estiveram dispostos a aceitar sua confusão ao invés de fugir dela e apenas quando eles desafiaram as perguntas que eles estavam fazendo, só ai eles puderam descobrir os insights e formulações que os deram novas capacidades. Uma vez que este novo mundo foi reconhecido, cientistas se reconectaram ao seu trabalho com nova energia. Curiosidade, surpresa e o prazer da descoberta substituíram sua fadiga e frustração. Tenho esperança que nós também possamos recuperar nossa energia e prazer ao olhar para o mundo das organizações a partir da visão de mundo deles. Acredito que seus mapas são guias confiáveis a terras prometidas, onde a criatividade humana, sabedoria e coragem podem ser plenamente utilizadas para criar organizações e sociedades saudáveis e resilientes.(WHEATLEY, 2011, p. xi)

Aceitar a confusão, o paradoxo, a incerteza e buscar alinhamento em nossos valores para construir de forma coletiva um futuro situado com sentido para seus participantes parece ser algo tão obvio, e ao mesmo tempo tão distante. Especialmente quando nos lembramos que as relações e estruturas sociais são relações e estruturas de poder, não há como falarmos de sustentabilidade, autonomia de times e de indivíduos sem falarmos de poder.

 

3.5.       O aspecto do poder na CHAT

A CHAT tem uma proposta clara de empoderamento dos sujeitos participantes da atividade, para que estes possam transformar os sistemas que fazem parte, construindo soluções para as contradições e evoluindo enquanto indivíduos, grupo e sociedade. Outras metodologias, teorias, abordagens e pensadores que pregam a transformação da nossa realidade a partir do empoderamento dos sujeitos: a pesquisa-ação, aprendizagem transformadora, Paulo Freire e seus estudos e práticas, Sterling em seu olhar para sustentabilidade, a lista é grande.

Ao mesmo tempo que temos o potencial da CHAT enquanto o deslocamento do indivíduo para o sistema de atividade e o objeto como unidade de análise observo uma lacuna grande nas questões relativas às relações de poder e política nos textos e abordagens propostas.

Há o espaço para isso no modelo, e o tema é tangenciado seguidamente. Em especial no aspecto da “divisão do trabalho” e nas “regras”. Blackler (2009) fala sobre a hierarquia nos níveis gerencias, porém sem um aporte teórico específico, fazendo um uso bem raso e pontual do trabalho de Flyvbjerg (2001).

Flyvbjerg (2001) inspirado na phronesis de Aristóteles explora a necessidade da pesquisa se aproximar das pessoas e do fenômeno de estudo, nas práticas e nos detalhes que constroem suas visões de mundo, de forma dialógica e dialética construir em conjunto com os sujeitos da pesquisa. O autor sugere que o pesquisador deva refletir como as relações de poder se dão, como elas podem se manifestar de forma distinta e compartilhar isso com os grupos sob os efeitos das relações de poder. Para isso sugere que o pesquisador se faça quatro perguntas: Para onde estamos indo? Quem ganha e quem perde, e a partir de quais mecanismos de poder? Esse desenvolvimento é desejável? O que deveríamos fazer a respeito?(FLYVBJERG, 2001, p. 145).

 

3.6.       Consultoria ou pesquisa?

Ormerod (1996) explora a combinação entre a consultoria e a pesquisa em management. O exercício da prática consultiva é apoiado por diversas Instituições de Ensino Superior tanto quanto forma de aproximação e atualização da academia com a realidade do mercado, como também como forma de receita extra para o pesquisador e em certos casos para a instituição. Porém, também levanta questões pertinentes relacionadas ao distanciamento da liberdade da prática da ciência social aplicada e desvinculada dos interesses por resultados de curto prazo das organizações.

A pesquisa-ação é constantemente confundida com consultoria e inclusive serve de inspiração para projetos de consultoria, porém os objetivos se diferenciam especialmente no que tange os resultados, e a abertura para aprendizagem das organizações(ORMEROD, 1996). Assim como outras metodologias a pesquisa-ação também é usada de forma superficial de modo que facilmente a descaracteriza (EDEN; HUXHAM, 1996).

A Teoria da Atividade tem em seu DNA a interferência na realidade vivida, no braço finlandês Engeström inicia seus estudos com o objetivo de transformar a realidade da educação em seu país nos anos 80. Nos anos 90 frente a crise econômica que acometia a Finlândia[45] adapta seus estudos para ajudar as empresas finlandesas a criarem intervenções de mais curto prazo e assertivas, já que não tinham folego financeiro para aguentar transformações de longo prazo, criando assim o “Laboratório de Mudança”, uma metodologia de intervenção a partir da Teoria da Atividade(SANNINO; HARRY; KRIS D., 2009).

A teoria da atividade pode ser usada tanto como um conjunto de teoria e metodologia, através da operacionalização do Laboratório de Mudança como também pode ser utilizada como lente teórica combinada com outros métodos de pesquisa, normalmente fazendo uso de procedimentos e ferramentas característicos das pesquisas qualitativas, não raro são aplicados em estudos de caso como na tese de Becker (2018)  que usou a CHAT para estudar “O processo de construção de uma matriz curricular sob a ótica da teoria da atividade” e Turcato (2017) que explorou em sua tese “O processo de institucionalização de micro práticas de transformação urbana”.

Assim com os sistemas de atividade a serem estudados, o pesquisador também necessita de um processo reflexivo sobre sua intencionalidade, valores e métodos a serem usados para produção de seu objeto. Mais que modelos estruturados, os questionamentos pessoais provocados por Flyvbjerg me parecem mais desafiadores e alinhados com o presente projeto.

CONTEÚDOS QUE PODERIA INCLUIR APÓS O CAMPO

3.7.       RUNAWAY OBJECTS

3.8.       PESQUISADOR INTERVENCIONISTA

3.9.       LABORATÓRIO DE MUDANÇA

4.    PERCURSO METODOLÓGICO

Navegar é Preciso

Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:

“Navegar é preciso; viver não é preciso”.

Quero para mim o espírito [d]esta frase,

transformada a forma para a casar como eu sou:

Viver não é necessário; o que é necessário é criar.

Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.

Só quero torná-la grande,

ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;

ainda que para isso tenha de a perder como minha.

Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue

o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir

para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça.

(Fernando Pessoa) (PESSOA, 2023)

Ao entrar em contato com a Cartografia, fui cativado pelo conceito de rizomas e pela ideia de construir um espaço onde conexões impensadas se tornam possíveis. A metáfora do rizoma é utilizada para descrever teorias e sistemas de conhecimento que não são hierárquicos, mas sim horizontais e não-lineares. Diferentemente das estruturas hierárquicas tradicionais (como uma árvore, onde tudo se origina de um tronco central), um rizoma não tem início nem fim, nem centro nem periferia. Em vez disso, é composto por uma multiplicidade de pontos ou nós que estão todos interconectados(DELEUZE; GUATTARI, 1995).

O rizoma é, portanto, um modelo para pensar sobre o mundo e a realidade que enfatiza a interconexão, a multiplicidade e a constante mudança. É um conceito que desafia as formas tradicionais de pensamento e sugere uma abordagem mais fluida e dinâmica para entender sistemas complexos (STERN; ROLNIK; DESPRET, 2013).

No entanto, quando ficou claro que a Cartografia se posiciona como um método de pesquisa-intervenção que vê as pessoas como participantes da pesquisa e não como objetos dela, o caminho a seguir tornou-se evidente (PASSOS; BARROS, 2009a).

SOBREVOO DA JORNADA

Podemos dizer que o percurso metodológico teve 4 grandes fases:

  1. a primeira foi uma fase de exploração do campo realizada junto à Teal Brasil, entre 2021 e 2022;
  2. a segunda fase foi o mergulho na empresa Tango, onde pude mapear as práticas de desenvolvimento de pessoas adotadas pela organização.

Esses dois passos cumpriam o projeto de tese aprovado. No entanto, durante o processo de pesquisa na Tango, ficou claro a possibilidade e o potencial da de implementar a terceira e quarta fase:

  • a formalização do framework
  • a adaptação do modelo, aplicação e a coleta de dados ainda dentro do escopo deste trabalho.

Esses grandes marcos podem ser observados na Figura 20. Também fica destacada na figura a abertura de novas fretes que andaram em paralelo e foram alimentando as entregas desta tese. Destacaria as principais como sendo:

  1. o desenvolvimento e adoção de artefatos de aplicação e automação dos processos de assessment e geração de relatórios individuais;
  2. o surgimento e minha participação no movimento dos IDG´s[46];
  3. a adoção do sistema Obsidian[47] de Gestão da Informação;
  4. Sistemas de Inteligência Artificial[48].

Figura 20 – Percurso Metodológico


Fonte: Autor

Como apontado anteriormente a escolha metodológica é pela Cartografia, e o deslocamento para fugir dos padrões de estrutura de projeto foi o desafio.

Desde 2018 venho participando mais ativamente de grupos que tratam de temas como Transformação Organizacional, Sistema B, Organizações Evolutivas, Capitalismo Consciente, Organizações TEAL. Venho, dessa forma, explorando o campo e identificando possíveis conexões e relações que possam viabilizar um estudo in loco. Meu envolvimento se restringia a grupos virtuais (fóruns de discussão, grupos de facebook, grupos de whatsapp, telegram, e-mails). Fato que vinha me incomodando pela falta de contato físico, até março de 2020 quando adotei o distanciamento social devido a intensificação da pandemia da COVID_19.

Em um primeiro momento estava vislumbrava a pesquisa acontecer em duas ou três empresas que tenho proximidade. Em um trabalho desenvolvido durante o ano de 2020 pude acompanhar um projeto de desenvolvimento de líderes pela prática e os desafios e reticências das organizações em conseguir aliar trabalho e desenvolvimento. Pude ver a dificuldade da diretoria em conseguir adequar seu discurso e sua prática.

Participei em outra organização de um diagnóstico de cultura completo, com levantamento documental, questionário com 300+ respondentes, sucedido de definições da diretoria de caminhos possíveis em direção ao futuro desejado em contraponto à cultura presente, discussões e desconfortos relacionados a realidade de poder encontrada e dificuldades de alinhamento de visão entre seu corpo gerencial.

Durante todas essas horas de pesquisa, teórica, documental, empírica, entrevistas, grupos focais, análises de conteúdo, relatórios e muitas reuniões de alinhamento, de acolhimento, de construção coletiva. Pude observar e ver o abismo existente entre o discurso e a prática, os impedimentos de cultura, os atravessamentos de poder, as adequações ao mercado.

Esse estudo de 9 meses poderia sem sombra de dúvida ser meu campo para uma tese de doutorado, onde faria uso da Teoria da Atividade em um estudo de caso. Cumpriria objetivos desenhados e poderia sim avançar, mas esse não seria o estudo cartográfico que espero construir.

Tenho assim a percepção clara de que já estou em campo, já estou observando, refletindo e intervindo com os atores em suas realidades. Mas este campo não é ainda o campo que desejo estar, da forma como gostaria de explorar, este foi sim um espaço de exploração, de aperfeiçoamento de reflexão. De questionamento de minhas visões pré-concebidas, de empatia pelos desafios das pessoas que estão todos os dias trabalhando em suas organizações, com ótimas intenções, porém esbarram seguidamente, uma vez atrás da outra em barreiras, não declaradas, porém muito concretas.

Tenho visto nos últimos 5 anos, organizações, líderes e times incapazes de observar e refletir sobre suas realidades. Incapazes de tolerar as contradições que vivem, incapazes de propor melhorias de forma coordenada, incapazes de olharem para si, de expressar seus sentimentos, de ajudarem um colega a se desenvolver, de questionarem um superior sobre uma decisão que não concorda, de propor uma mudança em um sistema de gestão sem que seja exclusivamente para seu benefício próprio.

Estas mesmas organizações investem pesado em tecnologias e metodologias avançadas de organização do trabalho, de comunicação, de acesso à informação. Mas seguem deixando de lado o desenvolvimento dos membros da organização. E aqui não estou falando da capacitação na nova ferramenta, estou destacando a incapacidade de ajudar o indivíduo A ou B a olhar para sua trajetória profissional e pessoal, entender suas dificuldades e desafios, planejar de forma propositiva um meio de se desenvolver. Estou falando da incapacidade de enxergar no desenvolvimento dos indivíduos um caminho para o atingimento dos objetivos da organização.

Equipes e times sobrecarregados de trabalho, demandas que chegam de todos os lados, interferências de poder, atravessamentos e jogos políticos e de carreira, contratações, demissões e promoções sem clareza do processo. Em meio a tudo isso, um indivíduo com expectativas de construir uma carreira, com obrigações financeiras e emocionais com sua família, com expectativas de agradar, de fazer a diferença, de não ser tão sacrificante trabalhar, de não adoecer, uma pessoa com medo.

E em muitas dessas empresas a estrutura organizacional está sendo transformada, as áreas precisam colaborar, times estão sendo constituídos, metodologias adotadas, expectativas criadas, e em muitos desses casos as pessoas não tem outra opção que não seja concordar, participar e tentar absorver o discurso proferido que pouco pode ser reconhecido na prática.

Em reuniões de gestores os líderes são incentivados a falar o que estão pensando, pois precisa-se deles nessa transformação de mindset. Porém, poucos realmente se sentem à vontade para falar. Muitos nem saberiam o que falar, pois não se tem certezas nesse momento, apenas sentimentos e percepções. Como é que um líder dessa empresa vai falar de sentimentos e percepções e sair impune?

Esse campo em que andei é atravessado por muita coisa ao mesmo tempo, de segurança psicológica até estruturas e processos formais de gestão. Pode-se recortar, observar, absorver de muitas formas, de muitos ângulos. E em cada uma dessas organizações as questões são diferentes, assim como as pessoas são diferentes, seus produtos e serviços, suas histórias, seus valores, seus mundos são distintos.

Porém, em todos eles tive a mesma impressão. Estão todos querendo fazer o seu melhor, estão todos querendo se adaptar, aprender, ter sucesso, ser feliz. Não será esta pesquisa que desvelará a pedra de roseta das organizações, porém tenho profunda intensão de que ela possa explorar, mostrar, organizar e ajudar, os que estiverem dispostos, a entender que é possível construir organizações que proporcionem o florescimento do potencial humano de seus membros sem comprometer sua viabilidade econômica.

E a forma como suspeito que isso possa acontecer é através do enfrentamento das contradições presentes, na organização, nos times e nos indivíduos. Cada um com suas realidades, cada um com seu grau de consciência, cada um em seu momento de vida. Todos em busca de algo similar, a felicidade. Objetivo tão volátil, incerto, complexo e ambíguo quanto a realidade que vivemos. Realidade que não suporta mais a busca pela felicidade através do acúmulo material e que precisa ser (re)significada, não só nas escolas e universidades, não só pelos governos, mas também nas organizações.

A cartografia investiga processos e movimentos de produção de subjetividade (KASTRUP; PASSOS, 2013). Subjetividade essa, esperada em um processo de ressignificação da visão de mundo das pessoas, subjetividade presente quando colocamos em xeque que o único objetivo de uma organização é o lucro, assim como o único objetivo de um profissional é seu reconhecimento financeiro. Subjetividade que espero ser capaz de apreender fazendo uso da CHAT e o entendimento de aprendizagem expansiva.

Barros e Barros(2013) reforçam que a cartografia faz emergir realidades que não estavam dadas, para tanto é necessário dissolver o ponto de vista de observador separado de seu campo, presente apenas para produzir sua pesquisa. As autoras defendem a necessidade de reajustar as fronteiras entre sujeito e objeto, destruir a expectativa de encontrar uma realidade dada em si mesma. A realidade encontrada é construída ativamente pelos sujeitos da pesquisa e pelo pesquisador, pesquisador ativo e em relação com a o campo e a realidade descrita(BARROS; BARROS, 2013).

4.1. A cartografia

Romper com a previsibilidade: A adoção da cartografia enquanto percurso metodológico tem o objetivo de romper com a previsibilidade esperada do pesquisador frente seu planejamento/projeto de pesquisa. Uma vez que a busca do controle sobre o caminho a percorrer, assim como a assertividade sobre o objeto tendem a transformar a potência em superficialidade da simulação do trajeto previsto (PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015).

Construir com os participantes: O desafio de colocar-se em campo para construir com os participantes da pesquisa um estudo que traga valor para os envolvidos coloca em xeque a centralidade do pesquisador, da mesma forma que exige um exercício constante de busca e expressão da sua verdade neste projeto que se torna coletivo. Assume-se uma posição de afetar mútuo, o pesquisador observador isento é substituído por um indivíduo com postura conceitual-política e transformador da realidade que pesquisa.

Transformar para conhecer: a dissolução do conhecimento dualista (natureza/cultura, quantitativo/qualitativo, objetivo/subjetivo) aproxima o pesquisador de uma realidade que assume a complexidade como desafio, com suas incertezas, problemas e contradições. A processualidade é forma de navegar a realidade em movimento constante do campo, forçando assim o próprio pesquisador a manter-se em movimento, usar da reflexividade para questionar-se, os sujeitos do campo, a própria pesquisa.

Ao invés de perguntar pela essência das coisas, o cartógrafo pergunta sobre seu encontro com as coisas na pesquisa. Substituir perguntas do tipo “o que é isto que encontrei?” para “como eu estou compondo isto que encontrei?”, o posicionando como criador da realidade. Contemplando a coexistência dos tempos (o presente que traz a virtualidade do passado, e a imprevisibilidade do devir futuro).

O cartógrafo se faz cartografando: formar e pesquisar se dão mutuamente. (POZZANA, 2013). “A cartografia introduz o pesquisador numa rotina singular em que não se separa teoria e prática, espaços de reflexão e de ação. Conhecer, agir e habitar um território não são mais experiências distantes umas das outras” (ALVAREZ; PASSOS, 2009, p. ,149).

O pesquisador-cartógrafo afeta e é afetado: pela presença-intervenção do seu caminhar constrói os caminhos de sua pesquisa. Tais efeitos podem ser lidos no percurso de sua pesquisa, assim como no movimento do problema e domínio da investigação (POZZANA, 2013). “O mundo não é algo que nos foi entregue: é algo que emerge de como nos movemos, tocamos, respiramos e comemos”(VARELA, 1996, p. 15).

Pelo fato de ser na interação com o território que somos capazes de cartografar esse é um método entendido como ad hoc, adaptando-se ao território encontrado o pesquisador faz uso das ferramentas possíveis para sua produção de dados, processo esse chamado de hódos-meta.

Caminho se constrói caminhando: O aspecto do hódos-metá, onde em contrapartida ao metá-hódos (lógica onde temos metas pré-definidas que orientam o percurso), essa inversão metodológica dá espaço para o pesquisador vivenciar o processo de pesquisa e de forma mais orgânica construir seu percurso metodológico. Isso quer dizer não ter prescrição de procedimentos, regras e protocolos de pesquisa anteriores a interação com o campo, mas sim fazer uso de pistas que apoiam o caminho do pesquisador (KASTRUP; PASSOS, 2013), Cintra e colaboradores explicam a origem das pistas:

Um grupo de pesquisadores do Departamento de Psicologia na Universidade Federal Fluminense e do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro que investiga possibilidades metodológicas para estudar os processos de subjetividade elaborou pistas do método da cartografia em dois volumes (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2009; PASSOS; KASTRUP; TEDESCO, 2014) como possibilidade de guiar os pesquisadores na apropriação de um método processual, não com objetivo de engessá-lo. Este estudo de revisão integrativa da literatura também busca tal apropriação (CINTRA et al., 2017, p. 46).

Pistas como norteadores: A não prescrição de procedimentos e protocolos só é possível pois na cartografia se faz uso de pistas como norteadores e guias para dar suporte a jornada do pesquisador. “As pistas que guiam o cartógrafo são como referências que concorrem para a manutenção de uma atitude de abertura ao que vai se produzindo e de calibragem do caminhar no próprio percurso da pesquisa – o hódos-metá da pesquisa” (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2015, p. 13).

Ao apoiar-se no caminho que vai sendo construído, o método reverte seu sentido, sem determinações ou prescrições dadas previamente. São as pistas metodológicas e a direção ético-política que servem de balizador para avaliar a experiencia e seus efeitos(PASSOS; BARROS, 2009a). São 8 as pistas metodológicas adotadas por este trabalho, sem hierarquia e sem prescrição porém com forte conexão umas com as outras, serão detalhadas na sequência.

4.1.1.  Pista 1 – A cartografia como método de pesquisa-intervenção

Toda pesquisa é intervenção. E ela se dá no plano da experiência em que o distanciamento da lógica cartesiano-positivista é subvertido, agenciando sujeito-objeto, teoria-prática em um mesmo plano de produção, que Passos e Barros (2009) chamam de plano da experiência. Definem ainda que “ a cartografia é o traçado desse plano de experiência, acompanhando os efeitos (sobre o objeto, o pesquisador e a produção do conhecimento) do próprio percurso de investigação”(PASSOS; BARROS, 2009a, p. 18). Tal noção apoia-se no princípio da análise institucional de transformar para conhecer, e não conhecer primeiro como requisito para depois transformar (PASSOS e BARROS, 2009).

Esse é um processo que se opera por transversalidades. Barros e Passos (2009, p. 27) destacam “operar na transversalidade é considerar esse plano em que a realidade toda se comunica. […] A tecedura desse plano não se faz de maneira só vertical ou horizontal, mas também transversalmente”. Não obstante, ao indicar a indissociabilidade entre pesquisa e intervenção, os autores afirmam a necessária implicação do pesquisador no campo de pesquisa, acompanhado de seus desejos, curiosidades, indagações e pressupostos evocando o ser político no fazer pesquisa-intervenção.

Cartografar é movimento: a cartografia exige do pesquisador posturas singulares. É necessário sujar-se, contaminar-se em si e no campo, questionar dados, pressupostos e as forças que tecem a experiência. Exige primordialmente que o pesquisador esteja implicado no movimento da pesquisa, tal qual o campo o pesquisador também necessariamente deve manter-se em movimento(COSTA, 2014).

Costa(2014) vai além ao descrever “é tudo manipulação”. Todo achado cartográfico é manipulação, pois é no fazer/manipular que se constrói a intervenção e consequente conhecimento. “Manipular é trazer para a mão o que outrora era de uma ordem mental” (COSTA, 2014, p. 74).

Costa explica que a cartografia é feita de encontros e ao cartógrafo pesa o dilema de conseguir definir a importância dos encontros a que é exposto, para ser capaz de identificar esses momentos a atenção do cartógrafo é outra pista/premissa fundamental no fazer cartografia.

4.1.2.  Pista 2 – O funcionamento da atenção no trabalho do cartógrafo

A contradição da atenção ao cartografar: É sobre atenção que Kastrup (2015) destaca dois pontos: a) a necessidade de uma “atenção à espreita” capaz de apreender dados, momentos, objetos que a priori parecem desconexos, pois são signos e forças circulantes ainda não significados “pontas do processo em curso”. E b) a atenção pode assumir diferentes funcionamentos: “seletivo ou flutuante, focado ou desfocado, concentrado ou disperso, voluntário ou involuntário, em várias combinações como seleção voluntária, flutuação involuntária, concentração desfocada, focalização dispersa etc.” (KASTRUP, 2015, p. 33).

Ao se deparar com o campo, o pesquisador deve dirigir sua atenção para algo, porém ao se fixar em um ponto tende a negligenciar os outros. Um caminho para tratar a questão é adotar a “atenção à espreita” – flutuante, concentrada e aberta – que utiliza todos os sentidos (KASTRUP, 2009, p. 48). Uma concentração sem foco fixo. Kastrup elenca quatro movimentos da atenção cartográfica: o rastreio, o toque, o pouso e o reconhecimento atento.

Acompanhar processos e produzir dados: A importância dos movimentos é reforçada quando recordamos que o objetivo do método cartográfico é ser capaz de acompanhar o processo e não a representação de um objeto. Devido ao DNA construtivista do método, entende-se que os dados não são coletados, mas sim produzidos pela pesquisa. Os dados são a produção real de algo que já estava virtualmente presente e é materializado no “caminhar” do pesquisador.

Rastreio constante do território: O rastreio é a “varredura do campo” para encontrar pistas, signos de processualidade. O toque é “sentido como uma rápida sensação, um pequeno vislumbre, que aciona o processo de seleção” (KASTRUP, 2009, p. 42). Não há um tempo ou uma intensidade definidos, mas é como um alerta, sinalizando onde levar a atenção. O pouso é o zoom, indica o fechamento do campo em uma parada da percepção, levando a uma mudança na escala da atenção e a uma reconfiguração do campo. Finalmente, o reconhecimento atento. Após o pouso, nos leva ao questionamento “o que está acontecendo?”

Tecendo conexões: A partir daí, efetua uma (re)aproximação do processo, de modo a se destacar seus contornos singulares. O fenômeno do reconhecimento é entendido como uma espécie de ponto de interseção entre percepção e ativação da memória, não sendo um circuito fechado, como o reconhecimento automático do objeto, mas uma possibilidade de ampliação da percepção. “O novo é, neste sentido, definido pela ligação, pela coexistência de diversas camadas de tempo, nunca perdidas, jamais ultrapassadas definitivamente, mas conservadas desde sempre e reunidas nas formas cognitivas da atualidade” (KASTRUP, 2003, p. 61).

4.1.3.  Pista 3 – Cartografar é acompanhar processos

Cartografar é habitar um território que não se habita: Barros e Kastrup (2009), observam a proximidade com a etnografia, normalmente, operacionalizada através da observação e/ou observação participante. Entende-se também que cartografar é “desenhar a rede de forças à qual o objeto ou fenômeno em questão se encontra conectado, dando conta de suas modulações e de seu movimento permanente” (BARROS; KASTRUP, 2015, p. 57). O movimento é apreendido pelo acompanhar do processo, intervindo e implicando-se no e com o campo, na maior parte das vezes em processos já em curso.

 Quando tem início uma pesquisa cujo objetivo é a investigação de processos de produção de subjetividade, já há na maioria das vezes um processo em curso. Nessa medida, o cartógrafo se encontra sempre na situação paradoxal de começar pelo meio, entre pulsações (BARROS e KASTRUP, 2009, p. 58).

Não à compartimentalização: A processualidade da cartografia não se refere apenas ao pegar uma pesquisa no meio de um processo em curso. Ela diz respeito ao modo de pesquisar. Os passos da pesquisa, tradicionalmente separados e organizados sequencialmente, não se separam na cartografia: “a processualidade está em todos os momentos – na coleta, na análise, na discussão dos dados e […] na escrita” (BARROS e KASTRUP, 2009, p. 59). As etapas de pesquisa na cartografia podem ser expressas como o próprio caminhar, produzido por passos que se sucedem sem se separar, cada um traz consigo o movimento anterior e precede o seguinte.

4.1.4.  Pista 4 – Movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia

A utilização de dispositivos tem o objetivo de viabilizar o trabalho com os objetos em movimento, sem coloca-los em categorias fixas que fariam perder o fluxo processual no qual as subjetividades são produzidas (KASTRUP; BARROS, 2009).

A cartografia é um procedimento construído caso a caso. A cartografia, enquanto método, requer procedimentos concretos encarnados em dispositivos. Os dispositivos[49] são “máquinas de ver e falar”, ou ainda

Um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre esses elementos  (FOUCAULT, 2005, p. 244).

Assim, o dispositivo caracteriza-se por sua força em romper o que estava bloqueado à criação. São três os movimentos-funções dos dispositivos destacados por Kastrup e Barros (2009): 1. “Movimento-função de referência” – deve ser utilizado de forma regular, articula a variação e a repetição; 2. “Movimento-função de explicitação” – é o “ato de trazer a consciência uma dimensão pré-reflexiva da ação” (idem, p.83) exploram o território no qual se opera a pesquisa/intervenção; e 3. “Movimento-função de produção e de transformação da realidade” – que, a partir da tensão gerada no movimento-explicitação, gera transformação no estado das coisas.

4.1.5.  Pista 5 – O coletivo de forças como plano de experiência cartográfica

Em busca do equilíbrio: A cartografia com sua dupla natureza de pesquisa e intervenção, tem o desafio de equilibra-se entre o movimento de produção constante dos objetos que animam o mundo ao mesmo tempo que ao acessar o plano coletivo de forças dessa construção, Escóssia e Tedesco(2009) explicam:

a gênese constante das formas empíricas, ou seja, o processo de produção dos objetos do mundo, dentre eles, os efeitos de subjetivação. Ao lado dos contornos estáveis do que denominamos formas, objetos ou sujeitos coexistem planos de forças que os produzem. (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 92).

Coletivo de forças não se refere ao conceito de social ou grupo, se aproximando das noções de Estado, sociedade, comunidade, coletividade. Esse modo de entender o coletivo segue outras dicotomizações combatidas pela cartografia como teoria-prática, sujeito-objeto, mente-corpo etc.

Na rede conceitual utilizada na cartografia o sentido de coletivo é constituído pelas relações presentes entre o plano das formas e o plano das forças, produtores da realidade. A distinção entre eles não é sinal de oposição, mas sim de potência na construção de relações reciprocas, gerando cruzamentos múltiplos.

O plano das formas é o plano do instituído, das figuras já estabilizadas. Como os objetos do conhecimento, constituidores da realidade percebida, seja pela apreensão sensorial, por leis ou pela probabilidade cientifica. Porém, esses objetos do mundo não possuem natureza fixa, pelo contrário, estão em constante transformação. São o resultado da interação dos planos de formas com o plano do coletivo de forças. É a estabilização provisório do jogo de forças, nos convencemos da universalidade do mundo que nos rodeia (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009).

Já o plano coletivo de forças é um conceito central para o entendimento da proposição não dicotomizada da cartografia. É também definido como plano transindividual ou pré-individual para Simondon. Esse é o território (espaço-tempo) entre o individual e o social, o plano onde se dá a criação das formas individuais e sociais, a origem dos processos de mudança/transformação(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009).

É na matéria pré-individual, sem contornos precisos e não delimitável, onde os fluxos de energia interferem a todo instante na continua gênese dos indivíduos classificada como um sistema metaestável. O resultado da matéria pré-individual é a individuação[50] ou forma individualizada, é constituída por aparente homogeneidade e contorno definido. Temos então as duas dimensões: individualizada com a propensão a ser repetida, e assim reconhecida como “verdade” por suas características serem delimitadas; e a dimensão pré-individual caracterizada por pontos singulares, alheios a ordenação e impossível delimitação(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009).

O exercício cartográfico é navegar na coexistência destes dois planos: sendo capaz de apreender os objetos e fatos empíricos (individualizados), porém contentores de uma realidade pré-individual. É do contato entre esses planos dessimétricos que emergem “estados críticos, situações problemáticas que exigem a procura de soluções” (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 98). Ou seja, o empírico (da regra, sistema, lei, processo, procedimentos) em não simetria com o pré-individual (intensidade e singularidades impessoais) é sujeito a uma nova fase de individuação, processo que redefine o ser individuado (individuo, grupo, instituição), que permanece com uma carga pré-individual podendo ser ativada a qualquer momento.

Ao que no primeiro olhar parece um conceito abstrato e distante, quando observamos os processos de transformação organizacional, e até mesmo o uso dos sistemas de atividade para atualização de práticas organizacionais e justamente essa a conexão esperada, porém partindo-se do princípio que os sujeitos já foram capazes de elaborar, ou serão capazes de elaborar o subjetivo e propor uma atualização para a prática presente. Assim como apresenta a limitação da observação do constituído, e reforça a importância da pista 4, e da capacidade de construir dispositivos que possam deslocar o individuo de um ambiente “sufocador” desta conexão com as possibilidades do devir (plano pré-individual).

Nesse sentido, o olhar do pesquisador voltado exclusivamente ao plano das formas instituídas revela sua insuficiência, na medida em que deixaria de fora da investigação parte constituinte do objeto estudado. As coisas e os estados de coisas, presentes no plano das formas, não seriam realidades fixas, mas efeito de recortes temporais do processo e corresponderiam a determinados momentos ou fases do contínuo movimento de variação gerado pelo contato (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 99)

Atualizamos assim o desafio da cartografia, de apreender as formas, porém ser capaz também de abarcar o seu processo contínuo de criação (individuação). Investigar as formas sem dissociá-las da dimensão processual, ou plano coletivo de forças moventes.

“Se o plano pré-individual das forças está sempre presente, ao lado do plano das formas, como potência para novas individuações, acessar o plano coletivo de forças é essencial à pesquisa cartográfica”(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 100). Como durante a pesquisa cartográfica a exploração ao plano transindividual pode ser habilitada?

4.1.6.  Pista 6 – Cartografia como dissolução do ponto de vista do observador

São três as ideias que compõem o plano de pesquisa ou plano de ação cartográfico: transversalidade[51], implicação e dissolução do ponto de vista do observador. A dissolução do ponto de vista do observador requer do pesquisador inicialmente a desconstrução da separação entre sujeito e objeto.

É através da transversalidade que a pesquisa-intervenção, altera os padrões comunicacionais propiciando um espaço de abertura para emergir o possível (pré-individual) que ainda não foi individualizado. Adiciona-se ao espaço propiciado pela transversalidade a implicação do pesquisador “implicados estamos todos em qualquer atividade de produção de conhecimento”(PASSOS; EIRADO, 2009, p. 117), daí a necessidade se fazer uma análise das implicações[52].

A dissolução do ponto de vista do observador: expõe o cartógrafo a novo paradoxo “habitar a experiência sem estar amarrado a nenhum ponto de vista e, por isso, sua tarefa principal é dissolver o ponto de vista do observador sem, no entanto, anular a observação” (PASSOS e EIRADO, 2009, p. 123).

O paradigma presente ao cartógrafo não é o do conhecer, mas o do cuidar: O cuidar como única forma de conhecer, o cuidar para cultivar uma realidade possível, emergente, embrionária. Para tal, necessita escapar a tentação de apenas buscar a solução dos problemas presentes e testar suas hipóteses. É no exercício da incorporação dos diversos pontos de vista sem se deter a predileções prévias que se possibilita transitar nesse espaço em construção (PASSOS; EIRADO, 2009).

Passos e Eirado (2009) explicam a importância da abertura para outras verdades possíveis:

quanto maior a certeza acerca dessa verdade nascida da experiência –, menor é o grau de abertura da experiência para a mudança, o que equivale a dizer, menor o seu coeficiente ou quantum de transversalidade. Assim também, essa variabilidade afeta a atitude implicacional do pesquisador: tanto maior a certeza do pesquisador acerca da verdade que surge em sua experiência com o campo de intervenção, menor a sua dissolvência no plano implicacional e, consequentemente, maior a sua sobreimplicação no trabalho de pesquisa. Maior abertura da experiência ou efetiva dissolução do ponto de vista do observador requer o reconhecimento da performatividade da experiência e a recusa de seu caráter de obrigação existencial(PASSOS; EIRADO, 2009, p. 125).

O cartógrafo lança-se à experiência em busca do emergir: seu e do mundo, sem estar distante a ponto de desvincular-se e nem preso em suas lentes próprias. É pela sua vulnerabilidade frente a experiencia que é capaz de acompanhar a emergência do campo, e por sua própria dissolvência performa seu caminho.

4.1.7.  Pista 7 – Cartografar é habitar um território existencial

É necessário habitar para cartografar: Um território é explicado por sua expressividade, como lugar de passagem, de constante transformação. Assim sendo é necessário ao cartógrafo uma imersão para que possa conhecer. “O trabalho da cartografia não pode se fazer como sobrevoo conceitual sobre a realidade investigada. Diferentemente, é sempre pelo compartilhamento de um território existencial que sujeito e objeto da pesquisa se relacionam e se co-determinam” (ALVAREZ e PASSOS, 2009, p. 131).

Um território não pode ser entendido como algo prévio que sempre existiu de forma independente. Personagens e paisagens se constituem mutuamente, reafirmando a natureza do território como lugar de passagem com constante transformação. Por isso, é necessário habitar para cartografar, inserir-se, engajar-se, conhecer “com” os sujeitos ali presentes, fazer parte da própria composição do território a ser conhecido/cultivado(ALVAREZ; PASSOS, 2009).

Nesse processo, mais do que deter-se a execução de normas técnicas, é a disposição por compor com o território que possibilita habitá-lo.

4.1.8.  Pista 8 – Por uma política da narratividade

Toda produção de conhecimento nos implica politicamente: pois se dá a partir de uma tomada de posição do pesquisador/cartógrafo. A escolha da fala a ser destacada, a pergunta feita, o referencial teórico escolhido, o território explorado entre todas as outras escolhas e implicações feitas durante e pesquisa são todas tomadas de posição numa política[53] de narratividade (PASSOS; BARROS, 2009b).

Com esse sentido ampliado, a política é a forma de atividade humana que, ligada ao poder, coloca em relação sujeitos, articula-os segundo regras ou normas não necessariamente jurídicas e legais. Não mais pensada exclusivamente a partir de um centro do poder (o Estado, uma classe), a política se faz também em arranjos locais, por microrrelações, indicando esta dimensão micropolítica das relações de poder (Foucault, 1977) (PASSOS; BARROS, 2009b, p. 151).

O exercício cartográfico propõe uma resistência às redundâncias comuns nos relatos de caso padrão, nos quais a repetição para reforço de clareza ou importância do caso. A proposta cartográfica sugere uma desmontagem do caso em si, de sua estrutura, permitindo que os microcasos e as microlutas que o permeiam componham também a cena. Desestabilizar o caso, provendo condições para que as forças que o compõem possam emergir, destacando as conexões, movimentos, linhas de fuga que possibilitam sua transformação (PASSOS e BARROS, 2009).

É, portanto, na escolha do cartógrafo de como será a forma com que irá narrar o que se passa, do que acontece no território. Já que o conhecimento expresso na narrativa não é apenas um problema teórico, mas também um problema político.

4.2. Estratégias de produção de conhecimento

Conforme preconizado na pesquisa cartográfica, tanto o trajeto quanto as ferramentas escolhidas pelo pesquisador são constituídas no desenrolar da pesquisa, assim sendo não faz sentido que haja uma predefinição das ferramentas e estratégias para produção de conhecimento durante a pesquisa.

No entanto, posso afirmar a utilização de algumas ferramentas básicas já em uso, e com aplicação que independe das escolhas da pesquisa, são: a) diário de campo; b) observação participante; c) entrevista semiestruturada; d) pesquisa documental.

O diário de campo é recomendado para que o pesquisador possa registrar suas impressões durante a interação no campo, assim como para que sirva de registro e recurso para revisitar seu trajeto cartográfico. Tais anotações “colaboram na produção de dados de uma pesquisa e têm a função de transformar observações e frases captadas na experiência de campo em conhecimento e modos de fazer” (BARROS e KASTRUP, 2009, p. 70).

A observação participante e as entrevistas são fundamentais por sua característica de possibilitar a observação e acompanhamento do fluxo processual objeto da pesquisa. Da mesma forma que são estratégias de produção de conhecimento também são pontos de intervenção do pesquisador no território.

A observação implica notar e metodicamente registrar: a) eventos; b) condições físicas de objetos e/ou do ambiente; c) comportamentos não verbais; e d) comportamento linguístico (VERGARA, 2000). A autora segue pontuando que observar é mais que olhar as coisas: o objetivo é contribuir para responder à pergunta geradora da investigação.

Já a pesquisa documental é fundamental para o entendimento dos processos históricos assim como para uma melhor percepção da cultura organizacional presente(GODOY, 1995). Discursos, normas e posicionamentos ético-políticos são comumente expostos nos documentos organizacionais e são de grande valia tanto para compreensão do território como ponto de apoio para entrevistas e construção dos trajetos metodológicos com os participantes da pesquisa.

Entrevistas como técnicas de coleta de dados incluem uma grande variedade de formas e de usos. Ainda que a forma mais comum, quando aplicada à pesquisa, seja a individual e presencial, elas podem ser em grupo e presencial, individual virtual, ou em grupo de forma virtual (FONTANA; FREY, 2000).

A entrevista individual semiestruturada em profundidade tem o entrevistado como personagem principal. Ela tem por objetivo entender, de forma detalhada, o ponto de vista do entrevistado sobre determinado objeto; já o entrevistador ocupa o papel de conduzir e complementar com perguntas o roteiro previamente preparado (BAUER; GASKELL, 2000). É provável o uso tanto de entrevistas informais como de grupos foco para melhor compreensão do território e aprofundamento em assuntos específicos, respectivamente.

4.3. Análise

Não há no cartografar, diferentemente das pesquisas de caráter representacional, etapa separada e subsequente a coleta de dados destinada à análise. No fazer cartográfico estes movimentos andam juntos, se retroalimentam e ajudam a definir e estabelecer as rotas de exploração do território investigado(BARROS; BARROS, 2013).

“Analisar é, assim, um procedimento de multiplicação de sentidos e inaugurador de novos problemas” (BARROS; BARROS, 2013, p. 375). Se contrapondo ao senso comum da pesquisa cientifica, ao cartografar se produz novas perguntas e problemas que levam a exploração do território a um próximo patamar de entendimento e complexidade, Barros e Barros(2013) pontuam:

toda “solução” é coextensiva a um modo de colocar o problema; o problema não é dado, ele depende da criação dos termos nos quais ele vai se apresentar. Analisar é, assim, um procedimento de multiplicação de sentidos e inaugurador de novos problemas.(BARROS; BARROS, 2013, p. 175)

Espera-se que a estrutura de pesquisa siga um mesmo padrão sugerido pelo fazer cartográfico: a) rastreio; b) toque; c) pouso; d) reconhecimento atento. Tanto em um olhar macro da pesquisa (na escolha do território), quanto no aprofundamento das temáticas emergentes.

A análise é o trabalho de desestabilização do que se apresenta, abrindo espaço do “individualizado” para o “transindividual”, é na análise conjunta com o campo que se deve ser capaz, de forma sensível, abrir o espaço e avançar nos questionamentos presentes na pesquisa a partir dos devires presentes no território.

 

4.4. Território[54]

Nos anos de 2019 e 2020 estive monitorando iniciativas, projetos e organizações. Palestras, e eventos on-line, assim como visita à empresas, interação nas redes sociais e fóruns de debate sobre os temas relacionados ao futuro do trabalho, novas formas de organizar, e movimentos como B Corps, Regenerative Organizations e Teal Organizations.

Durante esse primeiro sobrevoo no campo, em 2021, fui convidado para integrar o projeto Teal Brasil, que tem como objetivo “despertar a comunidade brasileira de pessoas que buscam reescrever a história do mundo por meio das organizações”. Fazendo uso da Teoria da Atividade, descreveria o movimento da seguinte forma:

  1. Objeto do movimento é: encontrar e divulgar práticas de organizações que operam na lógica TEAL.
  2. Artefatos: Plataforma Notion, Google Meet, e Miro como ferramentas principais para estruturar os trabalhos.
  3. Sujeito: Formada por pessoas voluntárias
  4. Comunidade: Pessoas voluntárias, empresas com práticas TEAL e pessoas interessadas no assunto
  5. Regras: Sociocracia é a metodologia e filosofia de gestão adotada pela iniciativa
  6. Divsão do trabalho: A inciativa foi organizada e, três times funcionais, autônomos: a) Squad Coleta, b) Squad Escrita, c) Squad Geral

Pude observar, participar e influenciar neste movimento, que se autointitulava uma organização em rede, que buscava, não só mapear as organizações com praticas Teal, mas também ser um exemplo no uso de práticas e ferramentas alinhadas com essas premissas.

Pude verificar na TEAL Brasil e nas Organizações mapeadas muitos dos aspectos apontados pela literatura de Organizações Hibridas, em especial:

  1. Dificuldades de equilibrar um espaço de contradição entre uma iniciativa sem fins lucrativos, e a necessidade de dinheiro para sustentar e gerar o impacto desejado
  2. Falta de alinhamento e construção de sentido compartilhada entre as pessoas da Organização
  3. Dificuldades de priorização e definição do modelo de negócio
  4. Desafio em sustentar as premissas em momentos de risco à sustentabilidade financeira da organização
  5. Necessidade de treinamento e desenvolvimento, técnico (ferramentas digitias) e não-técnico (premissas do movimento Teal), soft-skills

Os quatro itens são recorrentes na literatura, podemos destacar em especial o trabalho de Battilana (BATTILANA et al., 2015; BATTILANA; LEE, 2014; EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014)

            O conceito de uma organização que gera receita e remunera seus colaboradores, mesmo que sem retirada de lucros, é muitas vezes desafiador para pessoas que se conectam fortemente com o propósito e a ideologia do movimento ou organização (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

            A falta de alinhamento do sentido compartilhado coletivo (WEICK; ROBERTS, 1993) potencializado por processos de governança não estabelecidos, adicionado ao convite de uma gestão horizontalizada e participativa, acaba gerando resistências internas que consomem muito da energia da organização em fazer alinhamentos, convencimentos e explicações.

            A falta de clareza de visão e objetivos, faz com que o foco interno seja direcionado par ao desenho dos processos, e não no proposito organizacional (Objeto da Atividade).  É como se o Sistema da Atividade da organização. Ao não ter clareza do Objeto da Atividade (motivo de existir), buscasse nos valores e premissas o motivo, gerando um movimento entrópico do sistema.

            Podemos identificar esse movimento com o descrito por (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

Com um Sistema Operacional não funcional a iniciativa foi sendo consumida pelas pessoas que fizeram parte dela. Com espasmos de esforço individual, o que acabou gerando mais conflito pelo sentimento, e realidade, de poucas pessoas levando os outros nas costas, e nos momentos de sucesso a lógica colaborativa sendo evocada para que os louros fossem divididos, ou contestando as decisões tomadas por aqueles que lideraram o processo.

Na literatura encontramos a indicação de um processo de seleção baseado em compartilhamento de valores, um investimento constante em desenvolvimento da equipe, e adiciona à equação a necessidade de processos de governança claros. Ao que ele aponta a recorrência de Organizações Híbridas com dificuldades de ter clareza dos direcionadores estratégicos  (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

Figura 21 – Relações do Sistema de Atividade

Fonte: Autor adaptado de (AL-ALI, 2020; BLIGH; FLOOD, 2015)

Quando analisado pela lente da Teoria da Atividade, podemos identificar essas como contradições do sistema, em especial na área que chamamos de construção social do Sistema da Atividade(SA) (ver Figura 21). As Regras, Comunidade e Divisão do Trabalho.

Passando para um contexto mais específico, no caso da TEAL Brasil, a dificuldade em definir o objeto da Atividade afetou diretamente a eficiência dos outros Sistemas de Atividade. Esse impacto foi ampliado devido à proposta de um sistema colaborativo e aberto (altamente permeável), à participação parcial das pessoas devido à natureza voluntária do trabalho e à desconexão entre a ação e a Atividade Principal[55], mesmo com a proposta de organização por times que deveriam liderar projetos.

Esta situação fica clara na ausência de um modelo organizacional no nosso grupo Teal Brasil Mapeamento, onde, apesar do uso da sociocracia e do sistema “notion.so”, ocorre uma grande confusão sobre a relevância, impacto e priorização das tensões observadas.

OS REFLEXOS DA FALTA DE LENTES:

Ao considerarmos a abordagem da Sociocracia, observamos que as contradições são mapeadas e tratadas pela equipe, sendo nomeadas como tensões. Esse padrão é adotado em abordagens mais progressistas da agilidade. Contudo, apesar da adequação da ferramenta e da rotina de processamento das tensões proporcionarem uma sensação de progresso, ficou evidente o sentimento de combater incêndios em vez de abordar os assuntos realmente necessários (KOCH-GONZALES; RAU, 2019; LEMAY, 2019).

Para ilustrar isso, podemos citar três tensões que foram mapeadas em uma reunião em novembro de 2021: a falta de orientação clara sobre o uso do conteúdo, a indefinição das responsabilidades das pessoas que entrevistaram o caso, e a demanda excedendo a capacidade da equipe. A falta de um modelo organizacional torna subjetiva a priorização das tensões. O uso da Teoria da Atividade pode ajudar a construir uma visão compartilhada com relação à natureza e a prioridade dessas tensões.

A metodologia da sociocracia promove a participação e encoraja a criação de um espaço seguro para que sentimentos sejam compartilhados, fortalecendo a conexão entre a equipe e a construção de engajamento e pertencimento. No entanto, a ausência de um prisma interpretativo capaz de compreender a natureza interconectada dos Sistemas de Atividade e servir como um artefato mediador para o grupo resulta em uma consideração das visões individuais, mas falha, ou falhou, em possibilitar a construção de um sentido compartilhado dentro da equipe e da organização (WEICK; ROBERTS, 1993).

Portanto, a equipe pode optar por priorizar questões relacionadas ao sistema ativo, como o objeto, pois ele organiza o restante do sistema ativo. No que diz respeito à questão de passar responsabilidades (ou “passagem do bastão”), uma abordagem pode ser., pode-se nomear uma pessoa responsável por definir um modelo para organizar o conteúdo. Uma vez que as tensões são resolvidas, elas são reavaliadas porque têm impacto direto na terceira.

A não mediação de um artefato, coloca a discussão em um estado de embate de percepções e sentimentos a partir de pontos de vista distintos. Ativando experiências pessoais passadas traumáticas, ou sistemas de defesa em processos de embate de ideias. Fazendo com que o cultivo de um espaço de respeito e segurança psicológica acabe evitando que a tensão criativa apareça (EDMONDSON, 1999).

Em times mais maduros, ou com uma liderança com habilidades pessoais destacadas, pode trilhar esse espaço de tensão entre o conhecido e o desconhecido em busca da construção de um sentido compartilhado. Porém, essas características são raras, especialmente lideranças capazes de transitar entre posições mais diretivas e menos diretivas de acordo com as necessidades do grupo(LEINONEN et al., 2004). Pois essa habilidade exige a capacidade de equilibrar-se em contradições, paradoxos e no desconhecido, apoiando-se em teoria e método para facilitar a construção coletiva.

Aqui, podemos ver como um modelo da teoria da atividade pode ser útil em processos de gestão do dia a dia em geral, e especialmente em organizações que trabalham com equipes autônomas.

Diferentes autores apresentam esta ideia de formas variadas. Por exemplo: Engeström se refere à aprendizagem expansiva, Heifetz fala em solucionar problemas adaptativos, David Snowden falará em estabilizar problemas complexos, Weick utiliza o conceito de criar sentido compartilhado. Podemos incluir Robert Kegan em seu trabalho sobre Imunidade à mudança nesta mesma linha (ENGESTRÖM, 2001; HEIFETZ, RONALD, GRASHOW ALEXANDER, 2009; KEGAN; LAHEY, 2009; SNOWDEN, 2005)

Todos destacam a necessidade de ser capaz de “apresentar” o problema/ contradição/ tensão. Pois o principal desafio de mudar ou evoluir um sistema, em uma lógica não hierárquica de não uso coerção, ou outras práticas da abordagem que chamamos de comando e controle, não é encontrar uma solução ao problema. Mas sim, como incluir as partes envolvidas para que elas possam construir soluções locais e situadas, alinhadas à visão da organização e seguindo as premissas e valores compartilhados.

DESDOBRAMENTOS:

Com o desgaste e a perda de energia para manter o movimento, a TEAL Brasil foi convertida em uma Sociedade Limitada, com os membros da equipe “Core” se tornando sócios da empresa. Foi preciso fechar o sistema[56] para estabilizá-lo e permitir que o objeto fosse definido por um grupo mais compacto, sem as lacunas de conhecimento e visão apresentadas no formato de rede.

4.4.1.  Teal Brasil – Plataforma de conexão

A experiência adquirida durante o processo, a evolução na compreensão da Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) e o valor da cartografia como guia de abordagens, ferramentas e posicionamento foram aspectos enriquecedores dessa jornada. Além disso, tive a oportunidade de interagir com várias organizações, tanto diretamente[57] quanto indiretamente.

👀 Novamente uma pitadinha de serendipidade no processo de pesquisa.

Como voluntário da TEAL Brasil, tive a oportunidade de conduzir entrevistas com gestoras da Natura&Co, resultando na produção de dois artigos detalhados sobre as iniciativas em curso na organização. O primeiro artigo, descrevendo o projeto CorageN, detalhou o processo de seleção de trainees. Este projeto busca substituir o modelo tradicional de contratação por competências e foca em indivíduos com experiências de vida e visões de mundo únicas, que geralmente seriam excluídos de um processo seletivo tradicional.

O segundo artigo, descrevendo o projeto My Performance, explorou o processo de avaliação de desempenho. My Performance visa remodelar a forma como o desempenho dos funcionários é avaliado e monitorado. Além de considerar resultados financeiros, também aborda aspectos do desenvolvimento pessoal e impacto socioambiental. Este projeto é projetado para dar mais autonomia às pessoas, acelerar a curva de aprendizado e fomentar o desenvolvimento integral do indivíduo, não apenas considerando habilidades técnicas e interpessoais, mas também um olhar para o desenvolvimento pessoal.

Figura 22 – Mapa de organizações com práticas TEAL

Tela de computador com luz azul

Descrição gerada automaticamente com confiança média
Fonte: Autor[58]  

A gestora da Natura encerrou o vínculo após a conclusão do artigo sobre o projeto My Performance, acabou por interromper a possibilidade de expandir minha pesquisa, dada a falta de interesse ou disponibilidade. Durante esse período, tive a oportunidade de acompanhar a produção dos artigos, trocar informações com outros voluntários e acessar a documentação das entrevistas (todas de livre acesso). Foram listadas mais de 100 empresas e mais de 30 foram entrevistadas (Figura 22).

Durante esse processo, auxiliei na produção e execução das duas edições do Teal Brasil Festival. Este evento online foi criado para reunir a comunidade corporativa e as pessoas interessadas no tema do futuro do trabalho, propondo uma nova forma de clima organizacional para o conceito Teal, as duas iniciativas contaram com cerca de 3.000 pessoas. Durante o festival, foi possível realizar um mapeamento das tendências e práticas discutidas, com base em dados secundários coletados.

A partir das experiências e trocas trazidas pelo Teal Brasil, pude reunir uma série de informações e dados relacionados às “organizações referência”, e a comunidade de profissionais interessados no tema, em especial suas áreas de interesse e pontos de desenvolvimento necessários.

Em grande parte, essas organizações utilizam referências similares em suas práticas. A sociocracia é uma referência recorrente, especialmente pela forma como organiza equipes e estrutura os processos de tomada de decisão, sem perder o controle sobre os indivíduos. Os métodos ágeis também são comuns nessa comunidade, organizando planos em torno de projetos e times que podem ter mais ou menos autonomia (KOCH-GONZALES; RAU, 2019; LEMAY, 2019).

Tornou-se evidente o papel crítico que a ‘tensão’[59] desempenha. Dentro deste contexto, ‘tensão’ se refere a qualquer oportunidade de melhoria de um processo ou combinação, identificada por um membro da equipe, seja em uma reunião síncrona ou através de ferramentas de comunicação assíncrona. Tais ‘tensões’ atuam como sinais vitais, fornecendo feedback crucial para a evolução contínua do sistema de gestão e da composição da equipe(KOCH-GONZALES; RAU, 2019; LEMAY, 2019).

Ao mapear e entender as diferentes iniciativas e práticas empregadas pelas organizações, identifiquei preocupações comuns e objetivos semelhantes entre a maioria das organizações examinadas. A implementação desses modelos de trabalho levanta um ponto importante: a necessidade de treinamento adequado para as pessoas entenderem, absorverem e aplicarem esses modelos.

Continuando essa linha de pensamento, o trabalho de Batilana (2014) destaca um desafio importante: a manutenção da cultura organizacional em organizações em crescimento. A chegada de novos membros pode colocar em risco a cultura existente, criando obstáculos ao crescimento organizacional. Esta questão, juntamente com situações em que as organizações estão em meio à transformação cultural e à mudança de suas práticas de trabalho, realça a complexidade do desafio de integrar novas abordagens em seus times.

A partir da elaboração constituída nesta etapa da tese, posso concluir que Organizações Híbridas enfrentam diversos desafios na busca de seus objetivos. Os desafios notáveis incluem o processo de seleção e contratação, a sustentação da cultura nas organizações em crescimento, a necessidade de desenvolvimento contínuo de suas pessoas, a falta de ferramentas e processos para construção de sentido compartilhado nas equipes, e a resistência à transformação cultural e mudança de práticas de trabalho.

Além do já conhecido paradoxo em equilibrar objetivos organizacionais duplos. Com isso em mente, minha pesquisa conduziu-me a uma análise mais detalhada de uma organização específica que demonstra a capacidade de navegar nesse ambiente complexo.

 

4.5. O pouso

Essa organização é a TANGO[60], com a qual tive a oportunidade de colaborar diretamente ao longo de vários meses. Com as experiências e obstáculos enfrentados no decorrer dessa colaboração, foi possível observar como os desafios apontados anteriormente se manifestam na prática, e como a TANGO se esforça para superá-los.

Foi em abril de 2022 que tive o ok da empresa TANGO, autorizando o início da pesquisa. Assim, mergulhamos mais fundo na experiência da TANGO, explorando sua cultura, práticas e os caminhos que a organização escolheu para enfrentar os desafios destacados na seção anterior.

4.5.1.  Que empresa é essa?

A TANGO, uma renomada empresa de TI fundada nos Estados Unidos na década de 90, expandiu sua atuação para mais de 20 países, estabelecendo 50 escritórios ao redor do mundo, incluindo quatro no Brasil. Especializada em consultoria e desenvolvimento de softwares, a empresa opera com modelos presenciais, remotos e híbridos após a pandemia. A organização se estrutura de forma horizontal, dividida em duas grandes áreas: operações (OPS) e serviços profissionais (PS).

A TANGO é firmemente orientada para a mentalidade social, com princípios e práticas alinhados com as melhores práticas ambientais, sociais e de governança (ESG). Em 2021, completou a primeira avaliação do Sustainability Accounting Standards Board (SASB) e se comprometeu com o Pacto Global da ONU. Além disso, usa a Global Reporting Initiative (GRI) como estrutura para compartilhar dados de impacto.

A empresa é conhecida por seu ambiente de trabalho acolhedor e inclusivo. A TANGO é intrinsecamente consciente do impacto social, evidenciado por sua notável atuação em questões LGBTQI+. Ela foi votada como a empresa mais querida no Brasil em sua categoria e repetidamente classificada entre as melhores empresas multinacionais para trabalhar e para mulheres, segundo a Época NEGÓCIOS e o Great Place to Work.

A TANGO é uma organização descentralizada e autônoma, onde a autonomia ficou evidenciada durante todo o tempo de convivência. A autorização para a pesquisa foi concedida diretamente pela área jurídica, sem a necessidade de um intermediário. A TANGO é uma comunidade vibrante de indivíduos apaixonados, comprometida com a transformação da indústria de TI e com a inclusão e diversidade.

Os três pilares fundamentais da organização são: administrar um negócio sustentável, liderar na busca pela excelência em software e revolucionar a indústria de TI. A organização baseia-se na premissa de que as pessoas são boas e reflete isso em sua cultura organizacional. Além disso, a TANGO tem um forte posicionamento social, refletido em seu cuidado com a inclusão de grupos normalmente marginalizados. Evidenciado em entrevista com a Global Procurement “Sempre damos preferência para a pessoa mais marginalizada e prejudicada.”.

Seus programas de inclusão e diversidade estão voltados para diferentes grupos, incluindo mulheres na tecnologia, pessoas trans e pessoas com deficiência. A TANGO também está comprometida em aumentar a diversidade racial em todas as áreas da organização.

Seu processo seletivo é um aspecto central de suas práticas inclusivas e diversificadas. Os próprios colaboradores conduzem as entrevistas e tomam a decisão final sobre a contratação. O processo reforça e reflete os valores de diversidade e inclusão da empresa. Como dizem: “Mais do que saber, ou atuar de forma exemplar, buscamos pessoas que estejam abertas para aprender.”

Esse processo seletivo também é significativo do ponto de vista da representatividade. As entrevistas são conduzidas por colaboradores que refletem a diversidade da empresa, o que por si só causa um impacto profundo nos candidatos. Alguns colaboradores relataram como foi marcante serem entrevistados por pessoas negras, como eles próprios: “Essa foi a primeira vez na minha vida que a entrevista de emprego foi feita por uma pessoa negra, como eu.” Outro depoimento ressalta: “Eu vi que a coisa era diferente quando na entrevista de emprego havia três mulheres negras conduzindo o processo.”

Esses relatos demonstram como o processo seletivo não apenas busca alinhamento cultural, mas também reforça e reflete os valores de diversidade e inclusão da empresa.

Em meio ao crescimento acelerado, a empresa se destaca por sua excelência técnica no mercado de tecnologia. Muitos de seus colaboradores são líderes em seus respectivos campos, o que ajuda a impulsionar a excelência técnica em toda a empresa. A organização investe no desenvolvimento de seus colaboradores e incentiva a tomada de iniciativas.

A TANGO é uma organização que se adapta constantemente às demandas dos clientes e às expectativas de desenvolvimento dos colaboradores. O processo de integração, ou “onboarding”, é um exemplo disto. O processo é projetado para ser inclusivo, abrangente e voltado para o desenvolvimento do colaborador, incorporando tanto a cultura organizacional quanto o conjunto de habilidades técnicas necessárias para o sucesso na organização.

Todos os novos contratados passam por um programa de integração detalhado que dura várias semanas. O programa inclui treinamento sobre os valores e cultura da empresa, bem como orientação sobre as práticas e procedimentos operacionais. Além disso, cada novo contratado é designado para um mentor que fornece orientação e suporte contínuos durante as primeiras semanas e meses na empresa.

Uma parte fundamental do processo de integração é garantir que todos os novos colaboradores entendam e se sintam confortáveis com a cultura de diversidade e inclusão da empresa. Isso inclui orientação sobre como navegar em uma organização horizontal, sem uma hierarquia rígida, bem como treinamento sobre como respeitar e valorizar as diferenças individuais e culturais.

A empresa também se destaca pela maneira como encoraja e facilita o desenvolvimento profissional contínuo de seus colaboradores. Os colaboradores são incentivados a buscar oportunidades de aprendizado e desenvolvimento, e a empresa oferece uma variedade de recursos, incluindo treinamento interno, subsídios para educação continuada e a oportunidade de participar de conferências e workshops relevantes.

Outro aspecto importante da TANGO é o seu compromisso com a flexibilidade no trabalho. Reconhecendo que cada indivíduo tem necessidades e circunstâncias únicas, a empresa oferece várias opções de trabalho flexíveis, incluindo trabalho remoto, horários flexíveis e a opção de trabalhar em um dos vários escritórios da empresa.

A empresa cultiva um destaque no cenário global de TI pela sua abordagem única para negócios, cultura organizacional e práticas de trabalho. Sua dedicação à diversidade e inclusão, combinada com seu compromisso com a excelência técnica e a sustentabilidade, torna a TANGO um exemplo notável de uma empresa de TI moderna e progressista.

“Nosso mundo está sendo remodelado por uma revolução tecnológica. Como tecnólogos, precisamos ter consciência de que temos uma responsabilidade fundamental em relação ao futuro que estamos ajudando a construir. Isso significa que enfrentamos contradições e compensações sobre as quais precisamos tomar decisões difíceis e assumir. Trabalhar com movimentos sociais que dão voz àqueles que foram historicamente marginalizados nos permite entender e resolver melhor essas contradições.”  Diretor Global de Mudança Social, TANGO

“Nosso objetivo é integrar a perspectiva de tecnologia responsável não apenas aos padrões de desenvolvimento de tecnologia, mas à estratégia e cultura de negócios, porque todas as empresas estão se tornando tecnologia no núcleo. Nosso mundo cada vez mais digital exige que as próprias empresas se tornem profissionais de tecnologia responsáveis.” Diretora de Tecnologia, TANGO

“Em vez de regras rígidas ou códigos de prática, a ênfase da cartilha está em exercícios interativos e oficinas que estimulam conversas abertas e desenham perspectivas diversas para sinalizar questões como preconceito e consequências negativas no início do processo de desenvolvimento.” Diretora de Tecnologia, TANGO

Apresento na sequência um resumo de como se deu a pesquisa em campo, com grandes movimentos e o período em que cada etapa ocorreu.

4.5.2.  Desenvolvimento de pessoas

Podemos dizer que a mesma lógica é aplicada ao processo de desenvolvimento de pessoas. Destaco o caráter de autonomia e protagonismo esperado da pessoa colaboradora em sua jornada de desenvolvimento. Durante nossa conversa, a atual Global Procurement, anteriormente da área de Pessoas e Desenvolvimento, ressaltou o compromisso da organização em se negar a ver pessoas como meros recursos. Ela rejeita uma visão linear de carreira, seja no formato I, Y ou qualquer outro preconcebido.

“Nesse formato”, ela diz, “as pessoas não têm tempo para desenvolver potencialidades e encontrar sentido em seu trabalho”. Isso justifica o porquê de a organização preferir o termo “jornada” ao invés de “carreira”. Esse conceito estimula o indivíduo a tomar as rédeas de seu próprio desenvolvimento, utilizando a organização como um meio de crescimento e satisfação pessoal.

Nessa jornada pessoal, ela mesma atravessou três áreas distintas, destacando que “poderia ter ido para a área de projetos, mas não me interessei”.

A jornada de desenvolvimento é dividida em algumas etapas: auto reflexão, feedback, alinhamento de expectativas, entendimento das oportunidades, definição de objetivos, identificação de lacunas, planejamento, busca de apoio, avaliação e revisão do plano.

Esse roteiro, embora não inovador – podendo ser facilmente encontrado em manuais de RH sob diversos nomes pomposos como PDI (Plano de Desenvolvimento Individual), PDA (Plano de Desenvolvimento e Ação) e outros -, em muitas organizações se torna um processo esvaziado. Fica centralizado na figura do líder, cuja responsabilidade é garantir o cumprimento do processo e a inclusão da avaliação individual do colaborador, geralmente uma ou duas vezes por ano, no “sistema”.

Os PDIs, muitas vezes vinculados à meritocracia e ao PLR (Programa de Participação nos Lucros e Resultados), podem levar os líderes a criarem planos facilmente alcançáveis para suas equipes. Isso acontece pois o PLR é comumente considerado parte do salário do colaborador, e seu não recebimento causaria um problema para a liderança, normalmente já sobrecarregada.

Portanto, mesmo com instrumentos semelhantes, organizações com premissas diferentes chegam a resultados distintos. Vamos agora explorar mais de perto como a “experiência de crescimento integrada” é aplicada na empresa Tango.

Ao contrário da abordagem padrão, o processo na Tango não é conduzido pela liderança direta do colaborador. Em vez disso, um “comitê” de pelo menos quatro pessoas conduz o processo. Este grupo auxilia a pessoa na avaliação de seu progresso, na elaboração de novos planos de desenvolvimento e na conexão com pessoas dentro da organização que possam ajudá-la em seus desafios individuais.

O processo na Tango é norteado por algumas premissas fundamentais: a) a jornada é responsabilidade do pessoa colaboradora, b) as expectativas entre organização e a colaboradora precisam ser claras e relevantes, c) o plano de desenvolvimento, embora seja um esforço individual, deve estar alinhado com as necessidades coletivas, d) a organização é constituída por times (e pessoas) autônomas, e) o processo é sustentado por uma cultura de feedback e apoio contínuo, f) existe uma cultura de crescimento (“cultura de cultivo”), g) há constante validação e correção de curso quando necessário.

A união dessa jornada, baseada nesses valores, deve levar o colaborador a: 1) reconhecimento, 2) crescimento e 3) novas oportunidades.

4.5.3.  Cultura de cultivo

No início desta jornada, gostaria de enfatizar a importância de um valor fundamental que a organização Tango denomina “Cultura de Cultivo”. Esta pode ser a essência de toda a lógica, valores e processos utilizados pela organização. A Cultura de Cultivo é representada por uma árvore, que prontamente relaciono com a ideia de nutrir e multiplicar, de forma sustentável.

Essa cultura permeia toda a organização, incentivando o desenvolvimento pessoal e profissional de todos os seus membros. Muitas organizações centralizam este processo em departamentos específicos, tais como Recursos Humanos ou “Pessoas e Cultura”. Na Tango, no entanto, essa cultura de desenvolvimento é disseminada por toda a organização. Ela é vista como um indicador de desempenho, uma razão para recompensa, e é apoiada por uma alocação significativa de recursos – estratégia, tempo e dinheiro – para sustentar essa premissa.

Um exemplo dessa cultura pode ser visto na prática de pareamento, onde desenvolvedores trabalham juntos no mesmo projeto, normalmente combinando profissionais juniores com seniores. Isso cria um espaço efervescente para a troca de conhecimento de maneira orgânica. Este método remete ao modelo da pirâmide de apreensão, onde a principal forma de aprendizado e desenvolvimento de habilidades ocorre ao ensinar algo a alguém.

Enquanto o profissional mais experiente assume o papel de orientador, a organização proporciona uma cultura de mentoria e coaching distribuída por toda a empresa. Essa estrutura promove espaços para que os profissionais juniores refletam sobre seus objetivos de aprendizado e desenvolvimento. Na Tango, todos estão envolvidos em algum tipo de mentoria, seja como mentores ou como aprendizes, e os novos integrantes da empresa têm um mentor designado para guiá-los neste processo de aculturação.

Ao entrevistar alguns membros da equipe, questionei sobre a complexidade deste sistema e o tempo necessário para que um indivíduo entenda plenamente seu funcionamento. A literatura sugere que, à medida que uma organização diminui a hierarquia, ela precisa aumentar as habilidades individuais de autogestão e autonomia. Isso capacita o indivíduo a navegar pela liberdade que lhe é conferida.

A Global Procurement destacou: “Não adianta ter uma cultura excelente na teoria, se ela for muito complexa para que as pessoas a observem. Como então tornamos isso palatável?” Esta reflexão não revela uma certeza de um processo finalizado, mas sugere uma jornada em andamento. A ideia é de que as lideranças devem estar bem informadas sobre a situação de cada membro da equipe e que os indivíduos devem ter maturidade para buscar auxílio quando necessário.

4.5.4.  A segurança psicológica e permissão para não saber

Avançamos na compreensão de que a colaboradora, como a principal responsável por sua própria trajetória, deve adotar uma postura proativa em relação ao seu desenvolvimento. Mais do que isso, é essencial que entenda que a vulnerabilidade, a fragilidade, e a incerteza são partes inerentes do crescimento pessoal e profissional, e que não será julgada, rebaixada ou penalizada por expressá-los.

Este conceito central está profundamente enraizado em organizações progressistas comprometidas com a autogestão e em organizações mais tradicionais, principalmente aquelas que valorizam a saúde mental de seus colaboradores e entendem o impacto de uma cultura sem segurança psicológica em um ambiente que requer mais proatividade e tomada de decisões ágeis de seus membros(EDMONDSON, 2019).

Ao mesmo tempo que esse discurso ganha força, ela se contrapõe a organizações que lutam para mudar suas práticas de trabalho, a lideranças que acreditam erroneamente que opressão e rigidez moldam o caráter, e a outras premissas semelhantes. Tais premissas são comuns em organizações com processos de produção repetitivos, em massa, e que têm dificuldade em se adaptar aos paradigmas atuais de gestão de pessoas.

Existem vários fatores que se destacam como diferenciais nessa discussão, incluindo a cultura e as histórias contadas, o papel do mentor, o processo de seleção, o onboarding abrangente e o conceito de ‘praia’.

A primeira consideração é que somos seres sociais, aprendemos através da observação do comportamento das pessoas com quem trabalhamos. Esta é uma ideia central na Teoria da Atividade, que destaca o processo de aprendizagem social (Engestrom, 2001). Se você percebe que seus colegas fazem perguntas diversas, expõem suas falhas e, em vez de serem punidos, são apoiados, você absorve rapidamente essa mensagem. Este é o que chamamos de cultura real ou “a cultura é como as pessoas agem no dia a dia” (Taylor, 2005).

Além disso, a forma como a organização se posiciona é crucial. A Tango, por exemplo, como consultoria premium, não aloca indivíduos em clientes, mas equipes que desenvolvem projetos, preferencialmente com um caráter de negócio traduzido em soluções tecnológicas. Desta forma, ela se destaca em um mercado competitivo e predatório.

A força da organização reside na soma de conhecimentos e áreas de expertise, bem como na diversidade de suas pessoas, que contribuem com uma gama de saberes para as soluções que precisam ser criadas. A diversidade racial, de gênero e de outros grupos é vista como um recurso valioso, não uma “fraqueza”. O foco está na equipe, na complementaridade de suas habilidades e na capacidade dessa equipe de aprender e usar os recursos da “rede interna” quando necessário.

Fui então complementado: “Há uma série de valores que asseguram que essas palavras bonitas sejam realmente postas em prática. Especialmente o entendimento de que todos são iguais. Isso não é apenas retórica. A pessoa que entrou ontem tem tanto direito e espaço para se expressar quanto alguém com anos de experiência. É papel do indivíduo mais experiente garantir que isso aconteça.”

4.5.5.  Uma organização em rede

Durante nossa entrevista, notei uma surpreendente semelhança entre a trajetória de um consultor da Tango e de um consultor individual, especialmente considerando as características necessárias – como protagonismo, autonomia, habilidade para colaborar e impulsionar o próprio desenvolvimento, além de capacidades técnicas e comportamentais.

Porém, observei que as profissionais da Tango possuem algo que consultores individuais geralmente não têm: uma vasta e complexa rede de apoio e conhecimento, oferecendo suporte técnico, comportamental e em soft skills. Esta rede é como aquelas usadas por trapezistas – sempre presente para suporte em caso de necessidade.

Ao que fui complementado sobre o forte caráter coletivo da cultura da organização. Ninguém fica isolado na Tango; essa rede de suporte é onipresente. Além disso, a organização adota a prática de alocar times inteiros, não indivíduos, criando um sentido de comunidade e conforto que influencia a maneira como se relacionam, inclusive com os clientes. Todos os consultores têm contato direto com os clientes.

Assim, um traço comum e grande fonte de orgulho é o fato de fazer parte da Tango. Especialmente devido ao forte posicionamento ideológico-cultural em relação à inclusão e justiça social, que reforça os laços além das competências técnicas ou do interesse em trabalhar com tecnologias avançadas.

Esse orgulho fica evidente quando questiono sobre o assédio aos profissionais, especialmente após 2020, quando a pandemia de COVID-19 normalizou o trabalho remoto e abriu o mercado internacional para esses profissionais.

“Sim, perdemos algumas pessoas para empresas como Google e Dell. No entanto, não perdemos nossos profissionais para organizações que não possuem essas características progressistas, como respeito à diversidade e equipes autônomas.”

A saída de um membro é sempre um evento doloroso para o indivíduo, que geralmente busca objetivos pessoais, como morar em outro país ou outras questões pessoais.

4.5.6.  Formação de times

[benefícios de um processo constante de formação de times]

A organização funciona como uma rede, com times formados de acordo com a necessidade do cliente e a disponibilidade dos membros da organização, ao que a entrevistada complementa: complementa “a praia funciona tipo um tinder, onde as pessoas são conectadas com os projetos disponíveis”.

Sobre como se dá o alinhamento e a formação de times, entendi que a cada início de projeto é desenvolvido todo um processo de formação de times, estabelecimento de acordos, processos de team building, alinhamento de expectativas do projeto com expectativas individuais e gerenciar não apenas o projeto, mas também as pessoas e as relações que se constituem.

Importante ressaltar que um cliente não tem poder de decisão sobre a formação de um time. Essa é uma decisão interna da Tango, alinhada com a visão de que não são uma “body shop[61]“, “alocamos times completos para solucionar problemas do nosso cliente.”.

Esse posicionamento firme da Tango contribui para o reconhecimento que ela tem no mercado. Além de fornecer soluções técnicas, ela influencia culturalmente as organizações com o respeito à diversidade e políticas de inclusão, a entrevistada complementa:

“Me lembro de um cliente que, quando começamos a trabalhar juntos, tinha uma série de restrições relacionadas à diversidade. Depois de 5 anos de trabalho, a equipe do cliente, que tem mais de 5000 colaboradores, nos convidou para ministrar um treinamento, que normalmente só fazemos internamente, para eles. Eles queriam levar as questões de diversidade para dentro da organização e nos viam como referência.”

4.5.7.  Fix the system not the people (ajuste os sistemas não as pessoas)

Identificamos durante toda a jornada de mergulho, acompanhamento, entrevistas, levantamento documental de que o objeto de ajuste e adequação da Tango não são as pessoas, mas sim os processos (artefatos), que influenciam e direcionam o comportamento das pessoas.

Busquei entender melhor o sistema operacional em vigor na Tango, os sistemas e processos que eles utilizam para alcançar seus objetivos. Assim, questionei: “Que tipo de sistema operacional permite às pessoas traçarem suas próprias trajetórias profissionais, aprendendo e crescendo ao longo do tempo? Como esse sistema auxilia cada indivíduo na avaliação de sua performance, planejamento de próximos passos, discussão de planos e reconhecimento financeiro do seu trabalho? Como vocês acreditam que esse processo pode ser profundamente significativo, ao mesmo tempo em que é acessível e encorajador para as pessoas navegarem nele?”

O processo descrito anteriormente foi novamente citado. Tudo se inicia com a reflexão, porém, ao invés de ser uma linha reta entre autoreflexão e revisão de plano, ele se assemelha mais a uma montanha-russa, aquela que dá diversas voltas e retorna ao ponto de origem.

Autoreflexão -> feedback -> alinhamento de expectativas -> entendimento das oportunidades -> definição de objetivos -> compreensão das lacunas -> plano de ação -> obtenção de apoio -> avaliação e revisão do plano.

Mas com relação ao impacto social, há uma organização por temática que ajuda a pessoa em seu processo de auto reflexão, em cada uma das temáticas a pessoa tem acesso a um material que a ajuda a refletir sobre seu nível de domínio do conteúdo, assim com a necessidade de dominar o conteúdo em que o projeto que ela está envolvida necessita.

Quadro 7 – Exemplo temáticas e grau de maturidade

__NovatoIntermediárioSomador
Justiça econômica______
Justiça Climática______
Justiça racial______
Justiça de gênero______
Inclusão de PCD______
Diversidade de Gênero e Sexualidade______
Tecnologia e Sociedade______

Fonte: Autor

A depender da temática que o projeto em que a pessoa está envolvida exige dela, um questionário de autoavaliação a ajuda a identificar seu grau de maturidade/domínio sobre o assunto e os caminhos de desenvolvimento sugeridos e possíveis para a posição que ela está ocupando.

Novamente o modelo e a lógica aplicada direcionam a pessoa para a autonomia e o protagonismo em seu processo de desenvolvimento, dos seus pontos de atenção, e inclusive apontando fontes e recursos para que a pessoa possa se desenvolver de forma autônoma, ou buscando auxílio na rede de apoio que a organização provê.

4.5.8.  Como é que vocês dão lucro?

O desafio intrínseco às Organizações Híbridas é equilibrar objetivos que, inicialmente, parecem contraditórios. No caso da Tango, este equilíbrio é buscado entre o impacto social, manifestado por meio de uma série de programas, políticas, estratégias e sistemas que refletem o objetivo da organização de impactar e transformar o mercado de TI de forma positiva, e a sustentabilidade financeira da empresa.

A partir de 2017, a Tango passou a ser controlada por um fundo internacional. Como parte do acordo de venda, a preservação da cultura organizacional foi assegurada, considerada um diferencial da empresa, que se manteve integrada ao longo do tempo.

Nos últimos dois anos, a Tango tem apresentado um crescimento médio global de 20%, mantendo uma margem de EBITDA próxima a 20%. Isso assegura um fluxo de caixa positivo e os relatórios aos investidores indicam uma saúde financeira equilibrada, pronta para os próximos ciclos de expansão.

Diante da pergunta: “Como, mesmo com todo esse investimento em pessoas, cultura e desenvolvimento contínuo, que em outros ambientes seria considerado uma despesa, a Tango consegue ser uma empresa lucrativa?”, as respostas não são simples. No entanto, as minhas interlocutoras apontam o posicionamento premium da organização como um diferencial crucial. Em alguns casos, a Tango pode cobrar um preço até três vezes superior ao de outros fornecedores, mas a alta qualidade de serviço e o valor gerado para os clientes fazem com que seja a escolhida como parceira.

Outro aspecto importante das relações da Tango com seus clientes é a longevidade dos serviços. Existem empresas que são clientes da Tango há mais de 20 anos, e isso não é exceção. A norma é de fato estabelecer parcerias de longo prazo que são renovadas à medida que a Tango continua sendo uma referência técnica nas diferentes tecnologias que surgiram e evoluíram durante esse período.

O investimento continuado no desenvolvimento de pessoas, retroalimenta a característica da organização de desenvolver tecnologias, publicar livros e ter seus profissionais reconhecidos no mercado como referências nas áreas em que atuam.

{{ESPAÇO PARA COMPLEMENTAR ESTRATÉGIA DE DIFERENCIAÇÃO DCA CONSULTORIA BASEADA NO LIVRO DE CONSULTORIA, CRIAR RELAÇÕES DE CONFIANÇA..}}}

4.5.9.  ### RECORTES INDIVIDUAIS – SEGUINDO FIOS

Perfil do time e das pessoas entrevistadas:

Verifiquei na prática o funcionamento do time: valores e características das relações

Momento de encerramento do projeto e convite a todos envolvidos na jornada

Desmobilização e realocação dos integrantes

Pessoas e suas histórias

O jogo do palitinho: Virkkunen e Newnham (2013) sugerem que uma mudança pode agravar as contradições primárias; Posteriormente, as tentativas iniciais de mudança dos participantes podem gerar contradições secundárias, pois os elementos recém-introduzidos estão em contradição com outros elementos do sistema; Abordar essa situação envolve produzir um novo objeto ou artefatos para o sistema de atividades, mas a implementação gera contrações terciárias à medida que as pessoas tentam usar um novo modelo; Além disso, quando o sistema de atividades é transformado, existem contradições quaternárias entre o novo sistema e os de seus vizinhos que dependem funcionalmente da atividade funcionando da forma antiga.

4.6. ANÁLISE DO CAMPO (MIX + INTRO)

Relembrando que, a proposta é explorar a dinâmica de organizações híbridas, times autônomos, autogestão e a aprendizagem expandida, considerando as inter-relações, contribuições históricas e culturais. Reconhecemos que essas premissas podem não se aplicar universalmente a todas as empresas ou indivíduos, assim como nenhuma abordagem deveria ser posta em tal posição.

Ainda assim, não se pode não considerar os impactos da tecnologia e do conhecimento na maneira como vivemos e trabalhamos. Da mesma forma como a autonomia estava presente durante o período de produção em massa, ainda que timidamente, atualmente, dispomos de artefatos e tecnologias que permitem a implementação dessas lógicas em larga escala.

Isso não exclui a possibilidade de uma empresa tradicional, como uma fabricante de pregos, continuar operando de maneira hierárquica, centralizada e orientada para o lucro, alcançando os resultados propostos, da mesma forma que poderia ter feito no final do século XIX. Entretanto, ao contrário daquela época, hoje somos capazes de construir uma organização conectada e distribuída com mais de 11.000 pessoas.

Portanto, o foco deste trabalho reside na exploração das potencialidades liberadas por esses novos modos de operação, mais do que na crítica a outros modelos possíveis. Buscamos entender e iluminar as oportunidades e desafios que essas novas formas de organização apresentam, ajudando leitores a compreenderem e posicionarem-se diante dessa nova realidade.

4.6.1.  PREMISSAS

Estudo focado em organizações descentralizadas:

Autonomia

            Conexão engestrom, modelo dos tipos de trabalho; conexão billet aprendizagem no trabaho, dignan futuro do trabalho, humanocracia e destaque do humano; Agilidade

4.6.2.  Resultados

4.6.3.  CULTIVO DA AUTONOMIA

Sistema de Atividade -> Artefatos[62]

Artefatos são carregados de significado intrínseco, constituídos social e historicamente.

Não são poucas as organizações que, com o objetivo de fomentar a autonomia em seus quadros, introduzem novas regras, normas, artefatos e estruturas de divisão do trabalho.

Porém, há uma diferença abissal entre inserir novos artefatos no Sistema de Atividade de forma impositiva e o criar condições para que todo o sistema evolua junto com o Sistema de Atividade principal, alinhando premissas, valores e propósito de forma situada.

  1. Métodos top-down enfrentam grandes desafios em transformar Sistemas de Atividade, e por consequência comportamentos e resultados da organização ou de partes dela (ENGESTRÖM, 2000a). Isso ocorre principalmente porque o SA é multivocal[63] e situado[64] – definições centralizadas, quando aplicadas a múltiplas realidades, podem levar a processos inflexíveis, sendo aceitos ou rejeitados. Quando o objetivo é criar equipes autônomas, é crucial desenvolver e promover autonomia nos indivíduos, uma vez que a construção de significado é um fator chave para a adoção e apropriação pelos sujeitos envolvidos no Sistema de Atividade.
  2. Como a organização habilita seus times e pessoas a reconstituírem seus (SA) para atender às novas premissas do Sistema de Atividade Principal?
  3. Como as organizações atualizam seus (SA´s) sistêmicos para influenciar, apoiar e promover a evolução dos SA de toda organização?

Os artefatos são impregnados de informações, significado, história e cultura. Para observar isso, é necessário ampliar a análise do artefato para o Sistema de Atividade.

O mesmo artefato pode servir a diferentes objetivos e objetivos distintos. De fato, organizações frequentemente utilizam este artifício para responsabilizar pessoas, evitando discussões sobre motivações, processos e objetivos implícitos aos processos organizacionais. Isso é especialmente verdadeiro para organizações focadas unicamente no “bottom line”.

Em última análise, um machado é o mesmo artefato, seja nas mãos de um assassino ou de um bombeiro, servindo a diferentes objetivos e objetivos em cada Sistema de Atividade.

De maneira similar, isso pode ocorrer ao implementar um Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) em uma organização. À primeira vista, o PDI é inerte quando analisado isoladamente. No entanto, quando integrado a um Sistema de Atividade (SA), ele pode tornar-se uma ferramenta de desenvolvimento e evolução, ou um instrumento de controle e coerção.

5.    PROPOSIÇÃO FRAMEWORK

5.1. Introdução

O ambiente atual, marcado pela rápida evolução tecnológica, exige das organizações maior adaptabilidade, descentralização e protagonismo dos colaboradores (BOCCARDELLI et al., 2017). Esse desafio se intensifica no contexto das organizações híbridas, que unem elementos de diferentes modelos organizacionais e enfrentam dilemas decorrentes de sua natureza dual (BATTILANA; DORADO, 2010; BATTILANA; LEE, 2014; PARK, 2020). Tais organizações mesclam múltiplas formas e experimentam tensões distintas interna e externamente, tornando ainda mais necessário o desenvolvimento de habilidades de autogestão, comunicação e trabalho em equipe (PARK, 2020).

As megatendências, como avanços tecnológicos e mudanças climáticas e demográficas, estão reconfigurando a paisagem econômica e comercial, aumentando a competição e exigindo novas estruturas organizacionais eficientes para aproveitar oportunidades (ANNOSI et al., 2018). Nesse contexto, a aprendizagem individual e organizacional torna-se crucial para enfrentar os desafios dessa realidade dinâmica (MARINOV et al., 2022; SMITH; LEWIS; TUSHMAN, 2012).

A aprendizagem organizacional (AO) é um processo dinâmico e contínuo que permite às organizações adquirir, criar, transferir e aplicar conhecimento, visando melhorar o desempenho e se adaptar às mudanças do ambiente (ARGOTE, 2013). A institucionalização do aprendizado envolve a transformação de aprendizados individuais, e de grupos que são assimilados pela organização em forma de sistemas, estruturas, estratégias e procedimentos que deveriam garantir qualidade e eficiência nos serviços prestados. No entanto, essa é também uma barreira para a incorporação de novos aprendizados (CROSSAN et al., 1999).

A institucionalização da aprendizagem é necessária para colher os benefícios contínuos do que já foi aprendido. No entanto, quando a aprendizagem se torna institucionalizada no nível organizacional, ela pode ser difícil de alterar e corre o risco de se tornar irrelevante, chegando até a obstruir os fluxos de aprendizagem emergente. Tal situação levou a uma demanda por libertar as organizações e eliminar a burocracia (HAMEL; ZANINI, 2020).

Contudo, é importante destacar que a burocracia (ou institucionalização) não é, por si só, negativa, uma vez que desempenha um papel crucial na manutenção dos benefícios advindos das aprendizagens já consolidadas (BOCCARDELLI et al., 2017). Sob as lentes da Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT), a burocracia negativa será aquela que atrapalha o alcance do objetivo do Sistema de Atividade (SA), podendo ser classificada como uma contradição do (SA).

Neste artigo identificamos o mapeamento de contradições no Sistema de Atividade como o fenômeno de interesse. As contradições desempenham um papel central na Aprendizagem Expansiva, uma teoria desenvolvida por Yrjö Engeström como uma extensão da CHAT (ENGESTRÖM, 2001). As contradições são tensões, conflitos ou inconsistências que surgem dentro de um sistema de atividade ou entre sistemas de atividade interconectados, essas contradições funcionam como fontes de mudança e desenvolvimento, desencadeando processos de aprendizagem e inovação (ENGESTRÖM; SANNINO, 2011).

As contradições são, portanto, fundamentais para a Aprendizagem Expansiva, pois fornecem oportunidades para os participantes do sistema de atividade repensarem e reestruturarem suas práticas e objetivos (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010). Ao identificar, analisar e resolver contradições, os indivíduos e as organizações podem aprender e se adaptar às mudanças e aos desafios em seu ambiente (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010).

No entanto, as pessoas tendem a enxergar aquilo em que acreditam, em vez de acreditar naquilo que veem (WEICK, 1997). Identificar contradições não é suficiente; é necessário convencer os atores envolvidos de que essas contradições são verdadeiras no sistema que fazem parte. Ao enfrentar um desafio complexo ou, conforme Heifetz descreve, um problema adaptativo, a pessoa que identifica o desafio ou lidera o processo encontra um grande obstáculo: apresentar e persuadir as outras partes envolvidas de que estão diante de um problema (HEIFETZ, RONALD, GRASHOW ALEXANDER, 2009).

Na metodologia de intervenção proposta por Engeström, o Laboratório de Mudança, há um grande enfoque em “construir o caso”, coletando provas e evidências irrefutáveis que possam ser usadas com os participantes a fim de convencê-los (SANNINO; ENGESTRÖM; LEMOS, 2016). Essa metodologia foi aplicada em inúmeros estudos com sucesso, no entanto nutre uma série de dependências que se tornam impeditivas para que a teoria da atividade e da aprendizagem expansiva possam se popularizar (LEMOS; ENGESTRÖM, 2018). As principais dependências giram em torno do alto investimento de tempo despendido pelas pessoas pesquisadoras (especialistas na metodologia) para que sejam capazes de construir o caso, e facilitar todo o processo que é estimado entre 18 a 36 meses (SANNINO; ENGESTRÖM; LEMOS, 2016)

Com base nessa limitação perguntamos: É possível integrar o desenvolvimento individual de competências com o mapeamento do Sistema de Atividade e suas contradições? Esta integração poderá gerar um ganho direto e objetivo para as pessoas participantes e ao mesmo tempo produzir um mapeamento estratégico para o time/organização?

Neste artigo é apresentado um framework que tem por objetivo desenvolver competências de forma pragmática e ao mesmo tempo a capacidade crítica dos integrantes de um grupo, para que sejam capazes de identificar as contradições do Sistema de Atividade trabalhado objeto do trabalho.

A proposta do artigo é que: A introdução de um novo artefato desestabiliza o equilíbrio do Sistema de Atividade constituído e abre espaço para o mapeamento das contradições do sistema.

Uma série de 4 premissas são constituidoras e dão suporte a esta proposta:

 Com base nessas 4 premissas propomos um framework organizador para aplicação de um processo de aprendizagem pela prática, fazendo uso da estrutura da CHAT para desvelar contradições presente do sistema de atividade.

5.2. Framework

O framework é composto por 5 etapas (Figura 1): Integrar, Incluir, Instrumentalizar, Implementar e Interpretar. Espera-se que ao seguir essa estrutura a pessoa proponente de um processo de desenvolvimento consiga atender as premissas  apresentadas neste estudo, e coletar os dados de forma estruturada para que possa nortear os próximos passos do processo de desenvolvimento a ser aplicado em sua organização.

Figura 23 – Processo de 5 etapas do framework proposto

Fonte: Autor

Figura 24 – Níveis de intervenção

Fonte: Autor

 

5.2.1.   Integrar – Premissa I: Competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio.

No framework proposto, há duas camadas de desenvolvimento ocorrendo simultaneamente (Figura 2). Existe o desenvolvimento objetivo e prático dos colaboradores, e ao mesmo tempo, há o mapeamento e compreensão do Sistema de Atividade (SA) em que esses colaboradores estão inseridos e a identificação das contradições do SA.

Para que esse processo duplo seja possível, é essencial integrar a necessidade da organização de desenvolvimento individual com a lógica da Teoria da Atividade. Especialmente ajudando a organização a lapidar a sua necessidade em um formato que contemple as características do objetivo e construir essa necessidade em um Sistema de Atividade. O desenvolvimento a ser executado deve estar conectado a um Sistema de Atividade superior. Dependendo da realidade organizacional, isso pode ser uma competência, capacidade organizacional ou um objetivo organizacional que se espera que o desenvolvimento individual reduza o gap existente (SALAS et al., 2012).

Será construído um esquema de Sistemas de Atividade, de sorte que representem as principais atividades conectadas com o objeto de desenvolvimento. Dessa forma, definir o SA da competência-chave e determinar os resultados esperados no SA da intervenção proposta. Por exemplo: A organização precisa desenvolver a competência de gestão de projetos em sua equipe. A competência de Gestão de Projetos pode ser representada por um sistema de atividade próprio.

Abaixo um exemplo de aplicação de três sistemas de atividade no contexto de uma organização desenvolvedora de sistemas de informação, exploramos a forma como os Sistemas de Atividade estão conectados entre si, dessa forma dando sentido para o trabalho de desenvolvimento planejado:

Tabela 1 – Exemplo Sistemas de Atividade

Competência / ComponentesDesenvolvimento de AplicaçãoGestão de ProjetosColaboração Efetiva
SujeitoEquipe de desenvolvimentoGerente de projetosMembros da equipe
ObjetoAplicação para o clienteProjeto entregue conforme requisitos, prazos e orçamentosAlcançar objetivos comuns através da colaboração
ArtefatosFerramentas de desenvolvimento, linguagens de programação etc.Ferramentas e metodologias de gerenciamento de projetos, técnicas de comunicação e colaboraçãoFerramentas de comunicação, técnicas de construção de relacionamento, estratégias de tomada de decisão
ComunidadeEquipes internas, clientes, fornecedores, outros stakeholdersEquipe do projeto, clientes, fornecedores, outros stakeholdersEquipes internas, gestores, parceiros externos, outros stakeholders
RegrasPadrões de qualidade, diretrizes da empresa, regulamentaçõesPolíticas e diretrizes da empresa, padrões do setor, regulamentaçõesPolíticas e diretrizes da empresa, normas culturais, acordos de confidencialidade, regulamentações
Divisão do trabalhoDefinição e atribuição de tarefas, coordenação entre especialidadesDefinição e atribuição de tarefas, coordenação entre funções, monitoramento e controleDefinição e atribuição de tarefas, coordenação entre funções, monitoramento e avaliação

Fonte: Autor

Com base nessa construção, define-se a intervenção pontual e prática que fornece instrumentos (artefatos) para os colaboradores transformarem sua prática, com a intenção de melhor atender ao objetivo do Sistema de Atividade[65]. Neste exemplo, escolheremos uma intervenção com o objetivo de melhorar a capacidade de estabelecer acordos efetivos da equipe e aprimorar o nível de colaboração interna.

Concluímos a primeira etapa, de acordo com o exemplo, com a clareza de que o Sistema de Atividade que será trabalhado é Gestão de Projetos, que tem como Objetivo “Desenvolver e entregar o projeto de acordo com os requisitos do cliente, prazos e orçamentos”. A organização entende que a equipe precisa evoluir sua capacidade de estabelecer acordos efetivos, impactando positivamente a colaboração interna e o Objetivo do SA.

5.2.2.  Incluir – Premissa II: Dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento.

Espera-se que a definição do público, do tema e da estratégia de desenvolvimento sejam feitas a partir de dados e de um entendimento da realidade da organização e das pessoas envolvidas, processo esse que é chamado de Análise das Necessidades de Treinamento (SALAS et al., 2012). Tal procedimento tem por objetivo garantir o máximo possível que as pessoas que participarão do desenvolvimento[66] terão um real ganho com sua participação.

Uma vez determinado o público, o tema, o impacto e o motivo do desenvolvimento é necessário incluir as pessoas participantes. Essa inclusão passa por três pontos principais: 1) convite/comunicado, 2) venda do treinamento e o 3) envolvimento das lideranças.

  1. O convite deve conter: a) informações essências (data, local, duração, formato, pessoa facilitadora, demais características), b) importância, c) objetivo, metodologia, d) nível de envolvimento, e) presença ou não de acompanhamento futuro, f) impactos esperados (SALAS et al., 2012). O convite ajuda a participante a definir suas expectativas e tem um efeito direto no resultado do desenvolvimento (TANNENBAUM et al., 1991).
  2. Venda do treinamento: a) porque importa, b) para quem, c) alinhamento com estratégia necessidade da organização, d) indicadores que demonstram a necessidade, e) como esse movimento se conecta com a visão macro de desenvolvimento e dos objetivos da organização. Faz parte da comunicação oficial e não oficial a venda do treinamento, esta é uma parte importante do processo de engajamento dos participantes, porém quando se promete muito mais do que o treinamento entrega acaba-se gerando um resultado inverso e perde-se engajamento devido a frustração das expectativas do participante (BURKE; HUTCHINS, 2007; SALAS et al., 2012).
  3. O terceiro ponto é a forma como as lideranças serão envolvidas no processo como um todo: a) os pontos anteriores devem ser abordados de abordagem específica como as lideranças, abrindo espaço para validar a proposta e feedback sobre o movimento.
    Lideranças podem guiar, esclarecer dúvidas, preparar e reforçar os assuntos tratados com os participantes. Mas podem também esvaziar, diminuir e até mesmo sabotar um treinamento, de ambas as formas sendo determinante para o sucesso ou fracasso da intervenção (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

 Ainda no desafio de incluir, o framework se apoia na utilização de autoavaliação, A adoção da autoavaliação impacta em três níveis: individual, grupo e organizacional. No nível individual é uma ferramenta importante como estratégia de preparação e para aumentar o engajamento, mas especialmente porque se alinha com a intenção de ter uma pessoa participante e protagonista de seu processo de desenvolvimento (PANADERO; ROMERO, 2014). A utilização de instrumentos de autoavaliação é muito discutida no contexto da aprendizagem autorregulada[67] (ANDRADE; VALTCHEVA, 2009; BOUD; SOLER, 2016; PANADERO; ROMERO, 2014; SITZMANN; ELY, 2021).

Com relação ao grupo, partimos da premissa que a autoavaliação será feita em plataforma digital e que será possível manter o anonimato dos respondentes, porém consolidar números gerais. Nos leva a afirmar que a análise das respostas individuais gera uma série de informações de como o grupo se avalia, assim como o nível de qualidade da interação e pontos de melhoria necessários.

E no nível organizacional, para além do fato de essa estratégia reforçar o posicionamento da organização em desenvolver pessoas e times mais autônomos, entendendo que o processo de aprendizagem é também um marco importante e um sinal relevante da cultura organizacional. A organização também se beneficia da análise de dados, gerando uma capacidade maior de entender o seu público, mapear os sistemas de atividade relacionados ao tema do desenvolvimento e ter maior clareza com recortes de grupos das necessidades específicas, e da forma como os times se avaliam a se e a cultura da organização, restrito ao tema trabalhado.

O questionário de autoavaliação é uma peça-chave da seção Incluir, nos diferentes níveis e utilizações e funções que o mesmo pode ser ter. Deve-se ter um zelo grande na produção da autoavaliação e dos processos eletrônicos de gestão dos dados para que esses objetivos possam ser cumpridos com sucesso.

 

5.2.3.  Instrumentalizar – Premissa III: Intervenções curtas e práticas mantém engajamento.

Nesta etapa do framework, é proposta uma intervenção na forma de palestra interativa, seja on-line ou presencial, de curta duração, que disponibiliza uma ferramenta simples e aplicável para uso imediato pelos participantes. O intuito é fomentar a autonomia e protagonismo dos colaboradores em seus percursos profissionais e desenvolvimento pessoal.

A sessão de instrumentalização visa ser uma intervenção breve e centrada na competência a ser aprimorada. Esta palestra interativa de 90 minutos é dividida em quatro partes: os primeiros 10 minutos são dedicados ao contexto, 20 minutos ao conteúdo fundamental e 30 minutos à apresentação e aplicação conjunta da ferramenta com os participantes. Os últimos 30 minutos são reservados para perguntas e respostas.

  1. Contexto: o objetivo da contextualização é defender a importância do conteúdo, preferencialmente de forma impactante para criar surpresa e conexão com a audiência, utilize a lógica das apresentações estilo TED para seu storytelling. Sua estrutura deve conter; a) relevância, b) objetivos, c) cronograma (ANDERSON, 2016).
  2. Conteúdo: renuncie a profundidade em prol da acessibilidade. Seu objetivo é criar curiosidade e entregar o necessário para a ferramenta poder ser aplicada. Nosso objetivo é a prática.
  3. Ferramenta: utilize ferramentas de baixa complexidade, ou crie modelos no formato de canvas com poucos passos.
  4. Próximos passos: deixe claro os próximos passos que são esperados durante o programa, explicitar que haverá uma segunda aplicação de autoavaliação ao final do programa aumenta o sucesso do programa (SALAS et al., 2012).

O propósito desta intervenção é criar um momento específico que encoraje o participante a prosseguir com seu desenvolvimento de maneira prática, utilizando a ferramenta apresentada no cotidiano laboral. O foco reside na aplicação efetiva da ferramenta, retire todas as camadas de complexidade quanto possível, busque nos resultados das autoavaliações questões pertinentes para o grupo com quem está trabalhando, absorva características e exemplos da cultura da organização para usar em sua palestra interativa.

A combinação da autoavaliação inicial, da palestra interativa, do acompanhamento do processo com pontos de contato preestabelecidos e do compromisso dos participantes em realizar uma segunda autoavaliação após 30 dias, abordando aspectos como aplicação da ferramenta, aprendizados, desafios, resultados e impactos percebidos, tende a fortalecer o engajamento dos envolvidos (SALAS et al., 2012). O papel da liderança direta da equipe é crucial para assegurar que o tema continue sendo explorado e que a experiência coletiva seja aproveitada de forma positiva (SITZMANN; ELY, 2021).

É importante ressaltar que as pessoas estão constantemente aprendendo, porém raramente aprendem a mesma coisa simultaneamente. Esta situação representa um cenário propício para a troca de conhecimentos e aprendizado entre os membros da equipe. O modelo proposto não interfere na continuidade dos passos da aprendizagem expansiva. Permanecemos comprometidos em auxiliar os indivíduos participantes e o grupo como um todo na experimentação de uma ferramenta capaz de impulsionar o desenvolvimento de competências necessárias ao negócio. Simultaneamente, exercitamos um olhar voltado ao sistema de atividade, identificando e mapeando coletivamente as principais contradições do sistema.

5.2.4.  Implementar

As experiências de aprendizagem no local de trabalho envolvem a interação entre a prática social e a agência individual dos trabalhadores. Essa interação é influenciada tanto pela participação em atividades de trabalho cotidiano quanto em atividades de aprendizagem organizadas. Ambas práticas participativas são interdependentes e afetam o processo e os resultados da aprendizagem no local de trabalho (BILLETT, 2004; LAVE; WENGER, 1991).

A experiência de aprendizagem até este momento o IMPLEMENTAR se dá de forma interativa, porém direcionada pelo desenho da autoavaliação e da palestra interativa, fazer a virada para a prática é desafiador especialmente pela falta de estrutura para sustentar a prática. Algumas estratégias são importantes de serem incorporadas, quando esse tipo de experiência é uma prática nova na organização (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

Como apresentado, o sucesso do programa passa por: a) comunicar, b) projetar o potencial “vender”, e c) envolvimento das lideranças (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001). Enquanto que em abordagens de desenvolvimento de maior controle as lideranças teriam um papel de fiscalização, neste modelo o papel das lideranças é de ajudar sua equipe a criar sentido sobre o processo que estão vivendo através de conversas, criando assim uma compreensão compartilhada que viabilizará, ou não, combinados e ajustes de ações e comportamentos do grupo (BILLETT, 2004; SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001; WEICK; ROBERTS, 1993).

Também deve-se contemplar no desenho do programa estratégias de suporte e reforço durante esses 30 dias de prática, algumas delas são: a) Um encontro de mentoria 7 dias depois da palestra interativa, com o objetivo de formalizar um checkpoint de mensuração da adesão das pessoas participantes e caso necessário implementar junto a organização e a liderança direta intervenções para aumentar a adesão (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001); b) Comunicação de reforço, adotar as práticas de comunicação da organização para entregar novos inputs para as pessoas participantes, cards, figuras, e-mails, que agreguem valor e relembrem do processo que estão vivendo (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001); c) Assessment de autoconhecimento, disponibilizar questionários e assessments que ajudem as pessoas participantes a refletir de forma estruturada sobre seus padrões de comportamento e como estes podem ou não estar influenciando na experiência de aprendizagem proposta (LANAJ; FOULK; EREZ, 2019); d) Gameficação, estratégias de gameficar a experiência de aprendizagem, inclusive fazendo uso dos itens anteriores pode ser uma forma eficiente de envolver as pessoas participantes na proposta (REINERS, 2015).

A prática coletiva, relacionada à implementação de um novo artefato seguindo o conceito de single loop de Argyris (1977), desempenha um papel crucial ao possibilitar a desestabilização controlada e produtiva da ordem estabelecida no Sistema de Atividade (ENGESTRÖM, 2001). A desestabilização ocorre quando os indivíduos, incentivados a adotar uma ferramenta – inédita ou já conhecida – de maneira coletiva e coordenada, visam atingir um objetivo específico com expectativas claras de resultado. Essa ação introduz a “atenção presente” ao ambiente de trabalho, elevando a consciência dos colaboradores em relação às suas ações e ao contexto organizacional (WEICK; SUTCLIFFE, 2006). Nesse enfoque, o processo de sensemaking coletivo é fomentado, permitindo aos trabalhadores compartilhar experiências e interpretar, colaborativamente, o ambiente organizacional (WEICK; SUTCLIFFE; OBSTFELD, 2005). Desse modo, a prática coletiva apoia a aprendizagem no trabalho e impulsiona o desenvolvimento de competências individuais e organizacionais, criando oportunidades para a aprendizagem expansiva (ENGESTROM, 2016) ou, conforme a perspectiva de Argyris, a aprendizagem em double loop.

5.2.5.  Interpretar – Premissa IV: Reflexão estruturada pavimenta espaço para Aprendizagem Expansiva.

A reflexão estruturada no ambiente de trabalho possui um impacto significativo no desenvolvimento de habilidades e conhecimentos dos colaboradores (COOK; DUPRAS, 2004; COPE; WATTS, 2000). A importância da reflexão estruturada reside em sua capacidade de ajudar os colaboradores a extrair sentido das experiências vividas no ambiente de trabalho de forma a viabilizar o processo de construção de sentido individual e coletivo (KOO, 1999).

Engeström (2001) destaca que as contradições surgem quando as ideias antigas de um participante encontram novos pensamentos ou informações que contradizem essas ideias. No ambiente de trabalho, isso pode ocorrer quando um sistema de atividade (ou grupo de colaboradores) se depara com um novo artefato externo ao sistema de atividade, gerando contradições à medida que as abordagens antigas entram em conflito com as novas.

Além disso, a reflexão estruturada favorece a aprendizagem e a reflexão como processos coletivos, permitindo que os indivíduos compartilhem suas experiências e perspectivas em um ambiente colaborativo (Holman et al., 1997). A consideração de aspectos sociais e políticos no processo de aprendizagem e reflexão é fundamental para desenvolver uma compreensão mais profunda das dinâmicas organizacionais e promover a aprendizagem expansiva e o sensemaking coletivo (Lave, 1990; Weick et al., 2005).

A CHAT é uma lente teórica que ajuda muito na concepção e interpretação das respostas de um processo de reflexão estruturada, pelo fato de a teoria considerar os fatores histórico-culturais presentes, que deve ser expresso durante todo o processo de implementação deste framework, desde o Incluir até o Interpretar (ENGESTROM, 2014). Mas, especialmente na concepção das perguntas e do relatório individual do processo de reflexão estruturada. Além da contextualização histórico-cultural o Sistema de Atividade organiza e facilita a compreensão de um processo complexo como o proposto (SANNINO; ENGESTRÖM; LEMOS, 2016).

O modelo propõe que a introdução de um novo artefato desestabiliza o Sistema de Atividade, e possibilita uma experiência de aprendizagem coletiva, que apoiada por um processo de reflexão estruturada permite às pessoas participantes refletir criticamente sobre diferentes perspectivas para processos que estavam normalizados, abrindo espaço para avaliar não só a eficácia do artefato proposto como todo o Sistema de Atividade em que estão inseridos.

Figura 25 – Modelo Sistema de Atividade

Fonte: Autor inspirado em (Engeström, 2001)

Essa dupla camada de reflexão não é óbvia, e por isso um processo e estrutura para a reflexão é fundamental para ajudar as pessoas participantes a significar a experiência em diferentes níveis e sobre diferentes perspectivas.

Tabela 2 – Exemplo questionário

PerguntaSistema de Atividade
Quão frequentemente você adota uma abordagem estratégica na gestão de um determinado aspecto?Objetivo
Quais das seguintes competências você acredita serem as mais importantes para uma gestão eficaz em um determinado contexto?Artefatos
Em uma escala de 1 a 5, quão eficaz você considera sua habilidade em construir relacionamentos sólidos em um determinado contexto?Sujeito
Em sua experiência, quais fatores são mais importantes para exercer uma influência maior em determinadas situações e tomadas de decisão?Regras
Quão bem você acredita que sua organização promove a capacidade de consultoria entre seus profissionais em um determinado aspecto?Comunidade
Quão eficaz você considera a divisão de atividades e responsabilidades relacionadas à gestão de um determinado aspecto em sua equipe ou organização?Divisão de Trabalho
Com base em sua experiência, quão positivo você considera o impacto das habilidades e ações de gestão em um determinado aspecto nos resultados dos projetos ou iniciativas em que trabalhou?Resultados

Fonte: Autor

A aprendizagem e a reflexão como processos coletivos, são viabilizados pela reflexão estruturada, permitindo que os indivíduos compartilhem suas experiências e perspectivas em um ambiente colaborativo (Holman et al., 1997). A consideração de aspectos da cultura, sociais e políticos no processo de aprendizagem e reflexão é fundamental para desenvolver uma compreensão mais profunda das dinâmicas organizacionais e promover a aprendizagem expansiva e o sensemaking coletivo (Lave, 1990; Weick et al., 2005).

5.3. Discussão

A Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) é uma abordagem teórica e metodológica que busca compreender a interação entre os seres humanos, seus artefatos e o ambiente sociocultural em que estão inseridos. Baseada nas ideias de Lev Vygotsky, essa teoria enfatiza a importância do contexto histórico e cultural na formação das capacidades cognitivas e emocionais dos indivíduos. A CHAT destaca a aprendizagem como um processo social e colaborativo, no qual os participantes coletivamente resolvem problemas e criam novos conhecimentos (ENGESTROM, 2014). Sendo uma teoria interventiva de aprendizagem, inovação e mudança em condições de complexidade, pode ser usada como uma ferramenta de desenvolvimento (ENGESTROM; KEROSUO; KAJAMAA, 2007).

Engeström (2001) destaca cinco princípios fundamentais da teoria da atividade. O sistema de atividade é a unidade de análise e interage com redes de outros sistemas (VIRKKUNEN; KUUTTI, 2000). A atividade é coletiva, focada em um “objeto” e mediada (por exemplo, por regras ou normas culturais). Além disso, um sistema de atividade possui multivocalidade, caracterizado pela presença de diversos pontos de vista, tradições e interesses individuais e coletivos. Essa multivocalidade se intensifica nas redes de sistemas interativos. Um sistema de atividade também é resultado de evolução histórica, e sua compreensão total requer análise de seu passado.

Contradições são fundamentais para o desenvolvimento, representando tensões estruturais profundas entre os elementos do sistema, e não simplesmente problemas ou conflitos. A presença de problemas ou conflitos indica a existência de contradições. A possibilidade de transformação expansiva ou aprendizagem expansiva sempre existe, com jornadas compartilhadas e deliberadas em direção a novos objetivos e propósitos. O ciclo de aprendizagem expansiva, baseado na análise cultural-histórica do sistema (ENGESTRÖM, 2000b), estimula transformações expansivas ou desenvolvimentistas no sistema de atividade.

As contradições atuam como força motriz da mudança na Teoria da Atividade Histórico-Cultural, e como Engeström (2000) salienta, o potencial para inovação é percebido quando o foco se desloca das ações individuais para o sistema coletivo de atividade. O desafio consiste em encontrar maneiras de representar e tornar visível essa dinâmica coletiva, permitindo que as pessoas resolvam problemas juntas e criem soluções sistêmicas inovadoras (HILL et al., 2007). Assim, o objetivo é buscar formas eficazes de representação e visibilidade dessa dinâmica, possibilitando que os indivíduos trabalhem em conjunto na resolução de problemas e na elaboração de soluções inovadoras para os sistemas em questão.

A introdução de um novo artefato através de um programa de treinamento pontual pode desestabilizar um Sistema de Atividade e criar oportunidades para que os indivíduos se tornem mais conscientes (mindful) sobre o sistema e identifiquem contradições (WEICK; SUTCLIFFE, 2006). A quebra do fluxo contínuo dos processos automatizados pode levar a um aumento na atenção plena e permitir que as pessoas diferenciem, criem e apreciem suas experiências conscientemente, conforme mencionado por (WEICK; SUTCLIFFE; OBSTFELD, 2005).

O framework proposto adota uma série de estratégias para ajudar a pessoa participantes a abrir esse espaço de reflexão, especialmente a adoção de instrumentos e estímulos para uma reflexão estruturada (COOK; DUPRAS, 2004), e a ativação e suporte ao papel da liderança em facilitar e estimular tanto a prática, quanto a reflexão por parte de seu time (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

Ao adotar uma abordagem mais consciente em resposta a um novo artefato, os indivíduos são capazes de identificar contradições e áreas de melhoria no Sistema de Atividade. Levinthal e Rerup (2006) descrevem a atenção plena (mindfulness) como alta sensibilidade de percepção e alta flexibilidade de comportamento para responder a estímulos diversos e mutáveis. Ao abordar um novo artefato e seu respectivo treinamento com uma perspectiva mais consciente, os indivíduos podem reconhecer a necessidade de reconfigurar suposições, estruturas e ações em resposta às mudanças no sistema (LEVINTHAL; RERUP, 2006).

Já é antiga a busca por modelos de desenvolvimento mais colaborativos e que gerem maior autonomia no participantes (BURKE; HUTCHINS, 2007), no contexto de organizações menos hierárquicas e com a necessidade de maior adaptabilidade como em especial as organizações híbridas (ADLER, 2001; BATTILANA; DORADO, 2010) cultivar uma cultura de aprendizado constante e de maior autonomia em seus processos de aprendizagem e desenvolvimento é uma questão de sobrevivência (ANNOSI et al., 2018). No entanto, essa construção de uma cultura com aprendizes protagonistas não é algo tão simples de se construir.

Estudos mostraram que as pessoas tendem a preferir a aprendizagem ativa, mas quando confrontadas com ela, podem enfrentar dificuldades para se adaptar (WYLIE; SHIH, 2009). Tradicionalmente, aprender tem sido uma experiência passiva, na qual espera-se que os participantes absorvam informações sem interagir ativamente com elas. No entanto, estudos recentes mostraram que a aprendizagem ativa pode melhorar a competência dos participantes e suas atitudes em relação a um assunto (REDMOND et al., 2020). É importante reconhecer que a adaptação à aprendizagem ativa pode exigir tempo e esforço, mas os benefícios são significativos a longo prazo.

Autores como Billett, Goller, Harteis defendem a agência pessoal como sendo o fator determinante para a transformação do comportamento, explicam que fatores situacionais e contextuais moldam em grande parte as atividades e interações dos funcionários, mas a agência pessoal também desempenha um papel importante, afetando como os indivíduos se envolvem nessas atividades (BILLETT, 2006; ETELÄPELTO et al., 2013; GOLLER; BILLET, 2014; HARTEIS; GOLLER, 2014). A agência pessoal no trabalho permite que os funcionários influenciem seus próprios processos de desenvolvimento profissional, como participar ou rejeitar práticas de trabalho, alterar descrições de trabalho ou buscar feedback sobre o desempenho (GOLLER; BILLET, 2014).

Entendem que os indivíduos podem escolher intencionalmente em que tipo de experiência se envolvem no trabalho, especialmente quando é necessário aprender conhecimentos exigentes (BILLETT, 2004). A motivação para a aprendizagem intencional pode estar relacionada a vários fatores, como afirmar controle sobre o trabalho, criar uma imagem positiva, satisfazer necessidades sociais, lutar contra o tédio ou estimular a progressão na carreira (GOLLER; BILLET, 2014). Para se tornar competente, os colaboradores precisam de experiência em atividades relevantes, e se o local de trabalho não oferecer acesso, eles devem se tornar agentes e proativos (MORRISON, 1993).

No entanto é importante destacar que a cultura organizacional tem um papel significativo na maneira como os indivíduos aprendem e se desenvolvem no ambiente de trabalho. A cultura organizacional molda as normas e valores compartilhados, influenciando o comportamento dos funcionários e o modo como eles interagem uns com os outros (SCHEIN, 2010). Organizações com uma cultura que valoriza a aprendizagem ativa e a autonomia podem facilitar a transformação do modelo de aprendizagem passiva para um mais proativo. No entanto, em ambientes onde a cultura organizacional é mais rígida e centrada no controle, os funcionários podem enfrentar dificuldades para adotar abordagens mais autônomas e proativas à aprendizagem (ARGYRIS, 1993).

Além disso, a forma como os funcionários são avaliados e recompensados também pode afetar sua motivação e disposição para adotar uma abordagem mais ativa no aprendizado. Sistemas de avaliação de desempenho baseados em metas específicas e resultados de curto prazo podem desencorajar a experimentação e a aprendizagem autônoma, pois os colaboradores podem se sentir pressionados a cumprir metas em vez de investir tempo em seu desenvolvimento pessoal (AMABILE, 1993; ARGYRIS, 1993). Além disso, a história pessoal de cada indivíduo também desempenha um papel importante na forma como ele se adapta aos novos modelos de aprendizagem. As experiências educacionais e profissionais anteriores podem influenciar a disposição e a capacidade de alguém para adotar abordagens mais ativas e autônomas (BANDURA, 1977; SILVER; MITCHELL; GIST, 1995). Portanto, é fundamental levar em consideração a cultura organizacional, os sistemas de avaliação e as histórias pessoais ao abordar a transformação da aprendizagem passiva para uma abordagem mais ativa e autônoma(ENGESTRÖM, 2000c).

A proposta metodológica desse artigo busca aliar essas duas visões fazendo uso de recursos de reflexão estruturada, para que a pessoa participante possa refletir sobre a forma como ela atua e interage com os assuntos tratados, facilitando a construção de sentido individual sem julgamentos (WEICK, 1997). Ao mesmo tempo que, preservando o anonimato das pessoas participantes explora e explicita as características da cultura que reforçam ou são obstáculos para a transformação de seus comportamentos, para isso fazemos uso essencialmente da estrutura do Sistema de Atividade e da CHAT como lente teórica e de análise sobre os dados coletados (BLACKLER; REGAN, 2009).

5.4. Conclusão

Este estudo propõe um framework teoricamente embasado para o desenvolvimento de competências e aprendizagem organizacional, com foco na identificação de contradições no Sistema de Atividade e na promoção de condições para que a Aprendizagem Expansiva possa acontecer(ENGESTRÖM, 2001). A prática coletiva é fundamental para desestabilizar a ordem estabelecida no Sistema de Atividade de forma controlada e produtiva, o que, por sua vez, promove o desenvolvimento de competências individuais e organizacionais e gera informações e insights para o time e a organização planejarem seus próximos passos com base em dados. Esse foco na prática coletiva e na interação entre os colaboradores reflete a compreensão de que a aprendizagem organizacional é um processo social (ARGYRIS; SCHON, 1978), que ocorre através da interação, comunicação e colaboração entre os membros da organização. A etapa de interpretação embasa a importância da reflexão estruturada no desenvolvimento de habilidades dos colaboradores no ambiente de trabalho.

A reflexão estruturada permite que os colaboradores extraiam significado das experiências vividas e facilitem a construção de sentido individual e coletivo (WEICK, 1997), especialmente quando se lida com contradições que surgem quando ideias antigas entram em conflito com novos pensamentos potencializados pela aplicação prática da ferramenta introduzida (ARGYRIS, 1976). A Teoria da Atividade (CHAT) de Engeström (2014) é utilizada como uma lente teórica para conceber os questionários e interpretar as respostas de um processo de reflexão estruturada, levando em consideração os fatores histórico-culturais presentes.

A consideração de aspectos histórico-culturais é crucial para desenvolver uma compreensão mais profunda das dinâmicas organizacionais e promover a aprendizagem expansiva e o sensemaking coletivo, conforme proposto por Weick (1995). Isso implica que a aprendizagem organizacional não é apenas um processo técnico e racional, mas também é influenciada por fatores contextuais e emocionais que afetam a maneira como os indivíduos e grupos interpretam e respondem às mudanças no ambiente de trabalho.

Em síntese, o framework proposto neste artigo oferece uma abordagem integrada para o desenvolvimento de competências e aprendizagem organizacional, enfocando a identificação de contradições no Sistema de Atividade e promovendo condições para que a Aprendizagem Expansiva ocorra. A ênfase na integração, inclusão, instrumentalização, implementação e interpretação reflete a complexidade do processo de aprendizagem e a necessidade de abordagens multifacetadas para apoiar o desenvolvimento de competências e a transformação organizacional (ENGESTROM; KEROSUO; KAJAMAA, 2007).

As implicações práticas deste framework incluem a necessidade de as organizações investirem em processos de aprendizagem e desenvolvimento de competências que sejam abrangentes, integrados e sensíveis às dinâmicas organizacionais, culturais e sociais (ENGESTROM; KEROSUO, 2007). Isso significa que os liderança deve estar atenta às contradições presentes nos Sistemas de Atividade e estar dispostos a promover a Aprendizagem Expansiva.

As líderes organizacionais devem também reconhecer a importância da reflexão estruturada e apoiar a criação de espaços e oportunidades para que as pessoas colaboradoras compartilhem suas experiências e perspectivas (WEICK; SUTCLIFFE; OBSTFELD, 2005). Isso pode incluir a realização de sessões de aprendizagem em grupo, workshops e seminários, onde possam discutir e analisar suas experiências e ideias de forma crítica e construtiva.

Além disso, o desenvolvimento de competências e a aprendizagem organizacional devem ser abordados como processos contínuos e adaptativos, que exigem monitoramento e ajustes constantes (ARGYRIS, 2009; ENGESTROM; KEROSUO; KAJAMAA, 2007). Isso implica que as organizações devem estar abertas a repensar e revisar suas abordagens e estratégias de aprendizagem à medida que o contexto e as necessidades dos colaboradores mudam ao longo do tempo (SALAS et al., 2012). (seria interessante você mostrar onde o artigo ratifica/corrobora com o que foi apresentado na literatura e, se existe alguma discordância, mostra onde e porque isto ocorre)

A aplicação eficaz do framework proposto neste artigo pode auxiliar as Organizações Híbridas a abordarem os desafios associados à mudança organizacional, ao desenvolvimento de competências e à inovação de forma mais eficiente e eficaz. Ao mesmo tempo, pode contribuir para a criação de um ambiente de trabalho mais inclusivo, participativo e orientado ao aprendizado, no qual os colaboradores possam desenvolver suas habilidades e competências de forma contínua e colaborativa, e as organizações possam se adaptar e prosperar em um mundo cada vez mais complexo e incerto.

Além disso, o framework proposto pode servir como um guia útil para profissionais de aprendizagem e desenvolvimento organizacional, que buscam implementar intervenções de aprendizagem eficazes e adaptáveis. Ao se concentrar no engajamento dos participantes e na aplicação prática das ferramentas e estratégias, o framework pode ajudar a garantir que os objetivos de aprendizagem sejam alcançados e que os colaboradores estejam melhor preparados para enfrentar os desafios em um ambiente de trabalho dinâmico.

No entanto, é importante ressaltar que o sucesso do framework depende, em grande parte, do compromisso dos colaboradores e das lideranças em participar e apoiar o processo de aprendizagem. O envolvimento das lideranças, em particular, é fundamental para garantir a eficácia das intervenções de aprendizagem e para criar um ambiente propício à aprendizagem e ao desenvolvimento contínuo.

Deve-se destacar as limitações deste estudo e do framework proposto. Primeiro, a aplicabilidade do framework pode variar dependendo do contexto organizacional e do setor em que a organização opera. Portanto, as organizações podem precisar adaptar o framework às suas necessidades específicas e considerar fatores contextuais ao implementá-lo. Além disso, futuras pesquisas podem explorar os fatores que facilitam ou inibem a identificação de contradições e a aprendizagem expansiva em diferentes contextos e setores, a fim de refinar e melhorar o framework proposto.

6.    APLICAÇÃO DO FRAMEWORK

0 Campo aplicacao 1

6.1. Briefing

6.1.1.  Setup de um novo conteúdo utilizando o Framework.

O processo de co-construção de uma intervenção fazendo uso do framework proposto deve ser encarado como um espaço de construção coletiva, e aberto para adaptações de acordo com as necessidades capturadas. Na sequência apresento o modelo utilizado nesta tese que pode servir de ponto de partida para futuras aplicações:

  1. Conectar o objeto do desenvolvimento ao Sistema de Atividade:
    1. Entendimento do real problema que está se tentando resolver;    
    1. Mapeamento do processo e onde o treinamento pedido terá interferência;
    1. Mapeamento dos principais problemas e dificuldades que impedem os colaboradores de atuarem da forma desejada;
    1. Entendimento das iniciativas anteriores para tratar a questão;
    1. Construção do percurso histórico do time, e da organização na questão presente;
    1. Mapeamento das características dos indivíduos integrantes do time,
  2. Estudo documental sobre a organização
    1. Estrutura adotada para desenvolvimento de pessoas;
    1. Documentos relacionados à história e a cultura da organização;
    1. Outros conteúdos já utilizados para trabalhar o desenvolvimento da competência em questão;
    1. Padrões e formato das apresentações, e requisitos necessários;
    1. Requisitos e formatação para contemplar acessibilidade da apresentação[68]
  3. Formatação do Questionário Insights (autoavaliação):
  4. Construção do conteúdo da Palestra Interativa e do Canvas de Aplicação:
  5. Desenho do encontro de Mentoria:
  6. Formatação do Questionário de Impacto
  7. Construção do Relatório de Devolutiva

6.1.2.  Conectando o objeto ao Sistema de Atividade

Existe um desafio inerente ao processo de interação entre a pessoa que demanda e a pessoa que aplica, especialmente quando se trata dos interesses individuais que podem influenciar ou levar ao abandono de premissas do projeto. No caso desta tese, a líder de Treinamento e Desenvolvimento (L&D) da Tango, é necessário coletar informações e, muitas vezes, provocar uma reflexão mais profunda sobre a solicitação. No entanto, a pessoa que aplica também tem um interesse claro em garantir que a atividade seja realizada, mas sob certas circunstâncias, ela pode ser cancelada a qualquer momento.

Nesse contexto, a utilização de um modelo é extremamente valiosa, pois funciona como um artefato mediador (Engestrom, 2001). Ele não apenas garante o sucesso técnico, mas também atua como um instrumento de mediação na relação entre as partes envolvidas.

O modelo desempenha um papel essencial ao fornecer uma estrutura objetiva que ajuda a manter o foco estabelecido e a evitar que interesses individuais prejudiquem o andamento do projeto. Ele serve como uma referência comum que permite a comunicação e a negociação de forma mais eficiente e eficaz entre a pessoa demandante e a pessoa aplicadora.

Além disso, o modelo também auxilia na criação de um ambiente de reflexão e questionamento, onde as informações são coletadas de maneira mais abrangente e aprofundada. Ao provocar uma reflexão mais profunda sobre o pedido, o modelo permite uma compreensão mais clara das necessidades e expectativas da pessoa demandante, garantindo que a atividade proposta seja realmente relevante e efetiva.

6.1.2.1.      Alinhamento da demanda:

Usou-se um instrumento intermediário, um questionário apoiado em um deck de slides do powerpoint para apresentar o modelo e coletar as informações necessárias:

  1. Qual é o público-alvo e qual é a atividade principal que ele realiza? Como eles estão atualmente envolvidos e como deveriam estar idealmente envolvidos? (sujeito)
  2. Quais são os principais desafios ou dificuldades que você percebe na atividade da sua equipe? Como você acredita que um programa ou projeto específico ajudaria a superar esses desafios? (contradições)
  3. Quais são os principais processos ou atividades que estão envolvidos nesta demanda? Como eles são realizados atualmente e como deveriam ser idealmente realizados? (artefatos)
  4. Que situações ou contextos específicos na sua organização exigem habilidades mais eficazes por parte da sua equipe? (motivação / objeto)
  5. Ao final deste projeto ou programa, qual é o resultado esperado? Como você medirá o sucesso deste projeto? (foco do trabalho)
  6. Quais são os recursos (humanos, técnicos, financeiros) disponíveis e necessários para este projeto? Como eles estão sendo usados atualmente e como deveriam ser usados idealmente? (recursos)
  7. Como você avalia o impacto das habilidades de sua equipe na performance e nos resultados da organização? Quais são os indicadores de desempenho chave que você gostaria de rastrear? (indicadores de sucesso)
  8. Quais são as regras, diretrizes ou normas que governam esta atividade ou projeto? Como elas são aplicadas atualmente e como deveriam ser aplicadas idealmente? (Regras)
  9. Além das pessoas do time, quem são outras partes envolvidas nesta atividade? (Comunidade)
  10. Você já tentou outras abordagens ou soluções para melhorar a eficácia da equipe no passado? Se sim, quais foram os resultados e por que você acredita que este programa ou projeto seria mais eficaz? (história)
  11. Quais são as principais dificuldades ou desafios que você prevê neste projeto ou programa? Como eles podem ser superados? (restrições)

6.1.2.2.      Co-construção do conteúdo e da trajetória

Importante que o projeto seja co-construído entre a pessoa aplicadora e as pessoas da organização. Para tal, sugerimos que se constitua uma equipe de projeto com um time central. As partes envolvidas com necessidade de tomada de decisão e agência direta com o time que participará do programa. Nesta aplicação constituem uma equipe composta pela Head de L&D, uma pessoa especialista em desenvolvimento de pessoas, e a pessoa líder dos times que foram participantes do projeto.

Anteriormente, já havia realizado uma imersão na Tango para a parte anterior desta tese, o que facilitou o processo de compreensão dos aspectos histórico-culturais. No entanto, a fim de gerar valor para as partes interessadas, foi necessário aprofundar minha imersão nos conteúdos especializados da organização, nos processos de desenvolvimento e nas estratégias de implementação. Isso me permitiu ter acesso à documentação interna da empresa, o que possibilitou a tradução de como as competências se relacionam entre si e como elas contribuem para capacitar as equipes e os colaboradores a atender às capacidades organizacionais identificadas como necessárias para o negócio.

A abordagem adotada nos permitiu desenvolver um mapa de conexões mais acurado e alinhado à realidade, aprofundando nossa compreensão das interconexões entre as diversas competências. Esta investigação meticulosa evidenciou a relevância de explicitar as interdependências para o time, servindo como uma ferramenta valiosa para fomentar um senso de propósito coletivo, algo que já se mostrou efetivo para a equipe de projeto.

A partir da construção de uma visão clara e ampla sobre como as competências se interrelacionam, pudemos entender como elas impactam diretamente na capacidade de consultoria e, consequentemente, nos objetivos da organização. A análise detalhada, combinada com a adoção de descrições mais exatas, gerou uma fundação robusta para a execução do programa, garantindo que este esteja integrado e alinhado às necessidades da organização, ao invés de parecer um elemento isolado.

A Teoria da Atividade desempenha um papel fundamental nesse processo de transformação, desde a co-construção do briefing até o desenho da jornada. Ela auxilia na estruturação dos inputs, facilitando a compreensão do Sistema de Atividade e, principalmente, do objeto que estamos tratando. Além disso, permite que as pessoas na organização revisitem e compreendam sua própria realidade sob uma nova perspectiva.

Esse processo de compreensão e tradução enriquece tanto a equipe de projeto quanto a organização como um todo, e foi recebido de forma positiva pela equipe, que se surpreendeu com a capacidade de adaptação do framework às necessidades e características específicas da organização[69].

Dessa forma, a teoria da atividade não apenas facilita a compreensão de uma nova realidade, mas também promove uma análise reflexiva e uma abordagem personalizada, beneficiando tanto a equipe de projeto quanto a organização como um todo.

Figura 26

6.1.2.3.      Construção da autoavaliação

A autoavaliação é uma peça central do projeto. Pois, além de ser a primeira interação da pessoa participante com o conteúdo, é também ali que podemos criar ou perder engajamento(BOUD; SOLER, 2016). Preferencialmente o questionário deve durar 7minutos para ser preenchido. Para tal o assessment deve obter 3 grandes grupos de informações:

  1. nível de domínio da pessoa respondente;
  2. comportamentos característicos de seus pares (cultura na prática);
  3. presença ou ausência de processos, sistemas e características organizacionais que promovam ou não a competência e os comportamentos decorrentes de seu uso.

Para que o questionário auxilie na construção do sistema de atividade, o questionário deve ser correlacionado com as partes do sistema de atividade desde sua concepção. Além de capturar informações práticas, os dados nos ajudarão a criar conexão com as necessidades do grupo e as demandas da organização.

Houve predileção por perguntas de escala e de múltipla escolha para diminuir o esforço da pessoa respondente. E aumentarmos o engajamento delas em completá-lo.

Questionário aplicado:

#PerguntaTipo de perguntaSistema de Atividade
1Quão frequentemente você adota uma abordagem estratégica na gestão de stakeholders?EscalaObjeto
2Quão eficaz você considera sua habilidade em identificar e analisar as partes interessadas em projetos, iniciativas ou organizações?EscalaObjeto
3Quais das seguintes competências você acredita serem as mais importantes para uma gestão eficaz dos stakeholders? (Selecione até 3)Múltipla escolhaInstrumentos
4Em uma escala de 1 a 5, quão eficaz você considera sua habilidade em construir relacionamentos sólidos com stakeholders?EscalaSujeito
5Em uma escala de 1 a 5, quão eficaz você considera sua habilidade em garantir cooperação e apoio dos stakeholders?EscalaSujeito
6Em sua experiência, quais fatores são mais importantes para exercer uma influência maior nos projetos e nas tomadas de decisão? (Selecione até 3)Múltipla escolhaRegras
7Quão bem você acredita que sua organização promove a capacidade de consultoria entre seus profissionais?EscalaComunidade
8Comente: Quão bem você acredita que sua organização promove a capacidade de consultoria entre seus profissionais?Texto curtoComunidade
9Descreva uma situação em que você aplicou com sucesso suas habilidades de gestão de stakeholders para influenciar um projeto ou tomada de decisão.Texto curtoSujeito
10Quão importante você considera sua habilidade em gerenciar stakeholders para o sucesso dos projetos nos quais está envolvida?EscalaObjeto
11Quais dos seguintes recursos ou ferramentas você já utilizou ou considera útil na gestão de stakeholders? (Selecione todos que se aplicam)Múltipla escolhaArtefatos
12Com base em sua experiência, quais são os maiores desafios que você enfrenta na gestão de stakeholders?Texto curtoObjeto
13Quão bem você acredita que sua organização apoia e capacita os colaboradores na gestão de stakeholders?Escala de opiniãoComunidade
14Avalie seu nível de conhecimento e experiência em relação à gestão de stakeholders.Múltipla escolhaSujeito
15Quão importante você acredita que seja desenvolver e melhorar continuamente suas habilidades de gestão de stakeholders?Escala de opiniãoSujeito
16Quão satisfeita você está com o treinamento e desenvolvimento disponíveis em sua organização para aprimorar suas habilidades de gestão de stakeholders?Escala de opiniãoComunidade
17Quais dos seguintes métodos você considera mais eficazes para melhorar suas habilidades de gestão de stakeholders?Múltipla escolhaInstrumento
18Quão frequentemente você utiliza habilidades de gestão de stakeholders em seu trabalho atual?Escala de opiniãoSujeito
19Quão importante você acredita que é a gestão de stakeholders para o sucesso do seu trabalho e da organização em geral?Escala de opiniãoObjeto
20Qual a prioridade que a gestão de stakeholders tem em seu planejamento de desenvolvimento pessoal?Escala de opiniãoSujeito
21Quão claras e compreensíveis são as regras e políticas relacionadas à gestão de stakeholders em sua organização?Escala de opiniãoRegras
22Quais dos seguintes aspectos das regras e políticas de sua organização você acredita que precisam ser aprimorados para facilitar a gestão de stakeholders?Múltipla escolhaRegras
23Quão consistente é a aplicação das regras e políticas relacionadas à gestão de stakeholders em sua organização?Escala de opiniãoRegras
24Quão eficaz você considera a divisão de atividades e responsabilidades relacionadas à gestão de stakeholders em sua equipe ou organização?Escala de opiniãoDivisão de Trabalho
25Quais dos seguintes aspectos da divisão de trabalho e responsabilidades você acredita que precisam ser aprimorados para melhorar a gestão de stakeholders em sua equipe ou organização?Múltipla escolhaDivisão de Trabalho
26Quão satisfeita você está com o nível de autonomia e autoridade que você tem em relação à gestão de stakeholders em sua função atual?Escala de opiniãoDivisão do trabalho
37Com base em sua experiência, quão positivo você considera o impacto das habilidades e ações de gestão de stakeholders nos resultados dos projetos ou iniciativas em que trabalhou?Escala de opiniãoResultado
38Quais dos seguintes resultados você observou como consequência direta de uma gestão eficaz de stakeholders em sua organização ou em projetos específicos?Múltipla escolhaResultado

Quadro 8

O potencial de captura dos dados não pode transformar a autoavaliação em um questionário sem adesão. O objetivo do programa nas primeiras etapas: a) kick-off, b) autoavaliação, e c) talk interativa é manter alto nível de engajamento e participação.

6.1.2.4.       Engajamento é tudo

É importante reconhecer que no processo de desenvolvimento de pessoas adultas, não podemos assumir total responsabilidade por seu desenvolvimento, mas podemos auxiliá-las em sua jornada individual (KNOWLES; HOLTON III; SWANSON, 2005). Com base nessa compreensão, foi considerado crucial fornecer aos participantes uma resposta rápida em relação aos resultados de sua autoavaliação, estabelecendo assim uma relação de confiança e garantindo que seu investimento de tempo seja recompensado.

Para atender a esse objetivo, foi desenvolvido um sistema automatizado que processa o questionário, gera relatórios personalizados e os envia para o e-mail fornecido pelo participante. Esses relatórios foram referenciados em diferentes momentos, tanto pela equipe do projeto quanto pelos próprios participantes. Aqueles que não receberam seus relatórios entraram em contato conosco para solicitá-los, e prontamente atendemos a essas solicitações.

No total, tivemos 23 respondentes, sendo que 2 deles optaram por não fornecer seu endereço de e-mail ao responder ao questionário. A adoção de um relatório individualizado automatizado e de envio imediato são para que as participantes tenham acesso fácil e descomplicado aos seus dados, e ao mesmo tempo recebam inputs, provocações e um espaço de conexão ágil. Acredito que essa abordagem ágil e responsiva tenha contribuído para estabelecer um ambiente de confiança e valorização mútua entre o pesquisador intervencionista e do projeto e os participantes. Fato que se confirmou nos feedbacks, momentos de troca ao vivo e avaliação formal do programa.

Uma imagem contendo Mapa

Descrição gerada automaticamente
Interface gráfica do usuário, Texto, Site

Descrição gerada automaticamente
Gráfico, Gráfico de radar

Descrição gerada automaticamente
Gráfico, Diagrama, Esquemático, Gráfico de radar

Descrição gerada automaticamente
Interface gráfica do usuário

Descrição gerada automaticamente
Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente
Interface gráfica do usuário, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente
Interface gráfica do usuário, Texto, Site

Descrição gerada automaticamente
Interface gráfica do usuário, Texto

Descrição gerada automaticamente
Uma imagem contendo Linha do tempo

Descrição gerada automaticamente

Figura 27 – Exemplo relatório individual

A figura 10 é um exemplo das 10 páginas que compõem o relatório individual utilizado na Tango. A premissa de limpeza dos slides, com design que fosse elegante e convidativo para a leitura. Em especial, dando destaque para imagens que podem ser compreendidas rapidamente, apoiadas por um roteiro de perguntas norteadoras, para o segundo momento em que a pessoa participante resolve aprofundar no conteúdo apresentado.

Alguns cuidados são tomados no relatório, como referenciar ao nome da pessoa participante no texto. Ainda que seja um recurso tecnológico simples, os processos de personalização ajudam a constituir esse sentimento de proximidade. Os dados foram agrupados e processados no processo de automação para facilitar a compreensão da pessoa participante, e ao mesmo tempo para que ela possa refletir sobre os grandes grupos de conteúdo a cada momento.

O relatório cumpre uma série de funções para que o programa seja bem-sucedido:

  1. introduz o tema que será trabalhado, possibilitando a pessoa participante chegue no dia da talk interativa sabendo do que se trata, e o que precisará fazer durante o encontro;
  2. centraliza documentação, e informações do programa e do processo de desenvolvimento, através do relatório individual a participante encontra datas, contexto, conteúdo básico, informações adicionais desejadas pela organização, expectativas para o programa e atitude esperada dela como participante;
  3. inicia o processo de reflexão estruturada, um processo central para o programa, a reflexão sobre o conteúdo a ser trabalhado, mas também a reflexão sobre os comportamentos individuais, os traços da cultura e os padrões do Sistema de Atividade. Algumas características são destacadas desse processo:
    1. a pessoa respondente tende a se avaliar de forma mais positiva do que as outras pessoas a avaliariam, e tende a avaliar as outras pessoas de forma mais rigorosa que elas se avaliariam;
    1. a dissociação cognitiva evidenciada é usada para mexer nas autopercepções e no objeto de análise adotado. Essas informações são apresentadas na Talk Interativa de forma transparente e direta, chamando as participantes para refletir sobre os dados e sobre os padrões compartilhados de comportamentos e modelos mentais do grupo;
    1. em suma, usamos as evidências objetivas das avaliações[70], assim como as contradições possíveis de serem destacadas, como no item b, para evidenciar a necessidade de um esforço coletivo na operacionalização do programa.
  4. o relatório faz uso dos resultados da autoavaliação como matéria-prima para propor um roteiro de perguntas que estimulam a pessoa participante a refletir de uma forma estruturada sobre suas respostas.
    1. O caráter situado do conhecimento (ENGESTRÖM, 2001) é reforçado, construindo em cima das respostas dadas, e provocando para que mais conexões entre os dados possam ser feitas.
    1. Poucas participantes irão refletir sobre todas as perguntas, novamente esse é um posicionamento que se alinha com a proposta desse programa, mais do que forçar as pessoas a passar por um processo queremos convidá-las a andar pelo trajeto e entender, quem explorou, como foi, quem não explorou, por que não (GOLLER; BILLET, 2014).
  5. no relatório incluímos um convite para que as pessoas participantes compartilhassem suas histórias, reflexões, comentários e/ou percepções individuais de forma anônima através de áudio (infelizmente não tivemos nenhum compartilhamento).
    1. a proposta alinha-se com os aspectos Histórico-Culturais da Teoria da Atividade, de entendimento e valorização das histórias das partes envolvidas. Coletou-se informações em diferentes momentos da pesquisa, e gostaríamos de aqui também testar um modelo de capturar essas histórias de forma assíncrona.
    1. em um momento de feedback informal me foi dito “achei o convite muito estranho, não saberia muito bem o que compartilhar. Não faz parte do nosso dia a dia esse tipo de interação. “. Reforçando a importância do fator humano no processo de conexão entre as partes, e possibilidade de entender, conectar e valorizar os aspectos da história e da cultura situados no grupo[71][72].
  6. no relatório damos o destaque para o papel ativo no processo de aprendizagem esperado das participantes:
    1. no caso da Tango, esse ponto passou como algo já conhecido e esperado pelas participantes, no entanto em organizações com cultura de aprendizagem menos autônoma, a postura e atitude das pessoas participantes deve ser um ponto reforçado durante todo o programa;
    1. usamos o relatório para explicar o conceito de “on the job learning”, onde evidenciamos que não haverá atividades extras, o convite e o desafio é fazer uso da ferramenta apresentada no dia a dia do trabalho.
  7. por último apresentamos as datas e o cronograma do programa para a participante conferir se está agendada para tal.

6.1.2.5.      Macro visão do processo de autoavaliação:

Abaixo segue uma descrição do processo tecnológico de operacionalização da autoavaliação e das respostas individuais produzidas:

  1. O questionário é produzido em formato de texto, importado para a plataforma Typeform onde é configurado e tratado para que possa ser respondido.
  2.  O questionário é validado pela equipe de projeto, e editado se necessário.
  3. É feita a automação do questionário (as automações são feitas pela plataforma zapier),
    1. linkando-o ao google sheets, onde os dados serão processados por meio de fórmulas gerando os gráficos e as interpretações de grupos de respostas.
    1.  os dados produzidos são exportados para o google slides, onde são aplicados em um modelo pronto para receber as informações.
    1.  o relatório é exportado em um formato pdf, anexado em um e-mail e enviado da caixa de e-mail do autor para o participante.

{{ COMPLEMENTO SOBRE A IMPORTANCIA DA AUTOMAÇÃO, INTERAÇÃO COM A PESSOA RESPONDENTE COMO APONTADO POR LITERATURA}}

6.1.2.6.      A Talk interativa

A talk interativa tem o objetivo de:  a) dar contexto, b) entregar conteúdo, e c) instrumentalizar a participante a colocar em prática a ferramenta apresentada no seu dia a dia.

Porém o principal desafio está em ser capaz de convencer a participante a adotar o processo de aprendizagem pela prática, e colocar a ferramenta em prática.

Se olharmos para esse processo com o olhar da CHAT, podemos dizer que é um sistema composto de múltiplos sistemas de atividade com um objeto compartilhado.

Sistema 1:

  1. Sujeito: autor
  2. Objeto: Aplicação do modelo
  3. Artefato: muitos (comunicação, construção de conhecimento, captura de dados, processamento de dados, produção de conteúdo: questionário, relatório, apresentação, etc;  )
  4. Regras: cultura da organização,
  5. Comunidade: colegas pesquisadores, equipe de projeto,
  6. Divisão do trabalho: operação do processo, validação do conteúdo, aprovação do método,

Sistema 2:

  1. Sujeito: Área de L&D e Liderança do time
  2. Objeto: Busca de metodologias de desenvolvimento que atendam a necessidade dos times e pessoas da organização
  3. Artefato: documentos internos, pesquisas, referências externas, demandas dos times,
  4. Regras: processos, sistemas e normas da organização
  5. Comunidade: pares, outras lideranças da organização
  6. Divisão do trabalho: acompanhamento e validação do material, mobilização do time de participantes, comunicação interna e venda da ideia do projeto para as lideranças diretas, coleta de dados e avaliação do resultado

Sistema 3:

  1. Sujeito: Pessoa Participante / Time
  2. Objeto: desenvolvimento de competências e habilidades técnicas e não técnicas alinhadas com seu plano de desenvolvimento e objetivos de carreira
  3. Artefato: PDI, ferramentas tecnológicas de apoio, (modelo mental referente ao seu processo de aprendizagem e necessidades de desenvolvimento)[73]
  4. Regras: o programa é indicado, mas é por adesão, a pessoa não é obrigada a participar
  5. Comunidade: pares, comunidade da organização, referências externas
  6. Divisão do trabalho: participação no programa, avaliação do programa,

Abaixo sugerimos uma figura representativa dessa relação

Tela de computador com luz azul

Descrição gerada automaticamente com confiança baixa

Fonte: autor

É importante entender que, em grande parte o objetivo de todo processo anterior a talk é de capturar o máximo de informações[74] sobre esse Sistema de Atividade que está sendo constituído, o histórico anterior e as percepções das partes para que se aumente a chance de sucesso da intervenção.

No entanto, as pessoas envolvidas geralmente não possuem informações precisas sobre os sistemas de atividade. Em vez de dados, elas têm percepções altamente subjetivas. Essas percepções são influenciadas pelo fato de ser um objeto compartilhado, o que significa que as pessoas do Treinamento e Desenvolvimento também estão diretamente envolvidas. É comum que as informações sejam distorcidas, minimizadas, esquecidas ou que não se tenha uma compreensão clara sobre o assunto, tornando-as meras espectadoras de um processo aparentemente não gerenciável, em vez de atuarem como agentes ativos.

Por isso que toda essa estratégia é montada, e o framework segue as 4 premissas:  1) Competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio. 2) Dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento. 3) Intervenções curtas e práticas mantem engajamento. 4) Reflexão estruturada pavimenta espaço para Aprendizagem Expansiva.

Além disso, é essencial reconhecer a dificuldade de estabelecer uma cultura de aprendizagem autônoma, na qual os participantes sejam protagonistas do processo. Por essa razão, o modelo proposto é projetado para ser conciso, fornecendo informações e dados relevantes a todas as partes envolvidas.

O modelo tem o objetivo de, não simplesmente resolver o sistema de atividade, mas sim criar, de maneira controlada e coordenada, um desequilíbrio no sistema por meio da introdução de um artefato e identificar as contradições do sistema que estavam sendo negligenciadas. Essa premissa se baseia na ideia de chamar a atenção para processos que se tornaram rotineiros e automatizados, transformando-os em artefatos dentro do contexto da CHAT, e que são executados sem uma presença significativa (ENGESTRÖM, 2001; WEICK; SUTCLIFFE, 2006).

No caso da Tango o Sistema de Atividade em questão concentra-se em melhorar a capacidade das pessoas em atuar de forma consultiva. Por meio do desenvolvimento da competência de gestão de stakeholders.

Ao mesmo tempo que isso é feito, as pessoas são desenvolvidas em uma ou mais competências que são estratégicas para a organização e ajudarão as pessoas, o time e a organização a se aproximar de seus objetivos organizacionais.

6.1.2.7.      A premissa da transparência

Desde o primeiro momento é evidenciado para a organização o objetivo da intervenção, e ganha-se força entendendo que será feito um processo dois em um.

A proposta se alinha aos valores ágeis, de gestão baseada em dados, e ciclos curtos de implementação (Wise & Rouben, 2015). Onde pode-se ir ajustando a rota do processo de desenvolvimento, com outras intervenções nos mesmos moldes ou trabalhar as questões (contradições) mapeadas com outros recursos de forma mais assertiva (Hoda, 2011).

Por exemplo, quando este processo foi aplicado, e os dados foram coletados, identificou-se duas questões importantes, presentes nas figuras XXXX abaixo. Este é um grupo diverso, que mescla pessoas com domínio técnico da gestão de stakeholders e pessoas sem esse domínio, o que justifica a aplicação do programa. Porém os dados deixam evidente uma demanda dos times por uma maior clareza dos papeis, responsabilidades e resultados esperados com relação à este tema.

Ou seja, um programa de desenvolvimento técnico ferramental aplicado irá tratar parte da questão, a menos que as lideranças atuem de forma a esclarecer qual as questões apontadas, não se alcançará os objetivos, e possivelmente teremos em pouco tempo um time frustrado por não saber onde e como aplicar o conhecimento adquirido.

O questionário inicial nos fornece uma rica variedade de informações que são essenciais para a nossa interação efetiva com o público-alvo. O modelo de Laboratório de Mudança, conforme proposto por Engeström (2001), emprega instrumentos etnográficos e de vídeo para construir um caso robusto e comunicá-lo de maneira convincente aos participantes.

Em nosso método, adotamos uma abordagem que combina o mapeamento do sistema de atividade e a análise de comportamentos observáveis. Isso nos permite identificar e trazer à tona as contradições (Engeström, 2001) que, embora frequentemente já estejam presentes no grupo, tendem a estar difusas dentro das necessidades específicas dos indivíduos a partir de suas experiências, necessidades e urgências. Com essa estratégia, somos capazes de organizar essas contradições dispersas e torná-las visíveis, facilitando assim seu mapeamento e avançando no processo de aprendizado e desenvolvimento.

Uma imagem contendo Interface gráfica do usuário

Descrição gerada automaticamente

Podemos com base nos dados explicar a diversidade do grupo, com relação ao grau de maturidade do conteúdo que será trabalhado. Justificando para os avançados o porque da abordagem intermediária, e para os menos experientes o porque de não trabalharmos apenas o básico.

Gráfico

Descrição gerada automaticamente com confiança média

Mais que isso, os dados coletados apontam que falta ao grupo clareza de papéis e reponsabilidades não só apenas à aplicação ou exercício da competência gestão de stakeholders, mas também com relação a capacidade “guarda-chuva” de consultoria.

Aqui nos deparamos com uma situação que precisa ser bem conduzida com a organização onde o modelo é aplicado, e por isso os dados precisam ser muito bem trabalhados e organizados de forma a mostrar que nos aprofundamos no problema inicial, e que agora somos capazes de identificar padrões e contradições até então não mapeados para este grupo.

            Este é outro “detalhe” importante de destacar, a teoria da atividade em conjunto com a abordagem cartográfica nos permite mergulhar em uma realidade organizacional, e sermos mais precisos e gerar valor para as partes envolvidas, porque nos apoiamos ao conhecimento situado (Engestrom, 2001, Kastrup & Passos, 2013) .

            Esses dados podem ser validos para outros times, pois há uma cultura compartilhada na organização, e o comportamento das lideranças tende a seguir um mesmo padrão. Porém, não podemos afirmar que seja verdade. Portanto, se o objetivo for trabalhar o papel das pessoas colaboradoras em sua capacidade consultiva, indica-se que essa hipótese seja confirmada antes de tê-la como verdade.

É também importante tratar os dados e a devolutiva com atenção, pois a demanda inicial apontava a necessidade de desenvolver a capacidade consultiva, e para isso deveríamos trabalhar a competência de gestão de stakeholders. Se o entendimento do estudo aponta que o grupo precisa desenvolver a capacidade consultiva de forma rasa, a pessoa da organização responsável pelo projeto pode não ver valor nos dados encontrados.

6.1.2.8.      ### A Palestra Interativa

No dia 05/04 foi realizada a palestra interativa. Com um único objetivo, convencer o maior número de pessoas a colocar a ferramenta em prática.

Por que é tão importante a prática para o modelo proposto?

Quando falamos de aprendizagem expansiva, estamos tratando concomitantemente de dois processos.

Um deles é a evolução do sistema de atividade, que pode ser representado por essa imagem, um círculo com 7 passos, que como diz Engestrom (2020 – video), nunca é um processo sem percalços, para fins didáticos ele é representado neste formato limpo e direto.

O segundo processo é o processo de aprendizagem e desenvolvimento do indivíduo.

6.1.2.9.      ### Conectando com a teoria

–> Conectando com a teoria

A CHAT considera o aprendizado como um processo que ocorre apenas no nível individual, mas sim um fenômeno que se dá no Sistema de Atividade.

Entende-se que o aprendizado individual se dá quando um individuo participa de uma atividade, e por meio dessa participação, adquire novas habilidades e conhecimentos. A mediação desse processo de aprendizagem se dá por artefatos culturais, ferramentas, processos e linguagem, sendo também influenciada pelo contexto social e cultural em que a atividade acontece (Engestrom, 2014).

Já no nível coletivo, o aprendizado é considerado um processo de co-construção na CHAT. Onde os participantes de um sistema de atividade atuam juntos para realizar uma tarefa comum. Esse processo envolve a construção e negociação de significados/conceitos, a coordenação das ações e a resolução de contradições. Que quando ocorrem levam a uma mudança tanto no nível individual (aprendizado) quanto no nível coletivo (desenvolvimento) (Engestrom, 2014).

A aprendizagem expansiva, como já abordado antes na seção da lente teórica é um conceito central na CHAT, é um tipo de aprendizagem que leva à transformação do sistema de atividade como um todo. A ideia é que os indivíduos, ao participarem de uma atividade, não apenas aprendem dentro dos limites dessa atividade, mas também podem questionar e reconfigurar o próprio sistema de atividade.

Para isso é necessário ser capaz de identificar e resolver as contradições dentro do sistema, a criação de novas ferramentas e práticas (artefatos), e a redefinição dos objetivos da atividade. Por isso, a aprendizagem expansiva é entendida como um processo de inovação e mudança coletiva, que leva ao desenvolvimento tanto do indivíduo quanto do time ou organização (comunidade). <—

—> Diferenças fundamentais de processos de desenvolvimento focados apenas no desenvolvimento de competências e habilidades e de abordagens sistêmicas.

Em uma visão simplificada, é possível associar a abordagem de desenvolvimento centrada em competências e habilidades ao modelo econômico mecanicista, ou de produção em massa conforme FIGURA XXXXX onde o foco recai sobre capacitar pessoas para aplicar conhecimentos e habilidades em processos previamente desenhados por um grupo restrito de gestores ou engenheiros.

Esta ainda é uma abordagem adotada em muitos processos de desenvolvimento atualmente. No entanto, há uma versão mais evoluída dessa abordagem que pode ser descrita como vivências ou estudos de caso. Neste contexto, reconhece-se que a aquisição de conhecimento puro não é mais suficiente. Assim, processos que auxiliam os participantes a construir o conhecimento e aprender como aplicá-lo são utilizados, preparando os líderes das organizações para voltar à sua realidade e promover a transformação necessária.

Esses estudos de caso são geralmente baseados em ideais, permeados por crenças e construções que podem não se alinhar completamente com a realidade da organização onde a liderança irá aplicá-los. Esta é uma crítica à abordagens que não consideram o conhecimento situado como relevante ou fundamental para a efetivação das transformações esperadas.

Tipo histórico de trabalhoMétodo de desenvolvimento de pessoasMotivo da abordagemTomada de decisãoModelo de DesenvolvimentoExemplo
Craft Work🎓 Aprendizado situado e aprendizagem em prática como aprendiz e prática individual subsequenteA necessidade de produzir produtos artesanais tradicionais ou únicos e novos, com uma forte dependência do conhecimento e das habilidades do indivíduo.Individual ou pequenos grupos🧑‍🎓 Modelo de aprendizado mestre-aprendizOficinas de artesanato
Mass Production📚 Instrução de trabalho formal e treinamento para realizar tarefas específicas (Taylor, 1911/1998)A necessidade de produzir em grande escala e padronizada, com um alto grau de especialização e divisão funcional do trabalho.Hierárquica e centralizada🏭 Modelo de treinamento baseado em instruções de trabalhoFábricas de linha de montagem do início do século XX
Process Enhancement (Mass Production 2.0)🔄 Aprimoramento contínuo do processo e aprendizagem colaborativa para eliminar perturbações e desperdíciosA necessidade de lidar com a variação na qualidade dos produtos devido ao erro humano e mudanças qualitativas na demanda.Equipe focada no processo🔄 Modelo de aprendizado baseado em melhoria contínua do processoFábrica da Toyota
Mass Customization💻 Treinamento no uso de tecnologia da informação e comunicação (TIC) e no entendimento dos módulos do produtoA necessidade de atender às necessidades específicas dos clientes, produzindo uma variedade de versões de um produto.Compartilhada entre produção e cliente🖥️ Modelo de aprendizado baseado em TIC e modularização de produtosEmpresas de software personalizado
Co-Configuration Work🤝 Aprendizado e desenvolvimento contínuos, com foco na análise das necessidades dos clientes e na negociação do conteúdo do produto ou serviçoA necessidade de lidar com mudanças tanto nas necessidades do cliente quanto no conhecimento e capacidades do produtor.Compartilhada entre produtor, cliente e produto🌟 Modelo de aprendizado e desenvolvimento contínuos, centrado no clienteEmpresas de tecnologia modernas, como empresas de SaaS

Fonte: inspirado em Virkunnen e Newnham (2013), complementado pelo autor.

A abordagem de desenvolvimento individual, que se concentra na melhoria das habilidades, competências e atitudes do indivíduo, assume que, ao capacitar as pessoas, elas serão proativas na modificação de sistemas e processos que as impedem de mudar seu comportamento e da organização evoluir.

No entanto, essa visão é criticada por aqueles que adotam uma perspectiva mais sistêmica, argumentando que a ênfase deve ser na mudança dos sistemas e processos, e não nas pessoas. Esses autores sustentam que não podemos mudar as pessoas diretamente, mas que as pessoas se adaptam aos sistemas e processos existentes como uma estratégia de “sobrevivência” (Hamel, 2020).

Esta visão torna-se ainda mais relevante em uma economia dinâmica e em rápida mudança, onde as tecnologias estão continuamente transformando o trabalho e os objetos de atividade das organizações. Com essa realidade, a descentralização dos processos de gestão se torna necessária, permitindo que equipes autônomas criem soluções adequadas para a realidade encontrada. Isso favorece um modelo de rede em vez de um modelo hierárquico tradicional (Dignan, 2019).

<<A lógica aqui desenvolvida,  se aplica principalmente a organizações de serviços, incluindo aquelas com enfoque tecnológico que precisam criar suas próprias soluções para atender às demandas do mercado em que atuam. Para organizações focadas na produção em massa, manufaturas simples, indústrias pesadas e outras atividades que se baseiam em processos claramente definidos, e que buscam produtividade através da melhoria contínua de seus processos, o raciocínio aqui apresentado será mais relevante para suas áreas de apoio e pesquisa e desenvolvimento (P&D).>>

Nesse contexto, a capacitação das equipes não deve se limitar às competências identificadas como necessárias, mas também deve incluir a capacidade de mapear contradições, entender os sistemas de atividade e evoluir seus processos de maneira autônoma através da aprendizagem expansiva.

Como Heifetz aponta em sua abordagem de problemas adaptativos, que são semelhantes aos problemas complexos no modelo Cynefin de David Snowden, o desafio é que esses problemas não podem ser “resolvidos” no sentido tradicional. Eles podem apenas ser estabilizados, uma vez que a relação de causa e efeito não é direta e as variáveis que influenciam o problema estão em constante mudança (Heifetz & Grashow, 2009, Snowden, 2005)

Portanto, ao lidar com um problema adaptativo, o principal desafio é comunicar, influenciar e envolver a equipe na compreensão de que esse é um problema atual, relevante e que precisa ser abordado.

Nesse sentido, a capacidade de mapear contradições, baseadas em uma necessidade do negócio e em uma experiência prática e situada, pode servir para coletar dados e alertar o grupo envolvido sobre o assunto a ser abordado. Isso pode abrir espaço para a evolução do sistema de atividade e, consequentemente, para a aprendizagem expansiva (Engestrom 2001, Heifetz & Grashow, 2009).

6.1.2.10.   ### Palestra interativa – continuidade

A partir destes pontos destacados e da conceitualização teórica retomada, o momento de palestra interativa é pensada para durar 90 minutos e dividido em  4 momentos:

1. 10min – Contextualização – Porque o assunto é relevante para vocês e como se conecta com a necessidade do negócio;

2. 20min – Conceitos – Qual a teoria, modelo e suporte teórico à abordagem feita;

3. 30min – Ferramenta – Apresentação e aplicação da ferramenta em conjunto com as pessoas participantes, em plataforma virtual ou através da disponibilização de arquivo pptx, ou pdf para que cada um opere de sua máquina.

4. 30min – Perguntas e Respostas – O foco deste momento é responder às perguntas que estão na cabeça das participantes e podem fazer com que elas não coloquem a ferramenta em prática. Elas derivam da seguinte pergunta: De 0 a 10 quanto você está pronta para colocar a ferramenta em prática? Quais os obstáculos, dúvidas ou inseguranças presentes?

Estratégia de trabalho: poucos slides e muita prática. Após a palestra interativa fica constituído um canal de comunicação com o grupo, onde a depender do caso pode-se compartilhar materiais de aprofundamento teórico e prático, ainda que não seja recomendado.

Nesta abordagem a proposta é inverter o ciclo de aprendizagem, entendendo que os conteúdos trabalhados já fazem parte do dia a dia, colocar as pessoas participantes em papel de agentes ativos de seu processo a aprendizagem e atender as demandas de conteúdo conforme apareçam.

Cada vez menos essa deve ser uma preocupação, primeiro devido ao fácil acesso à informação com as facilidades de busca, e atualmente com a popularização das inteligências artificiais, o desafio é cada vez menos entregar conteúdo, e sim ser capazes de articular indivíduos e grupos a atuarem de forma coletiva e coordenada em prol de objetivos comuns.

Na última parte da Palestra Interativa, os participantes são relembrados da importância de colocar a ferramenta em prática, abre-se um canal de comunicação com a pessoa facilitadora, neste caso o autor, onde me coloquei a disposição para tirar dúvidas e e possíveis questões.

Sobre a aplicação:

Boa parte dos participantes de camera desligada – caracteristica da organização apoiada no entendimento de respeito as individualidades e necessidades específicas.

            Em parte é um desafio para a pessoa facilitadora que perde o contato visual e as expressoes faciais, recurso importante para processos de ensino aprendizage, presenciais ou virtuais.

Houve pouca interação das pessoas participantes, puxadas por um pequeno grupo, aproximadamente 5 pessoas das 23 que passaram pelo encontro, nem todas ficaram o tempo todo.

            Caracteritica comum em processso de ensino aprendizagem, no meio virtual também

6.1.2.11.   ### Mentoria

O encontro de mentoria … la lal al

6.1.2.12.   ### Interações assíncronas

Interações através de Google Chat. Com pouca adesão e uso dos participantes.

Abaixo, resumi o processo de pesquisa de campo, fornecendo uma visão geral dos principais movimentos e a duração de cada etapa.

6.2. Overview sobre o campo:

FasePeríodoAtividades
Fase de Planejamento e Negociação04 de Abril, 2022 – 03 de Maio, 2022– Contato inicial e apresentação do projeto – Negociações e ajustes com o Product Principal e o Project Manager – Desafios na obtenção de retorno e permissão para acompanhar um time
Eventos Internos e Sociais17 de Maio, 2022 – 19 de Maio, 2022– A organização e sua posição em questões sociais – Discussões sobre liderança, maternidade e diversidade
Início do Acompanhamento de Equipes27 de Maio, 2022 – 15 de Junho, 2022– Expectativa e confirmação do acompanhamento dos times – Entrevista com os desenvolvedores – Primeiros passos no acompanhamento das reuniões do Time1
Expansão das Conexões Internas01 de Julho, 2022 – 31 de Agosto, 2022– Ampliação do entendimento dos processos internos – Interação com novas figuras-chave – Esforço para estabelecer conexão com a gestora da “Praia”
Consolidação do Acompanhamento de Projetos12 de Setembro, 2022 – 28 de Novembro, 2022– Apresentação do projeto a outras lideranças – Esforços para reforçar conexões – Acompanhamento de projetos com novos times
Entrevistas e Conexões Globais11 de Novembro, 2022 – 6 de Janeiro, 2023– Entrevistas com Global Procurement – Estabelecimento de conexões com novos entrantes – Colaboração contínua com o Global Software Procurement
Apresentação e Aplicação do Framework7 de Março, 2023 – 7 de Março, 2023– Conexão com Learning and Development (L&D) – Proposta de aplicação do framework – Apresentação do projeto à Head of L&D Brazil and Latam
Execução e Feedback do Projeto17 de Março, 2023 – 2 de Maio, 2023– Implementação do projeto – Coleta de feedback e adaptação do modelo – Kick-off e condução do programa – Coleta de feedback e avaliação do impacto

Durante todo o tempo, tive acesso a diversos documentos e materiais internos que descrevem o processo de desenvolvimento de pessoas na empresa.

7.    RESULTADOS

Analise questionario de impacto

#Nível da ContradiçãoDescrição e ComentáriosImpactoDados de Suporte
1Contradição primáriaDesafio com indivíduos se sentindo despreparados após o treinamento.Médio“Depois do treinamento, você se sente mais preparada para ajudar os clientes durante o processo de criação e entrega do software/serviço contratado?”
2Contradição secundáriaDesafios de gerenciamento de stakeholders e tempo devido a demandas de implementação das ferramentas e restrições do projeto.Alto“Você aplicou a ferramenta no seu dia a dia?” “Principais dificuldades de colocar em prática as ferramentas”
3Contradição secundáriaManter coordenação e alinhamento dentro da equipe, com conflito entre as tarefas e os indivíduos da equipe.Médio“Quão satisfeita você está com o nível de autonomia e autoridade que você tem em relação à gestão de stakeholders em sua função atual?”
4Contradição secundáriaFalta de recursos e apoio para implementar mudanças, considerando restrições de tempo e esforço.Alto“Quão eficaz você considera a divisão de atividades e responsabilidades relacionadas à gestão de stakeholders em sua equipe ou organização?”
5Contradição primáriaDificuldade em equilibrar trabalho do projeto com outras responsabilidades, relacionando-se com demandas do projeto e responsabilidades do trabalho.Médio“Quais dos seguintes aspectos da divisão de atividades e responsabilidades você acredita que precisam ser aprimorados para melhorar a gestão de stakeholders em sua equipe ou organização?”
6Contradição secundáriaDesconexão entre a construção do mapa de stakeholders e sua aplicação no dia a dia, envolvendo ferramentas e indivíduos.Baixo“Você construiu seu mapa de stakeholders?”
8Contradição secundáriaDúvidas sobre eficácia da ferramenta e dificuldade em influenciar conversas, envolvendo contradição entre indivíduos e a comunidade.BaixoContradição entre “Sujeito” e “Comunidade”
9Contradição secundáriaNecessidade de melhorar a comunicação interna, abordando a contradição entre os indivíduos e a comunidade.MédioContradição entre “Sujeito”, “Divisão do Trabalho” e “Comunidade”
10Contradição quaternáriaDesafios em garantir que todos os membros da equipe entendam e estejam alinhados com os objetivos do projeto e expectativas do seu papelMédio“Qual é a sua avaliação do programa em relação ao aprendizado e desenvolvimento pessoal?”
11Contradição quaternáriaDiferenças na interpretação e compreensão das tarefas e metas do projeto geram contradições na equipe.Médio“Com base em sua experiência, quão positivo você considera o impacto das habilidades e ações de gestão de stakeholders nos resultados dos projetos ou iniciativas em que trabalhou?”
12Contradição terciáriaDiscordâncias sobre o uso de certas ferramentas ou metodologiasNão informadoNão há dados de suporte fornecidos
13Contradição terciáriaAlgumas pessoas viram um impacto positivo no engajamento e na cooperação, enquanto outras não viram valor na ferramenta ou acham que ela teria mais valor no início de um projetoNão informadoNão há dados de suporte fornecidos

8.    RESULTADOS

1.2.                

.

9.    CONTRIBUIÇÃO

Espero que essa tese possa avançar:

  1. Na construção empírico-teórica da aplicação da CHAT fazendo uso da Cartografia como percurso metodológico nos estudos organizacionais;
  2. No entendimento de como as organizações híbridas equilibram seus objetivos financeiros de curto prazo com o desenvolvimento de times e pessoas;
  3. Na construção de um framework teórico-analítico que facilite a construção e entendimento dos sistemas de atividade das práticas organizacionais relacionadas ao desenvolvimento de times e pessoas;

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11.  Apêndice 1:

[APRENDIZAGEM PELA PRÁTICA – Teoria da Atividade Aplicada para não Acadêmicos]

Introdução e Convite

Você já parou para pensar nas atividades que você realiza em seu dia a dia no trabalho, especialmente aquelas que parecem não estar funcionando tão bem quanto deveriam? Todos nós temos tarefas que nos desgastam, não funcionam como gostaríamos ou apresentam problemas recorrentes. Convidamos você a explorar uma dessas tarefas por meio da lente da Teoria da Atividade. Vamos abordar essa atividade passo a passo, de uma maneira que vai além do simples “quem”, “o que” e “por que”, para considerar aspectos mais profundos como as ferramentas e regras envolvidas, o contexto cultural, e até mesmo a história dessa atividade. Pronto(a) para começar?

Parte 1: Sistema de Atividade Básico (Primeira Geração)

  1. Pense em si mesmo e no papel que desempenha em sua organização ou trabalho. Quem é você nesse contexto? (Sujeito)
  2. Agora, pense em uma tarefa que você faz regularmente e que tem apresentado desafios ou problemas. Qual é essa tarefa? (Objeto)
  3. Quais são os objetivos ou resultados que você espera alcançar com essa tarefa? (Resultado)
  4. Que ferramentas ou recursos você usa para realizar essa tarefa? Pode ser algo físico como um computador ou software, ou algo menos tangível como um conjunto de habilidades ou conhecimentos que você possui. (Artefato Mediador)
  5. Para compreender melhor essa atividade, é importante considerar o contexto em que ela ocorre. Como o ambiente de trabalho, as normas e valores da sua organização, e o ambiente social e cultural mais amplo influenciam a forma como você realiza essa tarefa? (Contexto Histórico-Cultural)

Parte 2: Aprofundando-se na Atividade (Segunda Geração)

Contexto

Vamos dar um passo atrás e entender o Sistema em que essa ação está presente, também conhecido como Sistema de Atividade. Dentro desse sistema, as coisas que você faz de forma automática são chamadas de operações. As tarefas que você realiza como parte de uma entrega maior são chamadas de ações. E a entrega maior é conhecida como Atividade. Por exemplo, você pode estar envolvida na Atividade “Fechamento Mensal”, que inclui várias ações, como “verificar o status do projeto em relação ao planejamento”. Durante essa ação, você realiza várias operações, como digitar informações na tabela de controle. Com essa estrutura em mente, vamos explorar mais profundamente sua tarefa.

  1. Pense na ação que você descreveu na Parte 1. Quando você dá um passo atrás e olha para a Atividade maior da qual essa ação faz parte, o que você vê? Que Atividade é essa? (Atividade)
  2. Por que você precisa realizar a ação descrita? Qual é o propósito coletivo ou objetivo comum da sua equipe ao realizar esta Atividade? (Motivo / Objeto)
  3. Qual é o resultado esperado da Atividade? Como vocês saberiam se alcançaram o objetivo? (Resultado)
  4. Quais são as ferramentas, processos, estruturas usadas para realizar esta Atividade? (Artefatos)
  5. Existem regras ou normas específicas que devem ser seguidas ao realizar esta Atividade? Quais são elas? (Regras)
  6. Quem são as pessoas envolvidas nesta Atividade, mesmo que indiretamente? Como suas funções se relacionam com a Atividade? (Comunidade)
  7. Como as tarefas e responsabilidades para essa Atividade são divididas entre os membros da equipe? (Divisão do Trabalho)
  8. Você pode identificar algum problema ou dificuldade na forma como esta Atividade é realizada atualmente? (Contradições)

Parte 3: Princípios da Teoria da Atividade

  1. Existem diferentes opiniões ou abordagens para a tarefa entre você e os outros envolvidos? Se sim, poderia nos dar alguns exemplos? (Multivocidade do Sistema de Atividade)
  2. Como essa tarefa ou atividade mudou ao longo do tempo? Ela foi influenciada por mudanças em sua vida, tecnologia, cultura ou sociedade? (Histórico do Sistema de Atividade)
  3. Considerando as dificuldades ou frustrações mencionadas anteriormente, que mudanças você acha que poderiam resolver esses problemas? Você poderia sugerir algumas soluções possíveis? (Resolução de Contradições)

Parte 4: Aprendizagem Expansiva

  1. Considerando as mudanças que você propôs, como você acha que poderia começar a implementá-las? Quais passos você poderia tomar?
  2. Como você poderia envolver outras pessoas nesse processo? Quem são as pessoas que você precisaria para apoiar e implementar essas mudanças?
  3. Como você acha que a aprendizagem expansiva poderia acontecer a partir deste processo?

Este questionário visa ajudar você a refletir profundamente sobre suas atividades, compreendê-las dentro de um contexto maior e, possivelmente, identificar maneiras de melhorar.


[1] Texto escrito 2 anos antes do fim desta tese, como reflexão e preparação do projeto de tese.

[2] Antes de avançarmos para o período deste estudo, farei contextualização histórica da trajetória deste estudo. Que não começou no início do doutorado, e não termina com a entrega deste documento.

[3] O quadrado verde da imagem representa o espaço no tempo em que a pesquisa deste trabalho ocorreu, oficialmente entre julho de 2018 e maio de 2023. O retângulo azul representa o processo diretamente anterior, e o amarelo as possibilidades futuras. Neste documento me permitirei transitar entre os blocos, sempre referenciando onde estamos para lhe situar.

[4] No site Lume da UFRGS, você pode ter acesso à dissertação: Aprendizagem baseada em projetos: uma Pesquisa Ação Participante no processo de ensino/aprendizagem de Sustentabilidade no curso de Administração de Empresas

[5] Isaac Newton, Galileu Galilei

[6] Charles Chaplin em “Tempos modernos”

[7] Descrita com profundidade no item 4 desta tese

[8] Sistematizado por pistas, que dão os requisitos para seu uso

[9] Team Academy é a tradução de Tiimiakatemia, em português seria algo como “Academia de Times”. Johannes adotou, talvez tenha criado, o conceito de empreendedorismo em time “Teampreneurship’ e o formatou nos moldes de uma graduação com 4 anos de duração onde os alunos não têm provas, nem aulas, nem professores. Aprendem pela prática com projetos reais. O veículo de aprendizado é um time que se mantém durante todos os 4 anos, e o modelo societário é o cooperativismo.

[10] O ousar da Team Academy, consiste em construir em cima de um ideal de empreendedorismo norte-americano, baseado no indivíduo fora da curva que muda o mundo(BRUYAT; JULIEN, 2001). Associar a capacidade de mudar o mundo a um grupo de pessoas, e desenvolvê-las para um futuro de colaboração em times multifuncionais.

[11] A atividade é a unidade de análise da Teoria da Atividade, ela é o elo que conecta indivíduos e o contexto social representado no Sistema da Atividade(ENGESTROM, 2014), que veremos em profundidade na Seção 3

[12] A dialética, como um método de argumentação ou um processo de pensamento, envolve a consideração de opostos e a busca por resoluções sintéticas. Na Teoria da Atividade, a dialética é usada para entender as contradições internas que surgem dentro de um sistema de atividade(STETSENKO, 2011).

[13] Uso uma série de termos, exemplos, para dar despertar o sentido de quantidade de novas coisas de que se falava para exemplificar essas mudanças, até que chatGPT foi lançado e talvez passe a ser o exemplo para simbolizar o impacto da tecnologia em nossas vidas.

[14] Academia se refere ao ambiente acadêmico e ao conjunto de atividades relacionadas ao ensino, pesquisa e aprendizado nessas instituições. É um termo amplo que engloba a educação superior e todas as disciplinas acadêmicas.

[15] Conceito será aprofundado durante a Tese (Engeström, 2014)

[16] A construção deste Sistema de Atividade tem apenas objetivos didáticos e não tem a pretensão de representar de forma fiel o Sistema de Atividade do fazer acadêmico.

[17] No exercício proposto analisamos o Sistema de atividade do fazer acadêmico, em especial sob a ótica da produção de conhecimento, entendida como resultado dos processos de pesquisa.

[18] Constituímos um SA simplificado de uma realidade muito mais complexa, com o intuito didático do processo. Fizemos o recorte dos momento histórico que estamos vivendo com o lançamento do ChatGPT e os impactos que está causando no mundo do trabalho, em especial nos “trabalhadores do conhecimento”(BERG, [s.d.]).

[19] Uma crença claramente influenciada pelos caminhos adotados neste trabalho.

[20] Financial Times mudou sua linha editorial no mês de agosto de 2019, apontando o fim do capitalismo como conhecemos e a necessidade de dar um reset no sistema vigente(FINANCIAL TIMES, 2019). A Forbes em agosto destacou a declaração de 200 CEO´s das maiores corporações dos EUA, por um desenvolvimento mais consciente(SANDLER, 2019).

[21] Neste dia 29 de julho atingimos o ponto de saturação do planeta, “já usamos mais recursos de terra e mar do que o planeta pode regenerar em um período de 12 meses“(WWF, 2019).

[22] Aprendizagem expansiva é um processo de se trabalhar e resolver contradições em uma atividade a ser transformada.(ENGESTROM, 2014, p. xxiii)

[23] Em seu modelo Laloux (2017) organiza em 7 os estágios de consciência, conforme a Figura 1, e propõe em seu o modelo o paradigma TEAL como sendo o paradigma evolutivo, onde os indivíduos e a organização adotam o entendimento de continua mudança e evolução dos indivíduos e realidade em que estão presentes.  O paradigma TEAL tem correspondência em outros autores que chamam de diferentes formas: “‘Integral’ de Gebser, ‘Integrado’ de Loevinger, ‘Construir-Atento’ de Cook-Greuter, ‘Interindividual’ de Kegan, ‘Estrategista’ e ‘Alquimista’ de Torbert, ‘NA’ de Graves, ‘Autorrealização’ de Maslow[…] entre outros; é geralmente referenciada como integral” (LALOUX, 2017, p. 43).

[24] Metodologias Ágeis foram constituídas a partir do movimento LEAN, método de produção utilizado nas indústrias, que também já adota a lógica de times no seu processo produtivo, ainda que mesclado com estruturas hierárquicas definidas, devido à natureza da atividade de uma linha de produção com processos repetitivos (LEMAY, 2019).

[25] Em suma está em dúvida a estrutura organizacional onde o conhecimento é adquirido externamente (consultoria, cursos etc.) e pode ser aplicado diretamente na organização. Os autores estão destacando a necessidade de que as organizações possam criar sua própria base de conhecimento, fazendo uso do conhecimento externo, porém traduzindo, modificando e aplicando em sua realidade.

Organizações de grande porte nos anos 90 e 2000 entenderam em parte esse clamor, porém apoiadas em suas estruturas organizacionais criaram centros/áreas de engenharia/inovação/tecnologia. Desconectadas do resto da organização, o pensar seguiu sendo clusterizado na organização.

Junto com o movimento descrito como quarta revolução industrial, em especial a automação de processos, exige que empresas que a priori não eram tecnológicas possam ter em seus quadros pessoas capazes de solucionar problemas, e sugerir melhorias de forma descentralizada. Já os movimentos organizacionais inspirados na tecnologia (em especial metodologias ágeis), vem trabalhando com a formação de times autônomos, normalmente organizados por produtos tendo a centralidade de suas ações nos clientes esperando uma altíssima velocidade de adaptação de processos e produtos (times autogerenciáveis).

[26] Aprendizagem Expansiva será apresentada em profundidade na seção:

[27] Vamos aprofundar o entendimento na seção 2

[28] Teoria da Atividade Histórico-Cultural será apresentada em profundidade na seção:

[29] A Cartografia com percurso metodológico será apresentada em profundidade na seção:

[30] A distinção no inglês fica mais evidente quando se contrapõe as organizações For-profit com as Nonprofit. Deixando claro o objetivo do lucro em sua descrição.

[31] www.gastromotiva.org. A Imaflora.org, estudar.org, insitutoelos.org são exemplos outros exemplos de ONG´s e OSCs que equilibram suas atividades ofertando serviços ou produtos  (“As 100 melhores ONGs do Brasil – ÉPOCA | Brasil”, 2017).

[32] Há um entendimento e discussão importantes de serem feitos sobre o tema (motivação, questões tributárias, papel do estado), porém não é objeto desta tese.

[33] A depender do objetivo dessa remontagem histórica podemos ir até o século 19 e identificar no surgimento das cooperativas esse embrião, porém utilizaremos nesta tese o ponto de partida de Haigh et al., (2015).

[34] “´O conselho era legalmente obrigado a vender para o licitante mais alto´, disse Jonathan Storper, advogado da Hanson Bridgett, o primeiro escritório de advocacia a obter a certificação B. Nem Ben Cohen nem Jerry Greenfield queriam vender a empresa, mas como ela era pública, eles não tinham escolha. Desde então, os dois cofundadores expressaram preocupação com o fato de a empresa ter se distanciado de sua missão original de responsabilidade social.”(LAWRENCE, 2009).

[35] Adotada em 31 estados;

[36] Adotada em 10 estados;

[37] March (1991) Define os conceitos de Exploitantion e Exploration, apresentando um formato de ambidestria onde a organização desenvolve novas tecnologias/produtos/conhecimento em uma frente e tem em outra unidade/estrutura a lógica de explorar/rentabilizar a tecnologia/produto/conhecimento desenvolvido.

[38] Artefato, no exemplo dado é uma ferramenta, mais especificamente uma faca

[39] O caráter mutável do objeto é representado pela forma elíptica na figura 16.

[40] Sistemas de controle, coerção e poder são empregados para manter a estabilidade dos Sistemas de Atividade, como exploramos no Erro! Fonte de referência não encontrada. nos diferentes estágios de consciência.

[41] Culturalmente temos resistência em apresentar pontos de vista conflitantes, e enquanto coletivo, tampouco temos os recursos e maturidade para tratar tensões, contradições, e divergência de opiniões(KOCH-GONZALES; RAU, 2019).

[42] A distância entre as atividades presentes dos indivíduos e a nova forma histórica da atividade que pode ser gerada de forma coletiva como uma solução para o duplo vínculo potencialmente pertencente as ações cotidianas.

[43] Neste trabalho foi usada a edição de 2014.

[44] A Teoria da Atividade Histórico-cultural

[45] Em especial pela queda do muro de Berlim e crise de seu principal parceiro comercial a URSS.

[46] Os IDGs são a sigla para Inner Development Goals, ou em português “Objetivos de Desenvolvimento Interno”. O movimento parte do entendimento de que temos os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS´s). Porém nos falta as capacidades internas individuais para lidar com nosso ambiente cada vez mais complexo e os desafios inerentes a ele. Entendem que desenvolver habilidades internas (pessoais), são um caminho para pavimentar a transformação necessária.

[47] Obsidian é um Software livre e colaborativo que tem o objetivo de ajudar as pessoas a organizar informação em um formato de rede de informações interconectada. Disponibiliza recursos de pesquisa avançada, marcação, visualização gráfica dos dados e edição colaborativa.

[48] A Inteligência Artificial foi popularizada para o grande público desde o lançamento do ChatGPT em dezembro de 2022, em seu versão 3.5. Outras plataformas e serviços incorporaram Inteligência Artificial em seus serviços.

[49] A função de um dispositivo é a produção de subjetividades, que articulam jogos de objetivação e subjetivação. Dispositivo é qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes. Não somente, portanto, as prisões, os manicômios, o panóptico, as escolas, as confissões, as fabricas, as disciplinas, as medidas jurídicas etc, cuja conexão com o poder e em um certo sentido evidente, mas também a caneta, a escritura, a literatura, a filosofia, a agricultura, o cigarro, os computadores, os telefones celulares e – porque não – a linguagem mesma, que e talvez o mais antigo dos dispositivos, em que há milhares e milhares de anos um primata – provavelmente  sem dar-se conta das consequências que se seguiriam – teve a inconsciência de se deixar capturar(AGAMBEN, 2005). 

[50] “A individuação é definida como o processo através do qual ocorre a constituição das formas individuadas, dos indivíduos físicos, orgânicos, psíquicos e sociais.”(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 98)◘

[51] Conceito de transversalidade é proposto por Guatarri com objetivo de problematizar os limites do setting clínico, propondo assim um aumento do espectro comunicacional intra e intergrupos em uma instituição. O que interessa na cartografia é o que se passa entre os grupos, nos grupos, no que está além dos grupos, entre as formas ou no atravessamento delas(PASSOS; BARROS, 2009a). É pela alteração do padrão comunicacional nas instituições, adicionando um terceiro eixo que cruza e desestabiliza a hierarquia dos diferentes e a homogeneização dos iguais que se abre espaço para se habitar os pontos de vista em sua emergência sem apego a qualquer um deles(PASSOS; EIRADO, 2009).

[52] Implicação é um “entre”, entender que o pesquisador não está fora (distante da realidade observada), nem dentro (impondo seus interesses, crenças e juízos). Nem a subjetividade, nem a objetividade. É pelo imbricamento do contraditório e refinando na circularidade que emerge da prática do conhecer e do transformar.

[53] O conceito de política trabalhado pelos autores é em sentido ampliado, referindo-se à “forma de atividade humana que, ligada ao poder, coloca em relação os sujeitos, articula-se segundo regras ou normas não necessariamente jurídicas e legais” (PASSOS e BARROS, 2009b, p. 151).

[54] Todos os materiais utilizados nessa tese foram produzidos pelo autor. Desde os slides e design do relatório passando pelos processos de automação, compilação, tratamento e processamento dos dados. Tanto deste relatório como de outros processos de confecção e produção da tese.

[55] Como apontado por Leontiev, destacado na seção teórica, a desconexão entre Ação e Atividade é uma característica do capitalismo em especial dos processos de produção departamentalizados.

[56] Outros desafios contribuíram para esse movimento, como por exemplo a necessidade de mudar o nome da Organização por questões de marca.

[57] Fazendo entrevistas, trocando informações, referências e criando um vínculo pessoal com muitas dessas pessoas de contato das organizações mapeadas.

[58] Nome das empresas foi coletado do site do TEAL Brasil em Agosto de 2021.

[59] Evidente a relação direta entre tensões em Contradições na ótica da CHAT.

[60] O nome da empresa e das pessoas participantes da pesquisa serão preservados.

[61] Formato onde a empresa aloca pessoas “avulsas” no cliente.

[62] Lembrando que um Artefato é um objeto produzido pelo ser humano, podendo possuir materialidade, ou seja, é composto por elementos físicos e tangíveis, mas também pode ser imaterial, como o modelo mental utilizado para tomar decisões estratégicas em uma organização.

[63] Um Sistema de Atividade abriga múltiplas vozes e perspectivas. Cada participante contribui com seu próprio entendimento e experiências, moldando o sistema. Valorizar essas vozes e promover comunicação e colaboração entre elas permite negociação de significados e construção de conceitos compartilhados. Essa abordagem possibilita a análise e intervenção efetiva nos sistemas, compreendendo desafios e buscando soluções que considerem as diversas necessidades e perspectivas.

[64] A CHAT entende o saber como situado, portanto, moldado pelo contexto em que foi aprendido e usado. O que implica na necessidade de “traduções” e construções de sentido locais para proposições exteriores ao Sistema de Atividade.

[65] Abordagem alinhada com a literatura de treinamento e desenvolvimento, onde as referências são feitas aos objetivos organizacionais, ou lacunas de capacidades para que os objetivos sejam atendidos (BURKE; HUTCHINS, 2007; SALAS et al., 2012).

[66] É possível que as pessoas envolvidas não queiram, não saibam como, ou não estejam dispostas a terem uma atitude protagonista com relação ao seu desenvolvimento(SITZMANN; ELY, 2021), e a própria aplicação deste framework trará dados para mapear o nível de engajamento do público participante.

[67] Aprendizagem autorregulada é a modulação de processos afetivos, cognitivos e comportamentais para atingir objetivos de aprendizagem. Inclui múltiplos processos operando em conjunto. A autorregulação é crucial em um contexto de aprendizagem, especialmente porque o trabalho está se tornando mais complexo e centrado no conhecimento, exigindo que os funcionários se adaptem às demandas de trabalho em constante mudança. Além disso, os colaboradores têm mais controle sobre seu treinamento, e a aprendizagem informal está se tornando mais comum, aumentando a necessidade de avaliar a informação. Essas mudanças aumentam a demanda pela autorregulação da aprendizagem(SITZMANN; ELY, 2021).

[68] #resultado: a partir dos feedbacks recebidos da aplicação da Tango,

[69] #resultado: pude refletir sobre o espanto das partes envolvidas na capacidade de adaptação do modelo. Ficou presente as diferenças entre adaptarmos um modelo a partir de uma premissa, e utilizar um modelo construído em cima das premissas. Pudemos ver essa diferença na forma como a Tango constrói uma cultura de autonomia. Não focando em trabalhar competências e comportamentos para que as pessoas sejam autônomas, mas constituindo sistemas a partir de valores e premissas que façam a autonomia uma forma de agir.

Assim a capacidade de adaptação é intrínseca ao modelo, uma vez que o modelo foi concebido a partir das premissas dos saber situados, da valorização das características histórico-culturais, entre outros aspectos da CHAT como a multivocalidade.

[70] Exemplo de uso de estimulação dupla (ENGESTRÖM; NUTTALL; HOPWOOD, 2020)

[71] #análise: o processo de conexão entre as pessoas na empresa Tango é altamente valorizado. No entanto observou-se que em algumas situações, o caráter de organização em rede e times que se modificam bastante ao longo do tempo acaba gerando obstáculos extras para as pessoas do time. Especialmente para as pessoas que lideram o time tanto nas questões técnicas, quanto na gestão do projeto.

[72] #resultado: evidenciar a importância da conexão dos indivíduos, e suas histórias e cultura com o time e seus processos (Sistemas de Atividade). Especialmente no que tange ao processo de construção de sentido individual e compartilhado, é uma saída importante do estudo.

[73] #atenção: artefatos não são apenas instrumentos físicos, processos de significação se tornam artefatos e passam servir de intermediação entre o sujeito e o objeto na atividade. Entendendo o caráter social do processo de aprendizagem, é relevante observar se o grupo ou indivíduos tem crenças que podem comprometer o programa

[74] Informações situadas fazem com que o conteúdo apresentado crie conexões com a linguagem, cultura, história das pessoas e dos processos da organização. Por exemplo, o fato de eu adota na linguagem a estrutura de me referir às pessoas sem expressar o gênero, ou quando o fizer utilizar o feminino. Esse “padrão” é adotado em toda a organização, pois se adequa à expectativa de incluir pessoas e diminuir o viés na linguagem. Sendo assim, quando digo “as lideranças” ou “a pessoa líder”, abro espaço para que o conteúdo da mensagem seja transmitido, ao passo que se utiliza-se “o líder”, criaria um estranhamento que poderia diminuir a conexão e abertura com o grupo.

Essa abordagem alinha-se com o proposto na CHAT em especial na operacionalização dos aspectos histórico-culturais. Assim como a compreensão da evolução que os Sistemas de Atividade passaram, tanto como forma de verificar desafios que se sustentam ao longo do tempo, como também como ponto de alavancagem para os convites de evoluções futuras (ENGESTROM, 2014)Ì.

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