UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO

 

 

 

ROGERIO LEITE GONZALES

 

 

 

 

 

 

ORGANIZAÇÕES HÍBRIDAS E O DESAFIO DE CONSTRUIR SENTIDO COMPARTILHADO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

PORTO ALEGRE

2023

 

 

 

ROGÉRIO LEITE GONZALES

 

 

 

ORGANIZAÇÕES HÍBRIDAS E O DESAFIO DE CONSTRUIR SENTIDO COMPARTILHADO

 

 

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Administração.

 

Orientador: Prof. Dr. Luis Felipe Nascimento

 

 

 

 

 

PORTO ALEGRE

2023

AGRADECIMENTOS

Fiquei aqui me perguntando, como evitar que essa se torne uma mensagem de agradecimentos …. , tediosa?

Como agradecer às pessoas que me apoiaram e viabilizaram que essa tese acontecesse. Honrando as pessoas que deram suporte, ajudaram, escutaram, mobilizaram recursos, contatos, conhecimento, ou simplesmente estiveram presentes?

Como comunicar a relevância que tiveram nesta jornada que, é sim solitária para quem escreve, ao mesmo tempo que angustiante para quem acompanha?

Como explicar que a construção de conhecimento é um fenômeno social, sem ser chato pra burro, e que todas essas trocas e interações são parte do resultado?

Qual seria um jeito interessante de explicar pra Ane e Gael que isso tudo foi por e para vocês? Que este foi um sacrifício de toda nossa família. Como explicar que eu vi, entendo, agraço e honro todo o sacrifício, esforço e energia investida para que chegássemos ao fim?

Explicar para meus pais o papel que tiveram, desde o início até o cuidar do Gael agora na reta final, como faria isso?

Será que posso agradecer ao Ricardo, meu terapeuta, aqui? Talvez seja contra alguma regra. Seria importante lembrar de sua importância, tanto no diagnóstico de TDAH, como no suporte geral. Acho que não pode agradecer terapeuta não…

Mas, também. Quem vai ler isso aqui? Além da banca claro. Que já aproveito para prestar minha deferência a vocês. Em especial a Prof ª Claudia, pela paciência e generosidade, Tomas e Paola, Obrigado por aceitarem participar deste momento ímpar. Luis Felipe, meu orientador, obrigado pela liberdade e oportunidade de fazer uma pesquisa “um pouco” fora dos padrões.

Como não agradecer a Paty e Bruno? O que será que dirá minha sócia e parceira Lauren ao ler isso? E meus mais recentes sócios e apoiadores Andrea, Felipe e Thomaz? Talvez seja melhor não perguntar.

E, de fato, essa pesquisa não existiria sem as pessoas da Teal Brasil e da Tango. Meus sinceros agradecimentos pela participação ativa na construção deste trabalho e por tornarem esta tese possível.

Meus irmãos, Filipe, Fabiano e Papaleo – este último sendo o único que ajudou de fato😉 – amo vocês.

Tanto pensei em como fazer dessa mensagem um momento interessante, que não cheguei à conclusão alguma. Parece não ter como evitar o inevitável.

 

 

 

 

 

LISTA DE FIGURAS

 

Figura 1 – Representação livre da uma linha do tempo que inclui esse estudo    3

Figura 2 – Particionamento do conhecimento    6

Figura 3 – Crescimento do PIB per capta por países    7

Figura 4 – Representação gráfica da tese    9

Figura 5 – Representação gráfica da tese com conexões    9

Figura 6 – Meta processo Tese parte 1    10

Figura 7 -Meta processo Tese parte 2    11

Figura 8 – Múltiplas variáveis na análise de um fenômeno    16

Figura 9 – Sistema de Atividade do fazer acadêmico pré ChatGPT    17

Figura 10 – Sistema de Atividade do fazer acadêmico pós ChatGPT    18

Figura 11 – Exemplo de um (SA) com interrelações     19

Figura 12- Estágios da consciência humana e organizacional    23

Figura 13 – Espectro das Organizações Híbridas    37

Figura 14 – Dimensões do organizar híbrido    49

Figura 15 – Primeira geração da teoria da atividade    53

Figura 16 – Segunda geração da teoria da atividade    59

Figura 17 – Terceira geração da teoria da atividade    60

Figura 18 – Contradições que podem ser apresentadas pelos sistemas de atividades    63

Figura 19 – Ciclo de aprendizagem expansiva    68

Figura 20 – Tipos históricos de produção    77

Figura 21 – Sistema da Atividade mediado socialmente    78

Figura 22 – Roteiro social – coordenação    80

Figura 23 – Roteiro social – cooperação    81

Figura 24 – Roteiro social – comunicação reflexiva    81

Figura 25 – Loop de dupla estimulação    93

Figura 26 – Ciclo aprendizagem expansiva com loop    93

Figura 27 – Percurso Metodológico    100

Figura 28 – Relações do Sistema de Atividade    130

Figura 29 – Mapa de organizações com práticas TEAL    135

Figura 30 – Sistema de Atividade RH padrão    145

Figura 31 – Sistema de Atividade T&D padrão    146

Figura 32 – Sistema de Atividade RH Tango    146

Figura 33 – Sistema de Atividade – L&D Tango    147

Figura 34 – Sistema de Atividade com Objeto compartilhado    149

Figura 35 – Jornada da colaboradora Tango    162

Figura 36 – Roteiros Sociais de PDI    164

Figura 37 – Roteiro Social PDI Tango    166

Figura 38 – Framework Teórico-Analítico Tese    172

Figura 39 – Processo de 5 etapas do framework proposto    175

Figura 40 – Níveis de intervenção    176

Figura 41 – Modelo Sistema de Atividade    186

Figura 42 – Integração do Objeto de desenvolvimento    198

Figura 43 – Exemplo relatório individual    203

Figura 44 – Sistema de Atividade compartilhado    209

Figura 45 – Slide Talk Interativa    212

Figura 46 – Slide Talk Interativa    213

Figura 47 – Gráficos Análise 1    226

Figura 48 – Correlações 1    231

Figura 49 – Correlações 2    231

Figura 50 – Correlações 3    232

Figura 51 – Contradições mapeadas do Sistema de Atividade    237

Figura 52 – The OS Canvas    242

 

 

 

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Estágios de consciência    24

Quadro 2 – Sistemas de Atividade de uma Organização em diferentes níveis de consciência    27

Quadro 3 – Tipologia das organizações híbridas    40

Quadro 4 – Estrutura hierárquica da atividade e níveis de funcionamento em sistemas de atividade    60

Quadro 5 – Abordagem de pesquisa da CHAT 1/2    69

Quadro 6 – Abordagem de pesquisa da CHAT 2/2    70

Quadro 7 – Quadro comparativo entre Objetos Fugitivos e “não fugitivos”    85

Quadro 8 – Participantes da pesquisa Teal Brasil    122

Quadro 9 – Overview do campo na Tango    123

Quadro 10 – Abordagens    127

Quadro 11 – Exemplo temáticas e grau de maturidade    157

Quadro 12 – Questionário relacionando perguntas e Teoria da Atividade    199

Quadro 13 – Tipos históricos de trabalho vs aprendizagem    219

 

 

SUMÁRIO

 

1.    CONTEXTUALIZAÇÃO    11

1.1    Transformando “ou” em “e”    4

1.2    De pontos para nós – “From dots to knots”    7

1.3    Tecendo uma rede    9

1.4    Recursividade e reflexividade    10

1.5     Muitas “coincidências” me aproximaram da Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT)    12

1.6     Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) para ordenar o caos    14

1.7    A introdução de uma nova ferramenta é capaz de desestabilizar o Sistema de Atividade    15

1.8    Reflexões da “mini prática”    19

1.9    Sustentabilidade e o papel das organizações    21

1.10    Visualizando a proposição de Laloux a partir da CHAT    25

1.11    De organizações hierárquicas para times:    28

1.12    Não se constroem times autônomos sem indivíduos autônomos.    31

2    ORGANIZAÇÕES HIBRIDAS    35

2.1    Origens    38

2.2    Múltiplas identidades e confusão    39

2.3    Desafios de múltiplas identidades    41

3    LENTE TEÓRICA    50

3.1.    Um olhar sobre a CHAT e sua história:    51

3.2.    As três gerações da CHAT    52

3.3.    Princípios da teoria da atividade    62

3.4.    Aprendizagem expansiva    65

3.5.    Revisão    73

3.6.    Roteiros sociais    78

3.7.    Runaway Objects    84

3.8.    Laboratório de mudança    90

3.9.    Limitações da CHAT    94

4    PERCURSO METODOLÓGICO    97

4.1    A cartografia    101

4.1.1    Pista 1 – a cartografia como método de pesquisa-intervenção    103

4.1.2    Pista 2 – o funcionamento da atenção no trabalho da cartógrafa    104

4.1.3    Pista 3 – cartografar é acompanhar processos    106

4.1.4    Pista 4 – movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia    107

4.1.5    Pista 5 – o coletivo de forças como plano de experiência cartográfica    108

4.1.6    Pista 6 – cartografia como dissolução do ponto de vista do observador    110

4.1.7    Pista 7 – cartografar é habitar um território existencial    112

4.1.8    Pista 8 – por uma política da narratividade    112

4.2    Integrando chat e cartografia    114

4.2.1    Complementaridade e convergências    114

4.2.2    Desafios e complexidade na integração    115

4.2.3    Resistências e desafios relacionados a diferenças culturais, políticas e epistemológicas    117

4.2.4    Práticas colaborativas e interdisciplinares    118

4.2.5    Questões onto-epistemológicas    118

4.3    Estratégias de produção de conhecimento    120

4.4    Aspectos éticos    124

4.5    Análise    125

5    TERRITÓRIO    127

5.1    Primeiro pouso    128

5.2    Teal brasil – plataforma de conexão    133

5.3    Segundo pouso    138

5.3.1    Que empresa é essa?    138

5.3.2    Desenvolvimento de pessoas    142

5.3.3    Análise a partir da CHAT:    145

5.3.4    Cultura de cultivo    150

5.3.5    Segurança psicológica e a permissão para não saber    151

5.3.6    Uma organização em rede    153

5.3.7    Formação de times    155

5.3.8    Evoluir sistemas e proteger pessoas    156

5.3.9    Como é que vocês dão lucro?    158

5.4    Resultados    161

5.5    Limitações e lacunas    168

5.6    Organizações em transição    170

6    PROPOSIÇÃO FRAMEWORK    173

6.1    Contextualização    173

6.2    Framework    175

6.2.1    Integrar – premissa i: competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio.    176

6.2.2    Incluir – premissa ii: dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento.    178

6.2.3    Instrumentalizar – premissa iii: intervenções curtas e práticas mantém engajamento.    181

6.2.4    Implementar    182

6.2.5    Interpretar – premissa iv: reflexão estruturada pavimenta espaço para aprendizagem expansiva.    184

6.3    Conexões    187

6.4    Considerações sobre o Framework    190

6.5    Outros pontos de saída da proposta    191

7    APLICAÇÃO DO FRAMEWORK    193

7.1    Setup    193

7.2    Aplicação    194

7.2.1    Conectando o objeto ao sistema de atividade    194

7.2.2    Alinhamento da demanda:    195

7.2.3    Co-construção do conteúdo e da trajetória    196

7.2.4    Construção da autoavaliação    198

7.2.5    Engajamento é determinante    202

7.2.6    Macro visão do processo de autoavaliação:    206

7.3    A talk interativa    207

7.4    Dados para adaptação do modelo    211

7.5    A palestra interativa    214

7.6    Mentoria    216

7.7    Interações assíncronas    216

7.8    Conectando com a teoria    217

7.8.1    Contrastes entre processos de desenvolvimento orientados exclusivamente para habilidades e competências e abordagens sistêmicas    218

7.9    Resultados    222

7.9.1    Análise quantitativa pré-aplicação    223

7.9.2    Análise quantitativa pós-aplicação    224

7.9.3    Correlações e achados:    226

7.9.4    Achados da análise quantitativa    233

7.9.5    Análise dos dados qualitativos    235

7.9.6    Análise das contradições    236

7.10    Cruzamento com os Objetivos da Tese    238

8    Considerações finais e próximos passos    240

8.1    Limitações e estudos futuros    246

9    BIBLIOGRAFIA    247

10    Apêndice a:    259

 

 

 

 

 

 

  1. CONTEXTUALIZAÇÃO

 

Esta tese tem a pretensão de ser amistosa para a leitura de pessoas não acadêmicas. A partir desta premissa ela se estrutura de uma forma não convencional para os padrões acadêmicos normais.

A primeira seção “Contextualização”, é separada em dois grandes blocos. Desta página até a seção 1.9, você encontrará um espaço de contextualização da pesquisa, reflexão sobre os temas relacionados a ela e um sobrevoo explicando a forma como pesquisa se deu, e um exemplo de aplicação da Teoria da Atividade.

Da seção 1.9 até o fim da seção 1, você encontrará uma argumentação acadêmica da justificativa deste estudo, a pergunta de pesquisa e os Objetivos principal e secundários que nortearam o estudo.

No início das seções 2, 3 e 4 há um texto explicativo do conteúdo de cada seção para pessoas não acadêmicas.

No decorrer do texto adotei duas práticas para auxiliar a navegação pelo conteúdo e no entendimento da tese:

  1. no início de cada parágrafo, sempre que possível, destaquei uma frase com negrito que sintetiza ou indica o conteúdo do parágrafo;
  2. a partir da seção 4.2 proponho uma codificação visual para os parágrafos, indicando tipos de conteúdo de cada parágrafo;
  3. em diferentes momentos fiz uso de figuras, quadros e ilustrações para organizar, explicitar e facilitar a compreensão da informação tratada;
  4. na seção 3, produzi uma recapitulação antes da seção 3.5 para auxiliar a pessoa leitora a digerir a teoria exposta.

Dessa forma espero que a leitura e compreensão desta tese seja facilitada para a leitora

 

 

 

Ponto de Partida

 

Sempre foi assim,

Um pouco por convicção um pouco por teimosia.

Esta que parecia ser uma jornada

Em busca da forma correta de se fazer.

Eu e o tempo a significamos de forma distinta.

 

Já haviam falado sobre isso,

Já haviam trilhado esse caminho

Cada um à sua forma, com seu motivo

Em sua possibilidade…

 

Última opção?

Surpreendido balbuciava

Também não era claro

Última alternativa? Um fim? Um recomeço?

Talvez não haja real diferença….

 

Sempre foi assim

Um pouco por curiosidade, um pouco por prepotência

Adaptamo-nos pela observação e convicção

Voar, pousar e zarpar. Não há opção.

 

Repetia, em busca de conforto

Não há o que não se possa

Chamávamos de sincronicidade

O aleatório da intuição


Sempre foi assim

Um pouco por cuidado, um pouco por medo

Presença sútil pronta a se inflamar

Além da coerência, Integridade

 

Um pouco por conforto, um pouco por ignorância

Pintar a interdependência

Uma possibilidade a ser construída

Seguir em equilíbrio vacilante

 

Sempre foi assim,

Um pouco por convicção um pouco por teimosia…

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Pesquisar para quem?

Reflexividade, uma daquelas palavras que entendemos o significado, mas a cada experiência e exercício de observar-se e questionar-se mais camadas ela ganha, e assim vem sendo durante toda a trajetória deste pesquisador.

A escrita do projeto de tese é um desafio, não só pela teoria e pelo tema, mas especialmente pela metodologia. Espera-se que no doutorado a pessoa consiga estruturar de forma mais rápida seu projeto de pesquisa, assim como a sua execução já que se dedicou dois anos no mestrado a aprender e evoluir estes quesitos.

Porém, quando a Cartografia se apresenta como escolha metodológica tudo é posto em xeque. A forma de escrever, o objeto, o objetivo, o público a quem se destina o texto. Há uma multiplicidade de teses e dissertações que fazem uso da cartografia, muitas relatam o seu percurso metodológico detalhadamente, a experiência da pessoa pesquisadora em transitar por ele, suas dúvidas e seu exercício de reflexividade.

Mas como relatar o início da jornada? Como relatar o projeto, como projetar um percurso em uma metodologia que tem por característica a abertura e a construção com o campo? Como traduzir esse olhar, esse cuidado, essa reflexividade em um projeto de tese?

Nesse sentido me questiono: para quem estou escrevendo esse projeto de tese? Para além de cumprir um requisito do programa de doutorado, quais são meus objetivos nessa escrita? Quem é o público que lerá? Escrevo para os 3 professores que irão participar da banca apenas? Escrevo para que eu avance em meu projeto? Escrevo para alguém que possa se interessar?

Se a tese será escrita com os atores da pesquisa e para pessoas que se interessem pelo tema, me parece que esse projeto de tese deveria ser escrito para eles. Um convite, uma explicação, um descritivo, um compilado de algumas das leituras organizadas de forma a ajudar a dar sentido ao momento que vivemos, aos desafios que enfrentamos, as contradições presentes.

Uma narrativa que seja capaz de informar, compartilhar uma visão de mundo e convidar para uma jornada de aprendizagem e transformação da realidade.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Movimiento

Jorge Drexler fala de uma espécie em viagem sem pertences, Dylan se pergunta sobre quanto ainda precisaremos caminhar, Cartola alerta para o pouco da vida que se escapa em cada esquina. Seja pelo tic-tac “Pink-Floydiano”, pelo abacateiro de Gil, rodas de Chico, e tantos outros que por aí já passaram. Fato é que, inexoravelmente, estamos sendo arrastados pelo espaço-tempo.

Bowie em “Changes”, Lennon e McCartney em “Strawberry Fields Forever” falaram das infinitas possibilidades, das realidades que ocorrem ao mesmo tempo modificadas pelo ponto de vista do observador. As conexões do acaso e a serendipidade são elementos fundamentais nas construções literárias de Dostoievski, ou nas extrapolações de Kafka e Borges. Evidenciada na visão total de “O Aleph”, mas Borges a destaca especialmente na grande contradição de “Funes, el memorioso”.

Funes, personagem magistral criado por Borges, possui uma característica especial: sua memória total, capaz de lembrar de tudo, cada segundo, cada detalhe. Aprendeu facilmente inglês, francês, latim, contudo há a suspeita de que não era muito capaz de pensar, ao que complementa no livro: “Pensar é esquecer diferenças, é generalizar, abstrair. No mundo abarrotado de Funes não havia senão detalhes, quase imediatos.”

Para além da genialidade artística, esse preambulo foi feito para traçar o paralelo sobre os desafios de viver em um mundo complexo, inundado de informações e possibilidades. Em que a abundância pode, paradoxalmente, paralisar, e induzir à busca por formas de anestesia para evitar o desconforto da incerteza.

Posso dizer que esta tem sido minha questão geradora de movimento:

Como abarcar a complexidade sem paralisar-me?

 

Figura 1 – Representação livre da uma linha do tempo que inclui esse estudo

Fonte: Autor

  1. Transformando “ou” em “e”

A complexidade de uma situação pode ser vista como sendo maior quanto mais elementos ou variáveis ela tiver. Mas não é só a quantidade de elementos que importa, mas também como eles se relacionam ou interagem entre si. É a diferença entre somar coisas, multiplicá-las ou elevá-las à potência. Ou seja, não é só o que temos, mas também como essas coisas se combinam ou se influenciam que torna uma situação mais complexa.

Traduzindo para a linguagem natural, poderíamos dizer que é a diferença entre reconhecer a influência de múltiplos fatores sobre uma realidade e usar a conjunção “e” em vez da disjunção “ou”. Isso implica uma abordagem que não apenas reconhece a multiplicidade de influências, mas também a interconexão e interdependência entre elas.

Essa compreensão se solidificou durante minha experiência de um ano de imersão na Team Academy Finlandesa em 2009. Foi lá que vivenciei a realidade de paradoxos, como: aprender e trabalhar simultaneamente; diversão e seriedade, pesquisar e aplicar o conhecimento adquirido; de evoluir individualmente através do coletivo; de colaborar e ser pragmático. A lista continua, mas o ponto principal é que essas experiências me mostraram que a complexidade não precisa ser paralisante. Pelo contrário, pode ser uma fonte de riqueza e diversidade.

Falhando miseravelmente

Em 2010 os planos de continuidade na Finlândia são interrompidos para voltar ao Brasil e apoiar a empresa familiar que mantinha sociedade, uma indústria de reciclagem de plásticos.

Convicto da experiência recém vivenciada, apliquei uma tentativa atabalhoada de algo parecido com o vivido na Finlândia, com as equipes de produção da empresa, falhei miseravelmente.

Após fecharmos a empresa, tomei parte em muitas iniciativas, entre movimentos de em busca de sustentabilidades financeira, testes de hipótese de negócio e descobertas profissionais, durante dois anos implementei uma iniciativa de aprendizagem por projetos para alunos do ensino médio de uma escola de Porto Alegre, juntamente com treinamentos em organizações e para docentes do ensino superior.

Em 2016, em busca de referencial teórico, estrutura e método pesquisei no mestrado qual o impacto da implementação de aprendizagem baseada em projetos para ensino de sustentabilidade aos alunos do curso de administração da UFRGS.

Em um tuíte, posso dizer que o método é um alavancador de potencial para pessoas já convertidas. Ainda que 85% dos participantes tenham destacado a necessidade de ter metodologias de aprendizagem ativa e práticas no processo de ensino aprendizagem no currículo do curso. Pudemos verificar um alto impacto do método em 25% dos participantes, 50% passaram pelo processo e tiveram algum tipo de transformação em suas práticas e visão de mundo, e 25% foram resistentes à proposta(GONZALES, 2018).

Nesta pesquisa utilizei o olhar da aprendizagem experiencial (KOLB, 1984a), em uma pesquisa-ação (TRIPP, 2005), onde olhei para as pessoas e sua experiência de aprendizagem. O resultado foi o questionamento sobre qual o papel da cultura organizacional e a história dessas pessoas antes de entrar em contato com o método proposto.

Quando analisado em comparação com métodos passivos de aprendizagem (leia-se exposição de conteúdo), houve um grande impacto e a preferência de aproximadamente 80% pelo novo método. Dessa forma, o estudo indica adoção de metodologias ativas, e em especial baseada em projetos reais (GONZALES, 2018).

Às vezes, melhor não é suficiente

Quando algo muito ruim é melhorado, não se torna, necessariamente, bom. Quando o desafio é influenciar as futuras gerações de profissionais a serem protagonistas na construção de um futuro mais sustentável e justo. É necessário, além do acesso à informação, habilitar as pessoas a reconfigurar os sistemas em que atuam, e por conseguinte, constituem nossa sociedade.

Alinhado com a literatura, observamos o mesmo se repetir nas organizações, pessoas convencidas que precisam mudar, organizações com altos investimentos enfrentando grandes dificuldades de transformar a forma como as coisas realmente acontecem (ARGENTI et al., 2021; REEVES et al., 2018).

Continuamos focados em transmitir conteúdo e, quando muito, “capacitamos” as pessoas em como aplicar esse conteúdo por meio de métodos e ferramentas. Seja em ESG (Environmental, Social, and Governance), saúde mental, colaboração ou gestão de stakeholders, as premissas são muito semelhantes. Mesmo com a adoção de tecnologia e metodologias ativas, será que isso está sendo suficiente? Suficiente para o aprendiz, para as organizações e para o planeta?

Figura 2 – Particionamento do conhecimento


Fonte: Autor

 

 

 

 

 

 

  1. De pontos para nós – “From dots to knots”

 

Essa história de dividir as cosias começou com Newton e Galileu na chamada Revolução Científica do século XVII, quando começaram a descrever o mundo natural em termos de leis físicas universais. Essa abordagem foi extremamente importante para a humanidade, desde então o PIB mundial tem crescido de forma constante ao longo dos últimos três séculos. De acordo com o site Our World in Data (“Economic Growth – Our World in Data”, 2023), o PIB per capita aumentou mais de 20 vezes desde a independência dos Estados Unidos em 1776 até 2018.

Figura 3 – Crescimento do PIB per capta por países


Fonte: Our World in Data

 

Em um tempo em que a capacidade computacional era limitada, era necessário dividir os problemas para torná-los mais gerenciáveis. Hoje, com a evolução da tecnologia, temos a capacidade de criar modelos mais complexos que respeitam a interdependência entre sistemas e suas variáveis. Mais importante ainda, podemos repensar o papel das pessoas nesse contexto.

Na era da mecanização, especialmente quando a tecnologia ainda era incipiente, as pessoas eram vistas como substitutas das máquinas que ainda não existiam. A ideia de tratar pessoas como recursos, conforme proposto por Taylor e Fayol na administração científica, era predominante.

Nesse contexto histórico, as teorias e metodologias de pesquisa foram moldadas por uma visão de mundo que via as pessoas como recursos. Elas eram classificadas, categorizadas como objetos de estudo e consideradas substituíveis (Engeström, Sannino & Virkkunen, 2014). O pensamento era guiado por diretrizes amplas que deveriam ser desdobradas e implementadas na organização.

Hoje, embora ainda vejamos a influência dessas correntes de pensamento, temos a oportunidade de repensar essas premissas. Podemos valorizar o papel único e insubstituível das pessoas, tanto na lógica organizacional quanto nas premissas das pesquisas que são conduzidas. Isso representa uma mudança significativa na forma como abordamos a gestão e a pesquisa, colocando as pessoas no centro.

Uma das abordagens que se alinha com o ressignificar do papel das pessoas é a Cartografia. A Cartografia, metodologia de pesquisa inspirada em Deleuze e Guattari e desenvolvida por pesquisadoras como Virgínia Kastrup e Regina Benevides de Barros, é uma abordagem que busca mapear territórios e entender processos. Concentra-se na experiência subjetiva do indivíduo e entende a realidade como em constante mudança e fluxo. Ao invés de buscar verdades universais, a cartografia explora a multiplicidade e a complexidade das situações(KASTRUP; PASSOS, 2013).

Em minha interpretação pessoal ela funciona como um sistema operacional, passível de adicionar aplicativos (ferramentas e estratégias) a ela de acordo com as necessidades da pesquisa e as condições do território que se está encontrando. Um sistema operacional que entende o mundo como complexo, interconectado e interdependente e de conhecimentos situados.

  1. Tecendo uma rede

Incluir muitos elementos em uma análise pode ser desafiador, em especial quando essas variáveis são subjetivas, interpretáveis e em constante mudança, como parte das capturadas através da cartografia.

Figura 4 – Representação gráfica da tese


Fonte: Autor

Na Figura 4, apresentamos uma representação gráfica de 816 arquivos, que incluem referências, transcrições, documentos, figuras e textos de diversas naturezas e funções. Esses elementos, quando ordenados, classificados e relacionados entre si, formam caminhos, conexões e nós de uma rede específica. Essa rede é visualmente representada na Figura 5.

Figura 5 – Representação gráfica da tese com conexões


Fonte: Autor

Essas imagens foram geradas pelo programa Obsidian, que adotei como sistema de gestão e organização dos dados e informações utilizados na Tese.

  1. Recursividade e reflexividade

 

A sequência de tópicos apresentadas nesta seção, segue uma formatação lógica e não cronológica. Podemos entender o processo de construção da tese conforme a Figura 6.

Na Figura 6, podemos observar áreas de interesse em destaque. Estas foram exploradas de forma teórico e empírica de forma recursiva. Assim as conexões particulares deste estudo foram estabelecidas: entre Organizações Híbridas, Cartografia (metodologia) e Teoria da Atividade Histórico-Cultural (lente teórica).

Figura 6 – Meta processo Tese parte 1


Fonte: Autor

A recursividade permite a construção do conhecimento situado e em camadas. Possibilitando a constituição de conexões, conteúdos e construções teóricas que funcionam como pontes entre os pontos de partida.

Figura 7 -Meta processo Tese parte 2


Fonte: Autor

Depois de passar pelo contexto e histórico, assim como o porquê da metodologia escolhida, é hora de conhecermos as lentes usadas para “ordenar o caos”.

 

  1. Muitas “coincidências” me aproximaram da Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT)

 

É sabido e notório nos corredores acadêmicos os efeitos que uma teoria pode exercer em um pesquisador. Alguns sintomas dessa paixão acadêmica podem incluir: a) a tentativa de justificar tudo com a teoria escolhida; b) a necessidade de falar sobre ela o tempo todo; c) a tendência de criticar outras teorias.

Pode-se dizer que esses comportamentos são característicos de uma paixão, a qual pode surgir por diferentes motivos. No entanto, uma coisa é certa: uma paixão não é compreendida através, apenas, da razão. No nosso caso, fomos apresentados durante o mestrado. Ao projetar uma possível aproximação, fui prontamente alertado da sua complexidade, dificuldade de aplicação e profundidade. Movido pela razão e pelos prazos apertados do mestrado, nos evitamos.

Ao iniciar o doutorado, e vivendo os resultados do mestrado descritos antes, a CHAT aparecia novamente como um desafio pessoal, e possibilidade de incutir robustez teórica na nova exploração. Algumas coincidências interessantes sobre a CHAT e a Team Academy.

O principal teórico e expoente da CHAT se chama Yrjö Engeström, pesquisador finlandês que nos anos 90, frente à crise econômica que a Finlândia passava, construiu um modelo de aplicação da Teoria da Atividade para Organizações, chamado Laboratório de Mudança(ENGESTROM, 2014).

O fundador da Team Academy, se chama Johannes Partanen, professor de marketing finlandês que nos anos 90, frente à crise econômica que a Finlândia passava, construiu um modelo de aprendizagem pela prática, aplicada no ensino de Administração de Empresas, chamado Tiimiakatemia.

O aspecto que mais me chama a atenção são as influências cruzadas nas proposições. Enquanto a Team Academy propõe juntar empreendedorismo com cooperativismo, influências vindas de escolas de pensamento bem distintas.

Engeström, buscou na psicologia social russa o olhar para o coletivo através do conceito de Atividade e a adoção da dialética marxista. Seu livro “Learning by expanding” onde propõe as bases da Teoria da Atividade usada hoje é de 1987, dois anos antes da queda do muro de Berlim.

A CHAT entende que um Sistema de Atividade é parte de uma rede interconectada e interdependente de Sistemas de Atividade. A teoria pode ser aplicada em um recorte restrito, mas também é capaz de incluir outros níveis de análise, e as relações entre si. Destaco mais 3 pontos com base em Engeström (2014):

  1. A CHAT é capaz de capturar, ordenar, traduzir e analisar processos, com uma representação visual simples;
  2. Valoriza a multivocalidade, o fluxo constante e considera a aprendizagem como um processo social
  3. Entende a pessoa pesquisadora como uma agente de influência e transformação, adota a abordagem de pesquisa intervencionista

 

 

 

 

 

  1. Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) para ordenar o caos

A velocidade das mudanças, aceleradas pela tecnologia é vertiginosa, o VUCA, o BANI, as Startups, Starlink, Realidade Virtual, Unicórnios, “farialimers” … e o ChatGPT.

Vou usar o ChatGPT como ferramenta revolucionária de um Sistema de Atividade para exemplificar o uso da CHAT para a leitora. Vamos analisar o impacto do ChatGPT no Ensino Superior, especificamente na forma como a Academia é avaliada e recompensada, e os impactos dessa nova ferramenta.

Breve preâmbulo:

Existe uma crítica recorrente à maneira como a academia, especialmente os estudos organizacionais – que englobam pesquisas em administração dentro da grande área das ciências sociais aplicadas – é conduzida. A crítica se concentra na busca pelo produtivismo acadêmico, onde as pesquisadoras são pressionadas pela quantidade de artigos publicados e seu impacto(SILVA, 2019).

Para simplificar para a leitora não acadêmica: as pessoas pesquisadoras acadêmicas são avaliadas pela quantidade dos artigos que produzem e pelo impacto desses artigos, que deveria ser uma métrica de qualidade, mas tem sido amplamente debatido se é a melhor abordagem. O objetivo dessas métricas é tornar a produção acadêmica mais relevante, com a premissa de que a alta produção resultará em qualidade. Talvez haja a intenção de tornar visível o trabalho das pessoas pesquisadoras, que muitas vezes é invisível aos olhos da sociedade(DE FARIAS JÚNIOR, 2020).

As métricas são usadas para avaliar as professoras, os cursos e as universidades. Elas influenciam nos recursos destinados a cada instituição, e às pesquisadoras. Sendo assim, com a definição de que produzir era necessário, os processos internos das Universidades se ajustaram para esse fim. Em alguns casos, gerando formas criativas de produção de artigos(VIEIRA; CASTAMAN; JUNGES JÚNIOR, 2021).

Em dezembro de 2022 foi lançado o ChatGPT, um modelo de inteligência artificial capaz de produzir textos complexos e contextualmente relevantes. Foi treinado em uma ampla gama de dados da internet, e é capaz de realizar tarefas como responder perguntas, escrever ensaios, resumir textos, traduzir idiomas e até mesmo gerar ideias criativas(DWIVEDI et al., 2023).

Rapidamente uma série de aplicativos, plugins e funcionalidades foram lançadas, e demonstraram o potencial da ferramenta em substituir muitas das tarefas realizadas por humanos hoje. Tal qual a automação fez com o trabalho repetitivo nas indústrias e a mecanização retirou as trabalhadoras do campo, a inteligência artificial tende a impactar as profissionais do conhecimento e o mundo acadêmico(BERG, 2023).

 

  1. A introdução de uma nova ferramenta é capaz de desestabilizar o Sistema de Atividade

 

Quando nos falta uma lente teórica para examinar um fenômeno, é comum simplificarmos excessivamente a discussão ou aumentarmos a complexidade até a paralisia ou incompreensão. Vemos isso ocorrendo frequentemente nas redes sociais, e infelizmente a simplificação é muito mais fácil de ser absorvida e replicada.

 

Figura 8 – Múltiplas variáveis na análise de um fenômeno


Fonte: Autor

 

A Teoria da Atividade Cultural-Histórica (CHAT) propõe que um Sistema de Atividade é composto por seis componentes interconectados:

  1. Sujeito: uma pessoa ou grupo que está realizando a atividade. No contexto da academia, o sujeito seria a pessoa pesquisadora ou o grupo de pesquisa.
  2. Artefato: as ferramentas ou signos que o sujeito usa para realizar a atividade. No caso do ChatGPT, o próprio software seria o artefato.
  3. Objeto: o objetivo ou propósito da atividade. Na academia, o objeto poderia ser a produção de conhecimento ou a publicação de um artigo de pesquisa.
  4. Regras: as normas ou diretrizes que governam a atividade. No contexto acadêmico, as regras poderiam incluir as diretrizes de publicação ou os critérios de avaliação da pesquisa.
  5. Comunidade: o grupo social que compartilha o mesmo objeto. Na academia a instituição acadêmica e as partes envolvidas.
  6. Divisão do Trabalho: a maneira como as tarefas são distribuídas entre os membros da comunidade. Na pesquisa acadêmica, a divisão do trabalho pode variar bastante a depender do tamanho e da estrutura do grupo de pesquisa.

Estes seis componentes interagem para criar um sétimo elemento: o Resultado. O resultado é o produto final da atividade, que, no caso da pesquisa acadêmica, poderia ser um novo conhecimento ou uma publicação de pesquisa.

Ao aplicar essa estrutura para analisar a situação atual da academia com a introdução do ChatGPT, podemos começar a entender como essa nova ferramenta está afetando cada componente do Sistema de Atividade (SA) e, por extensão, o resultado final. Primeiro vamos construir um SA representando, de forma simplificada e geral, como está configurado o processo de produção acadêmica hoje em uma Instituição de Ensino Superior no Brasil.

Figura 9 – Sistema de Atividade do fazer acadêmico pré ChatGPT

Fonte: Autor adaptado de Engeström (2001)

 

Este exercício desempenha algumas funções importantes:

  1. Ilustra que a produção de um Sistema de Atividade (SA) é uma interpretação da pessoa pesquisadora sobre o fenômeno em estudo
  2. Revela a fragilidade do equilíbrio dos SAs

     

     

     

     

     

     

     


Figura 10 – Sistema de Atividade do fazer acadêmico pós ChatGPT
Fonte: Autor adaptado de Engeström (2001)

 

Na Figura 10, observamos um novo quadro chamado “Contradições”, e linhas vermelhas pontilhadas indicando algumas áreas de destaque. Esta análise destaca as contradições presentes no SA. As contradições são o motor de desenvolvimento e evolução de um SA. Em muitos casos, elas já estão presentes, mas não tem a força suficiente para mudar o sistema. No caso em questão, por exemplo, a insatisfação com a forma de medir a produtividade já existia entre as pesquisadoras, mas até agora não teve força suficiente para forçar uma evolução no SA (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010).

Esta é potencialmente a situação em que um novo artefato desestabiliza o equilíbrio do SA e exige uma evolução. Neste caso, forçando uma revisão completa da prática acadêmica, desde o Objeto (a razão de ser deste sistema), passando pelos artefatos que serão utilizados, as regras que serão redefinidas, a divisão do trabalho que será reconfigurada, e assim por diante (DWIVEDI et al., 2023).

A CHAT, neste caso a Teoria da Atividade, entende os SA como partes interconectadas de outros SA´s. Essa visão nos permite aumentar ou diminuir o “zoom” de análise de um SA, dependendo do fenômeno a ser pesquisado, para uma melhor compreensão do objeto de pesquisa e de suas interrelações (VIRKKUNEN; KUUTTI, 2000).

Figura 11 – Exemplo de um (SA) com interrelações

Fonte: Engeström (2001)

 

Na Figura 11, temos um SA com interrelações, pois podemos representar partes do SA como um SA independente. Por exemplo, o processo de revisão de um artigo, que pode ser representado como um artefato, pode ser investigado como um SA completo. Essa capacidade de aproximação e distanciamento do objeto de estudo permite à Teoria da Atividade construir uma compreensão mais sistêmica dos fenômenos, mantendo uma estrutura de análise comum.

 

  1. Reflexões da “mini prática”

 

Fizemos um pequeno ciclo de etapas que teve por objetivo de orientar a leitora não acadêmica, especialmente em relação às premissas adotadas por mim. Usei uma estrutura didática para ilustrar a natureza recursiva da pesquisa, que ganha profundidade à medida que os elementos se aproximam e novas conexões se tornam possíveis, tudo isso sustentado pela reflexividade da pessoa pesquisadora.

Destacamos o papel crucial da contextualização clara, apoiada por uma metodologia robusta e artefatos que fornecem as condições necessárias para a operacionalização da pesquisa. Além disso, enfatizamos a importância da lente teórica na organização de um fenômeno que, de outra forma, poderia ser considerado excessivamente complexo para estudo.

Como é comum em qualquer estudo, chegamos ao fim com mais perguntas do que quando começamos, cada uma delas nascendo da reflexão sobre a jornada que percorremos. Neste caso, não é diferente. Concluo esta introdução construtiva com uma questão que surge naturalmente:

As universidades precisarão redefinir seu papel na Era da Inteligência Artificial? Se sim, qual será esse novo papel?

Acredito que uma das frentes que deve ganhar força é relativo ao papel de auxiliar, pessoas, grupos, organizações a criar significado e aplicação situada ao conhecimento produzido em conjunto com a Inteligência Artificial. Que alinha-se com o posicionamento da Teoria da Atividade e da Cartografia de entender a pessoa pesquisadora como um intervencionista (CASAGRANDE; GODOI, 2013; PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015).

Talvez ameaçados pelos “cérebros de silício” possamos finalmente implodir a torre de marfim acadêmica e se aproximar dos fenômenos, da sociedade e da intervenção para transformação.

 

 

  1. Sustentabilidade e o papel das organizações

 

A busca por formas de organizar e aprender, que possibilitem um futuro mais sustentável e possam desenvolver o potencial humano das colaboradoras de uma organização é um caminho urgente e sem um final conhecido, essencialmente por serem dois conceitos (ou objetos de atividade) baseados em propósito e não em metas.

Ainda que tenhamos dificuldade de olhar para essas questões de forma analítica, pois nos dá um sentimento de incapacidade de ação, é sabido que vivemos em um mundo em desequilíbrio de forma insustentável (ONU, 2015). Nos encaminhamos para uma catástrofe de nossa espécie, onde a questão ambiental é a que mais ganha notoriedade, porém também enfrentamos crises: na justiça internacional (comércio e imigração); justiça global (pobreza e direitos humanos) e toda a questão ecológica (extinção das espécies, acidificação do oceano, aquecimento global, etc..)(SHOVE, 2010; WHITE, 2018).

Shove (2010) defende que a transição para a sustentabilidade não depende de legisladores forçando a população a transformar seus hábitos através de sacrifícios, ao invés disso a transição se dá quando “as regras” do jogo deixam de valer e o status quo é questionado. Talvez seja cedo para afirmar que é este movimento que estamos vivendo, porém alguns sinais de que uma redefinição está em curso são aparentes, como por exemplo o reposicionamento da linha editorial do Financial Times, pedindo que o modelo capitalista como o conhecemos seja repensado.

As organizações tem papel fundamental na construção de soluções viáveis para que sejamos capazes de enfrentar os desafios que temos pela frente enquanto humanidade(ONU, 2015). Esse chamado da ONU (2015) está ainda mais explicito a partir da agenda 2030, que organiza os desafios e metas relacionadas a sustentabilidade nos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS´s).

Nos últimos anos temos visto alguns movimentos empresariais promovendo um novo olhar para nossa forma de viver, produzir e organizar e neste trabalho me concentrarei nas formas de organizar. Pode-se destacar o Capitalismo Consciente, as Empresas B, Empresas Humanizadas, Culturas Restaurativas entre outros movimentos organizacionais que buscam uma transformação do papel das organizações. Em agosto de 2019, um grupo de 200 CEO´s de grandes organizações foi a público fazer uma declaração de que é necessário redefinir o propósito das corporações para “uma economia que sirva todos americanos”(SANDLER, 2019).

É relevante olharmos para esses movimentos, não de forma isolada, porém como parte de processo de redefinições que estão ocorrendo em diferentes frentes, formas, intensidades e grupos sociais. Nosso modelo de desenvolvimento é insustentável ambientalmente (WWF, 2019), a forma como ele se dá, promovendo a concentração de recursos, e a proliferação da miséria é um crime contra a humanidade (BBC, 2019). Porém, discussões decorrentes dos mencionados movimentos espelham o pensamento mecanicista, polarizando e radicalizando o debate com o intuito de manter o status quo (WHEATLEY, 2011). Ou se é azul ou vermelho; ou A, ou B. Como levantado pelo Jornal El País, “não temos capacidade de discutir política” (EL PAIS, 2019).

Estamos vivendo uma onda populista/conservadora e não sabemos como lidar com isso, o exemplo emblemático é a negação das mudanças climáticas e a inabilidade da comunidade científica e da mídia em responderem a esse fenômeno (COOK; COOK, 2016), sem mencionar a politização em torno da pandemia do novo corona vírus (COVID 19). Junte-se a isso nossa incapacidade, enquanto sociedade, de aceitar a contradição e a falta de respostas definitivas para problemas complexos (SCHNEIDER, 2015). Schneider (2015) destaca que a negação de paradoxos é um aspecto generalizado na nossa sociedade, pela incapacidade de sentir-se “sem chão”.

O autor usa a expressão “sem chão” para explicar momentos em que perdemos nossas referências, ou entendimentos de verdades absolutas. E enquanto sociedade, acabamos por comprar soluções simplistas e confortantes (SCHNEIDER, 2015).

Engeström (2014) relata um fenômeno parecido em processos de aprendizagem expansiva, onde as pessoa incapazes de construir uma proposta para a contradição enfrentada em uma atividade, acabam por desqualificar a problemática e retroagir no processo evolutivo.

Não sabemos, enquanto sociedade, como tratar o assunto e tampouco as organizações. O livro Reinventando Organizações de Frederick Laloux se tornou uma referência na busca por novas formas de organizar. A partir dos estudos de Ken Wilber, o autor apresenta um modelo de entendimento dos diferentes níveis de maturidade dos indivíduos que se refletem em modos organizacionais correspondentes. Buscando oferecer clareza de sua intenção pedagógica, Laloux propõe um adjetivo e uma cor para cada estágio evolutivo de seu modelo(LALOUX, 2017).

 

Figura 12- Estágios da consciência humana e organizacional

Fonte: Laloux (2017, p.34).

 

Laloux (2017) detalha em seu livro os estágios de consciência, sua relação com os tipos organizacionais e características de cada um desses tipos de organização. Segue-se a lógica de que as formas de organizar puderam evoluir e ressignificar os papéis das participantes dessas organizações. No quadro abaixo sistematizo as principais características das organizações conforme classificação do autor.

 

Quadro 1 – Estágios de consciência

 

Exemplos atuais

Principais avanços

Metáfora orientadora

Organizações Vermelhas


Constante exercício do poder pelo chefe para manter tropas na linha. O medo é a liga da organização. Altamente reativa, foco no curto prazo. Prospera em ambientes caóticos.

– Máfia

– Gangues de rua

– Milícias tribais

– Divisão do trabalho

-Autoridade de comando

Alcateia

Organizações Âmbares


Papéis altamente formais em uma pirâmide hierárquica. Comando e controle de cima para baixo (o que e como). Estabilidade valorizada acima de tudo por meio de processos rigorosos. Futuro é repetição do passado.

– Igreja Católica

-Forças Armadas

-Maioria das

agências governamentais

-Sistemas de escolas públicas

-Papéis formais (hierarquias estáveis e escaláveis)

-Processos (perspectivas de longo prazo)

Forças armadas

Organizações Laranjas


O objetivo é vencer a concorrência; atingir lucro e crescimento. Inovação é a chave para ficar à frente. Gestão por objetivos (comando e controle no quê; liberdade no como).

-Companhias multinacionais

-Escolas autônomas

– Inovação

Responsabilização

– Meritocracia

Máquina

Organizações Verdes


Dentro da estrutura da pirâmide clássica, foco na cultura e no empoderamento para alcançar extraordinária motivação dos funcionários.

– Organizações direcionadas pela cultura (Exemplos: Southwest Airlines, Ben & Jerry´s)

– Empoderamento – Cultura

direcionada por valores

– Modelo de stakeholders

Família

 

Fonte: Laloux (2017, p.34).

 

A ordenação por cores e estágios de evolução não é relacionada às pessoas, mas sim a cultura organizacional presente, “Se olharmos para a estrutura de uma organização, suas práticas e seus elementos culturais, geralmente podemos discernir de que visão de mundo elas derivam.(LALOUX, 2017, p. 40)”.

Não há particularmente nada novo em sua proposição, mas compila e traduz de forma acessível e didática, estes estágios de consciência organizacional. Propondo uma série de modelos caricaturados facilita a compreensão e absorção de suas ideias ao grande público, o autor lançou o livro em 2014 e se tornou uma referência na difícil tarefa dos indivíduos conseguirem expressar o tipo de transformação necessária nas organizações. Mais que mudança de discursos e ações isoladas(DIGNAN, 2019), é necessário uma transformação das práticas e da forma de enxergar o mundo (LALOUX, 2017).

A principal bandeira do “paradigma TEAL” é a expressão do potencial humano de todas as pessoas colaboradoras de uma organização. Esse ideal é expresso em três valores: propósito evolutivo, integralidade e autogestão (LALOUX, 2017).

 

  1. Visualizando a proposição de Laloux a partir da CHAT

 

No Quadro 2, podemos ver uma exploração dos níveis de consciência propostos por Laloux, vistos a partir da lente da Teoria da Atividade, importante destacar alguns pontos:

  1. Organizações podem gerar o mesmo produto a partir de lógicas e processos muito distintos
  2. O Objeto é o motivo de existir do Sistema de Atividade, o Objeto evolui junto com o aumento da complexidade da Organização
  3. Sujeito e Artefatos também evolui em direção à uma maior inclusão e autonomia dos atores do Sistema da Atividade
  4. A Comunidade se expande, incluindo clientes, cadeia produtiva e a sociedade como um todo
  5. A Divisão do trabalho também se reconfigura, ajustando-se ao Objeto, os Artefatos, as Regras, a Comunidade e os Sujeitos envolvidos

Podemos entender que, mesmo que o resultado ou produto se mantenha aparentemente o mesmo, o Sistema Operacional todo se reconfigura. A evolução de consciência de uma organização não é uma mudança superficial, ou que possa ser definida por um grupo e uma simples chave seja virada. Ao decorrer dessa Tese vamos explorar essa jornada.

Observamos a transição necessária das organizações de estruturas hierárquicas para a formação de times autônomos como uma estratégia essencial para lidar com a complexidade do sistema (organização) e do ambiente que está inserida. À medida que as organizações avançam para os estágios verdes e TEAL de consciência, eleva-se a autonomia e poder de decisão conferido às equipes. A razão para isso é que, em um ambiente complexo e em constante mudança, as decisões muitas vezes precisam ser tomadas rapidamente e no nível onde o trabalho está sendo realizado, o vulgo “na ponta”.

A estrutura baseada em times permite que as organizações sejam mais ágeis e resilientes, adaptando-se rapidamente às mudanças e respondendo efetivamente às novas demandas. Isso também capacita as integrantes da equipe a usarem seu conhecimento e habilidades para a tomada de decisões, aumentando o engajamento e a satisfação no trabalho.

 

 

 

 

Quadro 2 – Sistemas de Atividade de uma Organização em diferentes níveis de consciência

Estágio de consciência

Resultado

Objeto

Sujeito

Artefatos

Regras

Comunidade

Divisão do trabalho

Organizações Vermelhas

Produção de Móveis

Móveis simples, produção em massa

Operárias/ Trabalhadores

Ferramentas manuais, equipamentos rudimentares

Hierarquia imposta pelo chefe, controle rígido, disciplina

Chefe e trabalhadores

Trabalho dividido pelo chefe de forma autoritária

Organizações Âmbares

Produção de Móveis

Móveis de melhor qualidade, variedade limitada

Supervisores, Operários

Máquinas industriais simples, processos de produção padronizados

Regras formais, procedimentos padrão, comando e controle

Supervisores, operários, fornecedores, clientes

Trabalho dividido segundo funções bem definidas, seguindo hierarquia

Organizações Laranjas

Produção de Móveis

Móveis personalizados, linha diversificada

Gerentes, Operárias, Equipes de inovação

Máquinas industriais avançadas, ferramentas digitais para inovação e eficiência

Metas e objetivos claros, meritocracia, inovação incentivada

Gerentes, equipes de inovação, operárias, fornecedores, clientes

Trabalho dividido por competências, incentivo à inovação e responsabilização

Organizações Verdes

Produção de Móveis

Móveis ecológicos, sustentáveis, produção com baixo impacto ambiental

Todos as integrantes da organização

Tecnologias verdes, processos ecoeficientes, ferramentas de gestão colaborativa

Valores éticos e sustentáveis, democracia no local de trabalho, empoderamento das trabalhadoras

Todas as pessoas da organização, fornecedores éticos, clientes conscientes

Trabalho dividido de forma colaborativa, papéis flexíveis e adaptáveis, priorizando a satisfação do trabalho

Organizações TEAL

Produção de Móveis

Móveis transformacionais que agregam valor à vida das pessoas, criam bem-estar social e minimizam impactos ambientais

Todas as pessoas da organização

Tecnologias avançadas, processos adaptáveis, inteligência coletiva

Ausência de regras fixas, flexibilidade e adaptação, orientação por propósito

Todas as pessoas da organização, toda a cadeia de valor, sociedade

Auto-organização, papéis fluidos e rotativos, baseado nas necessidades e potencialidades individuais

Fonte: Autor

 

 

  1. De organizações hierárquicas para times:

 

A orientação do trabalho por times vem ganhando mais atenção, não só nas proposições de Laloux, como também é a lógica organizadora das metodologias ágeis (LEMAY, 2019). Sendo aplicado de muitas formas em diferentes situações, em publicação recente o World Economic Fórum aponta como os métodos ágeis estão sendo adaptados para os boards das grandes corporações (WORLD ECONOMIC FORUM, 2018).

É bem comum que se confunda o que é um time com um grupo de trabalho, a diferença fundamental reside na forma como o trabalho é medido, que por sua vez influencia em toda a dinâmica empregada. Um grupo de trabalho é composto por um grupo de pessoas e compartilham um objetivo e são coordenadas por uma liderança, porém tem suas performances individualmente acompanhadas e avaliadas. Por outro lado um time é “composto por um pequeno número de pessoas com habilidades complementares comprometidas com um propósito em comum, definição de metas e a abordagem e métricas que os farão mutualmente responsáveis” (KATZENBACH; SMITH, 1993, p. 112).

A adoção de times não é uma prática nova, apenas foi remodelada com as novas ferramentas tecnológicas, técnicas de modelos de gestão de projetos, e organização do fluxo de trabalho. Até mesmo o conceito de times autogerenciáveis ou autodirigidos não é novo, o primeiro estudo com times autodirigidos que se tem notícia foi realizado no Reino Unido e publicado em 1951, na ocasião era um time autodirigido para extração de carvão no método longwall (TRIST; BAMFORTH, 1951).

Assim como o experimento de Elton Mayo em Hawthorne, considerado o fundador da escola das relações humanas, a adoção de times autogerenciáveis é muito aplaudida e, ao mesmo tempo, muito criticada. Druskat e Pescolsolido (2002) mostram que o movimento de empoderamento dos times, possibilita o desenvolvimento de novas lideranças, a expressão da capacidade técnica dos integrantes do time, avanço nas capacidades de comunicação e tomada de decisão das equipes, assim como também mostram a redução dos cargos de gestão e o aumento da responsabilidade e responsabilização dos indivíduos na execução de suas tarefas.

Com a exclusão dos cargos de supervisão a organização se apoia no processo de peer pressure, ou seja a pressão dos pares passa a garantir o desempenho e qualidade dos integrantes do grupo, dessa forma podendo suprimir os níveis hierárquicos intermediários sem prejuízo de performance(DRUSKAT; PESCOSOLIDO, 2002). As autoras apontam o modelo mental dos integrantes do time como ponto preponderante para o sucesso da empreitada, assim como a cultura organizacional presente uma vez que os times têm um caminho de mão dupla em suas trocas com a organização.

A centralidade do usuário e a alta velocidade na evolução tecnológica e de mercado fazem com que as organizações precisem aproximar seus times – autônomos e multidisciplinares – dos processos de desenvolvimento e de tomada de decisão. Justificando-se a adoção de times como modelo de divisão do trabalho, principalmente em organizações de caráter mais tecnológico (DIGNAN, 2019).

Quando são necessárias múltiplas capacidades, os times são os mais adequados devido a sua capacidade de cooperar, por serem autônomos e por serem capazes de aprender rápido e de mudar rápido. A sua capacidade de análise e crítica, que vai além dos aspectos técnicos, os torna capazes de inovar através da tomada de decisões em situações paradoxais e por caminhos desconhecidos. Precisam ter proatividade e rebeldia de um empreendedor, mesmo estando dentro de uma organização (DIGNAN, 2019).

O processo de construção de times autônomos é um projeto desafiador de transformação radical, com grandes conflitos de interesses, relações de poder envolvidas no processo e normalmente não tratadas de forma transparente. Dignan (2019) destaca algumas dimensões como: a) autonomia; b) combinados para distribuição e fluxo do trabalho; c) formas de compartilhamento do poder e tomada de decisão; d) processos de aprendizagem e atualização de processos claros; e) definições de valores e diretrizes norteadoras; f) como nos reunimos e coordenamos; g) métricas e indicadores; h) meios e práticas de compartilhamento de informação; i) reconhecimento e remuneração; j) cultivo de nossas relações; l) utilização de recursos (tempo e dinheiro).

A literatura mostra que é incomum times e organizações terem clareza de como decisões são tomadas nestas dimensões (BREIDENBACH; ROLLOW, 2019; DIGNAN, 2019; LALOUX, 2017). Entender a forma como os combinados e as práticas realizadas para além do que é declarado e idealizado é chave para uma possível transformação da realidade presente e a possibilidade de construir combinados e formatos de trabalho de forma consciente, processual e coletiva(BREIDENBACH; ROLLOW, 2019; DIGNAN, 2019).

Somos incapazes de viver a tensão criativa do embate de ideias contrastantes sem a intermediação de uma figura com poder para decidir o caminho a seguir (BILLETT; HARTEIS; GRUBER, 2010). Organizações estão adotando metodologias e estruturas organizacionais a partir do discurso da autonomia e do pressuposto que essas capacidades são inerentes as suas colaboradoras, como reflexo vemos altos níveis de stress e proliferação de discursos simplistas para tratar essas dores, representados pelo fenômeno do coaching (LAANTI, 2013; STRAY; MOE; HODA, 2018).

O discurso da autonomia é um dos conflitos que existe entre aquilo que a organização gostaria de fazer e as práticas que ela está preparada para implementar. Será que uma organização e suas lideranças realmente querem que um grupo de pessoas que possa decidir sozinho, produzir sem supervisão e estarem felizes e satisfeitos no trabalho?

 

 

  1. Não se constroem times autônomos sem indivíduos autônomos.

 

Autonomia tem sido um tema bastante discutido no campo da psicologia, e psicologia social, uma das questões é como o discurso da autonomia reforça o individualismo, já bem destacado no modelo econômico liberal vigente (CHRISTMAN; ANDERSON, 2005). Esse olhar da autonomia está baseado na agência do indivíduo sobre suas decisões, e tem o ponto de partida em duas capacidades principais, a reflexão crítica e a escolha racional dirigida(MEYERS, 2005).

Meyers (2005) apoia sua argumentação em cinco conceitos envolvidos na construção da autonomia do indivíduo: o ser unitário, o ser social, o ser relacional, o ser dividido e o ser incorporado. A autora defende que o entendimento destas distintas dimensões do ser são o primeiro passo para que se possa fazer uso delas com objetivo de desenvolver sua capacidade pessoal de autodescoberta, autodefinição e autodireção.

Enquanto nos mantivermos presos no entendimento que a construção de times é uma capacidade técnica a ser desenvolvida através de combinados, processos e sistemas e seguirmos ignorando a necessidade de desenvolvimento do indivíduo de forma integral seguiremos fadados ao fracasso em transformar a forma como trabalhamos e vivemos(DIGNAN, 2019).

O processo de desenvolvimento dos indivíduos precisa ser apoiado pelas organizações, pois as pessoas isoladas não conseguem se manter atualizadas, sendo portanto relevante o tema da aprendizagem organizacional (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016). As ferramentas que dão suporte para a aprendizagem organizacional estão contidas em um paradigma mecanicista conteudista, de transmissão de conteúdo e padronização das rotinas a partir de melhores práticas que devem ser seguidas como modelo de sucesso (BILLETT; HARTEIS; GRUBER, 2010).

Teorias como a da Aprendizagem pela Experiência (KOLB, 1984b) ou a Teoria da Criação do Conhecimento na Empresa (NONAKA; TAKEUCHI, 1995) contribuem na discussão da aprendizagem organizacional, mas especificamente com relação à necessidade de reflexão sobre a prática/experiência. Porém, partem de um cenário onde já se tem clareza do problema a ser resolvido, ou há uma tarefa a ser executada (ENGESTRÖM, 2008).

Dessa forma a identificação do problema é deixado de lado de suas teorias, apoiados ainda na divisão do trabalho defendida pela administração científica de Taylor, onde o planejamento e desenho dos processos era feito pela alta gestão e corpo técnico e a execução pela massa de operários(ENGESTROM, 2014; ENGESTRÖM; SANNINO, 2012a).

Em um ambiente onde a capacidade de leitura do entorno e discussão de possibilidades ainda não pensadas é urgente, ou seja, a aplicação de velhas respostas para perguntas já conhecidas já não supre as necessidades que vivemos, esse papel está sendo ocupado por inteligências artificiais (IA) e robôs. Nesse sentido as propostas de Engeström e Sannino (2010) reforçam a importância do saber situado apoiando-se nos saberes presentes para construção de soluções e aprendizagens.

Essa tese busca entender como as organizações que estão trilhando esse caminho de construção de uma sociedade mais justa e em maior equilíbrio, sem perder a viabilidade financeira, estão construindo estruturas menos hierárquicas, mais autônomas e com maior possibilidade de desenvolvimento do potencial humano.

Desenvolvimento do potencial humano está relacionado com os processos de aprendizagem que são instigados e proporcionados pela organização. Nesta tese o potencial humano é tratado como o processo de evolução e ressignificação de suas concepções pessoais e significados atribuídos ao mundo em que vive, para isso me apoiarei em Engeström novamente e na Teoria da Aprendizagem Expansiva para identificar e entender quando eles ocorrem.

O campo pesquisado é delimitado pelo conceito de Organizações Híbridas, são aquelas que buscam equilibrar interesses econômicos, sociais e ambientais (os três pilares da sustentabilidade).

Como já apresentado, o estudo utiliza a Teoria da Atividade Histórico-Cultural como lente teórica e a Cartografia como percurso metodológico.

Ao que nos leva a pergunta de pesquisa norteadora do trabalho, e os objetivos dele:

Quais estratégias e práticas são empregadas pelas Organizações Híbridas para promover o desenvolvimento organizacional e o potencial humano de seus membros simultaneamente?

Objetivo Geral:

Investigar e compreender as estratégias e práticas adotadas por Organizações Híbridas para harmonizar o desenvolvimento do potencial humano de seus membros e a realização dos objetivos organizacionais.

Objetivos específicos

  • Identificar e compreender o contexto organizacional, os elementos analíticos (artefatos, sujeito, objeto, regras, comunidade e divisão do trabalho) e compor sistemas de atividade das organizações estudadas;
  • Construir e analisar os sistemas de atividade de cada micro prática realizada pelas organizações para este fim, constatando as contradições inerentes a estes sistemas;
  • Compreender se ocorrem e como se dão os processos de Aprendizagem Expansiva nas micro práticas analisadas;
  • Propor um framework teórico-analítico destas práticas baseado na teoria da atividade.

Assim na próxima sessão apresentarei as Organizações Híbridas, logo em seguida exploraremos a lente teórica entrando no âmbito das abordagens baseadas em prática, para posteriormente explorar a Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT). Na sequência descreverei os caminhos metodológicos escolhidos.

 

  1. ORGANIZAÇÕES HIBRIDAS

 

RESUMO PARA LEITORAS NÃO ACADÊMICAS:

Organizações híbridas são empresas com um objetivo bem interessante: elas querem resolver algum problema social ou ambiental ao mesmo tempo que buscam o lucro. É como juntar o melhor de dois mundos, só que não é tão simples como parece(HOFFMAN; BADIANE; HAIGH, 2012).

O objetivo é criar um equilíbrio entre o impacto positivo na sociedade, no meio ambiente e a saúde financeira do negócio. Isso significa que elas buscam combinar lucro com benefício à sociedade e meio ambiente. Existem vários tipos de organizações híbridas, elas estão distribuídas em um espectro entre Organizações sem fins lucrativos e Organizações “tradicionais” com fins lucrativos (BATTILANA; DORADO, 2010).

Um ponto importante é que todas essas organizações têm objetivos sociais e financeiros. As metas sociais podem variar de empresa para empresa, dependendo do que elas querem focar. Pode ser criar oportunidades para pessoas pobres, promover a inclusão de minorias, defender direitos humanos ou cuidar do meio ambiente. Já os objetivos financeiros são voltados para a criação de valor econômico e a sustentabilidade financeira (ALTER, 2007).

Mas nem tudo são flores. Organizações híbridas enfrentam um grande desafio: equilibrar a necessidade de ser financeiramente viável e ao mesmo tempo ter um impacto social significativo. Às vezes, esses dois objetivos entram em conflito, e as empresas precisam tomar decisões difíceis (BATTILANA; DORADO, 2010).

Organizações híbridas necessitam de uma cultura organizacional que sustente seu propósito. Isso inclui ter lideranças que dão o exemplo, sistemas de incentivo que reforçam comportamentos e valores desejados, e uma estrutura organizacional que ajude a manter um equilíbrio entre os objetivos sociais e econômicos (BATTILANA; LEE, 2014).

No fim das contas, cada organização híbrida é única em suas necessidades e desafios. Não existe um modelo perfeito que funcione para todos. Há o desafio adicional de ser capaz de conviver com as contradições de forma muito intensa. Em modelos organizacionais hierárquicos essa capacidade fica restrita à poucas pessoas responsáveis por criar estratégias e tomar grandes decisões. Porém, em estruturas organizacionais menos hierárquicas, onde espera-se que os times sejam capazes de tomar decisões com agilidade e alinhamento aos valores e propósito da organização o desenvolvimento das pessoas colaboradoras ganha uma grande importância, como apontamos na seção anterior (BATTILANA; LEE, 2014).

 

 

TEXTO ACADÊMICO:

Organizações hibridas são empresas que constroem seu modelo de negócios baseado no alivio de uma questão social ou ambiental específica (HAIGH et al., 2015). O número de organizações aderentes a este formato vem crescendo nos últimos anos, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento. Ainda que os termos utilizados para descrever esse movimento variem todos eles focam na dualidade entre o impacto social/ambiental e sua viabilidade financeira, assim como as iniciativas destas organizações para combinar atividades com e sem fins lucrativos (GARCIA, 2016; HAIGH et al., 2015).

Organizações híbridas são classificadas dentro de um contínuo ao invés de polaridades. Atividades de Responsabilidade Social Corporativa antes vistas como estranhas as atividades da organização, tem sido cada vez mais entendidas como essenciais para a organização e para as colaboradoras na conexão do trabalho com o propósito organizacional (ALTER, 2007).

No espectro das Organizações Híbridas temos dois tipos opostos e muito distintos de organizações, tendo o seu propósito primário como o ponto de diferenciação.

Organizações Sem Fins Lucrativos, Organizações Sem Fins Lucrativos com Geração de Receita e Empresas Sociais compartilham o propósito de impacto social e se diferenciam pela forma como viabilizam financeiramente seu impacto social.

Figura 13 – Espectro das Organizações Híbridas

Fonte: Alter (2007, p.23).

Já as Organizações com Fins Lucrativos, Corporações Praticando Responsabilidade Social e Negócios Socialmente Responsáveis tem seu propósito primário o retorno do investimento dos seus acionistas, viabilizado pelos lucros esperados de sua operação.

As Nonprofit existem para criar valor social/ambiental e precisam encontrar formas para atingir sua viabilidade financeira para sua manutenção. As For-profit existem para criar valor econômico, ainda que possam contribuir socialmente para sobreviver no mercado. As Organizações Híbridas buscam a criação de valor duplo para se manterem em um equilíbrio sustentável.

Organizações Sem Fins Lucrativos com Geração de Receita: atividades geradoras de receita são integradas as suas atividades sociais. Normalmente não são suficientes para cobrir todos os custos de operação da organização. A Gastromotiva é um exemplo de organização que financia parte de suas atividades com cursos.

Empresas Sociais: essa definição é objeto de longa controvérsia e nesta tese adotarei o entendimento de que empresas sociais se diferenciam dos Negócios Socialmente Responsáveis pelo fato de não distribuírem lucro para as suas acionistas, Grameen Bank é um exemplo desse grupo (ALTER, 2007).

Negócios Socialmente Responsáveis: são organizações com objetivos de gerar distribuição de lucro para seus acionistas e contribuir para um bem social maior. Bem & Jerry´s e Body Shop são exemplos desse grupo (ALTER, 2007)

Corporações Praticando Responsabilidade Social: são empresas que tem sua motivação direcionada para o lucro, porém se envolvem em filantropia. “Filantropia estratégica” (ALTER, 2007) que ajuda a empresa a maximizar seus lucros e auxilia a sociedade em um bem comum. Responsabilidade Social Corporativa não é classificada como uma inciativa social, ainda que sua atividade possa causar um impacto positivo para a sociedade e auxiliar o bem comum. Podemos ver exemplos em organizações que criam práticas internas de apoio a comunidade, ou através de fundações (Grupo RBS, Gerdau etc.).

  1. Origens

Podemos rastrear o início do movimento de organizações híbridas nos anos sessenta, juntamente com o crescimento de organizações (sem fins lucrativos) que começaram a ocupar o vácuo governamental em uma série de temáticas como direitos humanos, questões ambientais, movimentos antiguerra e da libertação das mulheres (HAIGH et al., 2015). A busca por viabilidade financeira e a independência destas organizações criaram as condições para que organizações híbridas começassem a surgir nas condições que hoje podemos observar(GARCIA, 2016).

Já o resguardo legal destas organizações demorou para começar ser contemplado pelos legisladores. Caso notório foi a aquisição da empresa americana de sorvetes Ben & Jerry pela multinacional Unilever em 2000. A multinacional ganhou nos tribunais o “direito” de comprar a empresa já que a legislação apontava que por ser pública a empresa era obrigada, ou a comprar a parte dos sócios pelo valor ofertado, ou aceitar a negociação presente e ser vendida para a maior proposta, pois atenderia o objetivo de maximização dos lucros dos sócios (PAGE; KATZ, 2010).

Até então as organizações acabavam sendo obrigadas a escolher uma das polaridades, empresas com ou sem fins lucrativos. Nos últimos anos uma série de estados e países aprovaram legislações que possibilitam formações societárias e regras fiscais que possibilitam as organizações híbridas de cumprirem sua missão e atingir objetivos financeiros, também distribuindo lucros aos sócios.

No Reino Unido foi criada a figura da Community Interest Company (CIC); nos Estados Unidos a Benefit Corporation e as Low-Profit Limited Liability Company (L3C) adotada em 31 estados (HONEYMAN, 2014). Essas estruturas possibilitam atender objetivos sociais e econômicos das organizações, possibilitando contemplar não apenas as sócias/acionistas (shareholders), mas também as partes interessadas (stakeholders). Essa dualidade, porém, pode gerar confusão organizacional da dificuldade de equilibrar objetivos à primeira vista contraditórios, assim como para as integrantes dessas organizações em suas tomadas de decisão diárias.

 

  1. Múltiplas identidades e confusão

 

Na literatura encontramos um grande destaque para a dificuldade das organizações hibridas equilibrarem a contradição de manter um negócio economicamente viável e ao mesmo tempo ter um impacto positivo na sociedade ou meio ambiente (BATTILANA; DORADO, 2010). Encarado como um sinal duplo a contradição de prioridades organizacionais se reflete em uma série de comunicações ineficientes, conflitos internos, e na potencial perda de eficiência da organização.

Seria esse realmente um ponto de dissonância impeditivo ou uma oportunidade de aprendizado e desenvolvimento para que toda a organização? Seria possível abraçar o entendimento e crença das contradições/tensões como oportunidades de desenvolvimento e não como pontos de fraqueza (da organização, dos times e dos indivíduos)?

As organizações híbridas por abraçarem as contradições no nível organizacional estariam facilitando o trabalho das lideranças, times e indivíduos de desenvolverem suas capacidades de criar sentido e tomar decisões equilibradas em um ambiente paradoxal (LUSCHER, 2018)?

Essas contradições são explicitadas na tabela seguinte, mostrando esse caminho do meio que as Organizações Híbridas se propõem em construir.

Quadro 3 – Tipologia das organizações híbridas

 

Puramente filantrópico

Híbrido

Puramente comercial

Motivos

Apelo à boa vontade e generosidade

Motivos múltiplos

Apelo ao interesse próprio

Métodos

Direcionada pela missão.

Equilíbrio entre missão e mercado.

Direcionada pelo mercado.

Objetivos

Criação de valor social.

Criação de valor social e econômica.

Criação de valor econômico.

Destino dos recursos/ lucro

Direcionado para as atividades relacionadas à missão da organização sem fins lucrativos (requerido por lei ou por política interna)

Reinvestido em atividades relacionadas a missão ou despesas operacionais, e/ou reservado para o crescimento da organização e desenvolvimento (com fins lucrativos, distribui uma porção).

Distribuído para as acionistas.

Fonte: Alter (2007) (tradução nossa).

 

  1. Desafios de múltiplas identidades

 

As Organizações Híbridas têm dinheiro e missão conectados diretamente, porém seguidamente estes objetivos entram em oposição ou competem entre si. Atender demandas sociais pode ser um bom negócio, produtos e serviços podem ter suas vendas ou gerar mais valor quando associados a questões sociais, projetos de aumento de eficiência nas cadeias de produção se conectam muito bem com os conceitos de sustentabilidade, a conexão de uma organização com a comunidade e com suas colaboradoras é reforçada com inciativas de Responsabilidade Social Corporativa. Porém, não demorará muito e as lideranças das Organizações Hibridas terão que tomar decisões difíceis, como por exemplo quando a geração de valor financeiro se opõe ao valor criado para a sociedade (HAIGH et al., 2015).

Não raro as lideranças dessas organizações tratam essas decisões como trade-offs, ou se gera o lucro desejado ou se atende a expectativa pactuada em sua política ou projeto de responsabilidade social. Demandas sociais sendo vistas como restrições de como o negócio pode operar (BATTILANA; LEE, 2014).

Outra abordagem é evitar a dicotomia e abraçar o paradoxo, buscando soluções ganha-ganha, repensando o modelo de negócio e entendendo as iniciativas sociais como atividade entrelaçada aos objetivos do negócio. Desenvolver formas inovadoras de fazer negócios e de organizar alinhando lucro e impacto social é um desafio chave para a liderança de Organizações Híbridas (ALTER, 2007). Organizações Híbridas combinam desafios sociais e econômicos já que precisam de ambos para que possam crescer e atingir seus objetivos organizacionais (SANTOS; PACHE; BIRKHOLZ, 2015).

Ainda que tenhamos exemplos de Organizações Híbridas e de grande impacto de suas atividades, como por exemplo os bancos focados em microcrédito que impactaram a vida de mais de 91 milhões de pessoas vivendo na pobreza, no mundo, criando acesso a pequenos empréstimos e contribuindo para sua prosperidade econômica, ainda assim essas organizações são vistas como frágeis (BATTILANA; LEE, 2014).

Os principais riscos presentes nesse tipo de organização são as tensões internas que colocam o desvio de sua missão como um risco muito presente, devido à dificuldade de se manter objetivos incompatíveis em equilíbrio (lucro e impacto social) (PACHE; SANTOS, 2015). Devido às peculiaridades de cada organização é necessário adaptar seus sistemas de gestão, governança, desenvolvimento de pessoas, desenho de estruturas para que se possa dar conta dos desafios que cada organização encontra em sua realidade (BATTILANA; LEE, 2014). Fica presente o questionamento de quanto esse cuidado muda quando falamos de organizações “normais”, ou seja, não deveriam todas as empresas estar atentas para se adaptarem aos desafios específicos que encontram em suas realidades?

Como destacam Battilana e Lee (2014), o avanço na compreensão desta temática tende a contribuir com todos os tipos de negócios, já que cada vez mais as organizações estão sendo obrigadas a abraçar objetivos múltiplos e potencialmente competidores entre si. Seja pela adoção de práticas de RSC, pela adoção de metodologias de gestão e governança menos centralizadoras, ou ainda por uma expectativa de que as organizações comecem a transferir seu foco do retorno dos sócios (shareholders) para contemplação das necessidades das partes envolvidas (stakeholders).

Durante o século 20, negócios comerciais, organizações públicas e de caridades adotaram formas distintas de se organizar. Nas últimas 3 décadas, no entanto, os limites entre essas formas e seus setores correspondentes passaram a ficar cada vez mais nebulosos. (Battilana, Lee, Walker, & Dorsey, 2012; Billis, 2010; Weisbrod, 1998).(BATTILANA; LEE, 2014, p. 398, tradução nossa)

Essa mistura de combinação de múltiplas formas organizacionais são foco de desordem, e potencialmente de criatividade e inovação (HAVEMAN; RAO, 2006). As invenções são permutações do contexto, todas as formas organizacionais independentemente de quão novas possam parecer são derivações de formas já existentes.

A multiplicidade de formas e influências criam desafios únicos para a sustentabilidade dessas organizações, gerando uma multiplicidade de tensões internas. Construir um senso de identidade híbrida entre os membros da organização é particularmente desafiador quando há a combinação de objetivos de negócio e sociais em sua missão (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014). Essa tensão
se faz presente nas atividades individuais de cada colaboradora, porém sobretudo na definição da alocação de recursos limitados entre as atividades comercial e social (MOIZER; TRACEY, 2010).

Poderiam as Organizações Híbridas usar essas tensões em seu processo de evolução conseguindo combinar múltiplas formas de maneira sustentável? (HAIGH et al., 2015)

Battilana e Lee (2014) sugerem a utilização do conceito do “organizar híbrido”, entendendo-o como um processo de construção e não como a adequação a um modelo já conhecido, as autoras propõem um olhar de como as atividades, estruturas, processos e significados pelos quais as organizações criam sentido e combinam os aspectos de múltiplas formas organizacionais.

Segundo as autoras, o organizar híbrido está presente em 5 (cinco) áreas chave da vida organizacional: 1) atividades organizacionais centrais; 2) composição da força de trabalho; 3) design organizacional; 4) relações interorganizacionais; 5) cultura organizacional. Descrevo na sequência essas cinco áreas:

  1. Atividades organizacionais centrais:
    1. As Organizações Híbridas correm um risco constante de perder o foco duplo de sua atividade e centralizar-se em uma delas, normalmente devido às pressões de sustentabilidade financeira a atividade comercial tende a ser mais privilegiada com o objetivo de manutenção da organização;
    2. Quanto menos integradas são as atividades sociais e comerciais maior o risco dessa desconexão (mission drift) ocorrer, forçando uma ruptura da alocação dos recursos humanos, financeiros e atencionais. Atividades comerciais segregadas das atividades sociais podem forçar uma situação de paradoxo onde atender uma parte da missão significa falhar em servir a outra parte (BATTILANA; DORADO, 2010);
    3. Da mesma forma, quanto mais conectadas as atividades que geram recursos para a organização e compartilham custos com as atividades sociais menor a tensão interna pois as atividades não competem pelos recursos escassos, ao contrário se beneficiam dessa conexão (HAIGH et al., 2015). Ainda assim, mesmo em organizações com essas características há riscos no desvio de missão como relatado em organizações de micro finanças (BATTILANA; DORADO, 2010).

Entre os fatores que influenciam essa queda de braço constante, as colaboradoras da organização desempenham um papel chave de criar sentido para as mudanças constantes e no equilíbrio da dicotomia em suas tomadas de decisão do dia a dia.

  1. Composição da força de trabalho:
    1. Battilana e Dorado (2010) fazem uso do conceito de Bourdieu (1977) de socialização para explicitar as pessoas são influenciadas por suas experiências profissionais e de formação (treinamentos). Influenciando e moldando sua visão de mundo, de forma a ser um obstáculo quando objetivos financeiros e sociais precisam coexistir;
    2. Pela dificuldade de se preencher seus quadros com “pessoas híbridas”, as Organizações Híbridas precisam criar condições para que pessoas de cada um dos setores sejam capazes de trabalhar em conjunto e contribuir para o atingimento dos objetivos organizacionais;
    3. O alinhamento entre identidade individual e organizacional tende a melhorar o compromisso organizacional, ajudando no alcance dos resultados esperados (PRATT; FOREMAN, 2000). Quando a organização espera que as colaboradoras se engajem com a orientação para o negócio tanto quanto a social, é possível que enfrentem dificuldades quando uma colaboradora se identifica mais com uma do que com a outra.
    4. Há, portanto, uma necessidade presente da organização criar espaço para o indivíduo ao mesmo tempo que também tem o desafio de ajudá-lo em sua preparação para equilibrar essa dualidade em algum momento, pois organizações que mantém as atividades sociais desconectadas de sua atividade comercial tendem a ter maior dificuldade de manter sua missão híbrida.
    5. No processo de desenvolvimento de suas colaboradoras a pessoa gestora tem uma influência definitiva. Em sua atividade essa pessoa tem o desafio de aproximar esses “dois mundos”, reforçar a cultura e missão da organização deixando espaço para que as colaboradoras não sejam oprimidas por uma imposição. Essa capacidade é mais presente em pessoas gestoras pluralistas, que abraçam a natureza híbrida da organização (BATTILANA; DORADO, 2010).

 

[…] a influência dos gestores sobre a identificação dos colaboradores com a organização é mais forte quando há a presença de certas práticas, incluindo o desenvolvimento integrativo de soluções, remoção de referências ideológicas explícitas, e a construção e reforço das rotinas que afirmam a ideologia sem fazer referência direta a elas. Quando possível, a presença de indivíduos híbridos pode também ajudar a diminuir o risco de ambiguidades organizacionais que podem resultar de algumas características serem correlacionadas em indivíduos, criando condições para conflitos intraorganizacionais. (BATTILANA; LEE, 2014, p. 416, tradução nossa)

  1. A depender do histórico profissional as novas colaboradoras precisam ser capazes de desaprender hábitos e crenças para que sejam capazes de se adequar a forma de trabalho da organização. Nesse processo é fundamental o papel do processo seletivo, assim como treinamentos, sistemas de incentivos e controles como meio de desenvolver profissionais híbridos capazes de equilibrar a ambiguidade em suas tomadas de decisão entre “negócios e caridade” (BATTILANA; LEE, 2014).
  2. Pode-se adotar diferentes estratégias em suas abordagens de contratação, desde a busca por colaboradoras que tenham a capacidade e disposição de abranger as dimensões sociais e comerciais, como também pode-se separar candidatas com perfis distintos que tenham capacidades complementares e de colaboração para expressarem de forma coletiva ambas as dimensões.
  3. Processo seletivo é altamente relevante, é proporcional ao nível de integração destas dimensões e quanto que organização e colaboradoras precisaram se engajar nelas diariamente, veremos agora a importância do design organizacional na definição dessa integração.

     

  1. Design Organizacional

Design organizacional pode ser entendido como a forma em que as lideranças da organização traduzem a estratégia em ação. Essa sessão é formada por três partes: a) estrutura organizacional formal; b) Sistemas de incentivo e controle; e c) governança.

  1. Estrutura organizacional formal

A estrutura organizacional define se as atividades comerciais e sociais serão desempenhadas pelas mesmas pessoas ou compartimentalizadas em subunidades. Se as atividades serão perfeitamente integradas a separação estrutural não se faz necessária, mas quando são atividades separadas a organização precisa de clareza da independência de cada uma dessas estruturas e seus pontos de contato, assim como as atividades de coordenação entre as distintas unidades (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

Situação similar é encontrada em organizações que utilizam a lógica de ambidestria em seus processos de inovação e/ou aprendizagem organizacional, requerendo coordenação entre as diferentes unidades que tem diferentes objetivos.

Quando há dúvida sobre quem está sendo servido (cliente vs comunidade), a organização pode optar por uma compartimentalização temporária para evitar que as equipes entrem em uma experiência de reflexividade paradoxal, com efeitos possíveis de paralisia e/ou desmobilização da força de trabalho(BATTILANA; DORADO, 2010).

 

  1. Incentivos e sistemas de controle

Sistemas de controle e incentivo irão ditar como os comportamentos e resultados serão medidos e recompensados. São também uma expressão de como a organização consegue ou não fazer um link entre sua missão comercial e social (BACH; EDWARDS, 2013).

Esses sistemas são usados para ensinar e reforçar comportamentos e valores desejados para as integrantes da organização. Podendo contribuir para uma compreensão compartilhada de como os múltiplos objetivos são conjuntamente avaliados e recompensados. São expressão dos valores da organização e uma forma de acompanhar resultados e necessidades de ajustes de processos ou de processos de tomada de decisão e/ou governança.

  1. Governança

A governança, juntamente com a estrutura e os sistemas de controle e incentivo são ferramentas fundamentais para garantir que o compromisso com ambas as agendas (social e econômico) será mantido. Resistindo ou se adaptando as necessidades e pressões para tender para um dos lados as custas do outro.

A estrutura de governança e o papel do board será distinto a depender do nível de integração e riscos de desequilíbrio do papel híbrido da organização.

  1. Relações Inter organizacionais

A aproximação entre organizações é mais comum em modelos de negócio “compre um, doe outro”. Organizações híbridas podem desenvolver relações de terceirização e parceiras com a finalidade de realizar sua missão. Tais estruturas são mais comuns em organizações onde o cliente compra um produto e automaticamente outro produto é doado a uma pessoa com em necessidade, exemplos de modelos de negócio desse tipo são as empresas Warby Parker que doa um par de óculos para uma pessoa em necessidade em um país subdesenvolvido. O mesmo modelo de negócios é adotado pela Tom´s Shoes, porém com calçados. Para viabilizar a logística e atendimento aos critérios dos beneficiados para a entrega dos produtos essas organizações firmam parcerias com organizações locais (BATTILANA; LEE, 2014).

 

  1. Cultura organizacional

A cultura organizacional é a expressão de quais atividade e como as pessoas as desempenham, ativando o design organizacional, a interação entre as integrantes da organização, definindo e reforçando padrões de valores, comportamentos e crenças que constituem a cultura organizacional (BATTILANA; LEE, 2014). As protagonistas destacam o fator da cultura na forma como as colaboradoras significam suas experiências e consequentemente influenciando na capacidade de constituir e manter uma organização hibrida.

Sendo o desenvolvimento da cultura um processo emergente e contínuo, o papel das lideranças é de fundamental importância. Seja pelo exemplo, pela influência direta que podem exercer no comportamento de suas equipes, ou ainda pela possibilidade de mudar os sistemas e símbolos que influenciam a cultura (BATTILANA; LEE, 2014).

A liderança em Organizações Híbridas tem um desafio específico, distinto das lideranças presentes em outras organizações. Essencialmente a presença constante de um paradoxo entre direções potencialmente opostas nos objetivos organizacionais (comercial e social). Sendo o papel esperado destas lideranças a capacidade de encontrar sinergias entre estes caminhos e influenciar e inspirar as integrantes da organização neste processo de construção de sentido (BATTILANA; LEE, 2014). É também um desafio das lideranças entender e agir quando é necessário fazer um processo de separação das atividades.

A hibridização das organizações e sua manutenção requer o delicado equilíbrio entre as duas lógicas/objetivos (BATTILANA; DORADO, 2010). O caminho recomendado para essa construção é através da definição das atividades organizacionais, das políticas de contratação e socialização, de métricas de sistemas de acompanhamento de resultados e desempenho e da construção e evolução de uma cultura organizacional habilitante desta organização (SANTOS; PACHE; BIRKHOLZ, 2015).

 

 

Figura 14 – Dimensões do organizar híbrido

Fonte: Adaptado de Battilana, Lee (2014).

 

No entanto, para essa construção as organizações híbridas não podem se apoiar em modelos prontos, pois o modelo híbrido não é sobre aplicar um plano pré-definido, mas sim construir um modelo adaptado e adaptando-o aos desafios presentes. E essa construção se dá através da aceitação das contradições, da desconstrução do ideal de um mundo controlado onde cada sinal de problema tem uma melhor solução a ser aplicada.

A construção das Organizações Híbridas se dá de forma orgânica, adaptativa e incluindo as diferentes partes interessadas na definição, experimentação e aprendizagem pela prática. No capítulo seguinte vamos explorar o referencial teórico adotado nesta tese, no primeiro momento mostrando suas conexões com as abordagens baseadas em prática para em seguida apresentar a Teoria da Atividade Histórico-Cultural.

  1. LENTE TEÓRICA

 

RESUMO PARA LEITORAS NÃO ACADÊMICAS:

 

A Teoria da Atividade é uma forma fascinante de entender como as pessoas interagem com o mundo ao seu redor e como isso influencia seu aprendizado e desenvolvimento. Essa teoria propõe que nossas ações não são isoladas, mas fazem parte de uma atividade maior que é guiada por um Objeto ou Motivo (ENGESTRÖM, 2001).

Imagine que você esteja preparando um jantar para amigos. Cozinhar a refeição, arrumar a mesa, escolher a música – todas essas são ações que fazem parte da atividade maior de ‘organizar um jantar’. E essa atividade é impulsionada por motivação de proporcionar uma noite agradável para seus amigos (ENGESTRÖM, 2001).

Um aspecto importante da Teoria da Atividade é o papel das contradições. Contradições são conflitos ou tensões que surgem dentro de uma atividade. Voltando ao exemplo do jantar, uma contradição pode surgir se você perceber que não tem todos os ingredientes necessários para a refeição que planejou. Mas essas contradições não são necessariamente ruins – na verdade, elas são vistas como oportunidades para aprendizagem e desenvolvimento (ENGESTRÖM, 2001).

Isto nos leva à ideia da ‘aprendizagem expansiva’. Segundo a Teoria da Atividade, quando nos deparamos com uma contradição, somos impulsionados a encontrar novas soluções. Este processo de ‘expandir’ nosso conhecimento e habilidades é o que a teoria chama de aprendizagem expansiva (ENGESTRÖM, 2001).

A utilização da Teoria da Atividade pode ajudar na compreensão de situações em que é necessário entender os processos e sistemas que estão influenciando o comportamento das pessoas, e dessa forma ajuda-las a transforma-los para que o Objeto, ou motivo, da Atividade possa ser alcançado (VIRKKUNEN; KUUTTI, 2000).

No entanto, a Teoria da Atividade não é uma solução mágica para todos os problemas. Ela tem suas limitações. Por exemplo, ao olhar para os sistemas e os padrões de comportamento dos grupos, ela não é a melhor lente para se observar as pessoas. Da mesma forma, para estudos que se interessam pelas relações de poder e de influência dentro de um grupo, ou sistema, a Teoria da Atividade não é a melhor opção (ENGESTRÖM, 2001).

A Teoria da Atividade é uma ferramenta útil para entender como agimos e aprendemos. Ela nos ajuda a reconhecer que nossas ações são parte de atividades maiores, e que contradições e desafios podem ser oportunidades para crescimento e desenvolvimento.

 

 

TEXTO ACADÊMICO

 

  1.  
  2.  
    1. Um olhar sobre a CHAT e sua história:

 

A CHAT tem seu surgimento na década de 20 no campo da psicologia a partir do trabalho de Lev Semenovich Vygotsky, tem um segundo impulso significativo a partir dos estudos de Leontiev, e a corrente que será explorada nesse trabalho tem Engeström como a principal referência e responsável pelas proposições que serão expostas e discutidas.

Tendo sua origem na psicologia da educação a CHAT baseia-se no entendimento de que o desenvolvimento psicológico do indivíduo tem constante e determinante influência das interações dele dentro dos contextos históricos e culturais com os quais este interage (VYGOTSKY, 1978).

Vygotsky no início do século XX busca em Marx o conceito de trabalho/atividade e o materialismo histórico para fazer o seu rompimento epistemológico com o materialismo mecanicista e o idealismo. Apoia-se primeiro em Marx com relação ao processo de florescimento da consciência a partir da atividade prática dos sujeitos, e depois em Rubinstein em declarar que os processos mentais e a consciência tem na prática da atividade não apenas sua manifestação mas também seu impulso, ou seja se formam a partir dela (PICCOLO, 2012).

Piccolo (2012) explica que em seu processo de construção teórica, Vygotsky se opõe ao dualismo vigente no campo da psicologia entre a psicologia subjetiva e a objetivista. Ambas as correntes não eram capazes de explicar a relação entre homem e realidade pois ignoravam os mediadores. Para ele é justamente a presença de signos ou ferramentas mediadoras que propiciam ao humano o aparecimento de “funções psíquicas superiores”.

Na Teoria da Atividade a relação é dialética, não mecânica, a partir do momento em que a atividade é criada por necessidades presentes na esfera cotidiana. Pode se descrever este processo recursivo da seguinte forma: contato com objeto; conversão do objeto em motivo de nova atividade, e por conseguinte, novas necessidades emergentes (PICCOLO, 2012). É por meio da atividade que os seres humanos desenvolvem suas capacidades, personalidade e consciência, transformam suas condições sociais, resolvem contradições, geram artefatos que transformam a cultura, e criam novas formas de viver e de ser (SANNINO; HARRY; KRIS D., 2009).

 

  1. As três gerações da CHAT

 

PRIMEIRA GERAÇÃO – AÇÃO INTERMEDIADA POR ARTEFATO

A primeira geração da teoria da atividade está centrada no trabalho de Vygotsky e está apoiada na ideia de mediação cultural da atividade, também conhecida pela tríade composta por sujeito, objeto e artefato mediador que representam a atividade mediatizada entre o homem e a realidade objetiva (ENGESTRÖM, 2001).

Atividade não pode ser entendida fora do contexto sociocultural: Vygotsky expande a análise, do indivíduo para a Atividade, que engloba os aspectos histórico-culturais e defende que a Atividade (conjunto de ações realizadas para alcançar um objetivo), não pode ser entendida fora de contexto sociocultural (PICCOLO, 2012).

Atividade tem um motivo amplo e muitas vezes abstrato, uma ação é um passo ou uma tarefa específica para atingir o objetivo de uma atividade. Por exemplo, a Atividade de preparar uma refeição, pode ter uma ação de cortar legumes(ENGESTRÖM, 2001).

Os artefatos, não apenas auxiliam na realização de uma atividade ou ação, mas também moldam a forma como a realizamos, no exemplo anterior o tipo da faca pode determinar como iremos cortar os legumes (ENGESTRÖM, 2001).

Portanto, artefatos são carregados de informação, conhecimento e história, que podem influenciar direta ou indiretamente a atividade (ENGESTRÖM, 2001).

 

Figura 15 – Primeira geração da teoria da atividade


Fonte: Engeström (2001).

 

Esta tríade nos permite estabelecer as relações essenciais para a compreensão da teoria, sendo importante conhecer a definição de cada um de seus elementos. Há uma evolução histórica nos conceitos de Vygotsky depois contribuições de Leontiev e Engeström contempladas nas definições dos elementos a seguir:

Sujeito – nesta proposição da Teoria da Atividade a unidade de análise é feita no âmbito individual, não havendo a integração da mediação de outros indivíduos e suas relações sociais (ENGESTRÖM, 2001). Leontiev contribui para a expansão do conceito de atividade e o sujeito passa do âmbito individual para o coletivo.

Artefato – após a inserção do artefato cultural e o rompimento do dualismo cartesiano entre indivíduo e sociedade, não era mais possível enxergar o indivíduo sem a influência da cultura e seus meios e, da mesma forma, a sociedade não pôde mais ser entendida sem a agência dos indivíduos que usam e produzem artefatos. Objetos se tornaram entidades culturais e a ação orientada a objeto passa a ser chave para o entendimento da psique humana (ENGESTROM, 2014).

Objeto – A definição de objeto é um desafio a depender da época e do autor, vamos tratar com quatro princípios fundamentais: a) o motivo, a existência de um objeto está relacionada a uma necessidade existente na sociedade. Assim as pessoas se envolvem em atividades coletivas para produzir objetos, satisfazer necessidades e desenvolver uma atividade; b) objeto é epistêmico e objetivo, a transformação é mental e discursiva ao mesmo tempo que objetivada por humanos e artefatos; c) objeto em constante mudança, está sempre em negociação pois é invisível em sua totalidade pelos participantes e d) objeto só pode ser alcançado de forma coletiva, individual e coletivo são vistos de forma dialética, para se compreender o coletivo é necessário levar em conta as ações individuais (QUEROL; CASSANDRE; BULGACOV, 2014).

Os Sistemas de Atividade são processos coletivos orientados ao objeto. O Objeto da Atividade é entendido como a finalidade do Sistema de Atividade, este por sua vez sofre a agencia de Sujeitos e é mediado por Artefatos, ou seja os artefatos possuem papel central (de mediação) na forma como os seres humanos interagem com a realidade, entendimento originado em Vygotsky (ENGESTROM, 2014).

É também através do conceito de mediação que Vygotsky cria o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal concebida como a distância entre o nível atual de desenvolvimento da criança, e o nível de desenvolvimento relativo a capacidade de solucionar problemas apoiado por pares com maior capacidade (ENGESTROM, 2014). Esse conceito também será expandido na proposição de Engeström para aprendizagem.

 

SEGUNDA GERAÇÃO – ATIVIDADE COMO UNIDADE DE ANÁLISE

Leontiev parte do legado de Vygotsky, Rubinstein e Marx para junto com o grupo de Kharkov inspirar a construção da segunda geração da Teoria da Atividade. Tirando o foco no indivíduo, Leontiev mostra como a evolução histórica da divisão do trabalho se reflete na diferenciação entre uma ação individual e uma atividade coletiva. No entanto, suas proposições não foram expressas de maneira gráfica e os estudos na União Soviética se restringiam a aplicação no processo de aprendizagem de crianças, aspectos relacionados a contradições das atividades eram assuntos bem delicados de serem tratados (ENGESTROM, 2014).

Hierarquia da Atividade: as limitações da primeira geração foram superadas com o entendimento da atividade coletiva no modelo analítico dando forma ao sistema de atividade. Podemos destacar três aspectos chave no trabalho de Leontiev, no que se refere a influência na segunda fase da CHAT. Primeiro é sua proposição hierárquica da atividade, relacionando atividade/motivo, ação/objetivo, operação/condições. O segundo é o sistema de atividade como unidade central de análise. E finalmente, o foco no objeto e motivo, a compreensão de que o objeto é o real motivo da atividade.

Para explicar a gênese histórica de como a atividade passou a ser constituída por uma série de ações, Leontiev usa o exemplo de um grupo caçando, onde um dos indivíduos é responsável por espantar a caça (batedor), de forma orquestrada e intencional para determinada direção, onde o resto do grupo terá maiores chances de sucesso na atividade (caça). Sob o ponto de vista da ação, essa é uma ação irracional, pois o batedor não será capaz de alcançar o animal e o abater, porém nas relações coletivas entre batedor e o restante do grupo a ação se justifica (DUARTE, 2003).

Atividade é dirigida norteada pelo objeto que tem um motivo inerente. A ação por objetivos, a forma como uma ação é realizada se chama operação. A operação é relacionada a condições que nem sempre são realizadas de forma consciente pelo sujeito. Finalmente, artefatos (ferramentas) são operações cristalizadas (padronizadas) (ENGESTROM, 2014).

A divisão do trabalho ao mesmo tempo que possibilitou os avanços extraordinários atingidos pela civilização, também distanciou o sujeito da construção de sentido de sua atividade laboral (DUARTE, 2003), o sentido e o motivo andam juntos, o sentido em âmbito da ação/individual e o motivo/coletivo no âmbito da atividade (ENGESTROM, 2014). Esse aspecto é constituidor e constituinte das dificuldades no processo de aprendizagem (que para Vygotsky e Engeström) está diretamente relacionada ao desenvolvimento, ou seja, uma aprendizagem que é capaz de criar novos instrumentos/artefatos indo do específico para o genérico (ENGESTROM, 2014).

A relação entre o objeto de cada ação e o motivo que justifica a atividade ficam interrelacionados. Também se justifica o significado da ação realizada pelo sujeito e o seu sentido. “O significado de uma ação diz respeito ao conteúdo da ação. O sentido dela diz respeito às razões, aos motivos pelos quais o indivíduo age.” (DUARTE, 2003, p. 286). Dessa forma o indivíduo trabalha com ações mediatizadas, neste caso não há relação direta entre a fome e a ação de espantar a caça, esta só se justifica pela ação do coletivo de caçar organizada em ações complementares (DUARTE, 2003).

Desconexão entre ação e atividade, contradição primária do capitalismo: Leontiev desvela a desconexão, em nossa sociedade capitalista, entre o significado do trabalho e o sentido dessa ação para o operário. O indivíduo trabalha em uma indústria, seu trabalho tem o significado de produzir um produto, porém devido a venda de sua força de trabalho o sentido da ação é receber o salário, o valor de troca de seu produto (commodity) que pode
vender, sua força de trabalho. Assim é possível a desconexão entre o significado e o sentido do trabalho (DUARTE, 2003). Esse, no entendimento de Leontiev, passa a ser a contradição básica dos Sistemas de Atividade, assunto que será abordado mais adiante.

Não existe atividade sem um objeto: A atividade é orientada a um objeto e o objeto é o real motivo da atividade, podendo ser material – humano ou não humano (um produto ou um paciente) – ou abstrato como uma teoria em desenvolvimento. Objeto é entendido na Teoria da Atividade como a coisa, ou projeto que as pessoas estão trabalhando para transformar, de forma coletiva e distribuída (BLACKLER; REGAN, 2009).

A atividade é sempre coletiva: Podemos falar da atividade do indivíduo, mas não de uma atividade individual, ações são individuais não atividades (ENGESTROM, 2014). Blackler e Regan (2005, p.164) explicam: “A teoria da atividade conceitualiza intenção coletiva e agência distribuída através dos termos ‘sistema da atividade’ e ‘objeto da atividade’. A CHAT segue uma abordagem dialética para a conceitualização da prática, que sugere uma abordagem para a intervenção.”

Objeto é mais que um objetivo ou um produto: São preocupações constantes que carregam motivos intrínsecos, geradores de atenção, esforço e significado. O objeto e o motivo dão coerência e continuidade a ação e ao mesmo tempo, por serem internamente contraditórios, geram uma instabilidade no Sistema de Atividade. Sendo assim a identificação de contradições no sistema de atividade ajuda os sujeitos a trabalharem nas causas do problema. Esse olhar colaborativo é necessário para que se possa criar uma visão compartilhada, fundamental, para a construção de uma solução expansiva das contradições (ENGESTROM, 2014).

Teoria da Atividade é o estudo do desequilíbrio: o sistema de atividade supre uma necessidade dos estudos baseados em prática em criar uma nova unidade de análise orientando o estudo ao objeto, coletivo e culturalmente mediado pela atividade humana (ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999). As ações ocorrem em contextos de constante desequilíbrio e desenvolvimento, desenvolvimento esse que molda, e é moldado, pelas ações que ocorrem (ENGESTRÖM, 2001).

Sistema de Atividade é multivocal: quer dizer que o Sistema de Atividade é composto pelo coletivo através das suas múltiplas vozes. Essa multiplicidade, ou diversidade de pontos de vista traz riqueza para a forma como o Sistema de Atividade é constituído e sustentado ao longo do tempo. A diversidade reconhecida na multivocalidade é em sua natureza uma característica desestabilizadora do sistema. Pois, a todo momento está sendo influenciada pelo ambiente e potencialmente contestando a forma estabelecida (ENGESTROM, 2014).

Multivocalidade é o motor do desenvolvimento: as contradições em sistemas de atividade são vistas como motores de mudança e desenvolvimento. As diferentes “vozes” podem apresentar contradições no sistema de atividade, as quais podem levar a mudanças e transformações quando resolvidas. Portanto, a multivocalidade é vista não apenas como uma característica do sistema de atividade, mas também como uma fonte potencial de evolução.

Contradições são fortaleza: as contradições internas e os debates são a fortaleza da teoria da atividade, justamente por seu caráter multivocal. Porém, para que se possa usufruir desse potencial é necessário que se construa um entendimento compartilhado do caráter da célula (ideia inicial), e uma busca por elucidar qual é a origem/raiz dessa célula, seguido de sucessivos passos de mediação para construção de um conceito em torno da célula (ENGESTRÖM, 2001). Ou seja, a evolução de um sistema de atividade requer um cultivo e apreciação das contradições do próprio sistema por seu coletivo.

Aprendizagem Expansiva é resolver contradições: na CHAT a resolução das contradições, ou evolução do Sistema de Atividade é entendido como o processo de Aprendizagem Expansiva. O desenvolvimento ou aprendizagem expansiva é visto como a resolução das contradições internas do sistema, por isso as contradições não devem ser sufocadas pois são conflito e possibilidade de evolução ao mesmo tempo (ENGESTROM, 2014).

O Sistema da Atividade, tem a intenção de, a partir de seus seis elementos básicos (sujeito, artefato, objeto, regras, comunidade e divisão do trabalho), servir de modelo analítico para a atividade humana (ENGESTRÖM, 2001). Os três primeiros elementos já foram descritos (Figura 15), seguimos para os três elementos adicionados na segunda geração.

Regras – são moldadas de forma implícita ou explicita, podendo ter a forma de convenções, combinados, contratos, leis, manuais que interfiram e interajam com o sistema de atividade;

Comunidade – é a representação dos indivíduos que estão envolvidos com o mesmo objeto, em terminologia atual podemos fazer um paralelo com stakeholders;

Divisão do trabalho tem duas características importantes de se levar em consideração, a primeira relacionada ao conceito de objeto/motivo e a influência no sentido do trabalho para os sujeitos, a segunda relacionada a divisão do trabalho entre as integrantes da comunidade (ENGESTROM, 2014).

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Figura 16 – Segunda geração da teoria da atividade

Fonte: Engeström (2001).

 

O sistema da atividade pode ser entendido como Figura 16, tendo os seis elementos interagindo entre si onde há sujeitos em interação com a comunidade atuando para a transformação do objeto, mediados por artefatos. As relações do sistema são regidas pelas regras que motivam e impedem determinadas ações, e finalmente a divisão do trabalho distribui as tarefas entre as integrantes da comunidade, assim como as divisões verticais de status e poder. Blackler explica da seguinte forma:

Objeto da atividade são parcialmente dados e parcialmente emergentes, Engeström sugere: a) a relação entre indivíduos e o objeto da atividade são intermediadas por conceitos e tecnologias; b) as relações entre comunidade e o objeto são mediadas pela divisão do trabalho; e c) as relações entre os indivíduos e as comunidades das quais são parte são mediadas por regras e procedimentos. Compondo uma co-relação entre o material, mental, social e cultural para a reflexão e para a ação (BLACKLER; CRUMP; MCDONALD, 2000, p. 281).

 

 

Quadro 4 – Estrutura hierárquica da atividade e níveis de funcionamento em sistemas de atividade

Sujeito

Artefato

Objeto

Comuni-dade

Regras

Div. do trabalho

Níveis sistemas de atividade

Coletivo

Metodo-logia ideologia

Nós no mundo

Redes societais de atividade

Societal (estado, regras, religião)

Div. societal do trabalho

Atividade

Individual

Modelos

Problemas em tarefas

Organização coletiva

Regras organizacionais

Div. do trabalho organizacional

Ação

Não consciente

Ferra-mentas

Resistência

Primeiro grupo imediato

Regras interpessoais

Div. trabalho interpessoal

Operação


Fonte: adaptado de Engeström (1987, p. 154).

 

TERCEIRA GERAÇÃO – REDES DE SISTEMAS DE ATIVIDADE

Com a popularização da teoria, as críticas também ganharam força e dentre elas os aspectos de diversidade e diálogo entre diferentes tradições foram expostos enquanto uma lacuna importante. São justamente estes desafios que a terceira geração da teoria tenta dar conta ao desenvolver ferramentas e um olhar para as redes integradas de sistemas de atividade, diálogo e múltiplas realidades e vozes. Neste formato de pesquisa, o modelo é expandido para que se possa integrar ao menos dois sistemas de atividade em interação (ENGESTROM, 2014).

 

Figura 17 – Terceira geração da teoria da atividade

Fonte: Engeström (2001)

 

A terceira geração opera o compartilhamento de objetos entre os sistemas de atividade, tratando assim de múltiplos sistemas de atividade, e suas interrelações. Os sistemas estão interconectados, e possuem seus objetos fragmentados, ou parcialmente compartilhados (ENGESTRÖM, 2008).

Em sua proposição Engeström situa o sistema da atividade como unidade de análise. Dessa forma os artefatos culturais assumem a centralidade da atividade coletiva, o objeto compartilhado da atividade é teorizado como um projeto coletivo que por sua vez é estabilizado pelas ferramentas, signos e procedimentos de um sistema de atividade. A mesma abordagem é usada em estudos de múltiplos sistemas de atividade em interação, que compartilham objetos de atividade (BLACKLER; REGAN, 2009).

 

 

 

 

 

  1. Princípios da teoria da atividade

 

Engeström (2001 p. 136) organiza a CHAT em cinco princípios, porém o quarto item necessita de maior detalhamento, este contém as questões relativas as contradições que são fundamentais para o quinto princípio:

  1. Sistema de Atividade (SA) é a unidade de análise: a unidade de análise primária é de um Sistema de Atividade, que deve ser coletivo, mediado por artefatos e orientado ao objeto. Ele é visto de forma relacional com outros sistemas em uma rede de atividade. Os sistemas de atividade se constroem e reproduzem através da geração de ações e operações;
  2. SA é multivocal: sistema de Atividade tem múltiplas vozes. O sistema é composto por uma comunidade com múltiplos pontos de vista, tradições e interesses. A divisão do trabalho no sistema cria diferentes posições para as participantes, os sujeitos carregam suas histórias e o sistema carrega múltiplas camadas em suas regras, artefatos e convenções. As vozes múltiplas, são aumentadas quando olhamos para as redes de Sistemas de Atividade em interação. Requerendo movimentos de tradução e negociação, sendo ao mesmo tempo uma fonte de problemas e de inovação;
  3. SA é um processo histórico: sistemas de atividade tomam forma e são transformados durante longos períodos. Seus problemas e potenciais só podem ser entendidos quando confrontados com sua história. A história precisa ser entendida como a história local da atividade e dos objetos, assim como a história teórica das ideias e das ferramentas que forjaram a atividade.
  4. Contradição é um conceito central: o quarto princípio posiciona as contradições como ingrediente central de mudança e evolução. As contradições não são o mesmo que problemas e conflitos. Contradições são acumulações históricas de tensão estrutural dentro e entre os Sistemas de Atividade. A primeira e cerne das contradições na abordagem da CHAT é a contradição das atividades no capitalismo, contida no valor de uso e no valor de troca das commodities.

    Contradição primária: é um conflito dentro de um único “nó” do Sistema de Atividade.

    Contradições secundárias: são conflitos entre nós do Sistema de atividade.

    Contradições terciárias são ocasionadas pela adição de um elemento cultural mais avançado no sistema, causando conflitos em todos os elementos do sistema, no embate do antigo e do novo.

    Contradições quaternárias são ocasionadas pela contradição da atividade central com as atividades vizinhas, haverá nova estabilização do sistema quando as contradições quaternárias forem resolvidas (ver Figura 18).

 

Figura 18 – Contradições que podem ser apresentadas pelos sistemas de atividades

Fonte: Becker (2018)

 

Veremos esses conceitos aplicados na análise do campo na Seção 4.6. Essa leitura é similar a leitura das metodologias ágeis em mapear as tensões para poder evoluir através de experimentos (LEMAY, 2019).

  1. Aprendizagem expansiva é resultado da resolução de contradições: o quinto princípio aponta a possibilidade de uma transformação expansiva no Sistema de Atividade. Assim que as contradições de um sistema são agravadas, alguns sujeitos começam a questionar e se desviar das normas estabelecidas. Em alguns casos esse processo pode resultar em uma visualização coletiva e um esforço conjunto para mudar. Uma aprendizagem expansiva ocorre quando o objeto e o motivo da atividade são reconceitualizados para se adequar a um horizonte mais abrangente de possibilidades do que o sistema de atividade anterior. Um ciclo completo de transformação expansiva pode ser entendido como uma jornada coletiva pela zona de desenvolvimento proximal da atividade.

As contradições são mais que características inerentes do sistema de atividade, são elas que geram o movimento em que o desenvolvimento pode acontecer. Novos estágios da atividade tomam forma como uma solução para uma contradição do estágio anterior. Essa é a forma como a CHAT explica as inovações, um fenômeno que se torna universal começa como uma iniciativa individual, particular. Antes de uma nova forma se popularizar ela surge como um desvio de um padrão estabelecido, esse é o padrão da aprendizagem expansiva (ENGESTROM, 2014).

 

  1. Aprendizagem expansiva

 

A aprendizagem expansiva é peça fundamental na proposição da CHAT, ao fazer/explicar a conexão da evolução dos sistemas de atividade, construindo uma teoria de aprendizagem a partir dos aspectos histórico-culturais a uma mente humana que dialeticamente constrói a realidade (ENGESTRÖM, 2001). A teoria inspira-se no trabalho de Bateson (1972) ao se constituir a partir da ideia de múltiplas formas de aprendizado.

No livro Learning by Expanding (1987) Engeström exercita a teoria em três caminhos, a aprendizagem escolar, no trabalho e a aprendizagem com arte e ciência. Evidencia-se a maior aplicabilidade de suas proposições para a adolescência e idade adulta, quando as pessoas estão vivendo maiores momentos de contradição, tanto interna quanto em seus ambientes. A teoria se aplica muito bem para sistemas de atividade em transformação, Engeström e Sannino (2012) apontam a conexão entre a emergência da teoria e o momento histórico de rápidas mudanças especialmente nas áreas da produção, negócios e organizacional.

Apoiando-se na Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) de Vygotsky, a Aprendizagem Expansiva entende que as novas formas históricas de atividade social são construídas pelos indivíduos de forma coletiva, com intuito de solucionar contradições presentes em sua forma anterior(ENGESTROM, 2014). Sem desconsiderar o aspecto cognitivo a teoria propõe abarcar os aspectos cognitivos e culturais do processo de aprendizagem.

É por dois principais processos que a aprendizagem se dá na teoria da atividade: internalização e externalização. A internalização se dá quando o indivíduo produz sentido a partir das relações sociais, pensamentos e ações. A externalização é a construção de conhecimento executada por uma pessoa ou grupo. Quando a aprendizagem engloba ambos processos ela é chamada de expansiva (ENGESTROM, 2014).

Na aprendizagem expansiva se aprende algo que ainda não está lá, ou seja, são as pessoas/aprendizes que constroem o novo objeto, de forma coletiva e fazem a implementação. É sobre transformar os sistemas de atividade, criando novos padrões para os mesmos(ENGESTROM, 2014), vamos dar um mergulho teórico em 5 tópicos que relacionam a sua concepção com a teoria de Bateson:

  1. É em Bateson (1972) que Engeström apoia seus três níveis de aprendizagem: I, II e III. No nível I o aprendizado se dá apenas por repetição e memorização, ou seja, condicionamento. No nível II o indivíduo entende as regras e se torna capaz de aprende, o “aprender a aprender”. Já no nível três o indivíduo vai transformar sua forma de ver o mundo, uma mudança de consciência (este é um evento raro, que se produz pelas contradições do nível II da aprendizagem) (ENGESTROM, 2014).
  2. No nível I tanto o objetivo quanto o resultado são dados, assim como os instrumentos para se sair do ponto A e chegar no B. É corrigindo a forma como o indivíduo faz uso das ferramentas que se constitui o processo de aprendizagem. Neste ponto o artefato de intermediação se chama ferramenta, a ferramenta é uma operação roteirizada que ganha forma própria. O caminho da aprendizagem I é a repetição automatizada sem reflexão, aprender é construir uma operação não-consciente(ENGESTROM, 2014).
  3. O nível II pode ser descrito por um processo flutuante entre reflexão consciente e inconsciente. É uma oscilação entre dois modos de construir modelos e generalizações, é a capacidade de aplicação de um instrumento e de abstração dele. São definidos como dois aspectos, o aspecto de: a) reprodução e o de b) produção, que gera o uso por Engeström de Aprendizagem IIa e IIb, sendo a IIa a situação onde o objeto e objetivo são dados e a solução e construída por tentativa e erro, e o IIb é quando a solução é produzida/inventada (ENGESTROM, 2014).
  4. Se poderia entender que a aprendizagem IIb é expansiva, porém ela só é potencialmente expansiva, porque é limitado ao nível da ação e ainda não se tem certeza de que o contexto do problema é uma contradição da atividade. Na aprendizagem II o indivíduo é apresentado a um problema para sua resolução, na aprendizagem III o problema ainda não existe, ele precisa ser constituído(ENGESTROM, 2014).
  5. A aprendizagem III acontece para resolver as contradições apresentadas na aprendizagem II, o indivíduo, ou melhor, o seu self, é substituído pela busca de um objeto coletivo que seja capaz de representar a complexidade dos contextos, ou seja da divisão do trabalho, assim como as questões tecnológicas e mediações simbólicas. Esse tipo de aprendizagem é um esforço coletivo e muito raro de ocorrer, o objeto da atividade de aprendizagem expansiva é todo o sistema de atividade em que as pessoas estão envolvidos.(ENGESTROM, 2014).
  6. Para que a aprendizagem de nível II, se transforme em III as contradições precisam aparecer para que possam ser “tratadas”, ou seja que as pessoas criem modelos, nova organização de contexto mudando assim o objeto da atividade.

No processo de aprendizagem expansiva, são quatro os tipos de contradição possíveis:

  1. Contradição primária: á um problema localizado em um elemento do sistema de atividade;
  2. A contradição secundária é quando a contradição atinge mais de um elemento;
  3. Contradições terciárias, são resultantes da implementação de uma modificação do Objeto da Atividade;
  4. E as quaternárias, são resultantes da influência dessa mudança no sistema da atividade, em outros sistemas da atividade interconectados.

Uma contradição primária e secundária pode ser resolvida sem que se mude o Objeto da atividade, talvez a adoção de uma nova tecnologia, ou a adaptação de uma regra seja o suficiente. Assim não seguindo o ciclo de desenvolvimento expansivo, e não resultando em contradições terciárias e quaternárias.

Caso as pessoas resolvam modificar o objeto, o reformulando de forma expandida inicia-se a fase de construção de um novo motivo, o próximo passo é sua implementação, na fase de aplicação e generalização. Neste momento novas tensões podem ser criadas dentro do sistema, essas são chamadas contradições terciárias.

 

Figura 19 – Ciclo de aprendizagem expansiva

Fonte: Cassandre (2014)

No Quadro 5, temos uma explicação da abordagem de pesquisa da CHAT. Na primeira coluna, temos questões focadas nos detalhes da prática. Perguntas como “O que as pessoas estão fazendo?” e “Como estão fazendo e com quem?” são essenciais para entender os ‘objetos da atividade’ que são o foco da prática e os fatores mediadores através dos quais são construídos. Além disso, as atividades são situadas culturalmente e mediadas, e elas envolvem uma divisão de trabalho dentro de uma comunidade. As atividades também são tensionadas, o que significa que os conflitos e as perturbações são motores do seu desenvolvimento.

A segunda explica as práticas no contexto do seu desenvolvimento histórico. Ela considera como as atividades evoluem ao longo do tempo, tornando-se mais complexas e independentes, com objetos da atividade se tornando mais abstratos e emergentes. Este eixo também considera a interação das atividades com outras atividades dentro de sistemas complexos e a natureza distribuída e descentralizada da expertise nesses sistemas.

 

 

 

Quadro 5 – Abordagem de pesquisa da CHAT 1/2

Abordagem de pesquisa da CHAT:


 

Estudo dos detalhes da prática

Estudo das práticas no contexto do seu desenvolvimento histórico

O que as pessoas estão fazendo?

O ‘objeto da atividade’ é fundamental para a análise teórica das práticas. Objetos da atividade são parcialmente dados e parcialmente previstos. São intimamente relacionados com os fatores mediadores através dos quais são construídos.

Ações são discretas, possuem início e fim claramente definidos e existem por um curto período. São orientadas a objetivos. As atividades são padrões complexos de práticas que suportam longos períodos. Atividades sugerem metas e fornecem motivos.

Como eles estão fazendo e com quem?

Atividades são culturalmente situadas e mediadas linguística e tecnologicamente. Elas são enactadas na comunidade e envolvem uma divisão de trabalho. Alguns fatores e suas interações são descritos como ‘sistemas de atividade’. Esta é a unidade de análise.

Atividades desenvolvem-se ao longo do tempo. Como uma tendência geral, os sistemas de atividade em organizações de trabalho parecem estar se tornando mais complexos e independentes, e os objetos mais abstratos e emergentes.

Como eles relacionam-se com outros, formados em diferentes sistemas de atividades.

Um grau de diferenciação interna é inevitável em sistemas de atividade de qualquer tamanho, mas organizações complexas podem facilmente se tornar segmentadas e fragmentadas. No entanto, mais do que analisar as organizações como sistemas únicos de atividade, é mais satisfatório analisá-las como redes de sistemas de atividades sobrepostos

A expertise em redes complexas de atividade é (necessariamente) distribuída, emergente e ‘descentralizada’, isto é, o curso de seu desenvolvimento não é, e não pode ser somente controlado pelo centro.

Qual é a natureza da aprendizagem coletiva?

Sistemas de atividades são sistemas produtores de tensões. Distúrbios entre e dentro dos sistemas são a força motriz de seu desenvolvimento.

Quando os sistemas de atividade se tornam mais fluídos e improvisados, as prioridades estabelecidas e as relações de poder são afrouxadas e podem ser reformadas.

Fonte: BLACKLER, CRUMP e MCDONALD (2000, p. 294)

 

O Quadro 6 é uma continuação do Quadro 5, só que focado em como a CHAT pode ajudar a melhorar o que a gente faz no dia a dia. Ele usa a Teoria da Atividade para nos fazer entender melhor o nosso trabalho e como a gente o faz. Ao analisar “Como a gente trabalha e com quem?”, a pesquisa estuda como nossas atividades mudam com o tempo. Ao questionar “Como a gente se relaciona com outros sistemas de atividades?”, a pesquisa busca entender como diferentes atividades se conectam e influenciam umas às outras. Por fim, a pergunta “Qual é a natureza da aprendizagem coletiva?” leva a discussões sobre possíveis desafios e conflitos no nosso trabalho, visando a melhorar nosso entendimento sobre como aprendemos juntos.

Quadro 6 – Abordagem de pesquisa da CHAT 2/2

Abordagem de pesquisa da TA:

  

Apoio ao desenvolvimento das práticas que estão sendo estudadas

O que as pessoas estão fazendo?

A pesquisa pode auxiliar as pessoas a tomarem consciência do objeto de sua atividade e do processo de construção do objeto.

Como eles estão fazendo e com quem?

A pesquisa pode explorar a natureza e a dinâmica de sistemas particulares de atividade e seu desenvolvimento.

Como eles relacionam-se com outros, formados em diferentes sistemas de atividades.

A pesquisa pode explorar a natureza variada das atividades (e as prioridades que elas implicam).

Qual é a natureza da aprendizagem coletiva?

A pesquisa pode desencadear discussões acerca de perturbações entre e dentro de sistemas de atividades e como estes são e, talvez, até respondê-las

Fonte: Blackler, Crump e Mcdonald (2000, p. 294)

 

Ainda que de forma um tanto acanhada identifico nesta fala um direcionamento para ação, a partir de suas capacidades e práticas a pessoa pesquisadora se coloca como multiplicador e possibilidade de ajudar as pessoas a transformarem “as realidades” a sua volta, Engeström se posiciona:

Esta abordagem implica em um localismo radical. A ideia é que as relações sociais fundamentais e contradições da formação socioeconômica dada – e assim o potencial para uma mudança qualitativa – estejam presentes em cada uma das atividades locais da sociedade. Espero que assim até mesmo as estruturas sociais locais mais impessoais, possam ser vistas como sendo constituídas por seres humanos completos com a ajuda de artefatos mediadores. Ainda que isso ocorra nos escritórios de políticos de alto escalão e em conselhos de grandes corporações ao invés dos chãos de fábrica e nas esquinas da cidade. Neste sentido, pode ser útil tentar olhar para a sociedade mais como uma rede multicamadas de sistemas de atividade interconectados e menos como estruturas piramidais rígidas e dependentes de um único centro de poder(ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999, p. 36).

Nem toda mudança é transformação: Dayydov (1999) fala sobre problemas não resolvidos da Teoria da Atividade, ele explica que nem toda mudança é transformação, para que assim o seja, se faz necessário criar as condições para que seja possível mudar o objeto internamente, expondo sua essência e a alterando. Pode-se olhar sobre dois aspectos para os processos de transformação, “mudar a ordem existente dos objetos” ou através do entendimento da origem do sistema “concretizar seu potencial interior”.

Nós, sociedade, podemos viver de forma que não agrida a natureza e a sociedade, porém é provável que não encontremos as condições necessárias para exercer a atividade desta forma nos sistemas que fazemos parte. Assim se faz necessário o entendimento histórico-cultural da realidade vivida para que se possa transformar o sistema de atividade de dentro para fora, expondo sua essência, e construindo coletivamente possibilidades para que o sistema possa concretizar seu potencial interior(DAVYDOV, 1999). É uma visão muito estreita acreditar que precisamos apenas entender, explicar e nos sentirmos em casa ao invés de transformar nossa realidade.

Na década de 90 a pesquisadora, consultora e rebelde Margaret Wheatley mergulhou na nova ciência, entrando pela porta de Fritjof Capra e seu ponto de mutação, lançou um livro chamado A Nova Liderança. Aproximando as fronteiras da ciência, com as práticas organizacionais e nosso impacto social e ambiental. Rodou o mundo falando sobre a mudança de paradigmas e a necessidade de assumirmos a fluidez e fragilidade da realidade vivida para que pudéssemos construir realidades mais humanas e sustentáveis, em seu prologo da edição de 2011 do livro ela diz:

 

Quando nossa visão de mundo não funciona mais e nos sentimos afundados em confusão, com certeza nos sentimos aterrorizados. De repente, perdemos o chão em que nos mantínhamos. Soluções que não funcionam mais. O mundo parece incompreensível e caótico, sem racionalidade. Nós respondemos a essa incoerência aplicando velhas soluções mais desesperadamente. Nos tornamos mais rígidos sobre nossas crenças. Nos apoiamos no hábito ao invés de criar novas respostas. Acabamos nos sentido frustrados, exaustos e sem poder frente a tanto fracasso. Essas frustrações e medos criam mais agressão. Tentamos fazer as coisas funcionarem através da força ao invés da inteligência e da colaboração.

Foi apenas quando os cientistas estiveram dispostos a aceitar sua confusão ao invés de fugir dela e apenas quando eles desafiaram as perguntas que eles estavam fazendo, só aí eles puderam descobrir os insights e formulações que os deram novas capacidades. Uma vez que este novo mundo foi reconhecido, cientistas se reconectaram ao seu trabalho com nova energia. Curiosidade, surpresa e o prazer da descoberta substituíram sua fadiga e frustração. Tenho esperança de que nós também possamos recuperar nossa energia e prazer ao olhar para o mundo das organizações a partir da visão de mundo deles. Acredito que seus mapas são guias confiáveis a terras prometidas, onde a criatividade humana, sabedoria e coragem podem ser plenamente utilizadas para criar organizações e sociedades saudáveis e resilientes.(WHEATLEY, 2011, p. xi)

Aceitar a confusão, o paradoxo, a incerteza e buscar alinhamento em nossos valores para construir de forma coletiva um futuro situado com sentido para seus participantes parece ser algo tão obvio, e ao mesmo tempo tão distante. Especialmente quando nos lembramos que as relações e estruturas sociais são relações e estruturas de poder, não há como falarmos de sustentabilidade, autonomia de times e de indivíduos sem falarmos de poder.

  1. Revisão

 

A evolução da compreensão das gerações de Chat, bem como da percepção de agência, aprendizagem e o papel das pessoas no Sistema de Atividade, não pode ser entendida apenas com relação à quantidade de elementos envolvidos, mas também de como eles interagem e se influenciam. É como a diferença entre somar coisas, multiplicá-las ou elevá-las à potência. Essa compreensão torna-se mais robusta à medida que avançamos nas gerações da CHAT

Na primeira geração, compreende-se o peso da história e da cultura na maneira como as atividades são realizadas. Aqui, as agentes eram vistas como chaves para a agência, assumindo que se as trabalhadoras entendessem a natureza historicamente evolutiva de suas ações laborais, estariam dispostas a ir além das orientações restritivas.

Sistema: no sistema de atividade proposto por ele, uma atividade é entendida como um mecanismo relativamente durável. Aqui, a divisão do trabalho isola várias ações direcionadas a objetivos e as alinha para servir a um propósito coletivo. Este sistema é orientado em direção a um objeto.

Objeto: esse objeto é a verdadeira motivação da atividade coletiva, dando à atividade sua identidade e direção. Com natureza durável e em constante construção, o objeto abre horizontes para possíveis ações dentro da atividade. Sua essência vai além de objetivos conscientes, que estão mais vinculados a ações discretas e efêmeras.

Na segunda geração, a agência era compreendida como um movimento expansivo de sujeitos individuais isolados, movidos por distúrbios recorrentes e problemas gerados por contradições internas historicamente acumuladas no sistema de atividade. Aqui, o poder torna-se algo que pode ser gerado a partir de baixo, apreendendo as contradições e reformulando a atividade para superar as contradições. O indivíduo adquire agência e poder ao unir esforços e construir o que poderíamos chamar de “motivos-objetivos”. Isso requer uma nova orquestração das relações sociais no trabalho, a criação de microcosmos geradores de colaboração e o desenho de futuros alternativos.

Desafio em definir o Objeto: vale ressaltar que definir o objeto de uma atividade pode ser um desafio para seus participantes. Usando o campo da medicina como exemplo, as profissionais podem concordar que o objeto de sua atividade laboral está na saúde e na doença. No entanto, ao serem solicitadas a especificar o objeto com mais precisão, cada profissional pode fornecer uma definição um pouco diferente, influenciada pela sua experiência individual e posição na divisão do trabalho dentro do sistema de atividade.

Na terceira geração, reconhece-se que diferentes sistemas compartilham o mesmo objeto, exigindo o desenvolvimento de capacidades de negociação, colaboração e associação para alcançar os objetivos das partes envolvidas. As profissionais devem ser capazes de se conectar e coordenar umas com as outras, “no local” quando necessário, mas também com base em um plano de longo prazo compartilhado e mutuamente monitorado.

Sistema é constituído das relações: nesse cenário, é importante notar que um sistema de atividade é mais do que a mera soma de seus componentes. A atividade cria seu próprio contexto dinâmico. Como Cole (1996, p. 141) coloca: “na teoria da atividade […], contextos são sistemas de atividade. O subsistema associado à relação sujeito-mediador-objeto existe como tal apenas em relação aos outros elementos do sistema.” Aqui, a visão contextual é totalmente relacional.

Os nós: à medida que os sistemas de atividade se tornam cada vez mais interconectados e interdependentes, muitos estudos recentes adotaram uma unidade de análise que consiste em uma constelação de dois ou mais sistemas de atividade com um objeto parcialmente compartilhado.

Construção de Redes: estes sistemas de atividade interconectados podem assumir diversas formas, incluindo uma relação produtor-cliente, uma parceria, uma rede, uma aliança ou outros modelos de colaboração multiatividade. Considera-se que a formação de pelo menos dois sistemas de atividade conectados por um objeto parcialmente compartilhado é a unidade primária de análise para a teoria de atividade de terceira geração.

Porém, Objetos em Fuga: Runaway Objects cada vez mais complexos com amplas ramificações sociais, como mudanças climáticas ou pandemias, conectam grandes números de sistemas de atividade além das fronteiras nacionais (Engeström, 2009).

A transição para a quarta geração está centrada na compreensão da agência como uma característica emergente, que floresce através do reconhecimento das diferenças e complementaridades da diversidade. Quando o centro de um sistema é incapaz de se sustentar e se dissolve, as participantes são impulsionadas a reconhecer e se adaptar ao caráter volátil do sistema em que estão inseridas.

Volatilidade se transforma em premissa: refletindo um ambiente onde as necessidades e oportunidades se transformam rapidamente, e os avanços tecnológicos possibilitam formas de colaboração anteriormente inconcebíveis, dando vida à lógica de rede.

Contudo, com
a centralidade em constante mudança: os nós da colaboração se tornam um desafio e uma necessidade, exigindo que sejam continuamente reconstruídos para atender às demandas cambiantes do objeto e do problema em questão.

Este processo é um chamado à diminuição da burocracia e das hierarquias, pela necessidade de maior protagonismo, maturidade e capacidade dos indivíduos para evoluir os sistemas de atividade e acompanhar os objetos em fuga de forma alinhada, porém descentralizada.

A Evolução: da burocracia segmentada e da produção em massa para a colaboração por meio de “nós” e co-configuração apresenta tanto riscos quanto possibilidades. À medida que o trabalho e as organizações operam cada vez mais em arranjos instáveis, fluidos e mal definidos, a abordagem intervencionista da teoria da atividade da terceira geração pode enfrentar dificuldades para unir diferentes partes interessadas ou até mesmo para identificar e estabilizar um conjunto de partes interessadas.

 

A quarta geração: perseguindo Objetos em fuga

A quarta geração surge como uma resposta a essas novas demandas e desafios.

Agência & Aprendizagem: a agência é concebida não mais como o domínio ou o controle de uma situação, mas sim como a capacidade de acompanhar e se adaptar a objetos que estão sempre em movimento e transformação. Isso requer um alto grau de flexibilidade, resiliência e habilidades de negociação, pois as profissionais têm que lidar com contradições e conflitos emergentes, ao mesmo tempo que têm que colaborar efetivamente com outros para alcançar os objetivos comuns.

Mutantes: esses objetos em fuga são fenômenos que estão constantemente mudando, evoluindo e se espalhando, criando novas situações e desafios. Lidar com esses objetos requer uma capacidade de aprendizado constante, não apenas na compreensão do objeto em si, mas também na forma como ele se relaciona com os sistemas de atividade circundantes.

A aprendizagem: se torna uma jornada contínua de negociação e renegociação com o objeto em fuga e com os diversos sistemas de atividade que o envolvem. Isso pode ser visto como um movimento constante entre momentos de estabilidade relativa e momentos de perturbação, à medida que o objeto em fuga se transforma e se move, exigindo que as participantes se adaptem e evoluam junto com ele.

Ao longo das gerações da CHAT tanto agência como o processo de aprendizado se transformam, refletindo a natureza dinâmica e complexa em que estamos inseridos, como resposta à necessidade de nos adaptar e evoluir para acompanhar essas mudanças.

 

 

Figura 20 – Tipos históricos de produção


Fonte: Traduzido de Engeström (2010)

 

 

 

 

 

 

  1. Roteiros sociais

 

No modelo de Engeström do Sistema de Atividade, a seção inferior do triangulo é entendida como a parte mediada socialmente (Figura 21). Intencionalmente, ou não, as regras de uma organização regem explicitamente (formal) ou implicitamente (informal) a forma como as pessoas se comportam.

 

Figura 21 – Sistema da Atividade mediado socialmente


Fonte: Autor adaptado de Engeström (2001)

 

A Figura 20 representa os tipos históricos de produção, indo do artesanal até o último estágio proposto por Engeström de “Produção Social”, em que através da tecnologia a colaboração seria possível em escalas antes tecnicamente impossíveis levando a adoção de produtos de código aberto com foco bem público. Ao que ele propõe que seja um caminho entre “Foco em problemas e consequências sociais” e o “Foco no processo e no produto em si” (ENGESTRÖM, 2008).

A diferença está na forma como o artefato é ativado: na seção 5.3.3- Análise a partir da CHAT:, destaco que os artefatos utilizados pela Tango não diferem do encontrado na literatura tradicional de recursos humanos, e do aplicado em organizações tradicionais, a diferença está na forma como o artefato é ativado.

A forma com que algo é feito, é entendido como a expressão da cultura organizacional (TAYLOR, 2005). Através do olhar da cultura podemos identificar como a comunidade aplica as regras esse organiza através de papéis e responsabilidades.

Para tal, a representação normalmente utilizada pela CHAT do “triangulo”, fica prejudicada, pois ela tem a função de desvelar o Sistema de Atividade, mapear o processo, organizar as partes, visualizar o todo. Assim, usaremos o recurso dos Roteiros Sociais como complemento para a análise e discussão do caso da Tango, e os apresentarei aqui.

Os Roteiros Sociais são: os padrões comportamentais e as expectativas que guiam as interações e comportamentos em um contexto social específico. Eles são influenciados por normas culturais, sociais e organizacionais, e podem ser explícitos (como protocolos ou procedimentos escritos) ou implícitos (como normas não escritas ou expectativas não ditas). Os roteiros sociais podem incluir a maneira como as reuniões são conduzidas, como as colegas de trabalho interagem entre si, como os problemas são resolvidos, e assim por diante (DE LANGE, 2011).

Os Roteiros Sociais são, portanto, a “maneira de fazer as coisas” em uma determinada comunidade. Enquanto os artefatos são as ferramentas ou meios pelos quais as pessoas interagem com o Objeto de Atividade, os roteiros sociais são a forma com que esses artefatos são usados.

Grau de consciência: analisar os Roteiros Sociais a partir do grau de consciência e sincronização pode ser revelador para a compreensão dos processos tácitos presentes do time ou organização. Nesta análise, nos ajudará a compreender como que as mesmas ferramentas podem ser aplicadas em diferentes organizações e ter resultados diferentes.

Segundo Engeström (2008), existem três níveis de comprometimento com os roteiros: coordenação, cooperação e comunicação.

  1. A coordenação: em sua forma mais básica, os roteiros sociais operam no nível da coordenação. Aqui, o roteiro funciona como um dispositivo de sincronização, permitindo que as participantes desempenhem seus papéis designados sem questionar suas responsabilidades ou o roteiro em si (Engeström et al., 1997, 371). Neste modelo (Figura 22), os papéis individuais são claramente definidos, e os objetivos gerais são entendidos tacitamente, garantindo um fluxo de trabalho ininterrupto sem a necessidade de discutir explicitamente o roteiro ou os objetivos compartilhados.

 

Figura 22 – Roteiro social – coordenação


Fonte: Engeström (2008, pg. 50)

 


  1. Cooperação: já a cooperação (Figura 23) representa um avanço em relação à coordenação, com as participantes se concentrando explicitamente no objeto coletivo de suas atividades. Nesta estrutura, a atenção direta é dada a um objeto compartilhado, muitas vezes desafiando temporariamente os limites estabelecidos pelo roteiro, enquanto os aspectos longitudinais do roteiro permanecem inalterados.

     

Figura 23 – Roteiro social – cooperação


Fonte: Engeström (2008, pg. 51)

 

  1. Comunicação reflexiva: a terceira e última forma de compromisso com roteiros é a comunicação reflexiva (Figura 24), que envolve uma reestruturação e mudança ativa do roteiro e do objeto compartilhado. Neste cenário, as participantes se desviam do roteiro estabelecido, refletindo sobre seu próprio papel, o roteiro e o objeto de prática comum. Tais situações de comunicação reflexiva são excepcionais e não são uma ocorrência diária.

     

Figura 24 – Roteiro social – comunicação reflexiva


Fonte: Engeström (2008, pg. 51)

 

💬
Contradições, o motor da transformação: a Teoria da Atividade, como apresentado na seção 3.3 explica que as mudanças nas práticas, como nos roteiros, são guiadas movidas pelas contradições (ENGESTRÖM 2008). Este princípio reconhece a inevitabilidade de diferenças e discordâncias dentro das comunidades. Consequentemente, distúrbios e conflitos que interrompem o fluxo normal de trabalho podem causar uma má coordenação, mas, inversamente, também podem abrir caminho para ajustes e inovações.

A partir da incorporação do Roteiro Social no processo de análise, observamos que há situações em que as pessoas são conduzidas a pura execução (coordenação), em outras situações há uma sobreposição das normas e papeis em prol de um objetivo comum. E finalmente, na Figura 24 vemos um ambiente onde há espaço para discussão e evolução dos Roteiro Social e do Objeto.

Desenvolver as habilidades necessárias para operar no modelo de comunicação reflexiva não é uma tarefa simples. Além das habilidades em si, o processo de transição de uma cultura que funcionou sob lógicas distintas representa um desafio significativo.

Evolução exige embate: a formação ou remodelação de Objetos e Artefatos não se dá de maneira isolada ou sem contratempos. Trata-se de um processo colaborativo e dialógico onde diferentes pontos de vista e vozes se encontram, colidem e eventualmente se fundem. As múltiplas vozes, por sua vez, possuem raízes em uma variedade de comunidades e práticas que, mesmo com suas diferenças, persistem em coexistir dentro do mesmo sistema de atividade coletiva (ENGESTRÖM, 2008).

Feitos de história: os processos de construção coletiva envolvem a interação e integração de experiências pessoais dos indivíduos através do diálogo, bem como as relações que estes estabelecem com a comunidade, a cultura e a historicidade do Objeto ou Artefato. Em outras palavras, a formação de um objeto é simultaneamente facilitada e limitada pelas concepções do objeto que foram historicamente acumuladas (ENGESTRÖM, 2008).

O equilíbrio: assim, cada passo em direção à transformação cultural e à operação efetiva no modelo de comunicação reflexiva envolve um equilíbrio cuidadoso entre respeitar o passado e abraçar o potencial de mudança.

Espiral de radicalização: a depender dos valores presentes no processo de transformação, entra-se em um espiral de radicalização através do aumento da rigidez das regras, e do aumento de pressão sobre as lideranças para que controlem e engajem suas equipes. Por exemplo, o conceito de “subculturas”, conforme classificado na literatura de cultura organizacional (SCHEIN, 2010a), desempenha um papel crucial aqui. As subculturas são frequentemente entendidas como obstáculos para os processos de transformação cultural, que precisam ser extintas ou controladas.

Desequilíbrio: Virkkunen e Newnham (2013) sugerem que a introdução de novos elementos no sistema de atividades pode inicialmente provocar contradições secundárias, já que esses novos elementos podem entrar em conflito com outros componentes do sistema. Para abordar esse problema, as participantes podem se esforçar para criar um novo objeto ou artefatos para o sistema de atividades. Contudo, a tentativa de implementação dessas novas soluções pode gerar contradições terciárias, pois as pessoas tentam se adaptar ao novo modelo.

Interdependência: ademais, ao transformar o sistema de atividades, podem surgir contradições quaternárias em decorrência da interdependência funcional com sistemas vizinhos, que ainda operam sob a forma antiga. Vale destacar que uma alteração no sistema pode intensificar as contradições primárias existentes. Portanto, ao buscar transformações, deve-se ter em mente que cada etapa de mudança pode revelar novas contradições e conflitos que requerem atenção e gerenciamento cuidadoso (VIRKKUNEN; NEWNHAM, 2013).

Desalinhamento: resultados fora do controle em uma organização acostumada ao controle, faz com que haja rupturas no processo e comportamentos desalinhados das lideranças gerando informações contraditórias as pessoas da organização e um esvaziamento dos esforços. Não à toa, verificamos a alta taxa de processos de transformação malsucedidos (REEVES et al., 2018).

 

 

 

  1. Runaway Objects

 

“Objetos Fugitivos” ou “Runaway Objects”, conforme descrito por Yrjö Engeström no contexto da Teoria da Atividade, se referem a questões ou problemas complexos, em evolução e frequentemente imprevisíveis, que se estendem além do controle de uma única organização ou indivíduo. Estes objetos não podem ser facilmente resolvidos ou gerenciados através de métodos e ferramentas tradicionais, pois muitas vezes envolvem múltiplos stakeholders, desafios interdisciplinares e estão sujeitos a mudanças contínuas(ENGESTRÖM, 2008).

Engeström usa o termo “runaway object” para enfatizar que esses problemas não são estáticos; eles estão em constante evolução, tornando difícil para as organizações e indivíduos acompanhá-los. A Teoria da Atividade fornece um arcabouço para entender como as atividades humanas e as interações sociais contribuem para o desenvolvimento e transformação destes objetos fugitivos (ENGESTRÖM; SANNINO, 2020).

Na definição construída por Engeström, os Objetos Fugitivos podem emergir inesperadamente e se espalhar globalmente em pouco tempo, como foi o caso das pandemias ou crises financeiras. Por outro lado, eles também podem levar a inovações significativas, como o surgimento do sistema operacional de código aberto Linux, que foi iniciado por alguns programadores e, subitamente, tornou-se uma inovação global (ENGESTRÖM; SANNINO, 2020).

Entender um Objeto como “em fuga” e fazer uso da CHAT em sua análise permite a obtenção de insights sobre as questões sistêmicas subjacentes, contradições e tensões que contribuem para o surgimento e evolução desses problemas complexos. Essa compreensão pode ajudar a desenvolver estratégias e intervenções mais eficazes para gerenciar e resolver objetos fugitivos em vários contextos organizacionais e sociais(ENGESTRÖM; SANNINO, 2020).

O desenvolvimento do conceito de Objetos “em fuga”, prepara a CHAT para adaptar-se e ser usada para a adaptação à ambientes em transformação acelerada. Porém, os exemplos utilizados, para fins didáticos, afastam a aplicação do conceito do uso das pesquisas que normalmente a CHAT é utilizada, para estudos Organizacionais (QUEROL; CASSANDRE; BULGACOV, 2014).

Assim a elaboração do conceito se faz necessária para a sua aplicação neste estudo. No quadro abaixo podemos apresento o uso do conceito em variados temas que são objeto dos estudos em organizações. Elaborando o conceito de Objetos em fuga, a partir dos cruzamentos de cada caso para evidenciar a complexidade inerentes a alguns objetos, que os qualificam como Objetos Fugitivos, e exemplos de “não fugitivos”.

 

Quadro 7 – Quadro comparativo entre Objetos Fugitivos e “não fugitivos”

Objetos Fugitivos

Explicação

Objetos Não Fugitivos

Explicação

1. Desigualdade no local de trabalho

Uma questão complexa que envolve múltiplos fatores como gênero, raça e status socioeconômico, requerendo mudanças sistêmicas.

1. Integração de funcionários

Um processo estruturado para a integração de novos funcionários.

2. Esgotamento e equilíbrio entre vida profissional e pessoal

Um problema multifacetado que envolve cultura organizacional, expectativas individuais e normas sociais, com impactos de largo alcance.

2. Atividades de construção de equipe

Eventos planejados para fomentar a cooperação e camaradagem.

3. Retenção de talentos em uma economia de freelancers

Um desafio dinâmico influenciado por mudanças nas estruturas de trabalho, expectativas dos funcionários e fatores econômicos.

3. Programas de treinamento de habilidades

Iniciativas estruturadas destinadas a aprimorar habilidades específicas.

4. Desenvolvimento de liderança ética

Um campo complexo e em evolução que envolve valores morais, tomada de decisão e diferentes stakeholders, com implicações de longo alcance.

4. Programas de reconhecimento de funcionários

Métodos estabelecidos para reconhecer e recompensar o desempenho.

5. Fomentar inovação e criatividade

Uma questão multifacetada que requer que cultura organizacional, práticas de gestão e empoderamento de funcionários sejam abordados.

5. Definição de metas e avaliações de desempenho

Um processo cíclico para avaliar e melhorar o desempenho do funcionário.

6. Diversidade, equidade e inclusão

Uma abordagem holística para lidar com vieses sistêmicos e promover uma cultura de respeito e pertencimento, afetando todos os níveis da organização.

6. Treinamento em gestão do tempo

Programas focados em melhorar a produtividade e a eficiência do trabalho.

7. Apoio à saúde mental no local de trabalho

Uma questão profundamente enraizada que envolve fatores culturais, organizacionais e de saúde, com impactos de largo alcance.

7. Oficinas de habilidades de comunicação

Eventos estruturados destinados a aprimorar habilidades interpessoais.

8. Adaptando-se ao trabalho remoto e híbrido

Um crescente desafio organizacional que requer a revisão de gestão, comunicação e processos de trabalho.

8. Programas de bem-estar dos funcionários

Iniciativas promovendo bem-estar físico e emocional.

9. Aprendizagem e desenvolvimento ao longo da vida

Um processo complexo e contínuo que envolve fatores pessoais, profissionais e sociais, com implicações para indivíduos e organizações.

9. Rotação de trabalho e treinamento cruzado

Oportunidades planejadas para as colaboradoras adquirirem novas habilidades e perspectivas.

10. Engajamento e motivação do funcionário

Um desafio multifacetado que engloba necessidades individuais, cultura organizacional e práticas de liderança, com amplas implicações.

10. Treinamento de resolução de conflitos

Programas focados em melhorar habilidades de resolução de problemas e negociação.

Fonte: Autor baseado em Engeström e Sannino (2020)

 

Os reflexos de entender e adotar a visão do Objeto do Sistema como um Objeto Fugitivo são:

  1. O processo de pesquisa precisa ser capaz de absorver a natureza complexa do Objeto, mantendo-se flexível e capaz de responder às mudanças identificadas no campo. Também exigirá uma abordagem interdisciplinar para apreender e compreender as diferentes perspectivas das partes interessadas de um objeto multifacetado;
  2. O processo de análise dos dados, construção do Sistema de Atividade e intepretações se torna mais complexo, devido às múltiplas visões, a necessidade de apoiar-se em diferentes perspectivas, e a influência clara da pesquisadora em tomar decisões fundantes para os resultados da pesquisa;
  3. A construção do Sistema de Atividade (SA) requer um aprofundamento nos dados, e percepções das partes interessadas, assim como a exploração das conexões e interdependências do SA, como outros SAs.

     

Entender o Objeto da Atividade como um Objeto Fugitivo, é também aceitar o processo constante de construção de conceito, na definição de Engeström, ou construção de sentido compartilhado na definição de Weick (ENGESTRÖM; SANNINO, 2020; WEICK; ROBERTS, 1993).

Os objetos fugitivos, pela sua complexidade inerente e pela sua capacidade de modelar e serem modelados pelo contexto social mais amplo, requisitam uma contínua construção de conceitos. Tradicionalmente, o estudo da formação de conceitos ocorre predominantemente em ambientes controlados, como salas de aula e laboratórios, o que poderíamos traduzir na linguagem natural como somar coisas (ENGESTRÖM, 2020).

No entanto, como na diferença entre multiplicar ou elevá-las à potência, Engeström (2020) sugere que os processos mais interessantes de formação de conceitos estão a ocorrer “no campo”, fora desses ambientes controlados, à medida que as pessoas se esforçam para compreender fenômenos novos e complexos (ENGESTRÖM, 2020).

Na Teoria da Atividade, a formação de conceitos é vista como um processo dinâmico e contextualizado que ocorre durante a interação ativa dos indivíduos com o mundo ao seu redor. Esta visão difere consideravelmente das abordagens mais tradicionais que encaram este processo como algo estritamente individual e principalmente cognitivo. Tal como a diferença entre o uso da conjunção “e” em vez da disjunção “ou”, a formação de conceitos na Teoria da Atividade está fortemente enraizada no contexto social, histórico e cultural em que as pessoas operam (ENGESTRÖM, 2020).

Engeström (2020) defende que não se trata de um processo isolado que acontece exclusivamente dentro das mentes das pessoas, mas sim de um processo de aprendizagem coletiva e colaborativa que se desenrola na comunidade de prática à qual as pessoas pertencem. Ele introduz o conceito de “formação de conceitos em estado selvagem” para descrever como os conceitos são formados e evoluem em situações reais e complexas, fora dos ambientes controlados de salas de aula ou laboratórios. Estas situações podem ser caracterizadas pela incerteza, ambiguidade e dinamismo, e é aqui que os “objetos fugitivos” se tornam relevantes.

No entanto, mesmo perante a complexidade de um objeto fugitivo, a formação de conceitos não é um processo livre de restrições. As pessoas buscam coerência e estabilidade na formação de seus conceitos, mesmo quando enfrentam debates intensos e discrepâncias de opiniões. Os conceitos que emergem deste processo de “formação de conceitos em estado selvagem” não são meramente intermediários para entender o mundo, mas também ferramentas para agir sobre ele, pois a compreensão desses conceitos complexos e fugitivos pode ser a chave para transformar o mundo em um lugar mais justo e sustentável (ENGESTRÖM, 2020)..

Para ilustrar o processo de formação de conceitos na teoria da atividade, vamos considerar uma organização fictícia chamada Tango, uma empresa de consultoria que desenvolve soluções tecnológicas para clientes. A Tango tem um objeto de atividade dual: enquanto ela se esforça para alcançar objetivos financeiros (como qualquer outra empresa), ela também tem um compromisso declarado com a sustentabilidade e o impacto social positivo.

Para adicionar outra camada de complexidade, vamos dizer que a popularização e o uso crescente da inteligência artificial (IA) estão impactando significativamente o ambiente de negócios da Tango.

Agora, vamos examinar alguns exemplos de como essas forças podem interagir e levar à formação de novos conceitos dentro da Tango.

  1. A popularização da IA: como a IA se torna cada vez mais comum, pode haver um debate dentro da Tango sobre como integrá-la em seus serviços. Alguns membros da equipe podem ver a IA como uma forma de melhorar a eficiência e aumentar os lucros, enquanto outros podem se preocupar com os potenciais impactos negativos da IA na sustentabilidade e no impacto social. Este debate pode levar à formação de novos conceitos sobre o que a IA significa para a Tango e como ela pode ser usada de uma forma que equilibre seus objetivos financeiros e sociais;
  2. A dualidade do objeto de atividade: a tensão entre os objetivos financeiros e sociais da Tango pode ser uma fonte contínua de debate e conflito dentro da organização. Isso pode levar à formação de novos conceitos que ajudem a organização a navegar nessa dualidade. Por exemplo, a organização pode desenvolver um novo conceito de “lucro sustentável” que combine sucesso financeiro com impacto social positivo.

Se o processo de formação de conceitos não for reconhecido como uma necessidade e conduzido adequadamente, pode resultar na cisão de conceitos entre pessoas da organização. Alguns membros da equipe podem priorizar o uso irrestrito de IA, enquanto outros podem se voltar contra a tecnologia, levando a uma falta de coerência na direção estratégica da organização.

Esses momentos ocorrem o tempo todo, e vão corroendo a unidade de um grupo, quando este não é capaz de intermediar conduzir um processo coletivo de significação, ou ressignificação dos conceitos.

O caráter volátil da definição do Objeto de Atividade, o caráter multifacetado e complexidade inerentes, como apontado no item b dos reflexos da adoção do conceito de Objeto em fuga, coloca a pessoa pesquisadora em evidência em seu processo de pesquisa. Em especial, exige desta um posicionamento claro, e a transparência nas decisões que são tomadas na condução da pesquisa.

Posicionamento esse que deveria ser feito de qualquer forma, mas se torna mais necessário em um contexto em que as decisões da pessoa pesquisadora causarão grande impacto nos resultados da pesquisa.

 

 

  1. Laboratório de mudança

 

Engeström faz uma distinção importante entre o que classifica como intervenções lineares e intervenções formativas, que são concepções de intervenção bastante distintas (ENGESTRÖM; SANNINO, 2021).

Segundo Engeström, as intervenções lineares são fundamentadas na premissa de que a pesquisadora-intervencionista tem a visão do resultado e que aquelas que estão de fato envolvidos no processo de aprendizado devem aderir ao projeto delineado. Em contrapartida, as intervenções formativas, na visão de Engeström, são empreendidas em parceria com as praticantes e as aprendizes. O Laboratório de Mudança é um exemplo emblemático desse tipo de intervenção na perspectiva dele.

A proposta das intervenções formativas é gerar conceitos novos que possam ser empregados em diferentes contextos, atuando como guias para o desenvolvimento de soluções situadas. Isso significa que o resultado não é um pacote padronizado, mas sim um conceito generativo. A intervenção formativa, de acordo com Engeström, produz algo que não estava presente no início, e tanto o conteúdo quanto o decorrer da intervenção são objetos de negociação durante todo o processo (ENGESTRÖM; SANNINO, 2021)..

Esse método de intervenção está ligado à agência transformadora entre as participantes, já que são elas que detêm o conceito e o aplicam na prática. Dessa forma, na visão de Engeström, o papel da pessoa pesquisadora não é tentar controlar todas as variáveis, mas estimular e manter esse processo expansivo de transformação, que na realidade é liderado e pertence aos praticantes (ENGESTRÖM; SANNINO, 2021).

Com base nesse panorama, Engeström sugere uma análise minuciosa dos Laboratórios de Mudança, um processo de intervenção formativa que parte do ponto em que as próprias profissionais encontram uma situação contraditória, algo que é crucial para o seu trabalho e para a sua vida, e que eles analisam e transformam, gerando um conceito novo que não é previamente conhecido pela pesquisadora intervencionista.

O laboratório de Mudança pode ser descrito nos passos abaixo, segundo Engeström e Sannino (2021):

  1. Ponto de partida: o ponto de partida é um sistema de atividades que enfrenta um problema desafiador. Normalmente, as pesquisadoras são convidados ou se tornam parceiras das pessoas envolvidas.
  2. Apreensão do problema: é realizado um trabalho de campo para entender como esse problema premente se manifesta no cotidiano e no trabalho diário das participantes.
  3. Dados espelho: as pesquisadoras coletam o que se denomina “dados espelho” sobre o problema. Isso muitas vezes é feito por meio de filmagens de situações críticas, interações críticas, entrevistas, além de acompanhamento (shadowing) dos profissionais em seu trabalho diário.
  4. O Processo:
    1. Duração: as participantes se reúnem em seis a 12 sessões do laboratório de mudança, que normalmente duram cerca de duas horas cada uma.
    2. Confrontação: os “dados espelhos” são apresentados às participantes. Elas veem suas próprias situações-problema como se estivessem diante de um espelho, muitas vezes com o auxílio de vídeos, o que desencadeia um conflito ou motivações e um esforço para resolver esse conflito.
    3. Contradições: para encontrar uma solução para o problema, as participantes analisam o desenvolvimento histórico e apresentam contradições em seu sistema de atividades, tentando identificar as causas raízes da questão.
    4. Potencial: elas projetam uma futura zona de desenvolvimento proximal para sua atividade e elaboram um novo modelo para a atividade.
    5. Implementação (experimentos): implementam um novo modelo na prática, geralmente testando-o primeiro em projetos piloto limitados e, gradualmente, avançando para uma implementação em larga escala (Aprendizagem Expansiva).
    6. Geração de dados e análise: todas as sessões, desde o entendimento do problema, a coleta de “dados espelhos”, até a implementação de um novo modelo na prática, geralmente primeiramente testado em projetos piloto limitados, são gradualmente direcionadas para uma implementação em larga escala.    

Embora o processo descrito do Laboratório de Mudança possa parecer simples e “limpo” quando descrito, Engeström (2020) destaca que o caminho é cheio de nuances, idas e vindas, destacando o dinamismo e a complexidade dos problemas tratados.

Formação de conceitos: o primeiro e talvez o principal desafio do Laboratório de Mudança é convencer as participantes de que existem problemas concretos dentro do Sistema de Atividade (SA). Em outras palavras, é necessária uma construção coletiva de entendimento sobre as contradições presentes no SA (ENGESTRÖM; NUTTALL; HOPWOOD, 2020).

Dados espelho: é a documentação de situações em vídeo que posteriormente serão mostradas ao grupo de trabalho, com o objetivo de evidenciar as contradições e facilitar a criação de um significado compartilhado entre as participantes. A estratégia de dupla estimulação é empregada para facilitar o processo individual e coletivo de enfrentamento dessas contradições durante o Laboratório de Mudança (ENGESTRÖM; NUTTALL; HOPWOOD, 2020).

Dupla estimulação: a dupla estimulação funciona como um gatilho para provocar o movimento e contrapor a apatia esperada de parte do grupo. Consiste no uso de um artefato para definir ou aprimorar a agência em situações conflitantes. Por exemplo, se você tem uma reunião agendada para as 15h e a outra pessoa não comparece, pode-se utilizar um artefato (como um relógio ou um alarme) para tomar a decisão de esperar ou não. Esse artefato aumenta a sua agência e ajuda a tomar uma ação decisiva para resolver o conflito (ENGESTRÖM; NUTTALL; HOPWOOD, 2020).

Destravando a paralisia: os artefatos desempenham um papel crucial na prevenção da paralisia em situações de conflito, servindo como ferramentas para auxiliar na tomada de decisões e promover ações. Essa característica é essencial na aprendizagem expansiva, um processo que envolve a confrontação constante com cenários conflituosos na vida cotidiana e a busca por suas soluções (ENGESTRÖM; NUTTALL; HOPWOOD, 2020).

Figura 25 – Loop de dupla estimulação


Fonte: (ENGESTRÖM; SANNINO, 2021)

Nesses momentos desafiadores, encontrar meios de progresso é necessário. Segundos estímulos, também conhecidos como artefatos, frequentemente facilitam esse avanço ao possibilitar a descoberta de soluções. Seus formatos variam, podendo ser tão simples quanto um mapa da situação esboçado em um papel ou um conjunto básico de palavras-chave ou slogans (SANNINO, 2020).

Esses ciclos de dupla estimulação, incorporados nas diferentes fases da aprendizagem expansiva, são ilustrados na Figura 26.

Figura 26 – Ciclo aprendizagem expansiva com loop


Fonte: Autor adaptado de Engeström (2020)

 

Os ciclos de dupla estimulação, apresentados na Figura 26, ilustram de maneira efetiva como a utilização de artefatos auxilia na superação de momentos de conflito e paralisia na aprendizagem expansiva. No entanto, é crucial ressaltar que, embora as estratégias e ferramentas mencionadas tenham seu valor, existem também limitações que devem ser consideradas. Agora, para expandir nossa compreensão e visão de conjunto da pesquisa, vamos transitar para a análise dessas limitações, focando especificamente na Teoria da Atividade. Esta mudança de foco nos permitirá uma visão mais crítica e equilibrada da abordagem.

 

  1. Limitações da CHAT

 

A Teoria da Atividade, apresenta algumas limitações que merecem atenção, com base em Bligh e Floyd (2017), destacamos quatro:

  1. Ênfase no coletivo: A teoria coloca um forte enfoque no aspecto coletivo, o que, em certos casos, pode obscurecer a importância de práticas ou cognições individuais dentro desse contexto. Ela pode não dar a devida atenção às motivações dos sujeitos emergentes de contextos sociológicos mais amplos, nem como estes respondem internamente às tensões que encontram em suas práticas.
  2. Falta de foco analítico nas relações de poder: há uma tendência da teoria em não incentivar um foco analítico adequado em certos aspectos da prática humana, como as relações de poder dentro dos grupos e a historicidade da prática.
  3. Incapacidade de tratar a agência e poder: a teoria ao focar no entendimento do Sistema da Atividade fica alijada de localizar de forma adequada a operação de poder, desigualdade e diferença.
  4. Conceitualização da comunidade: a teoria tende a concentrar-se mais nas estruturas do que nos comportamentos individuais dentro delas. Isso pode limitar sua eficácia ao examinar as dinâmicas dentro de comunidades específicas.
  5. Implicações estruturais do modelo de Engeström: o modelo de sistema de atividade proposto por Engeström pode não refletir a complexidade e a desordem inerentes à atividade humana.

A Cartografia como percurso metodológico, busca diminuir algumas das debilidades apresentadas, em especial o item 5. As relações de poder não são exploradas neste estudo, ao passo que não quer dizer que elas não existam e não influenciem os Sistemas de Atividade estudados. Quer dizer que foi uma escolha minha em não aprofundar o tema, reforçado pelo fato de o campo pesquisado não ter apresentado este como um assunto fundante para os objetivos delineados do estudo.

Além dos pontos já destacados, é importante abordarmos os desafios com o Laboratório de Mudança:

Método centralizador: promover um aprendizado mais amplo, mudando situações problemáticas de forma colaborativa e flexível, é impressionante. No entanto, quando olhamos mais de perto e de forma crítica, algumas limitações ficam aparentes em sua aplicação. Isso se torna claro quando observamos o papel central da pessoa pesquisadora, que tem a tarefa de mediar e facilitar a criação de um sistema conjunto de atividades e significados (ENGESTRÖM; SANNINO, 2020).

O acesso e uso da CHAT pode ser democratizado? Esta tese, assim como a Teoria da Atividade, a Cartografia e as Organizações Híbrida, entende que a complexidade não precisa, e não pode, ser vista como um obstáculo. Então, quando verifico os caminhos de desenvolvimento da Teoria da Atividade, me questiono: De que forma o uso e aplicação da teoria pode ser simplificada para que seja mais acessível? Por que não se utiliza a tecnologia para criar modelos adaptáveis e descentralizados que possam capacitar as pessoas a transformar suas realidades?

É preciso descentralizar: parece que os próprios proponentes da Teoria da Atividade estão ignorando suas descobertas anteriores, que apontam para uma necessidade de descentralização e adaptação (ENGESTRÖM; SANNINO, 2020). O papel desempenhado pela equipe de pesquisa, ainda que seja apresentado com um processo em que as pessoas participantes são as agentes de transformação. Elas dependem de forma definitiva do papel mediador e do conhecimento inacessível do grupo de pesquisa. Situação que entendo seja desatualizada para as possibilidades tecnológicas e necessidades de evoluir organizações e times para um futuro mais autônomo e sustentável.

Visão inspiradora, prática obsoleta: ainda que a visão comunicada seja da necessidade de integração de múltiplas camadas da sociedade para tratar os problemas complexos que enfrentamos enquanto humanidade. Um consórcio de universidades, como proposto por Engeström e Sannino (2020) não é o suficiente para enfrentar os desafios prementes do nosso tempo. Parte de uma lógica obsoleta, lenta, centralizada e hierárquica para tratar problemas múltiplos e em transformação.

Na tentativa de criar uma sociedade mais justa e sustentável, devemos nos questionar se a atual abordagem da Teoria da Atividade está realmente habilitando as pessoas a transformar suas realidades ou se, ao contrário, está centralizando o processo e, inadvertidamente, criando mais obstáculos.

De teoria para tecnologia: afinal, para construir “cordas” fortes e resilientes, precisamos que todas as partes sejam capazes de lidar com problemas, desenvolver artefatos situados e evoluir seus Sistemas de Atividade. E talvez, para isso, não precisamos de um pesquisador no centro, mas sim de uma teoria da atividade que funcione como uma tecnologia social, acessível e adaptável às necessidades das pessoas.

 

 

 

 

 

  1. PERCURSO METODOLÓGICO

 

Navegar é Preciso

Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:

“Navegar é preciso; viver não é preciso”.

Quero para mim o espírito [d]esta frase,

transformada a forma para a casar como eu sou:

Viver não é necessário; o que é necessário é criar.

Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.

Só quero torná-la grande,

ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;

ainda que para isso tenha de a perder como minha.

Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue

o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir

para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça.

(Fernando Pessoa) (PESSOA, 2023)

 

 

 

 

 

 

 

Ao entrar em contato com a Cartografia, fui cativado pelo conceito de rizomas e pela ideia de construir um espaço onde conexões impensadas se tornam possíveis. A metáfora do rizoma é utilizada para descrever teorias e sistemas de conhecimento que não são hierárquicos, mas sim horizontais e não-lineares. Diferentemente das estruturas hierárquicas tradicionais (como uma árvore, onde tudo se origina de um tronco central), um rizoma não tem início nem fim, nem centro nem periferia. Em vez disso, é composto por uma multiplicidade de pontos ou nós que estão todos interconectados(DELEUZE; GUATTARI, 1995).

A cartografia, segundo Deleuze e Guattari no livro “Mil Platôs” (1995), é um princípio que é totalmente focado em experimentar a realidade. Ela está relacionada ao conceito de rizoma, que liga qualquer ponto a outro, sem ser limitado a uma ou várias coisas. O rizoma possui várias dimensões e direções, e o mapa, não tem apenas uma maneira de ser explorado – as possibilidades são muitas.

São seis os princípios básicos que compõem a ideia de rizoma, de acordo com Deleuze e Guattari:

  1. Conexão: não existe um ponto fixo e as ramificações não seguem uma ordem específica. Qualquer ponto pode se ligar a outro em todas as direções.
  2. Heterogeneidade: o rizoma não é baseado apenas em linguagem. Ele mistura elementos de várias áreas como biologia, política e economia.
  3. Multiplicidade: o rizoma não é uma coisa só, mas também não é composto por várias coisas puras. Pode ser quebrado em qualquer lugar e continuar a crescer.
  4. Ruptura a-significante: existe uma tensão constante entre a criação de formas e a quebra delas. Se uma parte do rizoma for quebrada, não interfere em seu funcionamento.
  5. Cartografia: o pensamento sobre o rizoma não é uma representação, mas uma invenção. O mapa faz parte do rizoma e pode ser alterado.
  6. Decalcomania: este princípio capta os bloqueios e pontos de saturação. Deve-se começar primeiro pelo mapa (rizoma) para depois projetar o decalque (pontos de estruturação).

O rizoma é um sistema aberto que se altera constantemente. Seu funcionamento não segue um princípio de causa e efeito, e não há nada que esteja fora dele (KASTRUP; BARROS, 2009).

Forma de ver o mundo: o rizoma é, portanto, um modelo para pensar sobre o mundo e a realidade que enfatiza a interconexão, a multiplicidade e a constante mudança. É um conceito que desafia as formas tradicionais de pensamento e sugere uma abordagem mais fluida e dinâmica para entender sistemas complexos (STERN; ROLNIK; DESPRET, 2013).

A definição pela Cartografia se concretizou com o entendimento de seu posicion0mentoa como um método de pesquisa-intervenção que vê as pessoas como participantes da pesquisa e não como objetos dela. (PASSOS; BARROS, 2009a). Descrevo em linhas gerais as etapas deste estudo:

 

SOBREVOO DA JORNADA

 

Podemos dizer que o percurso metodológico teve 4 grandes etapas:

  1. a primeira foi uma etapa de exploração do campo realizada junto à Teal Brasil, entre 2021 e 2022;
  2. na segunda etapa foi o mergulho na empresa Tango, onde pude mapear as práticas de desenvolvimento de pessoas adotadas pela organização.

Esses dois passos cumpriam o projeto de tese aprovado. No entanto, durante o processo de pesquisa na Tango, ficou claro a possibilidade e o potencial da de implementar a terceira e quarta etapas:

  1. a formalização do framework
  2. a adaptação do modelo, aplicação e a coleta de dados ainda dentro do escopo deste trabalho.

Esses grandes marcos podem ser observados na Figura 27. Também fica destacada na figura a abertura de novas fretes que andaram em paralelo e foram alimentando as entregas desta tese. Destacaria as principais como sendo:

  1. o desenvolvimento e adoção de artefatos de aplicação e automação dos processos de assessment e geração de relatórios individuais;
  2. o surgimento e minha participação no movimento dos IDG´s;
  3. a adoção do sistema Obsidian de Gestão da Informação;
  4. Sistemas de Inteligência Artificial.

 

Figura 27 – Percurso Metodológico


Fonte: Autor

 

    

 

  1. A cartografia

 

Romper com a previsibilidade: a adoção da cartografia enquanto percurso metodológico tem o objetivo de romper com a previsibilidade esperada da pessoa pesquisadora frente seu planejamento/projeto de pesquisa. Uma vez que a busca do controle sobre o caminho a percorrer, assim como a assertividade sobre o objeto tendem a transformar a potência em superficialidade da simulação do trajeto previsto (PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015).

Construir com as participantes: o desafio de colocar-se em campo para construir com as participantes da pesquisa um estudo que traga valor para as envolvidas coloca em xeque a centralidade da pessoa pesquisadora, da mesma forma que exige um exercício constante de busca e expressão da sua verdade neste projeto que se torna coletivo. Assume-se uma posição de afetar mútuo, a pesquisadora observadora isenta é substituída por uma pessoa com postura conceitual-política e transformador da realidade que pesquisa.

Transformar para conhecer: a dissolução do conhecimento dualista (natureza/cultura, quantitativo/qualitativo, objetivo/subjetivo) aproxima a pessoa pesquisadora de uma realidade que assume a complexidade como desafio, com suas incertezas, problemas e contradições. A processualidade é forma de navegar a realidade em movimento constante do campo, forçando assim a própria pesquisadora a manter-se em movimento, usar da reflexividade para questionar-se, as pessoas do campo, a própria pesquisa.

Coexistência: ao invés de perguntar pela essência das coisas, a cartógrafa pergunta sobre seu encontro com as coisas na pesquisa. Substituir perguntas do tipo “o que é isto que encontrei?” para “como eu estou compondo isto que encontrei?”, o posicionando como criador da realidade. Contemplando a coexistência dos tempos (o presente que traz a virtualidade do passado, e a imprevisibilidade do devir futuro).

A cartógrafa se faz cartografando: formar e pesquisar se dão mutuamente. (POZZANA, 2013). “A cartografia introduz o pesquisador numa rotina singular em que não se separa teoria e prática, espaços de reflexão e de ação. Conhecer, agir e habitar um território não são mais experiências distantes umas das outras” (ALVAREZ; PASSOS, 2009, p. ,149).

A pessoa pesquisadora-cartógrafa afeta e é afetada: pela presença-intervenção do seu caminhar constrói os caminhos de sua pesquisa. Tais efeitos podem ser lidos no percurso de sua pesquisa, assim como no movimento do problema e domínio da investigação (POZZANA, 2013). “O mundo não é algo que nos foi entregue: é algo que emerge de como nos movemos, tocamos, respiramos e comemos”(VARELA, 1996, p. 15).

Pelo fato de ser na interação com o território que somos capazes de cartografar esse é um método entendido como ad hoc, adaptando-se ao território encontrado a pessoa pesquisadora faz uso das ferramentas possíveis para sua produção de dados, processo esse chamado de hódos-meta.

Caminho se constrói caminhando: o aspecto do hódos-metá, onde em contrapartida ao metá-hódos (lógica onde temos metas pré-definidas que orientam o percurso), essa inversão metodológica dá espaço para a pessoa pesquisadora vivenciar o processo de pesquisa e de forma mais orgânica construir seu percurso metodológico. Isso quer dizer não ter prescrição de procedimentos, regras e protocolos de pesquisa anteriores a interação com o campo, mas sim fazer uso de pistas que apoiam o caminho da pessoa pesquisadora (KASTRUP; PASSOS, 2013), Cintra e colaboradores explicam a origem das pistas:

Um grupo de pesquisadores do Departamento de Psicologia na Universidade Federal Fluminense e do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro que investiga possibilidades metodológicas para estudar os processos de subjetividade elaborou pistas do método da cartografia em dois volumes (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2009; PASSOS; KASTRUP; TEDESCO, 2014) como possibilidade de guiar os pesquisadores na apropriação de um método processual, não com objetivo de engessá-lo. Este estudo de revisão integrativa da literatura também busca tal apropriação (CINTRA et al., 2017, p. 46).

Pistas como norteadores: a não prescrição de procedimentos e protocolos só é possível pois na cartografia se faz uso de pistas como norteadores e guias para dar suporte a jornada da pessoa pesquisadora. “As pistas que guiam o cartógrafo são como referências que concorrem para a manutenção de uma atitude de abertura ao que vai se produzindo e de calibragem do caminhar no próprio percurso da pesquisa – o hódos-metá da pesquisa” (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2015, p. 13).

Ao apoiar-se no caminho que vai sendo construído, o método reverte seu sentido, sem determinações ou prescrições dadas previamente. São as pistas metodológicas e a direção ético-política que servem de balizador para avaliar a experiencia e seus efeitos(PASSOS; BARROS, 2009a). São 8 as pistas metodológicas adotadas por este trabalho, sem hierarquia e sem prescrição porém com forte conexão umas com as outras, serão detalhadas na sequência.

 

  1. Pista 1 – a cartografia como método de pesquisa-intervenção

 

Toda pesquisa é intervenção. E ela se dá no plano da experiência em que o distanciamento da lógica cartesiano-positivista é subvertido, agenciando sujeito-objeto, teoria-prática em um mesmo plano de produção, que Passos e Barros (2009) chamam de plano da experiência. Definem ainda que ” a cartografia é o traçado desse plano de experiência, acompanhando os efeitos (sobre o objeto, o pesquisador e a produção do conhecimento) do próprio percurso de investigação”(PASSOS; BARROS, 2009a, p. 18). Tal noção apoia-se no princípio da análise institucional de transformar para conhecer, e não conhecer primeiro como requisito para depois transformar (PASSOS; BARROS, 2009).

Esse é um processo que se opera por transversalidades. Barros e Passos (2009, p. 27) destacam “operar na transversalidade é considerar esse plano em que a realidade toda se comunica. […] A tecedura desse plano não se faz de maneira só vertical ou horizontal, mas também transversalmente”. Não obstante, ao indicar a indissociabilidade entre pesquisa e intervenção, as autoras afirmam a necessária implicação da pessoa pesquisadora no campo de pesquisa, acompanhado de seus desejos, curiosidades, indagações e pressupostos evocando o ser político no fazer pesquisa-intervenção.

Cartografar é movimento: a cartografia exige da pessoa pesquisadora posturas singulares. É necessário sujar-se, contaminar-se em si e no campo, questionar dados, pressupostos e as forças que tecem a experiência. Exige primordialmente que a pesquisadora esteja implicada no movimento da pesquisa, tal qual o campo a pesquisadora também necessariamente deve manter-se em movimento(COSTA, 2014).

É tudo manipulação: Costa (2014) vai além ao descrever “é tudo manipulação”. Todo achado cartográfico é manipulação, pois é no fazer/manipular que se constrói a intervenção e consequente conhecimento. “Manipular é trazer para a mão o que outrora era de uma ordem mental” (COSTA, 2014, p. 74). Costa explica que a cartografia é feita de encontros e à cartógrafa pesa o dilema de conseguir definir a importância dos encontros a que é exposto, para ser capaz de identificar esses momentos a atenção da cartógrafa é outra pista/premissa fundamental no fazer cartografia.

 

  1. Pista 2 – o funcionamento da atenção no trabalho da cartógrafa

 

A contradição da atenção ao cartografar: é sobre atenção que Kastrup (2015) destaca dois pontos: a) a necessidade de uma “atenção à espreita” capaz de apreender dados, momentos, objetos que a priori parecem desconexos, pois são signos e forças circulantes ainda não significados “pontas do processo em curso”. E b) a atenção pode assumir diferentes funcionamentos: “seletivo ou flutuante, focado ou desfocado, concentrado ou disperso, voluntário ou involuntário, em várias combinações como seleção voluntária, flutuação involuntária, concentração desfocada, focalização dispersa etc.” (KASTRUP, 2015, p. 33).

A atenção da cartógrafa: ao se deparar com o campo, a pesquisadora deve dirigir sua atenção para algo, porém ao se fixar em um ponto tende a negligenciar os outros. Um caminho para tratar a questão é adotar a “atenção à espreita” – flutuante, concentrada e aberta – que utiliza todos os sentidos (KASTRUP, 2009, p. 48). Uma concentração sem foco fixo. Kastrup elenca quatro movimentos da atenção cartográfica: o rastreio, o toque, o pouso e o reconhecimento atento.

O rastreio: conforme descrito por Kastrup (2015), se refere ao processo em que a cartógrafa varre o campo de estudo em busca de um alvo móvel, sem ter conhecimento prévio deste alvo. Procura pistas e signos de processualidade, acompanhando as mudanças no campo.

O toque: é um processo de seleção desencadeado quando algo notável é percebido ou sentido pela cartógrafa entre os elementos observados. Este processo não é subjetivo, mas é ativado quando algo requer atenção. A atenção é acionada a partir de sensações, não de percepções ou representações de objetos, e é quase involuntariamente capturada, servindo como reação de orientação a uma fonte de mudança. O toque evidencia a natureza rizomática da pesquisa de campo, que possui múltiplas entradas e não segue um único caminho para atingir a meta (PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015).

O pouso: é a mudança de escala da atenção da cartógrafa, onde ocorre uma parada, um zoom em algum lugar do campo. Um novo território se forma, e o campo de observação se reconfigura Kastrup (2015). Momentaneamente, há organização de um campo em torno de um ponto, um centro mais marcante, sem se limitar a ele, pois a atenção é dinâmica, movendo-se dentro e entre janelas atencionais (PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015) .

O reconhecimento atento: é a quarta variedade. A pessoa pesquisadora deve estar atenta para apreender os movimentos de um processo em curso. Seu olhar não busca representar um objeto e nem seu reconhecimento automático, mas sim entender como se utiliza dele. O trabalho da cartógrafa é justamente mapear um território até então desconhecido (KASTRUP, 2015). Assim, a fabricação do conhecimento ocorre durante a jornada da pesquisa, com o envolvimento da atenção da cartógrafa, que, por meio dela, cria um território de observação.

Acompanhar processos e produzir dados: a importância dos movimentos é reforçada quando recordamos que o objetivo do método cartográfico é ser capaz de acompanhar o processo e não a representação de um objeto. Devido ao DNA construtivista do método, entende-se que os dados não são coletados, mas sim produzidos pela pesquisa. Os dados são a produção real de algo que já estava virtualmente presente e é materializado no “caminhar” da pessoa pesquisadora.

Tecendo conexões: a partir daí, efetua uma (re)aproximação do processo, de modo a se destacar seus contornos singulares. O fenômeno do reconhecimento é entendido como uma espécie de ponto de interseção entre percepção e ativação da memória, não sendo um circuito fechado, como o reconhecimento automático do objeto, mas uma possibilidade de ampliação da percepção. “O novo é, neste sentido, definido pela ligação, pela coexistência de diversas camadas de tempo, nunca perdidas, jamais ultrapassadas definitivamente, mas conservadas desde sempre e reunidas nas formas cognitivas da atualidade” (KASTRUP, 2003, p. 61).

 

  1. Pista 3 – cartografar é acompanhar processos

 

Cartografar é habitar um território que não se habita: Barros e Kastrup (2009), observam a proximidade com a etnografia, normalmente, operacionalizada através da observação e/ou observação participante. Entende-se também que cartografar é “desenhar a rede de forças à qual o objeto ou fenômeno em questão se encontra conectado, dando conta de suas modulações e de seu movimento permanente” (BARROS; KASTRUP, 2015, p. 57). O movimento é apreendido pelo acompanhar do processo, intervindo e implicando-se no e com o campo, na maior parte das vezes em processos já em curso.

Quando tem início uma pesquisa cujo objetivo é a investigação de processos de produção de subjetividade, já há na maioria das vezes um processo em curso. Nessa medida, o cartógrafo se encontra sempre na situação paradoxal de começar pelo meio, entre pulsações (BARROS e KASTRUP, 2009, p. 58).

Não à compartimentalização: a processualidade da cartografia não se refere apenas ao pegar uma pesquisa no meio de um processo em curso. Ela diz respeito ao modo de pesquisar. Os passos da pesquisa, tradicionalmente separados e organizados sequencialmente, não se separam na cartografia: “a processualidade está em todos os momentos – na coleta, na análise, na discussão dos dados e […] na escrita” (BARROS; KASTRUP, 2009, p. 59). As etapas de pesquisa na cartografia podem ser expressas como o próprio caminhar, produzido por passos que se sucedem sem se separar, cada um traz consigo o movimento anterior e precede o seguinte.

 

 

 

  1. Pista 4 – movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia

 

A utilização de dispositivos: tem o objetivo de viabilizar o trabalho com os objetos em movimento, sem coloca-los em categorias fixas que fariam perder o fluxo processual no qual as subjetividades são produzidas (KASTRUP; BARROS, 2009).

A cartografia é um procedimento construído caso a caso. A cartografia, enquanto método, requer procedimentos concretos encarnados em dispositivos. Os dispositivos são “máquinas de ver e falar”, ou ainda

Um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre esses elementos (FOUCAULT, 2005, p. 244).

O dispositivo caracteriza-se: por sua força em romper o que estava bloqueado à criação. São três os movimentos-funções dos dispositivos destacados por Kastrup e Barros (2009): 1. “Movimento-função de referência” – deve ser utilizado de forma regular, articula a variação e a repetição; 2. “Movimento-função de explicitação” – é o “ato de trazer a consciência uma dimensão pré-reflexiva da ação” (idem, p.83) exploram o território no qual se opera a pesquisa/intervenção; e 3. “Movimento-função de produção e de transformação da realidade” – que, a partir da tensão gerada no movimento-explicitação, gera transformação no estado das coisas.

 

 

  1. Pista 5 – o coletivo de forças como plano de experiência cartográfica

 

Em busca do equilíbrio: a cartografia com sua dupla natureza de pesquisa e intervenção, tem o desafio de equilibra-se entre o movimento de produção constante dos objetos que animam o mundo ao mesmo tempo que ao acessar o plano coletivo de forças dessa construção, Escóssia e Tedesco (2009) explicam:

a gênese constante das formas empíricas, ou seja, o processo de produção dos objetos do mundo, dentre eles, os efeitos de subjetivação. Ao lado dos contornos estáveis do que denominamos formas, objetos ou sujeitos coexistem planos de forças que os produzem. (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 92).

O sentido de coletivo de forças: não se refere ao conceito de social ou grupo, se aproximando das noções de Estado, sociedade, comunidade, coletividade. Esse modo de entender o coletivo segue outras dicotomizações combatidas pela cartografia como teoria-prática, sujeito-objeto, mente-corpo etc. Na rede conceitual utilizada na cartografia o sentido de coletivo é constituído pelas relações presentes entre o plano das formas e o plano das forças, produtores da realidade. A distinção entre eles não é sinal de oposição, mas sim de potência na construção de relações reciprocas, gerando cruzamentos múltiplos.

O plano das formas: é o plano do instituído, das figuras já estabilizadas. Como os objetos do conhecimento, constituidores da realidade percebida, seja pela apreensão sensorial, por leis ou pela probabilidade cientifica. Porém, esses objetos do mundo não possuem natureza fixa, pelo contrário, estão em constante transformação. São o resultado da interação dos planos de formas com o plano do coletivo de forças. É a estabilização provisório do jogo de forças, nos convencemos da universalidade do mundo que nos rodeia (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009).

Já o plano coletivo de forças: é um conceito central para o entendimento da proposição não dicotomizada da cartografia. É também definido como plano transindividual ou pré-individual. Esse é o território (espaço-tempo) entre o individual e o social, o plano onde se dá a criação das formas individuais e sociais, a origem dos processos de mudança/transformação(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009).

Dimensão individualizada e pré-individualizada: é na matéria pré-individual, sem contornos precisos e não delimitável, onde os fluxos de energia interferem a todo instante na continua gênese dos indivíduos classificada como um sistema metaestável. O resultado da matéria pré-individual é a individuação ou forma individualizada, é constituída por aparente homogeneidade e contorno definido. Temos então as duas dimensões: individualizada com a propensão a ser repetida, e assim reconhecida como “verdade” por suas características serem delimitadas; e a dimensão pré-individual caracterizada por pontos singulares, alheios a ordenação e impossível delimitação(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009).

O exercício cartográfico é navegar na coexistência destes dois planos: sendo capaz de apreender os objetos e fatos empíricos (individualizados), porém contentores de uma realidade pré-individual. É do contato entre esses planos dessimétricos que emergem “estados críticos, situações problemáticas que exigem a procura de soluções” (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 98). Ou seja, o empírico (da regra, sistema, lei, processo, procedimentos) em não simetria com o pré-individual (intensidade e singularidades impessoais) é sujeito a uma nova fase de individuação, processo que redefine o ser individuado (individuo, grupo, instituição), que permanece com uma carga pré-individual podendo ser ativada a qualquer momento.

O conceito na prática: ao que no primeiro olhar parece um conceito abstrato e distante, quando observamos os processos de transformação organizacional, e até mesmo o uso dos sistemas de atividade para atualização de práticas organizacionais e justamente essa a conexão esperada, porém partindo-se do princípio de que os sujeitos já foram capazes de elaborar, ou serão capazes de elaborar o subjetivo e propor uma atualização para a prática presente. Assim como apresenta a limitação da observação do constituído, e reforça a importância da pista 4, e da capacidade de construir dispositivos que possam deslocar o indivíduo de um ambiente “sufocador” desta conexão com as possibilidades do devir (plano pré-individual).

Nesse sentido, o olhar do pesquisador voltado exclusivamente ao plano das formas instituídas revela sua insuficiência, na medida em que deixaria de fora da investigação parte constituinte do objeto estudado. As coisas e os estados de coisas, presentes no plano das formas, não seriam realidades fixas, mas efeito de recortes temporais do processo e corresponderiam a determinados momentos ou fases do contínuo movimento de variação gerado pelo contato (DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 99)

Atualizamos assim o desafio da cartografia, de apreender as formas, porém ser capaz também de abarcar o seu processo contínuo de criação (individuação). Investigar as formas sem dissociá-las da dimensão processual, ou plano coletivo de forças moventes.

“Se o plano pré-individual das forças está sempre presente, ao lado do plano das formas, como potência para novas individuações, acessar o plano coletivo de forças é essencial à pesquisa cartográfica”(DA ESCÓSSIA; TEDESCO, 2009, p. 100). Como durante a pesquisa cartográfica a exploração ao plano transindividual pode ser habilitada?

 

  1. Pista 6 – cartografia como dissolução do ponto de vista do observador

 

Plano de pesquisa: são três as ideias que compõem o plano de pesquisa ou plano de ação cartográfico: transversalidade, implicação e dissolução do ponto de vista do observador. A dissolução do ponto de vista do observador requer da pessoa pesquisadora inicialmente a desconstrução da separação entre sujeito e objeto.

É através da transversalidade que a pesquisa-intervenção, altera os padrões comunicacionais propiciando um espaço de abertura para emergir o possível (pré-individual) que ainda não foi individualizado. Adiciona-se ao espaço propiciado pela transversalidade a implicação da pessoa pesquisadora “implicados estamos todos em qualquer atividade de produção de conhecimento”(PASSOS; EIRADO, 2009, p. 117), daí a necessidade se fazer uma análise das implicações.

A dissolução do ponto de vista do observador: expõe a pessoa cartógrafa a novo paradoxo “habitar a experiência sem estar amarrado a nenhum ponto de vista e, por isso, sua tarefa principal é dissolver o ponto de vista do observador sem, no entanto, anular a observação” (PASSOS; EIRADO, 2009, p. 123).

O paradigma presente à cartógrafa não é o do conhecer, mas o do cuidar: o cuidar como única forma de conhecer, o cuidar para cultivar uma realidade possível, emergente, embrionária. Para tal, necessita escapar a tentação de apenas buscar a solução dos problemas presentes e testar suas hipóteses. É no exercício da incorporação dos diversos pontos de vista sem se deter a predileções prévias que se possibilita transitar nesse espaço em construção (PASSOS; EIRADO, 2009).

Passos e Eirado (2009) explicam a importância da abertura para outras verdades possíveis:

quanto maior a certeza acerca dessa verdade nascida da experiência –, menor é o grau de abertura da experiência para a mudança, o que equivale a dizer, menor o seu coeficiente ou quantum de transversalidade. Assim também, essa variabilidade afeta a atitude implicacional do pesquisador: tanto maior a certeza do pesquisador acerca da verdade que surge em sua experiência com o campo de intervenção, menor a sua dissolvência no plano implicacional e, consequentemente, maior a sua sobreimplicação no trabalho de pesquisa. Maior abertura da experiência ou efetiva dissolução do ponto de vista do observador requer o reconhecimento da performatividade da experiência e a recusa de seu caráter de obrigação existencial(PASSOS; EIRADO, 2009, p. 125).

A pessoa cartógrafa lança-se à experiência em busca do emergir: seu e do mundo, sem estar distante a ponto de desvincular-se e nem preso em suas lentes próprias. É pela sua vulnerabilidade frente a experiencia que é capaz de acompanhar a emergência do campo, e por sua própria dissolvência performa seu caminho.

 

  1. Pista 7 – cartografar é habitar um território existencial

 

É necessário habitar para cartografar: um território é explicado por sua expressividade, como lugar de passagem, de constante transformação. Assim sendo é necessário à cartógrafa uma imersão para que possa conhecer. “O trabalho da cartografia não pode se fazer como sobrevoo conceitual sobre a realidade investigada. Diferentemente, é sempre pelo compartilhamento de um território existencial que sujeito e objeto da pesquisa se relacionam e se co-determinam” (ALVAREZ; PASSOS, 2009, p. 131).

Um território não pode ser entendido como algo prévio que sempre existiu de forma independente. Personagens e paisagens se constituem mutuamente, reafirmando a natureza do território como lugar de passagem com constante transformação. Por isso, é necessário habitar para cartografar, inserir-se, engajar-se, conhecer “com” os sujeitos ali presentes, fazer parte da própria composição do território a ser conhecido/cultivado(ALVAREZ; PASSOS, 2009).

Nesse processo, mais do que deter-se a execução de normas técnicas, é a disposição por compor com o território que possibilita habitá-lo.

 

  1. Pista 8 – por uma política da narratividade

 

Toda produção de conhecimento nos implica politicamente: pois se dá a partir de uma tomada de posição da pessoa pesquisadora/cartógrafa. A escolha da fala a ser destacada, a pergunta feita, o referencial teórico escolhido, o território explorado entre todas as outras escolhas e implicações feitas durante e pesquisa são todas tomadas de posição numa política de narratividade (PASSOS; BARROS, 2009b).

Com esse sentido ampliado, a política é a forma de atividade humana que, ligada ao poder, coloca em relação sujeitos, articula-os segundo regras ou normas não necessariamente jurídicas e legais. Não mais pensada exclusivamente a partir de um centro do poder (o Estado, uma classe), a política se faz também em arranjos locais, por micro relações, indicando esta dimensão micropolítica das relações de poder (Foucault, 1977) (PASSOS; BARROS, 2009b, p. 151).

Desestabilizar para emergir: o exercício cartográfico propõe uma resistência às redundâncias comuns nos relatos de caso padrão, nos quais a repetição para reforço de clareza ou importância do caso. A proposta cartográfica sugere uma desmontagem do caso em si, de sua estrutura, permitindo que os micro casos e as micro lutas que o permeiam componham também a cena. Desestabilizar o caso, provendo condições para que as forças que o compõem possam emergir, destacando as conexões, movimentos, linhas de fuga que possibilitam sua transformação (PASSOS; BARROS, 2009).

É, portanto, na escolha da cartógrafa de como será a forma com que irá narrar o que se passa, do que acontece no território. Já que o conhecimento expresso na narrativa não é apenas um problema teórico, mas também um problema político.

Há uma ressonância muito grande entre o posicionamento da cartógrafa, um pesquisador interventor e as premissas apresentadas na seção 3, onde exploramos a Lente Teórica. Ao passo que se faz relevante entendermos como a CHAT e Cartografia podem funcionar juntas.

 

 

  1. Integrando chat e cartografia

 

As próximas seções compões a parte da tese em que os conceitos passam a ser articulados, entre dados do campo, referências teóricas, análises, reflexões e conclusões ou proposições. Para ajudar a pessoa leitora proponho um modelo de sinalização visual da principal função de cada parágrafo, conforme o índice abaixo:



📚 – Revisão de literatura ou referência a trabalhos anteriores

💡 – Uma nova ideia ou perspectiva

🔍 – Detalhes do assunto em discussão

💼 – Descrições: caso ou exemplos

🔬 – Análise de dados ou resultados

➡️ – Transição ou mudança de tópico

💬 – Posicionamentos, opiniões, contextualizações

– Reflexões, provocações ou retórica

 

  1. Complementaridade e convergências

 

📚 A pesquisa de “runaway objects” é um tema complexo e multifacetado que demanda abordagens interdisciplinares e colaborativas (ENGESTRÖM, 2008; HÄMÄLÄINEN; VÄHÄSANTANEN, 2011), dificuldades similares são visíveis na integração entre a Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) e a Cartografia.

💡 A integração da Cartografia e CHAT tem o potencial de beneficiar a pesquisa de Objetos Fugitivos, pois a cartografia através de seu entendimento de conhecimento situado tem como um dos principais desafios a própria definição do objeto da pesquisa, e como estratégia de adaptação faz uso das pistas como estrutura de seu percurso metodológico (KASTRUP; BARROS, 2009).

🔬 Fornecendo uma abordagem interdisciplinar que promove a participação ativa das pesquisadoras e facilita a identificação de contradições e convergências entre as perspectivas envolvidas (KASTRUP; PASSOS, 2013). Essa integração tem o potencial de transformar a forma como a pesquisa de é conduzida, uma vez que apresenta um método de navegar em um ambiente volátil e desconhecido. Ao passo que a CHAT pode complementar a Cartografia oferecendo uma estrutura, inclusive visual, para construção de linguagem comum entre as pessoas envolvidas. Facilitando a criação de sentido e a estabilização temporária do Sistema de Atividade.

🔍 No entanto, um posicionamento crítico e reflexivo por parte das pesquisadoras é exigido (KAPTELININ; NARDI, 2007). Capacidade que toda pesquisadora presume ter, porém que poucos são capazes de exercer, muitas vezes justamente por estarem presos sem metodologias engessadas que antes mesmo de conhecerem o campo já determinam todos os passos da pesquisa, e em alguns casos até o resultado esperado (ALCADIPANI, 2011).

 

  1. Desafios e complexidade na integração

 

📚 A integração de CHAT e Cartografia apresenta desafios e complexidades que exigem dos pesquisadores um profundo entendimento das teorias e metodologias subjacentes a cada abordagem. Por um lado, a CHAT enfoca a análise das atividades humanas em contextos sócio-históricos específicos, considerando as interações entre as pessoas e os artefatos mediadores (ENGESTROM, 2014). Ao passo que a Cartografia enfatiza a produção de conhecimento situado, reconhecendo a singularidade e a contextualização dos fenômenos estudados (ALVAREZ; PASSOS, 2009).

🔍 A integração dessas abordagens requer dos pesquisadores a habilidade de articular os conceitos e métodos de ambas, bem como a capacidade de lidar com as incertezas e complexidades inerentes ao estudo de Objetos em Fuga e acima de tudo isso ser capaz de desistir de abrir mão de convicções, ao se dar conta de que o objeto mudou, evoluiu, se transformou (HÄMÄLÄINEN e VÄHÄSANTANEN, 2011; KASTRUP e PASSOS, 2013).

🔍 Além disso, a integração de CHAT e Cartografia implica em uma mudança na condução da pesquisa científica, uma vez que as pesquisadoras devem adotar uma postura crítica e reflexiva em relação às teorias e métodos empregados, reconhecendo as limitações e contradições presentes no processo de integração (STETSENKO, 2011). Essa mudança também envolve enfrentar resistências e desafios culturais, políticos e epistemológicos que emergem no decorrer da pesquisa (KAPTELININ; NARDI, 2007).

Por exemplo, quando a pessoa pesquisadora da temática dos times autônomos, como proposto neste estudo se dá conta de que criar uma lógica de pressão entre pares, apoiada por um sistema de gestão mais bem estruturado com uso de inteligência artificial e baseado em dados suprime a necessidade de um gestor, porém pode aumentar o controle sobre as pessoas, de forma indireta. Talvez, seja até mais maquiavélico do que ter uma pessoa gestora a quem se possa dirigir. Como esse aspecto entrará na pesquisa? Ele muda o objeto da pesquisa? Muda a pesquisa? Como você a pesquisadora se posicionará?

💡 A necessidade de adaptação e aprimoramento das metodologias de pesquisa é um aspecto crucial na integração de CHAT e Cartografia uma vez que há a necessidade de capturar dados de modo a contemplar a estrutura da CHAT para a análise, ao passo que deve ser flexível o suficiente para navegar no ambiente fluido que a Cartografia se propõe(HÄMÄLÄINEN; VÄHÄSANTANEN, 2011; STETSENKO, 2011).

🔍 A adaptação pode incluir o desenvolvimento de novas estratégias e ferramentas metodológicas que permitam às pesquisadoras abordar efetivamente os desafios e incertezas associados ao estudo de runaway objects (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010).

Por exemplo, como seria criar um questionário utilizando a Teoria da Atividade como estrutura teórica, porém com claro objetivo de intervenção na realidade pesquisada, e respeitando a construção coletiva a concepção desse instrumento deveria ser uma coprodução com as personagens da pesquisa (KAPTELININ; NARDI, 2007)?

 

  1. Resistências e desafios relacionados a diferenças culturais, políticas e epistemológicas

 

🔬 A integração de CHAT e Cartografia enfrenta resistências e desafios relacionados às diferenças culturais, políticas e epistemológicas entre as abordagens (KAPTELININ; NARDI, 2007; PASSOS; BARROS, 2009). Essas diferenças podem levar a divergências sobre questões como subjetividade versus objetividade, indeterminação versus controle e validação e generalização. A Cartografia enfatiza um olhar crítico e político, abordando questões de poder e relações sociais em seu processo de investigação, enquanto a CHAT, embora reconheça a importância do contexto e do conhecimento situado, não se concentra tão explicitamente nas dimensões políticas e críticas dos fenômenos estudados (BLACKLER; REGAN, 2009).

💡 Para lidar com essas diferenças, é fundamental que as pesquisadoras desenvolvam habilidades para gerenciar e negociar visões distintas, reconhecendo a importância de abordar contradições onto-epistemológicas e de estabelecer um diálogo entre os campos do conhecimento (STETSENKO, 2013). Além disso, a aprendizagem situada e expansiva, conectada à Cartografia e CHAT, deve ser valorizada, pois reconhece a aquisição de conhecimento em contextos específicos e promove o desenvolvimento e a inovação (ENGESTRÖM, 2001). Ao abordar as diferenças culturais, políticas e epistemológicas de forma construtiva, as pesquisadoras podem promover a integração bem-sucedida de CHAT e Cartografia, permitindo a investigação adaptativa de times autônomos e sustentáveis (KAPTELININ, 2005; VIRGÍNIA KASTRUP; BARROS, 2009).

➡️ Ao abraçar essa abordagem interdisciplinar e colaborativa, as pesquisadoras podem explorar o potencial da integração CHAT-Cartografia para gerar insights significativos e inovadores em diferentes contextos organizacionais, contribuindo assim para a pesquisa e prática no estudo de runaway objects (ENGESTRÖM, 2008).

 

 

  1. Práticas colaborativas e interdisciplinares

 

🔬 A adoção de práticas colaborativas e interdisciplinares é um elemento-chave para a integração bem-sucedida de CHAT e Cartografia. Essas práticas envolvem a formação de equipes de pesquisa multidisciplinares, nas quais as integrantes têm a oportunidade de compartilhar conhecimentos e experiências, bem como aprender umas com as outras (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2015). Esse conceito trasposto à pesquisa individual requer da pessoa pesquisadora a integração com outras pessoas, em especial com os atores da pesquisa como co-pesquisadoras e colaboradoras dos caminhos da pesquisa.

💡 Além disso, é essencial que as pesquisadoras se engajem em um diálogo aberto e construtivo com outras disciplinas e campos do conhecimento, buscando compreender e respeitar as diferenças e convergências entre CHAT e Cartografia (ALVESSON; HARDY; HARLEY, 2008). Essa abordagem colaborativa e interdisciplinar pode resultar em uma maior compreensão dos fenômenos estudados e na identificação de soluções inovadoras e eficazes para os desafios e incertezas associados ao estudo de runaway objects (ENGESTRÖM, 2008).

 

  1. Questões onto-epistemológicas

 

🔬 A utilização conjunta de CHAT e Cartografia traz à tona questões onto-epistemológicas relevantes, uma vez que ambas as abordagens possuem pressupostos teóricos e filosóficos distintos. A CHAT, fundamentada na psicologia histórico-cultural e na teoria da atividade, adota uma perspectiva materialista e dialética, enfatizando a análise de sistemas de atividade e a interação entre os sujeitos, objetos e instrumentos na construção do conhecimento (LEONTIEV, 1978; VYGOTSKY, 1978). Por outro lado, o método cartográfico. Alinhado à epistemologia pós-estruturalista, esse método advém do conceito de rizoma de Deleuze e Guattari (2011), valorizando a subjetividade, a singularidade e a emergência de novas formas de conhecimento e práticas (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2015).

💡 Apesar das diferenças onto-epistemológicas, é possível identificar convergências entre CHAT e Cartografia que favorecem a integração das abordagens. Ambas compartilham o compromisso com a análise crítica e a transformação das práticas sociais e dos sistemas de atividade, destacando a importância da reflexão, da experimentação e da colaboração no processo de investigação e construção do conhecimento (LEONTIEV, 1978; PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2015). Além disso, as abordagens enfatizam a necessidade de considerar o contexto específico e as múltiplas dimensões (cognitivas, afetivas, políticas, culturais etc.) envolvidas nas atividades e práticas investigadas (ENGESTRÖM, 2001; BENEVIDES DE BARROS; PASSOS, 2004).

🔬 Entretanto, é importante reconhecer e lidar com as contradições onto-epistemológicas na integração de CHAT e Cartografia. A pessoa pesquisadora deve adotar uma postura reflexiva e crítica, questionando os pressupostos teóricos e filosóficos das abordagens e buscando formas de conciliar ou articular as diferentes perspectivas em prol de uma análise mais rica e abrangente das práticas e sistemas de atividade investigados. A integração de abordagens distintas pode ser vista como um desafio, mas também como uma oportunidade para promover o diálogo e a aprendizagem entre diferentes campos do conhecimento e tradições científicas (KUHN, 1962).

📚 Por exemplo, a combinação de abordagens quantitativas e qualitativas, muitas vezes consideradas incompatíveis devido às suas diferenças onto-epistemológicas, tem sido defendida por pesquisadoras que adotam uma perspectiva de “paradigma de complementaridade” (DENZIN, 2010). Nesse contexto, a utilização conjunta de métodos e técnicas oriundos das ciências naturais e sociais pode ampliar o alcance e a profundidade da análise, permitindo a compreensão de fenômenos complexos e multifacetados (CRESWELL, 2015).

🔬 A integração de abordagens com diferenças onto-epistemológicas não é necessariamente um impeditivo para a aplicação conjunta, desde que sejam consideradas as especificidades e as contribuições de cada perspectiva (DENZIN, 2010; MORIN, 2008). O desafio reside em estabelecer um diálogo entre as abordagens, identificando as possíveis convergências e complementaridades, e reconhecendo as limitações e contradições inerentes ao processo de integração (KUHN, 1962). Nesse sentido, a utilização conjunta de CHAT e Cartografia pode ser vista como uma estratégia metodológica inovadora e promissora para a análise e transformação de times autônomos e práticas sustentáveis, embora exija um esforço reflexivo e crítico por parte da pessoa pesquisadora.

💡 A transição de uma discussão sobre questões onto-epistemológicas para estratégias de produção de conhecimento requer uma mudança de foco de teoria e filosofia para abordagens mais práticas. Embora a CHAT e a Cartografia tenham diferentes pressupostos teóricos, a combinação bem-sucedida dessas abordagens mostra que é possível utilizar diferentes estruturas filosóficas e teóricas de maneira complementar.

➡️ Vamos agora abordar a aplicação prática dessas ideias, explorando as estratégias usadas para a produção de conhecimento. A pesquisa não ocorre no vácuo, mas é moldada e informada por ferramentas e técnicas específicas. Estas incluem, mas não se limitam a diário de campo, observação participante, entrevista semiestruturada e pesquisa documental.

 

  1. Estratégias de produção de conhecimento

 

💼 As estratégias para produção do conhecimento foram refinadas com o decorrer da pesquisa, e à medida que oportunidades e desafio se apresentaram, utilizou-se ferramentas básicas como: a) diário de campo; b) observação participante; c) entrevista semiestruturada; d) pesquisa documental.

📚 O diário de campo é recomendado para que a pessoa pesquisadora possa registrar suas impressões durante a interação no campo, assim como para que sirva de registro e recurso para revisitar seu trajeto cartográfico. Tais anotações “colaboram na produção de dados de uma pesquisa e têm a função de transformar observações e frases captadas na experiência de campo em conhecimento e modos de fazer” (BARROS e KASTRUP, 2009, p. 70).

📚 A observação participante e as entrevistas são fundamentais por sua característica de possibilitar a observação e acompanhamento do fluxo processual objeto da pesquisa. Da mesma forma que são estratégias de produção de conhecimento também são pontos de intervenção da pessoa pesquisadora no território.

🔍A observação implica notar e metodicamente registrar: a) eventos; b) condições físicas de objetos e/ou do ambiente; c) comportamentos não verbais; e d) comportamento linguístico (VERGARA, 2000). A autora segue pontuando que observar é mais que olhar as coisas: o objetivo é contribuir para responder à pergunta geradora da investigação.

📚 Já a pesquisa documental é fundamental para o entendimento dos processos históricos assim como para uma melhor percepção da cultura organizacional presente(GODOY, 1995). Discursos, normas e posicionamentos ético-políticos são comumente expostos nos documentos organizacionais e são de grande valia tanto para compreensão do território como ponto de apoio para entrevistas e construção dos trajetos metodológicos com as participantes da pesquisa.

📚 Entrevistas como técnicas de coleta de dados incluem uma grande variedade de formas e de usos. Ainda que a forma mais comum, quando aplicada à pesquisa, seja a individual e presencial, elas podem ser em grupo e presencial, individual virtual, ou em grupo de forma virtual (FONTANA; FREY, 2000).

🔍 A entrevista individual semiestruturada em profundidade tem o entrevistado como personagem principal. Ela tem por objetivo entender, de forma detalhada, o ponto de vista do entrevistado sobre determinado objeto; já o entrevistador ocupa o papel de conduzir e complementar com perguntas o roteiro previamente preparado (BAUER; GASKELL, 2000). É provável o uso tanto de entrevistas informais como de grupos foco para melhor compreensão do território e aprofundamento em assuntos específicos, respectivamente.

💬 Utilizaram-se dados secundários não previstos, houve participação em eventos e abordagem de autores acadêmicos e não acadêmicos. Fóruns, conversas e interações formais e informais constituíram a exploração do território, cultivaram relações com os atores da pesquisa e proporcionaram acesso a dados intermediários que viabilizaram avanços significativos na pesquisa. Estas foram algumas das formas não previstas que constituíram a jornada, ferramentas e estratégias de produção de conhecimento.

Quadro 8 – Participantes da pesquisa Teal Brasil

Participante

Organização

Entrevista

Construção conjunta

Interação Assíncrona

Participante 1

Teal Brasil

X

X

X

Participante 2

Teal Brasil

X

X

X

Participante 3

Teal Brasil

X

X

X

Participante 4

Teal Brasil

X

X

X

Participante 5

Teal Brasil

X

X

X

Participante 6

Teal Brasil

X

 

X

Participante 7

Teal Brasil

X

 

X

Participante 8

Teal Brasil

   

X

Participante 9

Teal Brasil

   

X

Product Manager 0

Tango

   

X

Product Manager 1

Tango

X

 

X

Project Manager

Tango

X

X

X

Senior Developer1

Tango

X

 

X

Developer1

Tango

X

 

X

Developer2

Tango

X

 

X

Developer3

Tango

X

 

X

Delivery Principal

Tango

X

X

X

Beach Lead

Tango

X

 

X

Lead Product Manager

Tango

X

 

X

Global Procurement

Tango

X

 

X

Learning & Development Specialist1

Tango

X

X

X

Head of L&D Brazil and Latam

Tango

X

X

X

Account Manager

Tango

X

X

X

Legal

Tango

   

X

Fonte: Autor

 

Abaixo, o processo de pesquisa de campo, fornecendo uma visão geral dos principais movimentos e a duração de cada etapa.

 

Quadro 9 – Overview do campo na Tango

Fase

Período

Atividades

Fase de Planejamento e Negociação

04 de Abril, 2022 – 03 de Maio, 2022

– Contato inicial e apresentação do projeto

– Negociações e ajustes com o Product Principal e o Project Manager

– Desafios na obtenção de retorno e permissão para acompanhar um time

Eventos Internos e Sociais

17 de Maio, 2022 – 19 de Maio, 2022

– A organização e sua posição em questões sociais

– Discussões sobre liderança, maternidade e diversidade

Início do Acompanhamento de Equipes

27 de Maio, 2022 – 15 de Junho, 2022

– Expectativa e confirmação do acompanhamento dos times

– Entrevista com os desenvolvedores

– Primeiros passos no acompanhamento das reuniões do Time1

Expansão das Conexões Internas

01 de Julho, 2022 – 31 de Agosto, 2022

– Ampliação do entendimento dos processos internos

– Interação com novas figuras-chave

– Esforço para estabelecer conexão com a gestora da “Praia”

Consolidação do Acompanhamento de Projetos

12 de Setembro, 2022 – 28 de Novembro, 2022

– Apresentação do projeto a outras lideranças

– Esforços para reforçar conexões

– Acompanhamento de projetos com novos times

Entrevistas e Conexões Globais

11 de Novembro, 2022 – 6 de Janeiro, 2023

– Entrevistas com Global Procurement

– Estabelecimento de conexões com novos entrantes

– Colaboração contínua com o Global Software Procurement

Apresentação e Aplicação do Framework

7 de Março, 2023 – 7 de Março, 2023

– Conexão com Learning and Development (L&D)

– Proposta de aplicação do framework

– Apresentação do projeto à Head of L&D Brazil and Latam

Execução e Feedback do Projeto

17 de Março, 2023 – 2 de Maio, 2023

– Implementação do projeto

– Coleta de feedback e adaptação do modelo

– Kick-off e condução do programa

– Coleta de feedback e avaliação do impacto

Fonte: Autor

 

 

  1. Aspectos éticos

 

📚 Formalização: o processo de pesquisa na Tango foi formalizado com a assinatura de um Acordo de Confidencialidade (NDA). Todas as minhas interações com as pessoas colaboradoras da Tango foram sempre precedidas de uma apresentação pessoal, da pesquisa e do consentimento dos participantes (FLICK, 2022) .

Nas interações com as participantes da Teal Brasil, segui o mesmo protocolo de me apresentar como a pessoa pesquisadora, e a pesquisa. A vivência no Teal Brasil foi mais prolongada, o papel de voluntário se sobressaiu na forma como as relações foram constituídas com o grupo.

🔍 Consentimento: em algumas situações fizemos a gravação da conversa com a utilização do recurso do Zoom, onde todas as partes ficam cientes da gravação. Em outros casos, sempre que entendi que seria capaz de tomar notas dos assuntos, evitei gravar para que a outa parte se sentisse mais à vontade(SALMONS, 2014).

Na Teal Brasil, nas entrevistas, o mesmo protocolo foi adotado da gravação quando necessário, e da preferência por anotações paralelas.

💡 Anonimato: decidi manter o anonimato das pessoas participantes e da empresa Tango. Mesmo com a anuência de identificação, pois entendi que preservar as pessoas e a informação não era relevante para o objeto do estudo. Identifiquei outras pessoas que participaram de alguma forma da pesquisa, por entender que não houve utilização de dados, nem informações sensíveis incorporadas ou utilizadas de forma direta no texto aqui produzido.

 

 

  1. Análise

 

📚 O cartografar desta pesquisa, diferentemente das pesquisas de caráter representacional, não existiu etapa separada e subsequente à coleta de dados destinada à análise. No fazer cartográfico, esses movimentos caminharam juntos, se retroalimentaram e ajudaram a definir e estabelecer as rotas de exploração do território investigado(BARROS; BARROS, 2013).

📚 “Analisar é, assim, um procedimento de multiplicação de sentidos e inaugurador de novos problemas” (BARROS; BARROS, 2013, p. 375). Se contrapondo ao senso comum da pesquisa cientifica, ao cartografar se produz novas perguntas e problemas que levam a exploração do território a um próximo patamar de entendimento e complexidade, Barros e Barros (2013) pontuam:

toda “solução” é coextensiva a um modo de colocar o problema; o problema não é dado, ele depende da criação dos termos nos quais ele vai se apresentar. Analisar é, assim, um procedimento de multiplicação de sentidos e inaugurador de novos problemas.(BARROS; BARROS, 2013, p. 175)

📚 A análise é o trabalho de desestabilização do que se apresenta, abrindo espaço do “individualizado” para o “transindividual”, é na análise conjunta com o campo que se deve ser capaz, de forma sensível, abrir o espaço e avançar nos questionamentos presentes na pesquisa a partir dos devires presentes no território(KASTRUP; PASSOS, 2013).

💬 A pesquisa seguiu o padrão sugerido pelo fazer cartográfico: a) rastreio; b) toque; c) pouso; d) reconhecimento atento (KASTRUP; PASSOS, 2013), com algumas adaptações.

💬 Na prática os movimentos não ocorreram de forma tão bem delimitada como na literatura, descritos por Kastrup e Passos (2015). O processo de rastreio, que representa um monitoramento do campo em busca de sinais e movimento, pela escolha do tema de pesquisa, é um movimento incorporado no meu trabalho e na forma como me relaciono com o mundo.

💼 Participar em fóruns, podcasts, eventos (em especial on-line), publicações de novos trabalhos e das redes sociais de autores e pessoas influentes do campo, são as formas principais com que busco a novidade de sinais e movimentos (PASSOS; KASTRUP; DA ESCÓSSIA, 2015).

💼 Ao que me leva a “incursões” em temas específicos de tempos em tempos, motivado por interesse, por alguma demanda de trabalho, ou por colaboração com outro profissional ou pesquisador em que se faz necessário um maior domínio sobre algum assunto. Movimento entendido como Toque na literatura.

➡️ Por esses motivos, utilizarei o conceito do “Pouso” para descrever as incursões operadas neste estudo.

 

 

  1. TERRITÓRIO

 

Rastreio e toques

💼 Nos anos de 2019 e 2020 monitorei iniciativas, projetos e organizações. Palestras, e eventos on-line, assim como visitas às empresas, interação nas redes sociais e fóruns de debate sobre os temas relacionados ao futuro do trabalho, novas formas de organizar, e movimentos como B Corps, Regenerative Organizations e Teal Organizations. Abordei autoras de livros, de podcasts, autores de artigos, pessoas diversas que se mostraram abertas e dispostas a interagir e apoia meu processo, alguns desses contatos no Quadro 10 – Abordagens .

Quadro 10 – Abordagens

Contato

Data

Formato

Atuação

Tema

Aaron Dignan

out/19

Online

Autor livro

Autogestão

Lisa Gil

nov/19

Online

Podcast

Autogestão

Brett Bligh

2023

Online

Acadêmico UK

Teoria da Atividade

Sebah Al Ali

2023

Online

Acadêmica UK

Teoria da Atividade

Thomas Eckardt

out/19

Presencial

Autor livro

Capitalismo Consciente

Jorg Audy

jun/19

Presencial

Professor

Agilidade

Aitor Zizarza

mar/20

Online

Pesquisador

Empreendedorismo em Equipe

Jose Mari

mai/20

Online

Professor

Empreendedorismo em Equipe

Liher Pillar

jun/20

Online

Pesquisador

Aprendizagem

Alicia Gómez

ago/20

Online

Professora

Empreendedorismo em Equipe

Rodrigo Yoshima

abr/20

Online

Profissional

Agilidade

Zoe Fitzgerald

abr/20

Online

Profissional

Aprendizagem

Monica Lemos

jun/20

Online

Pesquisador

Teoria da Atividade

Felipe Anghinoni

out/19

Presencial

Profissional

Aprendizagem

Fonte: Autor

 

  1. Primeiro pouso

 

💼 Resultado dessa movimentação no campo, em 2021, tive uma primeira conversa sobre a iniciativa, algumas agendas online depois fui convidado para integrar o projeto Teal Brasil, que tem como objetivo “despertar a comunidade brasileira de pessoas que buscam reescrever a história do mundo por meio das organizações”. Fazendo uso da Teoria da Atividade.

🔬Descreveria o movimento da seguinte forma:

  1. Objeto do movimento é: encontrar e divulgar práticas de organizações que operam na lógica TEAL;
  2. Artefatos: plataforma Notion, Google Meet, e Miro como ferramentas principais para estruturar os trabalhos;
  3. Sujeito: formada por pessoas voluntárias;
  4. Comunidade: pessoas voluntárias, empresas com práticas TEAL e pessoas interessadas no assunto;
  5. Regras: sociocracia é a metodologia e filosofia de gestão adotada pela iniciativa;
  6. Divisão do trabalho: a inciativa foi organizada e, três times funcionais, autônomos: a) Squad Coleta, b) Squad Escrita, c) Squad Geral.

Neste período tive a oportunidade de observar, participar e influenciar neste movimento, que se autointitulava uma organização em rede, que buscava, não só mapear as organizações com práticas Teal, mas também ser um exemplo no uso de práticas e ferramentas alinhadas com essas premissas.

📚 Pude verificar na TEAL Brasil e nas Organizações mapeadas muitos dos aspectos apontados pela literatura de Organizações Hibridas, em especial:

  1. Dificuldades de equilibrar um espaço de contradição entre uma iniciativa sem fins lucrativos, e a necessidade de dinheiro para sustentar e gerar o impacto desejado;
  2. Falta de alinhamento e construção de sentido compartilhada entre as pessoas da Organização;
  3. Dificuldades de priorização e definição do modelo de negócio;
  4. Desafio em sustentar as premissas em momentos de risco à sustentabilidade financeira da organização;
  5. Necessidade de treinamento e desenvolvimento, técnico (ferramentas digitais) e não-técnico (premissas do movimento Teal), soft-skills;

📚 Os cinco itens são recorrentes na literatura, podemos destacar em especial o trabalho de Battilana (BATTILANA et al., 2015; BATTILANA; LEE, 2014; EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014)

    💬 O conceito de uma organização que gera receita e remunera suas colaboradoras, mesmo que sem retirada de lucros, é muitas vezes desafiador para pessoas que se conectam fortemente com o propósito e a ideologia do movimento ou organização (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

    💬 A falta de alinhamento do sentido compartilhado coletivo (WEICK; ROBERTS, 1993) potencializado por processos de governança não estabelecidos, adicionado ao convite de uma gestão horizontalizada e participativa, acaba gerando resistências internas que consomem muito da energia da organização em fazer alinhamentos, convencimentos e explicações.

    💬 A falta de clareza de visão e objetivos, faz com que o foco interno seja direcionado par ao desenho dos processos, e não no proposito organizacional (Objeto da Atividade). É como se o Sistema da Atividade da organização. Ao não ter clareza do Objeto da Atividade (motivo de existir), buscasse nos valores e premissas o motivo, gerando um movimento entrópico do sistema.

    🔍 Situação descrita na literatura, da dificuldade de a Organização Híbrida construir e sustentar um Objeto da Atividade que mantenha a organização mobilizada. Ao que se agrega da dificuldade de atualizar o Objeto e Sistema de Atividade de acordo com as mudanças do ambiente, essencialmente pela resistência das partes envolvidas de reconstituir a imagem e as histórias constituídas daquela organização. (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

💬Com um Sistema Operacional não funcional a iniciativa foi sendo consumida pelas pessoas que fizeram parte dela. Com espasmos de esforço individual, o que acabou gerando mais conflito pelo sentimento, e realidade, de poucas pessoas levando os outros nas costas, e nos momentos de sucesso a lógica colaborativa sendo evocada para que os louros fossem divididos, ou contestando as decisões tomadas por aqueles que lideraram o processo.

📚 Na literatura encontramos a indicação de um processo de seleção baseado em compartilhamento de valores, um investimento constante em desenvolvimento da equipe, e adiciona à equação a necessidade de processos de governança claros. Ao que ele aponta a recorrência de Organizações Híbridas com dificuldades de ter clareza dos direcionadores estratégicos (EBRAHIM; BATTILANA; MAIR, 2014).

Figura 28 – Relações do Sistema de Atividade

Fonte: Autor adaptado de (AL-ALI, 2020; BLIGH; FLOOD, 2015)

 

Quando analisado pela lente da Teoria da Atividade, podemos identificar essas como contradições do sistema, em especial na área que chamamos de construção social do Sistema da Atividade (SA) (ver Figura 28). As Regras, Comunidade e Divisão do Trabalho.

🔍 Passando para um contexto mais específico, no caso da TEAL Brasil, a dificuldade em definir o objeto da Atividade afetou diretamente a eficiência dos outros Sistemas de Atividade. Esse impacto foi ampliado devido à proposta de um sistema colaborativo e aberto (altamente permeável), à participação parcial das pessoas devido à natureza voluntária do trabalho e à desconexão entre a ação e a Atividade Principal, mesmo com a proposta de organização por times que deveriam liderar projetos.

💼 Esta situação fica clara na ausência de um modelo organizacional no nosso grupo Teal Brasil Mapeamento, onde, apesar do uso da sociocracia e do sistema “notion.so”, ocorre uma grande confusão sobre a relevância, impacto e priorização das tensões observadas.

 

OS REFLEXOS DA FALTA DE LENTES:

 

🔍 Ao considerarmos a abordagem da Sociocracia, observamos que as contradições são mapeadas e tratadas pela equipe, sendo nomeadas como tensões. Esse padrão é adotado em abordagens mais progressistas da agilidade. Contudo, apesar da adequação da ferramenta e da rotina de processamento das tensões proporcionarem uma sensação de progresso, ficou evidente o sentimento de combater incêndios em vez de abordar os assuntos realmente necessários (KOCH-GONZALES; RAU, 2019; LEMAY, 2019).

💼 Para ilustrar isso, podemos citar três tensões que foram mapeadas em uma reunião em novembro de 2021: a falta de orientação clara sobre o uso do conteúdo, a indefinição das responsabilidades das pessoas que entrevistaram o caso, e a demanda excedendo a capacidade da equipe. A falta de um modelo organizacional torna subjetiva a priorização das tensões. O uso da Teoria da Atividade pode ajudar a construir uma visão compartilhada com relação à natureza e a prioridade dessas tensões.

🔍 A metodologia da sociocracia promove a participação e encoraja a criação de um espaço seguro para que sentimentos sejam compartilhados, fortalecendo a conexão entre a equipe e a construção de engajamento e pertencimento. No entanto, a ausência de um prisma interpretativo capaz de compreender a natureza interconectada dos Sistemas de Atividade e servir como um artefato mediador para o grupo resulta em uma consideração das visões individuais, mas falha, ou falhou, em possibilitar a construção de um sentido compartilhado dentro da equipe e da organização (WEICK; ROBERTS, 1993).

🔍 A não mediação de um artefato, coloca a discussão em um estado de embate de percepções e sentimentos a partir de pontos de vista distintos. Ativando experiências pessoais passadas traumáticas, ou sistemas de defesa em processos de embate de ideias. Fazendo com que o cultivo de um espaço de respeito e segurança psicológica acabe evitando que a tensão criativa apareça (EDMONDSON, 1999).

🔍 Em times mais maduros, ou com uma liderança com habilidades pessoais destacadas, pode trilhar esse espaço de tensão entre o conhecido e o desconhecido em busca da construção de um sentido compartilhado. Porém, essas características são raras, especialmente lideranças capazes de transitar entre posições mais diretivas e menos diretivas de acordo com as necessidades do grupo(LEINONEN et al., 2004).

💼 Esse é um exemplo empírico de uma questão recorrente na gestão de times, como apontado por Dignan (2019) e sua indicação de utilização das tensões como estratégia de mapeamento para evoluir os combinados do time e sistemas da organização.

📚 Diferentes autores apresentam esta ideia de formas variadas. Por exemplo: Engeström se refere à aprendizagem expansiva, Heifetz fala em solucionar problemas adaptativos, David Snowden falará em estabilizar problemas complexos, Weick utiliza o conceito de criar sentido compartilhado. Podemos incluir Robert Kegan em seu trabalho sobre Imunidade à mudança nesta mesma linha (ENGESTRÖM, 2001; HEIFETZ, RONALD, GRASHOW ALEXANDER, 2009; KEGAN; LAHEY, 2009; SNOWDEN, 2005)

Os autores citados, destacam a necessidade de ser capaz de “apresentar” o problema/ contradição/ tensão. Pois o principal desafio de mudar ou evoluir um sistema, não é encontrar uma solução ao problema. Mas sim, incluir as partes envolvidas para que elas possam construir soluções situadas, alinhadas à visão da organização e seguindo as premissas e valores compartilhados.

💡 A utilização da Teoria da Atividade, como artefato organizador das contradições apontadas pelo time pode ser útil em processos de gestão do dia a dia em geral, e especialmente em organizações que trabalham com equipes autônomas.

➡️ Desdobramento: com o desgaste e a perda de energia para manter o movimento, a TEAL Brasil foi convertida em uma Sociedade Limitada, com as integrantes da equipe “Core” se tornando sócios da empresa. Foi preciso fechar o sistema para estabilizá-lo e permitir que o objeto fosse definido por um grupo mais compacto, sem as lacunas de conhecimento e visão apresentadas no formato de rede.

 

  1. Teal brasil – plataforma de conexão

 

A experiência adquirida durante o processo, a evolução na compreensão da Teoria da Atividade Histórico-Cultural (CHAT) e o valor da cartografia como guia de abordagens, ferramentas e posicionamento foram aspectos enriquecedores dessa jornada. Além disso, tive a oportunidade de interagir com uma série de organizações, tanto diretamente quanto indiretamente.

👀 Novamente uma pitadinha de serendipidade no processo de pesquisa.

💼 Como voluntário da TEAL Brasil, tive a oportunidade de conduzir entrevistas com gestoras da Natura&Co, resultando na produção de dois artigos detalhados sobre as iniciativas em curso na organização. O primeiro artigo, descrevendo o projeto CorageN, detalhou o processo de seleção de trainees. Este projeto busca substituir o modelo tradicional de contratação por competências e foca em indivíduos com experiências de vida e visões de mundo únicas, que geralmente seriam excluídos de um processo seletivo tradicional.

💼 O segundo artigo, descrevendo o projeto My Performance, explorou o processo de avaliação de desempenho. My Performance visa remodelar a forma como o desempenho dos funcionários é avaliado e monitorado. Além de considerar resultados financeiros, também aborda aspectos do desenvolvimento pessoal e impacto socioambiental. Este projeto é projetado para dar mais autonomia às pessoas, acelerar a curva de aprendizado e fomentar o desenvolvimento integral do indivíduo, não apenas considerando habilidades técnicas e interpessoais, mas também um olhar para o desenvolvimento pessoal.

 

Figura 29 – Mapa de organizações com práticas TEAL


Fonte: Autor

 

💼 A gestora da Natura encerrou o vínculo após a conclusão do artigo sobre o projeto My Performance, acabou por interromper a possibilidade de expandir minha pesquisa, dada a falta de interesse ou disponibilidade. Durante esse período, tive a oportunidade de acompanhar a produção dos artigos, trocar informações com outros voluntários e acessar a documentação das entrevistas (todas de livre acesso). Foram listadas mais de 100 empresas e mais de 30 foram entrevistadas (Figura 29).

💼 Durante esse processo, auxiliei na produção e execução das duas edições do Teal Brasil Festival. Este evento online foi criado para reunir a comunidade corporativa e as pessoas interessadas no tema do futuro do trabalho, propondo uma nova forma de clima organizacional para o conceito Teal, as duas iniciativas contaram com cerca de 3.000 pessoas. Durante o festival, foi possível realizar um mapeamento das tendências e práticas discutidas, com base em dados secundários coletados.

💼 A partir das experiências e trocas trazidas pelo Teal Brasil, pude reunir uma série de informações e dados relacionados às “organizações referência”, e a comunidade de profissionais interessados no tema, em especial suas áreas de interesse e pontos de desenvolvimento necessários.

📚 Em grande parte, essas organizações utilizam referências similares em suas práticas. A sociocracia é uma referência recorrente, especialmente pela forma como organiza equipes e estrutura os processos de tomada de decisão, sem perder o controle sobre as pessoas. Os métodos ágeis também são comuns nessa comunidade, organizando planos em torno de projetos e times que podem ter mais ou menos autonomia (KOCH-GONZALES; RAU, 2019; LEMAY, 2019).

📚 Tornou-se evidente o papel crítico que a ‘tensão’ desempenha. Dentro deste contexto, ‘tensão’ se refere a qualquer oportunidade de melhoria de um processo ou combinação, identificada por um membro da equipe, seja em uma reunião síncrona ou através de ferramentas de comunicação assíncrona. Tais ‘tensões’ atuam como sinais vitais, fornecendo feedback crucial para a evolução contínua do sistema de gestão e da composição da equipe(KOCH-GONZALES; RAU, 2019; LEMAY, 2019).

💼 Ao mapear e entender as diferentes iniciativas e práticas empregadas pelas organizações, identifiquei preocupações comuns e objetivos semelhantes entre a maioria das organizações examinadas, alinhadas com a literatura. A implementação desses modelos de trabalho levanta um ponto importante: a necessidade de treinamento adequado para as pessoas entenderem, absorverem e aplicarem esses modelos (BATTILANA; LEE, 2014).

🔍 Continuando essa linha de pensamento, o trabalho de Battilana (2014) destaca um desafio importante: a manutenção da cultura organizacional em organizações em crescimento. A chegada de novos membros pode colocar em risco a cultura existente, criando obstáculos ao crescimento organizacional. Esta questão, juntamente com situações em que as organizações estão em meio à transformação cultural e à mudança de suas práticas de trabalho, realça a complexidade do desafio de integrar novas abordagens em seus times.

🔬 A partir da análise do campo elaborada com a literatura, destaco os seguintes desafios nas Organizações Hibridas que transitaram no ecossistema da Teal Brasil: o processo de seleção e contratação, a sustentação da cultura nas organizações em crescimento, a necessidade de desenvolvimento contínuo de suas pessoas, a falta de ferramentas e processos para construção de sentido compartilhado nas equipes, e a resistência à transformação cultural e mudança de práticas de trabalho.

➡️ Além, do já conhecido paradoxo em equilibrar objetivos organizacionais duplos. Com isso em mente, minha pesquisa conduziu-me a uma análise mais detalhada de uma organização específica que demonstra a capacidade de navegar nesse ambiente complexo.

 

 

  1. Segundo pouso

 

💼 Essa organização é a TANGO, com a qual tive a oportunidade de colaborar diretamente ao longo de vários meses. Com as experiências e obstáculos enfrentados no decorrer dessa colaboração, foi possível observar como os desafios apontados anteriormente se manifestam na prática, e como a TANGO se esforça para superá-los.

💼 Foi em abril de 2022 que tive o ok da empresa TANGO, autorizando o início da pesquisa. Assim, mergulhamos mais fundo na experiência da TANGO, explorando sua cultura, práticas e os caminhos que a organização escolheu para enfrentar os desafios destacados na seção anterior.

💼 A escolha da Tango se deu pelo seu destacado reconhecimento como uma organização híbrida de grande impacto social, sendo referência para benchmarks e reconhecida de forma recorrente através de prêmios e convites para ser painelista em fóruns relacionados aos temas de justiça social, equidade de gênero, inclusão e diversidade, organizações híbridas. Ao mesmo tempo que a empresa tem sede a cidade de Porto Alegre, fez parte em diversos momentos da disciplina em que fiz o estágio docente na UFRGS, e através de rede de contatos pessoal pude abrir esse canal de pesquisa na organização.

 

  1. Que empresa é essa?

 

💼 A TANGO, empresa de TI fundada nos Estados Unidos na década de 90, expandiu sua atuação para mais de 20 países, estabelecendo 50 escritórios ao redor do mundo, incluindo quatro no Brasil. Especializada em consultoria e desenvolvimento de softwares, a empresa opera com modelos presenciais, remotos e híbridos após a pandemia. A organização se estrutura de forma horizontal, dividida em duas grandes áreas: operações (OPS) e serviços profissionais (PS).

💼 A TANGO é firmemente orientada para a mentalidade social, com princípios e práticas alinhados com as melhores práticas ambientais, sociais e de governança (ESG). Em 2021, completou a primeira avaliação do Sustainability Accounting Standards Board (SASB) e se comprometeu com o Pacto Global da ONU. Além disso, usa a Global Reporting Initiative (GRI) como estrutura para compartilhar dados de impacto.

💼 A empresa é conhecida por seu ambiente de trabalho acolhedor e inclusivo. A TANGO é intrinsecamente consciente do impacto social, evidenciado por sua notável atuação em questões LGBTQI+. Ela foi votada como a empresa mais querida no Brasil em sua categoria e repetidamente classificada entre as melhores empresas multinacionais para trabalhar e para mulheres, segundo a Época NEGÓCIOS e o Great Place to Work.

💼 A TANGO é uma organização descentralizada e autônoma, onde a autonomia ficou evidenciada durante todo o tempo de convivência. A autorização para a pesquisa foi concedida diretamente pela área jurídica, sem a necessidade de um intermediário. A TANGO é uma comunidade vibrante de indivíduos apaixonados, comprometida com a transformação da indústria de TI e com a inclusão e diversidade.

💼 Os três pilares fundamentais da organização são: administrar um negócio sustentável, liderar na busca pela excelência em software e revolucionar a indústria de TI. A organização baseia-se na premissa de que as pessoas são boas e reflete isso em sua cultura organizacional. Além disso, a TANGO tem um forte posicionamento social, refletido em seu cuidado com a inclusão de grupos normalmente marginalizados. Evidenciado em entrevista com a Global Procurement “Sempre damos preferência para a pessoa mais marginalizada e prejudicada.”.

💼 Seus programas de inclusão e diversidade estão voltados para diferentes grupos, incluindo mulheres na tecnologia, pessoas trans e pessoas com deficiência. A TANGO também está comprometida em aumentar a diversidade racial em todas as áreas da organização.

💬 Seu processo seletivo é um aspecto central de suas práticas inclusivas e diversificadas. As próprias colaboradoras conduzem as entrevistas e tomam a decisão final sobre a contratação. O processo reforça e reflete os valores de diversidade e inclusão da empresa. Como dizem: “Mais do que saber, ou atuar de forma exemplar, buscamos pessoas que estejam abertas para aprender.”

💬 Esse processo seletivo também é significativo do ponto de vista da representatividade. As entrevistas são conduzidas por colaboradoras que refletem a diversidade da empresa, o que por si só causa um impacto profundo nos candidatos. Algumas colaboradoras relataram como foi marcante serem entrevistados por pessoas negras, como eles próprios: “Essa foi a primeira vez na minha vida que a entrevista de emprego foi feita por uma pessoa negra, como eu.” Outro depoimento ressalta: “Eu vi que a coisa era diferente quando na entrevista de emprego havia três mulheres negras conduzindo o processo.”

🔬 Esses relatos demonstram como o processo seletivo não apenas busca alinhamento cultural, mas também reforça e reflete os valores de diversidade e inclusão da empresa.

💼 Em meio ao crescimento acelerado, a empresa se destaca por sua excelência técnica no mercado de tecnologia. Muitos de suas colaboradoras são liderança em seus respectivos campos, o que ajuda a impulsionar a excelência técnica em toda a empresa. A organização investe no desenvolvimento de suas colaboradoras e incentiva a tomada de iniciativas.

💼 A TANGO é uma organização que se adapta constantemente às demandas dos clientes e às expectativas de desenvolvimento das colaboradoras. O processo de integração, ou “onboarding”, é um exemplo disto. O processo é projetado para ser inclusivo, abrangente e voltado para o desenvolvimento da colaboradora, incorporando tanto a cultura organizacional quanto o conjunto de habilidades técnicas necessárias para o sucesso na organização.

💼As pessoas contratadas passam por um programa de integração detalhado que dura várias semanas. O programa inclui treinamento sobre os valores e cultura da empresa, bem como orientação sobre as práticas e procedimentos operacionais. Além disso, cada nova contratada é designado para uma mentora que fornece orientação e suporte contínuos durante as primeiras semanas e meses na empresa.

🔍 Uma parte fundamental do processo de integração é garantir que todos as novas colaboradoras entendam e se sintam confortáveis com a cultura de diversidade e inclusão da empresa. Isso inclui orientação sobre como navegar em uma organização horizontal, sem uma hierarquia rígida, bem como treinamento sobre como respeitar e valorizar as diferenças individuais e culturais.

💼 A empresa também se destaca pela maneira como encoraja e facilita o desenvolvimento profissional contínuo de suas colaboradoras. Suas pessoas são incentivadas a buscar oportunidades de aprendizado e desenvolvimento, e a empresa oferece uma variedade de recursos, incluindo treinamento interno, subsídios para educação continuada e a oportunidade de participar de conferências e workshops relevantes.

🔬Outro aspecto importante da TANGO é o seu compromisso com a flexibilidade no trabalho. Reconhecendo que cada indivíduo tem necessidades e circunstâncias únicas, a empresa oferece várias opções de trabalho flexíveis, incluindo trabalho remoto, horários flexíveis e a opção de trabalhar em um dos vários escritórios da empresa.

💼 A empresa cultiva um destaque no cenário global de TI pela sua abordagem única para negócios, cultura organizacional e práticas de trabalho. Sua dedicação à diversidade e inclusão, combinada com seu compromisso com a excelência técnica e a sustentabilidade, torna a TANGO um exemplo notável de uma empresa de TI moderna e progressista. Abaixo destaco duas falas públicas de pessoas colaboradoras da organização que retratam a questão

Nosso mundo está sendo remodelado por uma revolução tecnológica. Como tecnólogos, precisamos ter consciência de que temos uma responsabilidade fundamental em relação ao futuro que estamos ajudando a construir. Isso significa que enfrentamos contradições e compensações sobre as quais precisamos tomar decisões difíceis e assumir. Trabalhar com movimentos sociais que dão voz àqueles que foram historicamente marginalizados nos permite entender e resolver melhor essas contradições.”
Diretor Global de Mudança Social, TANGO

Em vez de regras rígidas ou códigos de prática, a ênfase da cartilha está em exercícios interativos e oficinas que estimulam conversas abertas e desenham perspectivas diversas para sinalizar questões como preconceito e consequências negativas no início do processo de desenvolvimento.
Diretora de Tecnologia, TANGO

🔬Vimos nessa seção um descritivo profundo da organização, que encontra na literatura de Organizações Híbridas parte dessa descrição, em especial para as práticas de ESG, diversidade e inclusão. (BATTILANA; DORADO, 2010). No entanto fica evidente que a Tango, ultrapassa os padrões convencionais de organizações que buscam equilibrar impacto social/ambiental com sustentabilidade financeira, se aproximando mais de um termo ainda em construção e estudos recente que é o de “Empresas Ativistas”(CHATTERJI; TOFFEL, 2018, 2019; FLAMMER; TOFFEL; VISWANATHAN, 2021).

🔬 Battilana e Dorado (2010), destacam a importância do processo de contratação e do investimento constante para a preparação das pessoas colaboradoras a estarem aptas a navegar em um ambiente de contradição constante. Da mesma forma que as questões relacionadas a sustentabilidade, e mais especificamente a diversidade e inclusão, o processo seletivo da Tango eleva o patamar descrito pela literatura(BATTILANA et al., 2015).

➡️ A potencialização dos aspectos descritos na literatura de Organizações Híbridas se dá na Tango em especial pelas características que vamos explorar nas próximas 7 seções.

 

  1. Desenvolvimento de pessoas

 

💬 Podemos dizer que a mesma lógica é aplicada ao processo de desenvolvimento de pessoas. Destaco o caráter de autonomia e protagonismo esperado da pessoa colaboradora em sua jornada de desenvolvimento. Durante nossa conversa, a atual Global Procurement, anteriormente da área de Pessoas e Desenvolvimento, ressaltou o compromisso da organização em se negar a ver pessoas como meros recursos. Ela rejeita uma visão linear de carreira, seja no formato I, Y ou qualquer outro preconcebido.

💬 “Nesse formato”, ela diz, “as pessoas não têm tempo para desenvolver potencialidades e encontrar sentido em seu trabalho”. Isso justifica o porquê de a organização preferir o termo “jornada” ao invés de “carreira”. Esse conceito estimula o indivíduo a tomar as rédeas de seu próprio desenvolvimento, utilizando a organização como um meio de crescimento e satisfação pessoal.

💼 Em sua jornada pessoal, ela mesma atravessou três áreas distintas, destacando que “poderia ter ido para a área de projetos, mas não me interessei”.

💬A jornada de desenvolvimento é dividida em algumas etapas: autorreflexão, feedback, alinhamento de expectativas, entendimento das oportunidades, definição de objetivos, identificação de lacunas, planejamento, busca de apoio, avaliação e revisão do plano.

📚 O roteiro, embora não inovador – podendo ser facilmente encontrado em manuais de RH sob diversos nomes pomposos como PDI (Plano de Desenvolvimento Individual), PDA (Plano de Desenvolvimento e Ação) e outros -, em muitas organizações se torna um processo esvaziado. Fica centralizado na figura da liderança, cuja responsabilidade é garantir o cumprimento do processo e a inclusão da avaliação individual do colaborador, geralmente uma ou duas vezes por ano, no “sistema”(GOLDSMITH; CARTER, 2009).

🔍Os PDIs, muitas vezes vinculados à meritocracia e ao PLR (Programa de Participação nos Lucros e Resultados), podem levar as lideranças a criarem planos facilmente alcançáveis para suas equipes. Isso acontece pois o PLR é comumente considerado parte do salário do colaborador, e seu não recebimento causaria um problema para a liderança, normalmente já sobrecarregada(RYAN; DECI, 2000).

🔬 Portanto, mesmo com instrumentos semelhantes, organizações com premissas diferentes chegam a resultados distintos. Vamos agora explorar mais de perto como a “experiência de crescimento integrada” é aplicada na empresa Tango.

💼 Ao contrário da abordagem padrão, o processo na Tango não é conduzido pela liderança direta da colaboradora. Em vez disso, um “comitê” de pelo menos quatro pessoas conduz o processo. Este grupo auxilia a pessoa na avaliação de seu progresso, na elaboração de novos planos de desenvolvimento e na conexão com pessoas dentro da organização que possam ajudá-la em seus desafios individuais.

💼O processo na Tango é norteado por algumas premissas fundamentais: a) a jornada é responsabilidade da pessoa colaboradora, b) as expectativas entre organização e a colaboradora precisam ser claras e relevantes, c) o plano de desenvolvimento, embora seja um esforço individual, deve estar alinhado com as necessidades coletivas, d) a organização é constituída por times (e pessoas) autônomas, e) o processo é sustentado por uma cultura de feedback e apoio contínuo, f) existe uma cultura de crescimento (“cultura de cultivo”), g) há constante validação e correção de curso quando necessário.

A união dessa jornada, baseada nesses valores, deve levar a colaboradora a: 1) reconhecimento, 2) crescimento e 3) novas oportunidades.

🔬Na próxima seção vamos fazer uma análise sobre o papel do desenvolvimento de pessoas com a lente da Teoria da Atividade.

 

  1. Análise a partir da CHAT:

 

🔬Nas Figuras 23 e 24, temos uma representação de um Sistema de Atividade (SA) de uma organização “padrão”, que segue as recomendações da literatura de gestão de pessoa, que aponta como objetivo final da área de RH “criar valor através da função de recursos humanos”(BARNEY; WRIGHT, 1998). O que leva a área a estruturar suas atividades em torno do ciclo de vida da pessoa colaboradora: a) seleção; b) integração; c) desenvolvimento; d) retenção e promoção; e) transição ou saída.

🔬As etapas podem variar, mas a ideia se mantém na essência. A partir dessa missão o RH se estrutura com subáreas, ou pessoas especialistas para cuidar do ciclo de vida, ou da experiencia da colaboradora, com objetivo de atender a necessidade do negócio, como na Figura 30, e na 31 detalho a área de treinamento e desenvolvimento (T&D) sob a ótica da CHAT

Figura 30 – Sistema de Atividade RH padrão


Fonte: Autor

 

🔬A área de T&D se estrutura com o objetivo de desenvolver as pessoas da organização para cumprir os objetivos da área, e atender as necessidades do negócio.

 

Figura 31 – Sistema de Atividade T&D padrão


Fonte: Autor

🔬Com base nos dados que coletamos da Tango, destacaria alguns pontos de diferença dos processos comuns da área de RH. Em especial, a característica tanto da área de Pessoas (forma como é chamado na Tango) como um todo, como o T&D trabalharem para dar as condições para que as pessoas sejam protagonistas da sua jornada na organização.

🔬Essa pequena mudança de prisma na definição do Objeto da atividade, faz com que tanto as estruturas possam ser mais enxutas, como as funções e atividades desempenhadas pela área de pessoas e de T&D.

Figura 32 – Sistema de Atividade RH Tango


Fonte: Autor

🔬Destaco o foco em criar, gerencias e operar estruturas e modelos. E não os processos em si. Verificamos essa abordagem, por exemplo nas práticas de seleção que é feita por pessoas colaboradoras, e na forma como o processo de avaliação do progresso da jornada da pessoa colaboradora é conduzido também por um comitê de colaboradoras, e não por alguém especializado.

 

Figura 33 – Sistema de Atividade – L&D Tango


Fonte: Autor

 

🔬Já na área de T&D, vemos a mesma abordagem. Uma área enxuta, com muitas parcerias externas e internas. O fato de a área ser enxuta, dá velocidade e flexibilidade para que conteúdos possam ser atualizados com opções do mercado, e os programas internos e a cultura de aprendizagem, e em especial a cultura de cultivo possam ser promovidas e sustentar essa abordagem.

🔬Como destacado no fim da seção anterior, a característica que promove essa virada, dos padrões conhecidos de RH e T&D, é a autonomia extrema. Ao adotar autonomia como esse valor fundante, a Tango expande o Sistema de Atividade do processo de T&D, e da área de pessoas para essa abordagem que Engeström (2014) classifica como Sistemas de Atividade com Objeto de Atividade compartilhado. Em que todas as atividades são direcionadas para um objeto, que é moldado e transformado em um resultado ao longo do tempo. Este objeto é compartilhado entre as integrantes do sistema de atividade e serve como um ponto focal comum.

 

 

 

 

 

 

🔬 Vemos na Figura 34, o Sistema de Atividade do processo de desenvolvimento de pessoas. Em que o Objeto compartilhado é descrito como “Desenvolvimento do potencial das colaboradoras de forma autônoma e autodirigida.”. O Objeto une a Atividade das Colaboradoras da Tango, com a Atividade da área de T&D em que ambas colaboram e se complementam para a realização do Objeto.

Figura 34 – Sistema de Atividade com Objeto compartilhado


➡️ Entendida essa virada conceitual, que implica diretamente na prática, vamos entender o papel da Cultura de Cultivo na sustentação dessa forma de desenvolver pessoas.

 

  1. Cultura de cultivo

 

💼 Esta se mostra como outra peça fundante da lógica, valores e processos utilizados pela organização. A Cultura de Cultivo é representada por uma árvore, que prontamente relaciono com a ideia de nutrir e multiplicar, de forma sustentável.

💼 A Cultura de Cultivo permeia toda a organização, incentivando o desenvolvimento pessoal e profissional de todas as integrantes. Muitas organizações centralizam este processo em departamentos específicos, tais como Recursos Humanos ou “Pessoas e Cultura”. Na Tango, no entanto, essa cultura de desenvolvimento é disseminada por toda a organização. Ela é vista como um indicador de desempenho, uma razão para recompensa, e é apoiada por uma alocação significativa de recursos – estratégia, tempo e dinheiro – para sustentar essa premissa.

💬 Um exemplo dessa cultura pode ser visto na prática de pareamento, onde desenvolvedores trabalham juntos no mesmo projeto, normalmente combinando profissionais juniores com seniores. Isso cria um espaço efervescente para a troca de conhecimento de maneira orgânica. 🔍Este método remete ao modelo da pirâmide de apreensão, onde a principal forma de aprendizado e desenvolvimento de habilidades ocorre ao ensinar algo a alguém(JOHNSON; JOHNSON, 1987).

🔍Enquanto o profissional mais experiente assume o papel de orientador, a organização proporciona uma cultura de mentoria e coaching distribuída por toda a empresa. Essa estrutura promove espaços para que as profissionais juniores reflitam sobre seus objetivos de aprendizado e desenvolvimento. Na Tango, todos estão envolvidos em algum tipo de mentoria, seja como mentores ou como aprendizes, e as novos integrantes da empresa têm um mentor designado para guiá-los neste processo de aculturação (KEGAN et al., 2014; WAGEMAN; HACKMAN; LEHMAN, 2005).

🔍Ao entrevistar alguns membros da equipe, questionei sobre a complexidade deste sistema e o tempo necessário para que um indivíduo entenda plenamente seu funcionamento. A literatura sugere que, à medida que uma organização diminui a hierarquia, ela precisa aumentar as habilidades individuais de autogestão e autonomia. Isso capacita o indivíduo a navegar pela liberdade que lhe é conferida(BREIDENBACH; ROLLOW, 2019).

💬A Global Procurement destacou: “Não adianta ter uma cultura excelente na teoria, se ela for muito complexa para que as pessoas a observem. Como então tornamos isso palatável?” Esta reflexão não revela uma certeza de um processo finalizado, mas sugere uma jornada em andamento. A ideia é de que as lideranças devem estar bem-informadas sobre a situação de cada membro da equipe e que as pessoas devem ter maturidade para buscar auxílio quando necessário.

 

  1. Segurança psicológica e a permissão para não saber

 

💼Avançamos na compreensão de que a colaboradora, como a principal responsável por sua própria trajetória, deve adotar uma postura proativa em relação ao seu desenvolvimento. Mais do que isso, é essencial que entenda que a vulnerabilidade, a fragilidade, e a incerteza são partes inerentes do crescimento pessoal e profissional, e que não será julgada, rebaixada ou penalizada por expressá-los.

📚 Este conceito central está profundamente enraizado em organizações progressistas comprometidas com a autogestão e em organizações mais tradicionais, principalmente aquelas que valorizam a saúde mental de suas pessoas e entendem o impacto de uma cultura sem segurança psicológica em um ambiente que requer mais proatividade e tomada de decisões ágeis de seus membros(EDMONDSON, 2019).

🔍Ao mesmo tempo que esse discurso ganha força, ela se contrapõe a organizações que lutam para mudar suas práticas de trabalho, a lideranças que acreditam erroneamente que opressão e rigidez moldam o caráter, e a outras premissas semelhantes. Tais premissas são comuns em organizações com processos de produção repetitivos, em massa, e que têm dificuldade em se adaptar aos paradigmas atuais de gestão de pessoas(DIGNAN, 2019).

Existem vários fatores que se destacam como diferenciais nessa discussão, incluindo a cultura, as histórias contadas, o papel do mentor, o processo de seleção, o onboarding abrangente e o conceito de ‘praia’.

📚 A primeira consideração é que somos seres sociais, aprendemos através da observação do comportamento das pessoas com quem trabalhamos. Esta é uma ideia central na Teoria da Atividade, que destaca o processo de aprendizagem social (Engeström, 2001). Se você percebe que seus colegas fazem perguntas diversas, expõem suas falhas e, em vez de serem punidos, são apoiados, você absorve rapidamente essa mensagem. Este é o que chamamos de cultura real ou “a cultura é como as pessoas agem no dia a dia” (Taylor, 2005).

🔍 Além disso, a forma como a organização se posiciona é crucial. A Tango, por exemplo, como consultoria premium, não aloca indivíduos em clientes, mas equipes que desenvolvem projetos, preferencialmente com um caráter de negócio traduzido em soluções tecnológicas. Desta forma, ela se destaca em um mercado competitivo e predatório.

🔬 A força da organização reside na soma de conhecimentos e áreas de expertise, bem como na diversidade de suas pessoas, que contribuem com uma gama de saberes para as soluções que precisam ser criadas. A diversidade racial, de gênero e de outros grupos é vista como um recurso valioso, não uma “fraqueza”. O foco está na equipe, na complementaridade de suas habilidades e na capacidade dessa equipe de aprender e usar os recursos da “rede interna” quando necessário(WEBER; KHADEMIAN, 2014).

💬Fui então complementado pela Global Procurement: “Há uma série de valores que asseguram que essas palavras bonitas sejam realmente postas em prática. Especialmente o entendimento de que todos são iguais. Isso não é apenas retórica. A pessoa que entrou ontem tem tanto direito e espaço para se expressar quanto alguém com anos de experiência. É papel do indivíduo mais experiente garantir que isso aconteça.”

🔬 A Tango demonstra um compromisso exemplar com segurança psicológica. No entanto, isso ocorre devido às premissas e valores adotados pela organização. Viver a empresa a partir da justiça social, e as políticas de inclusão, transformaram a Tango em um espaço de intensa diversidade. Juntamente com a diversidade, soma-se uma seleção eficiente baseada em valores e processos extremamente eficientes de educação nessas temáticas e desenvolvimento pessoal. Neste caldeirão de iniciativas, cuidados, processos e a não permissividade para comportamentos intoleráveis aos valores da organização, tornou-se evidente que o conceito de segurança psicológica era insuficiente para descrever completamente o ambiente cultivado pelas pessoas da Tango.

➡️ Em vez disso, a Tango criou um ambiente que não apenas suporta a segurança psicológica, mas também encoraja a abertura, a inclusão, e o crescimento pessoal. Esta combinação de fatores criou um ambiente de trabalho que é muito mais do que “seguro” – é ativamente acolhedor, inclusivo e propício para o crescimento e desenvolvimento contínuos.(EDMONDSON, 2019).

 

  1. Uma organização em rede

 

💡Durante a pesquisa, notei uma surpreendente semelhança entre a trajetória de um consultor da Tango e de um consultor individual, especialmente considerando as características necessárias – como protagonismo, autonomia, habilidade para colaborar e impulsionar o próprio desenvolvimento, além de capacidades técnicas e comportamentais.

💼 Porém, as profissionais da Tango possuem algo que consultores individuais geralmente não têm: uma vasta e complexa rede de apoio e conhecimento, oferecendo suporte técnico, comportamental e em soft skills. Esta rede é como aquelas usadas por trapezistas – sempre presente para suporte em caso de necessidade.

💬Ao que fui complementado sobre o forte caráter coletivo da cultura da organização. Ninguém fica isolado na Tango; essa rede de suporte é onipresente. Além disso, a organização adota a prática de alocar times inteiros, não indivíduos, criando um sentido de comunidade e conforto que influencia a maneira como se relacionam, inclusive com as clientes. Todas as pessoas consultoras têm contato direto com as clientes.

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Os processos descritos de suporte para o desenvolvimento de suas pessoas, e o fomento da inovação e aplicação desses conhecimento, com o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, parte fundante da Teoria da Atividade e em linha com os conceitos uma Organização que Aprende e de Segurança Psicológica.(EDMONDSON, 2019; ENGESTRÖM, 2001; SENGE, 2018).

💼Assim, um traço comum e grande fonte de orgulho é o fato de fazer parte da Tango. Especialmente devido ao forte posicionamento ideológico-cultural em relação à inclusão e justiça social, que reforça os laços além das competências técnicas ou do interesse em trabalhar com tecnologias avançadas.

O orgulho fica evidente quando questiono sobre o assédio aos profissionais, especialmente após 2020, quando a pandemia de COVID-19 normalizou o trabalho remoto e abriu o mercado internacional para esses profissionais.

💬 “Sim, perdemos algumas pessoas para empresas como Google e Dell. No entanto, não perdemos nossos profissionais para organizações que não possuem essas características progressistas, como respeito à diversidade e equipes autônomas.”. A saída de um membro é sempre um evento doloroso para o indivíduo, que geralmente busca objetivos pessoais, como morar em outro país ou outras questões pessoais.

🔬 A estrutura modular adotada pela Tango, pode ser relacionada com o entendimento das Organizações em Rede, ao mesmo tempo que entrega velocidade e adaptabilidade dos processos as organizações em rede tem o desafio de coesão, identidade organizacional, coordenação do trabalho e responsabilização (BAKER; NOHRIA; ECCLES, 1992).

 

  1. Formação de times

 

🔬 A organização funciona como uma rede: com times formados de acordo com a necessidade do cliente e a disponibilidade dos membros da organização, ao que a entrevistada complementa: complementa “a praia funciona tipo um tinder, onde as pessoas são conectadas com os projetos disponíveis” (BAKER; NOHRIA; ECCLES, 1992).

💼 Processo constante de construção de times: sobre como se dá o alinhamento e a formação de times, a cada início de projeto é desenvolvido todo um processo de formação de times, estabelecimento de acordos, processos de teambuilding, alinhamento de expectativas do projeto com expectativas individuais e gerenciar não apenas o projeto, mas também as pessoas e as relações que se constituem.

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Conexões com a CHAT e Organizações Híbridas: Engeström (2014), destaca a importância da participação ativa das pessoas na construção e liderança de seus processos de aprendizagem. Assim com o Battilana e Lee (2014) reforçam a necessidade de um desenvolvimento contínuo das pessoas para que se sustente a cultura organizacional.

💼 Proteção das suas pessoas: o cliente não tem poder de decisão sobre a formação de um time. Essa é uma decisão interna da Tango, alinhada com a visão de que não são uma “body shop”, “alocamos times completos para solucionar problemas do nosso cliente.”. Cultiva-se assim, um senso de comunidade, que é uma das marcas da Tango, cuidar de suas pessoas reforçado o caráter do coletivo auxilia nessa construção, que Seth Godin chama de Tribo(GODIN, 2008).

🔬 O posicionamento firme da Tango contribui para o reconhecimento que ela tem no mercado. Além de fornecer soluções técnicas, ela influencia culturalmente as organizações com o respeito à diversidade e políticas de inclusão, a entrevistada complementa:

💬 “Me lembro de um cliente que, quando começamos a trabalhar juntos, tinha uma série de restrições relacionadas à diversidade. Depois de 5 anos de trabalho, a equipe do cliente, que tem mais de 5000 colaboradores, nos convidou para ministrar um treinamento, que normalmente só fazemos internamente, para eles. Eles queriam levar as questões de diversidade para dentro da organização e nos viam como referência.”

🔬A adoção de uma premissa de construção constante de times, pode ser vista como um custo adicional à organização, que “perde” tempo com os processos de teambuilding. No entanto, esse posicionamento de construção constante como padrão, coloca a organização alguns passos à frente, em especial nas questões relativas à construção de um ambiente de segurança psicológica(EDMONDSON, 2019)e, e ao desenvolvimento de capacidades internas de condução dos processos de alinhamento e construção de times (HACKMAN, 2004).

 

 

  1. Evoluir sistemas e proteger pessoas

 

🔬 Durante toda a jornada: acompanhamento, entrevistas, levantamento documental de que o objeto de ajuste e adequação da Tango não são as pessoas, mas sim os processos (artefatos), que influenciam e direcionam o comportamento das pessoas (ENGESTROM; MIETTINEN; PUNAMAKI, 1999).

Busquei entender melhor o sistema operacional em vigor na Tango, os sistemas e processos que eles utilizam para alcançar seus objetivos. Assim, questionei: “Que tipo de sistema operacional permite às pessoas traçarem suas próprias trajetórias profissionais, aprendendo e crescendo ao longo do tempo? Como esse sistema auxilia cada indivíduo na avaliação de sua performance, planejamento de próximos passos, discussão de planos e reconhecimento financeiro do seu trabalho? Como vocês acreditam que esse processo pode ser profundamente significativo, ao mesmo tempo em que é acessível e encorajador para as pessoas navegarem nele?”

💼 O processo descrito anteriormente foi novamente citado. Tudo se inicia com a reflexão, porém, ao invés de ser uma linha reta entre autorreflexão e revisão de plano, ele se assemelha mais a uma montanha-russa, aquela que dá diversas voltas e retorna ao ponto de origem. Característico de processos que são desenhados com o intuito de conduzir a pessoa em sua jornada, mesma situação é descrita por Engeström (2020) ao falar sobre o Laboratório de Mudanças.

💼 Autorreflexão -> feedback -> alinhamento de expectativas -> entendimento das oportunidades -> definição de objetivos -> compreensão das lacunas -> plano de ação -> obtenção de apoio -> avaliação e revisão do plano.

💼 Mas com relação ao impacto social, há uma organização por temática que ajuda a pessoa em seu processo de autorreflexão, em cada uma das temáticas a pessoa tem acesso a um material que a ajuda a refletir sobre seu nível de domínio do conteúdo, assim com a necessidade de dominar o conteúdo em que o projeto que ela está envolvida necessita.

 

Quadro 11 – Exemplo temáticas e grau de maturidade

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Novato

Intermediário

Avançado

Justiça econômica

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Justiça Climática

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Justiça racial

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Justiça de gênero

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Inclusão de PCD

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Diversidade de Gênero e Sexualidade

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Tecnologia e Sociedade

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Fonte: Autor

🔬 A depender da temática que o projeto em que a pessoa está envolvida exige dela, um questionário de autoavaliação a ajuda a identificar seu grau de maturidade/domínio sobre o assunto e os caminhos de desenvolvimento sugeridos e possíveis para a posição que ela está ocupando. Encontramos na literatura de processos autogeridos de aprendizagem, e cultura de aprendizagem a importância de prover artefatos que ajudem a pessoa a refletir sobre seu grau de desenvolvimento, identificando os gaps e tendo auxilio para desenvolver-se (PANADERO; ROMERO, 2014; PARNELL; PROCTER, 2011).

🔬Novamente o modelo e a lógica aplicada direcionam a pessoa para a autonomia e o protagonismo em seu processo de desenvolvimento, dos seus pontos de atenção, e inclusive apontando fontes e recursos para que a pessoa possa se desenvolver de forma autônoma, ou buscando auxílio na rede de apoio que a organização provê. Em que seguem nutrindo os caminhos para um desenvolvimento continuado em especial da capacidade de navegar no ambiente contraditório das Organizações Híbridas (BATTILANA; DORADO, 2010).

 

  1. Como é que vocês dão lucro?

 

O desafio intrínseco às Organizações Híbridas é equilibrar objetivos que, inicialmente, parecem contraditórios. No caso da Tango, este equilíbrio é buscado entre o impacto social, manifestado por meio de uma série de programas, políticas, estratégias e sistemas que refletem o objetivo da organização de impactar e transformar o mercado de TI de forma positiva, e a sustentabilidade financeira da empresa.

💼A partir de 2017, a Tango passou a ser controlada por um fundo internacional. Como parte do acordo de venda, a preservação da cultura organizacional foi assegurada, considerada um diferencial da empresa, que se manteve integrada ao longo do tempo.

💼Nos últimos dois anos, a Tango tem apresentado um crescimento médio global de 20%, mantendo uma margem de EBITDA próxima a 20%. Isso assegura um fluxo de caixa positivo e os relatórios aos investidores indicam uma saúde financeira equilibrada, pronta para os próximos ciclos de expansão.

Diante da pergunta: “Como, mesmo com todo esse investimento em pessoas, cultura e desenvolvimento contínuo, que em outros ambientes seria considerado uma despesa, a Tango consegue ser uma empresa lucrativa?”, as respostas não são simples.

💬No entanto, as minhas interlocutoras apontam o posicionamento premium da organização como um diferencial crucial. Em alguns casos, a Tango pode cobrar um preço até três vezes superior ao de outros fornecedores, mas a alta qualidade de serviço e o valor gerado para as clientes fazem com que seja a escolhida como parceira.

🔬O posicionamento premium da Tango só é possível pela sua liderança técnica, no entanto ela se torna uma realidade pela capacidade descentralizada de construir relacionamentos e gerar valor para o cliente, dessa forma o cliente sabe que independente do time que for alocado, as capacidades necessárias para o trabalho estarão presentes, e a forma de solução será através de processos sob medida e de cocriação (WEISS, 2011).

🔬Outro aspecto importante das relações da Tango com seus clientes é a longevidade dos serviços. Existem empresas que são clientes da Tango há mais de 20 anos, e isso não é exceção. A norma é de fato estabelecer parcerias de longo prazo que são renovadas à medida que a Tango continua sendo uma referência técnica nas diferentes tecnologias que surgiram e evoluíram durante esse período. Também descrito na literatura, o desafio no processo de construir relacionamentos duradouros, em especial em serviços técnicas de consultoria consiste em ser visto pelo parceiro como, mais do que uma referência técnica, um aliado e companheiro de jornada, auxiliando não só na resolução de questões técnicas, mas em termos gerais de desafios e oportunidades do negócio (WEISS, 2017).

🔬O investimento continuado no desenvolvimento de pessoas, retroalimenta a característica da organização de desenvolver tecnologias, publicar livros e ter seus profissionais reconhecidos no mercado como referências nas áreas em que atuam.
Ao conectar o desenvolvimento de novas tecnologias, com a tradução destas em serviços que geram valor aos clientes, a Tango constitui um fluxo de renovação e aprendizagem capaz de sustentar o protagonismo da empresa ao longo do tempo (SENGE, 2018).

 

 

  1. Resultados

 

❗️ Em 1993 Johannes Partanen observou que os alunos aprendiam mais fora da sala de aula do que dentro, e decidiu propor uma metodologia de ensino disruptiva em que as pessoas aprendem fazendo, tem muita autonomia e a escola é dependente do protagonismo das participantes para funcionar, nem todas se adaptam.

❗️ Em 1987, Yrjio Engeström observou que as pesquisas acadêmicas ficavam distantes de uma aplicação à necessidade das organizações, e decidiu propor uma metodologia de pesquisa-intervenção disruptiva em que as pessoas aprendem fazendo, tem muita autonomia e a intervenção é dependente do protagonismo dos participantes para funcionar, nem todas se adaptam.

❗️ Em 1993, os fundadores da Tango observaram que a tecnologia era elitista e era inacessível às pessoas marginalizadas em nossa sociedade, decidiu propor uma metodologia de trabalho disruptiva em que as pessoas aprendem fazendo, tem muita autonomia e o resultado é dependente do protagonismo das participantes para funcionar, nem todas se adaptam.

💬 Os três casos descritos acima, são mais do que proposições metodológicas, eles representam a ação direta de pessoas visionárias que transladaram, traduziram, enactaram uma visão de mundo em ação. Para usar nossa lente teórica podemos dizer que deram forma as regras, divisão do trabalho, mas especialmente foram capazes, e ainda são, de mobilizar e traduzir as necessidades e anseios de uma comunidade.

💡No caso da Tango a conexão entre autonomia radical, justiça social, excelência técnica apoiado em premissas como: permissão para errar, cultura de cultivo, organização em rede, intolerância a intolerantes, ser antes de dizer, mudar sistemas e proteger pessoas, e a certeza de que sua jornada é individual, mas você nunca estará sozinho. Criam condições singulares que vamos explorar na sequência desta seção.

 

💡Ao dar o protagonismo do processo para a pessoa colaboradora a Tango cria uma lógica de objetos compartilhados entre as pessoas envolvidos em que a responsabilidade é da colaboradora, porém ela é nutrida por uma estrutura que está sendo pensada em das as condições necessárias para que ela tenha sucesso em sua jornada.

 

Figura 35 – Jornada da colaboradora Tango


Fonte: Autor

 

🔬A Figura 35 ilustra essa jornada da colaboradora na Tango. É importante notar que essa estrutura não é rígida, mas aberta à evolução. Mesmo composta de direcionadores e roteiros de aplicação, os processos desenhados são “pilotados” pelas próprias colaboradoras. Neste sistema, é possível experimentar ambos os papéis: a colaboradora, ao mesmo tempo que participa de um comitê, também será avaliada por um comitê em seu processo de avaliação da sua jornada pessoal.

🔬 O ciclo contínuo de papéis revitaliza o sistema. Não apenas as pessoas são renovadas, mas os processos também são constantemente testados por novos participantes que estão aprendendo sobre eles e aplicando-os em novas realidades. Estes, por sua vez, são influenciados por novos artefatos e novas expectativas (contradições). Em vez de deslegitimar o processo anterior, essas contradições servem como degraus para sua evolução (aprendizagem expansiva)(ENGESTRÖM, 2001).

💡 O movimento contínuo estimula a revisão individual de perspectivas, premissas e comportamentos. Com cada novo projeto, novo time, novas conexões, há uma necessidade de apresentação, posicionamento e contribuições para uma construção inédita. Embora possa parecer um exercício cansativo, é na verdade uma oportunidade para a evolução pessoal através de um processo recursivo. Poderíamos dizer que esta é uma organização em constante renovação e reconstrução (BREIDENBACH; ROLLOW, 2019).

🔬 A capacidade de renovação é cultivada pela cultura organizacional da Tango, em especial as características de: a) permissão para errar, b) alinhamento de valores, c) cultura de cultivo, d) modificar sistemas e proteger pessoas, e) estrutura descentralizada “organização em rede”, f) diminuição do impacto histórico-cultural para transformar processos e comportamentos, g) diminuição do “poder”, h) transparência radical.

Essa rede de características constroem as bases de definição do “grau de consciência e sincronização” dos Roteiros Sociais, como podemos observar na Figura 36.

Figura 36 – Roteiros Sociais de PDI


Fonte: Autor adaptado de Engeström (2008)

 

💬 Conforme discutido na seção 3.5, os Roteiros Sociais representam como “as coisas realmente acontecem”. Neste contexto, construímos um exemplo de uma organização onde o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) é adotado como uma ferramenta, porém sem a formação de um Objeto compartilhado. A Figura acima ilustra a desconexão entre os Objetos de cada ator e os Roteiros Sociais inerentes à atividade.

🔍 Esse caso, apesar de hipotético, possui forte aderência empírica e demonstra o resultado de métricas de desempenho individualizadas. Essas métricas retratam a falta de conexão entre os Objetos de Atividade das partes envolvidas, gerando situações de competição interna, seja entre áreas ou pessoas, ou até mesmo cenários de simples desconexão, onde os processos são conduzidos sem clareza sobre o “porquê” e o “para quê”.

🔬 Consequentemente, observa-se menor comprometimento das partes envolvidas e surge a necessidade de implementar instrumentos de coerção para garantir que os comportamentos ou atividades sejam realizados. Isso é um indicativo de que a falta de um objeto compartilhado pode levar a atividades menos eficazes e até mesmo conflituosas.

💡 A Tango, como descrito nessa seção é capaz de criar condições para que as contradições sejam expostas e tratadas. Em especial, a estrutura em rede da organização que promove um processo de oxigenação e renovação tanto das relações quanto dos processos adotados pelos times em seus projetos.

 

Figura 37 – Roteiro Social PDI Tango


Fonte: Autor adaptado de Engeström (2008)

 

💡 Liberdade pode ser sufocante: ainda que pareça exagerado a exposição a uma liberdade extrema pode gerar paralisia e stress (BREIDENBACH; ROLLOW, 2019). Encontramos resultado similar na pesquisa de mestrado, conforme comentado anteriormente (GONZALES, 2018). A Tango consegue equilibrar esse desafio, que poderíamos classificar como um aculturamento, com alguns passos:

  1. uma seleção que busca alinhamento de visão de mundo, mas também a capacidade e interesse em aprender e ensinar;
  2. um processo organizador da jornada da pessoa colaboradora, baseado na liberdade, porém com um desenho recursivo. Isso quer dizer que a pessoa tem uma série de janelas em que pode tomar decisões importantes com alto impacto. Porém, saber que a possibilidade se manterá ao longo do tempo, e que em 3 ou 6 meses você poderá fazer a escolha novamente dá tempo e espaço para cada pessoa evoluir em seu próprio tempo;
  3. onboarding estendido, um processo de onboarding que além das questões práticas da organização, apresenta o cuidado, as iniciativas, e os caminhos com relação à justiça social, as iniciativas de diversidade, inclusão e equidade e todo o ecossistema de programas e iniciativas desenhadas para apoias a nova colaboradora na organização;
  4. a praia, é um espaço e um “setor” em que as pessoas que não estão alocadas em projetos remunerados aguardam. Há iniciativas de projetos pro-bono em que a Tango apoia Organizações com sua expertise. A pessoa aguardando realocação na “praia” também pode se dedicar a algum estudo ou projeto específico de sua escolha;
  5. todas as pessoas colaboradoras da Tango, podem e são incentivadas a ter uma pessoa mentora, que vai lhe apoiar em seu processo de desenvolvimento, com conhecimento técnico e/ou com aconselhamentos de caminhos de carreira e conexões com outras pessoas da organização.

💡Combo entre desafio e acolhimento: na Tango, você tem acesso a pessoas referência na área de tecnologia e projetos desafiadores que aplicam tecnologia de ponta. Além disso, há pessoas inspiradoras e com interesse e disponibilidade em ajudar as pessoas da rede. A integração do desenvolvimento técnico no sentido de realização é cuidadosamente equilibrada com o foco em causar impacto social positivo. Sua jornada pessoal é valorizada, acelerada e apoiada de forma que mesmo que seja um processo de desenvolvimento pessoal, o caminho e o veículo de desenvolvimento são coletivos.

 

 

  1. Limitações e lacunas

 

🔍 Sem dúvidas a Tango é uma organização que destoa do universo de organizações no Brasil. Sua jornada de 30 anos evoluindo seus processos e estruturas, com a sustentação dos valores e propósito originais da organização trazem uma historicidade profunda na organização como um todo, mas em especial nos artefatos e normas formais e informais da organização.

💼 Lacunas: há múltiplas contradições, tensões e melhorias mapeadas e ainda por serem mapeadas. Aqui exploraremos um deles, que resultou na construção do framework e em sua aplicação na Tango.

💬 Contextualização: vimos nesta última seção que há uma cultura vibrante e habilitadora na Tango, que permite que as pessoas da organização consigam transitar em seus processos de desenvolvimento pessoal, alinhadas com as necessidades e oportunidades da organização, reforçando seu protagonismo e autonomia durante o processo.

Porém, identificamos algumas lacunas quando se faz necessário desenvolver competências e capacidades em times alocados, e não nas jornadas individuais.

🔬 O processo de desenvolvimento: pode seguir alguns caminhos, a jornada pessoal norteada pelo P. A, construído na jornada de desenvolvimento narrada e explorada anteriormente neste capítulo. Há também movimentos de testes de novas ferramentas, processos ou sistemas motivados por um novo projeto, ou a aplicação de nova tecnologia. Também, é possível que haja uma demanda do cliente por algum desenvolvimento ou aplicação específica. Ou ainda, uma necessidade identificada pelo Gestor do projeto, tech lead, ou qualquer pessoa do time que entenda que se faz necessário um desenvolvimento específico. Situações que nos levam a uma pergunta:

Como integrar jornadas de desenvolvimento de forma efetiva, para que não só se transmita informação, mas que se desenvolva competências aplicadas e habilite a evolução dos Sistemas de Atividade relacionados?

Essa questão está contida na questão de pesquisa desta tese, porém podemos dizer que é mais específica. Para além de entender como as organizações híbridas são capazes de equilibrar o desenvolvimento de pessoas e o atingimento de seus objetivos organizacionais. Esse é um desafio que se alinha com as dificuldades mapeadas na primeira parte do campo, quando se levantou as informações das Organizações Híbridas a partir do Teal Brasil.

 

A pergunta deste estudo é: Quais estratégias e práticas são empregadas pelas Organizações Híbridas para promover o desenvolvimento organizacional e o potencial humano de seus membros simultaneamente?

    Entendo que nesta seção capturamos a forma como a Tango trabalha essa questão, a partir da jornada da pessoa colaboradora. Mas acima de tudo, cultivando um espaço de autonomia e protagonismo.

 

  1. Organizações em transição

 

Não são poucas as organizações que, com o objetivo de fomentar a autonomia em seus quadros, introduzem novas regras, normas, artefatos e estruturas de divisão do trabalho.

Diferenças de abordagem: porém, há uma diferença fundamental entre inserir novos artefatos no Sistema de Atividade de forma impositiva e o criar condições para as pessoas operem e se expressem de forma autônoma, evoluindo a si, os Sistemas de Atividade que estão envolvidas e o Sistema de Atividade principal, alinhando premissas, valores e propósito de forma situada, como visto no caso da Tango.

Métodos top-down: transformar os sistemas de atividade de uma organização através de métodos top-down enfrenta enormes desafios, principalmente porque o sistema de atividades é multivocal e situado. Quando o objetivo é criar equipes autônomas, é crucial desenvolver e promover autonomia nos indivíduos, uma vez que a construção de significado é um fator chave para a adoção e apropriação pelos sujeitos envolvidos no Sistema de Atividade (ENGESTRÖM, 2000).

Neste contexto de transição, duas perguntas-chave surgem:

  1. Como a organização habilita seus times e pessoas a reconstituírem seus (SA) para atender às novas premissas do Sistema de Atividade Principal?
  2. Como as organizações atualizam seus (SA´s) sistêmicos para influenciar, apoiar e promover a evolução dos SA de toda organização?

Os artefatos são impregnados de informações, significado, história e cultura. Para observar isso, é necessário ampliar a análise do artefato para o Sistema de Atividade.

O mesmo artefato pode servir a diferentes objetivos e objetivos distintos. De fato, organizações frequentemente utilizam este artifício para responsabilizar pessoas, evitando discussões sobre motivações, processos e objetivos implícitos aos processos organizacionais. Isso é especialmente verdadeiro para organizações focadas unicamente no “bottom line”.

Em última análise, um machado é o mesmo artefato, seja nas mãos de um assassino ou de um bombeiro, servindo a diferentes objetivos e objetivos em cada Sistema de Atividade.

De maneira similar, isso pode ocorrer ao implementar um Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) em uma organização. À primeira vista, o PDI é inerte quando analisado isoladamente. No entanto, quando integrado a um Sistema de Atividade (SA), ele pode tornar-se uma ferramenta de desenvolvimento e evolução, ou um instrumento de controle e coerção.

Com base nesta análise, apresentamos na Figura 38 um framework teórico-analítico que organiza visualmente a trajetória de uma organização híbrida na busca de equilibrar o desenvolvimento organizacional com o potencial humano de suas colaboradoras. Na próxima seção, propomos um framework teórico para abordar a questão-chave que surge da análise dos resultados do campo:

Como integrar jornadas de desenvolvimento de forma efetiva, para que não só se transmita informação, mas que se desenvolva competências aplicadas e habilite a evolução dos Sistemas de Atividade relacionados?

 

 

 

 

Figura 38 – Framework Teórico-Analítico Tese


Fonte: Autor

  1. PROPOSIÇÃO FRAMEWORK

    1. Contextualização

A partir dos achados na seção 5, e da proposição do framework teórico-analítico da Figura 38, apresentamos uma contextualização prévia para a proposição desta seção:

💬 O ambiente atual, marcado pela rápida evolução tecnológica, exige das organizações maior adaptabilidade, descentralização e protagonismo das colaboradoras (BOCCARDELLI et al., 2017). Esse desafio se intensifica no contexto das organizações híbridas, que unem elementos de diferentes modelos organizacionais e enfrentam dilemas decorrentes de sua natureza dual (BATTILANA; DORADO, 2010; BATTILANA; LEE, 2014; PARK, 2020). Tais organizações mesclam múltiplas formas e experimentam tensões distintas interna e externamente, tornando ainda mais necessário o desenvolvimento de habilidades de autogestão, comunicação e trabalho em equipe (PARK, 2020).

📚 As megatendências, como avanços tecnológicos e mudanças climáticas e demográficas, estão reconfigurando a paisagem econômica e comercial, aumentando a competição e exigindo novas estruturas organizacionais eficientes para aproveitar oportunidades (ANNOSI et al., 2018). Nesse contexto, a aprendizagem individual e organizacional torna-se crucial para enfrentar os desafios dessa realidade dinâmica (MARINOV et al., 2022; SMITH; LEWIS; TUSHMAN, 2012).

🔍 Nesta seção vamos dar foco ao mapeamento de contradições no Sistema de Atividade. As contradições desempenham um papel central na Aprendizagem Expansiva, como explorado na seção 3.4 (ENGESTRÖM, 2001). As contradições são tensões, conflitos ou inconsistências que surgem dentro de um sistema de atividade ou entre sistemas de atividade interconectados, essas contradições funcionam como fontes de mudança e desenvolvimento, desencadeando processos de aprendizagem e inovação (ENGESTRÖM; SANNINO, 2011).

🔬 As contradições são, portanto, fundamentais para a Aprendizagem Expansiva, pois fornecem oportunidades para as participantes do sistema de atividade repensarem e reestruturarem suas práticas e objetivos (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010). Ao identificar, analisar e resolver contradições, as pessoas e as organizações podem aprender e se adaptar às mudanças e aos desafios em seu ambiente (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010).

💡 No entanto, as pessoas tendem a enxergar aquilo em que acreditam, em vez de acreditar naquilo que veem (WEICK, 1997). Identificar contradições não é suficiente; é necessário convencer as participantes envolvidas de que essas contradições são verdadeiras no sistema que fazem parte. Ao enfrentar um desafio complexo ou, conforme Heifetz descreve, um problema adaptativo, a pessoa que identifica o desafio ou lidera o processo encontra um grande obstáculo: apresentar e persuadir as outras partes envolvidas de que estão diante de um problema (HEIFETZ, RONALD, GRASHOW ALEXANDER, 2009).

🔍 Na metodologia de intervenção proposta por Engeström, o Laboratório de Mudança, há um grande enfoque em “construir o caso”, coletando provas e evidências irrefutáveis que possam ser usadas com as participantes a fim de convencê-las (SANNINO; ENGESTRÖM; LEMOS, 2016). Essa metodologia foi aplicada em inúmeros estudos com sucesso, no entanto nutre uma série de dependências que se tornam impeditivas para que a teoria da atividade e da aprendizagem expansiva possam se popularizar (LEMOS; ENGESTRÖM, 2018).

🔬 Os principais obstáculos são relacionados ao alto investimento de tempo despendido pelas pessoas pesquisadoras (especialistas na metodologia) para que sejam capazes de construir o caso, e facilitar todo o processo que é estimado entre 18 a 36 meses (SANNINO; ENGESTRÖM; LEMOS, 2016)

Com base nessa limitação perguntamos: É possível integrar o desenvolvimento individual de competências com o mapeamento do Sistema de Atividade e suas contradições? Esta integração poderá gerar um ganho direto e objetivo para as pessoas participantes e ao mesmo tempo produzir um mapeamento estratégico para o time/organização?

💡 Nesta seção apresentamos um framework que tem por objetivo propor um modelo de desenvolvimento de competências de forma pragmática e ao mesmo tempo a capacidade crítica dos integrantes de um grupo, para que sejam capazes de identificar as contradições do Sistema de Atividade trabalhado objeto do trabalho.

💡 A proposição do framework é que: A introdução de um novo artefato desestabiliza o equilíbrio do Sistema de Atividade constituído e abre espaço para o mapeamento das contradições do sistema.

Uma série de 4 premissas são constituidoras e dão suporte a esta proposta:

  1. Competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio;
  2. Dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento;
  3. Intervenções curtas e práticas mantem engajamento;
  4. Reflexão estruturada pavimenta espaço para Aprendizagem Expansiva.

     

💡 Com base nessas 4 premissas propomos um framework organizador para aplicação de um processo de aprendizagem pela prática, fazendo uso da estrutura da CHAT para desvelar contradições presente do sistema de atividade.

 

  1. Framework

💼 O framework é composto por 5 etapas (Figura 1): Integrar, Incluir, Instrumentalizar, Implementar e Interpretar. Espera-se que ao seguir essa estrutura a pessoa proponente de um processo de desenvolvimento consiga atender as premissas apresentadas neste estudo, e coletar os dados de forma estruturada para que possa nortear os próximos passos do processo de desenvolvimento a ser aplicado em sua organização.

Figura 39 – Processo de 5 etapas do framework proposto

Fonte: Autor

 

Figura 40 – Níveis de intervenção

Fonte: Autor

 

  1. Integrar – premissa i: competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio.

 

🔬 No framework proposto, há duas camadas de desenvolvimento ocorrendo simultaneamente (Figura 2). Existe o desenvolvimento objetivo e prático das pessoas colaboradoras, e ao mesmo tempo, há o mapeamento e compreensão do Sistema de Atividade (SA) em que elas atuam e a identificação das contradições do SA.

💬 Para que esse processo duplo seja possível, é essencial integrar a necessidade da organização de desenvolvimento individual com a lógica da Teoria da Atividade. Especialmente ajudando a organização a lapidar a sua necessidade em um formato que contemple as características do Objeto e construir essa necessidade em um Sistema de Atividade. O desenvolvimento a ser executado deve estar conectado a um Sistema de Atividade superior. Dependendo da realidade organizacional, isso pode ser uma competência, capacidade organizacional ou um objetivo organizacional que se espera que o desenvolvimento individual reduza o gap existente (SALAS et al., 2012).

💡 Será construído um esquema de Sistemas de Atividade, de sorte que represente as principais atividades conectadas com o objeto de desenvolvimento. Dessa forma, definir o SA da competência-chave e determinar os resultados esperados no SA da intervenção proposta.

💼 Neste exemplo, partimos de uma demanda específica de melhorar a performance do time, identificado pela gestão de projetos, que aponta a dificuldade em colaborar como o principal obstáculo para os resultados desejados.

💬 Aqui, construímos três sistemas de atividade no contexto da organização e exploramos a forma como os Sistemas de Atividade estão conectados entre si, dessa forma, conectando a intervenção de desenvolvimento com a necessidade do negócio em um nível mais amplo, ajudando as pessoas participantes a criar sentido para o trabalho a ser desenvolvido:

 

Tabela 1 – Exemplo Sistemas de Atividade

Competência / Componentes

Desenvolvimento de Aplicação

Gestão de Projetos

Colaboração Efetiva

Sujeito

Equipe de desenvolvimento

Gerente de projetos

Membros da equipe

Objeto

Aplicação para o cliente

Projeto entregue conforme requisitos, prazos e orçamentos

Alcançar objetivos comuns através da colaboração

Artefatos

Ferramentas de desenvolvimento, linguagens de programação etc.

Ferramentas e metodologias de gerenciamento de projetos, técnicas de comunicação e colaboração

Ferramentas de comunicação, técnicas de construção de relacionamento, estratégias de tomada de decisão

Comunidade

Equipes internas, clientes, fornecedores, outros stakeholders

Equipe do projeto, clientes, fornecedores, outros stakeholders

Equipes internas, gestores, parceiros externos, outros stakeholders

Regras

Padrões de qualidade, diretrizes da empresa, regulamentações

Políticas e diretrizes da empresa, padrões do setor, regulamentações

Políticas e diretrizes da empresa, normas culturais, acordos de confidencialidade, regulamentações

Divisão do trabalho

Definição e atribuição de tarefas, coordenação entre especialidades

Definição e atribuição de tarefas, coordenação entre funções, monitoramento e controle

Definição e atribuição de tarefas, coordenação entre funções, monitoramento e avaliação

Fonte: Autor

 

🔍 Com base nessa construção, define-se a intervenção pontual e prática que fornece instrumentos (artefatos) para as colaboradoras aplicarem em seu dia a dia, com a intenção de melhor atender ao objetivo do Sistema de Atividade. Neste exemplo, escolheremos uma intervenção com o objetivo de melhorar a capacidade de estabelecer acordos efetivos da equipe e aprimorar o nível de colaboração interna.

🔬 Concluímos a primeira etapa, de acordo com o exemplo, dando clareza de que o Sistema de Atividade que será objeto da intervenção é o de Gestão de Projetos, que tem como Objetivo “Desenvolver e entregar o projeto de acordo com os requisitos do cliente, prazos e orçamentos”. A organização entende que a equipe precisa evoluir sua capacidade de estabelecer acordos efetivos, impactando positivamente a colaboração interna e o Objetivo do SA.

 

  1. Incluir – premissa ii: dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento.

 

💡 Espera-se que a definição do público, do tema e da estratégia de desenvolvimento sejam feitas a partir de dados e de um entendimento da realidade da organização e das pessoas envolvidas, processo esse que é chamado de Análise das Necessidades de Treinamento (SALAS et al., 2012). Tal procedimento tem por objetivo garantir o máximo possível que as pessoas que participarão do desenvolvimento terão um real ganho com sua participação, e assim verão valor em dedicar-se a sua participação.

➡️ Uma vez determinado o público, o tema, o impacto e o motivo do desenvolvimento é necessário incluir as pessoas participantes. Essa inclusão passa por três pontos principais: 1) convite/comunicado, 2) venda do treinamento e o 3) envolvimento das lideranças:

  1. O convite deve conter: a) informações essências (data, local, duração, formato, pessoa facilitadora, demais características), b) importância, c) objetivo, metodologia, d) nível de envolvimento, e) presença ou não de acompanhamento futuro, f) impactos esperados (SALAS et al., 2012). O convite ajuda a participante a definir suas expectativas e tem um efeito direto no resultado do desenvolvimento (TANNENBAUM et al., 1991);
  2. Venda do treinamento: a) porque importa, b) para quem, c) alinhamento com estratégia necessidade da organização, d) indicadores que demonstram a necessidade, e) como esse movimento se conecta com a visão macro de desenvolvimento e dos objetivos da organização. Faz parte da comunicação oficial e não oficial a venda do treinamento, esta é uma parte importante do processo de engajamento das participantes, porém quando se promete muito mais do que o treinamento entrega acaba-se gerando um resultado inverso e perde-se engajamento devido a frustração das expectativas da participante (BURKE; HUTCHINS, 2007; SALAS et al., 2012);
  3. O terceiro ponto é a forma como as lideranças serão envolvidas no processo como um todo: a) os pontos anteriores devem ser abordados de abordagem específica como as lideranças, abrindo espaço para validar a proposta e feedback sobre o movimento.
    Lideranças podem guiar, esclarecer dúvidas, preparar e reforçar os assuntos tratados com as participantes. Mas podem também esvaziar, diminuir e até mesmo sabotar um treinamento, de ambas as formas sendo determinante para o sucesso ou fracasso da intervenção (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

Ainda no desafio de incluir, o framework se apoia na utilização de instrumentos de autoavaliação. A adoção da autoavaliação impacta em três níveis: individual, grupo e organizacional.

📚 No nível individual é uma ferramenta importante como estratégia de preparação aumento do engajamento das participantes, mas especialmente porque se alinha com a intenção de ter uma pessoa participante e protagonista de seu processo de desenvolvimento (PANADERO; ROMERO, 2014). A utilização de instrumentos de autoavaliação é muito discutida no contexto da aprendizagem autorregulada (ANDRADE; VALTCHEVA, 2009; BOUD; SOLER, 2016; PANADERO; ROMERO, 2014; SITZMANN; ELY, 2021).

🔍 Com relação ao grupo, partimos da premissa que a autoavaliação será feita em plataforma digital e que será possível manter o anonimato dos respondentes, porém a possibilidade de consolidar números gerais nos abre diversas possibilidades. Em especial a análise dos dados tem o potencial de revelar informações de como o grupo se percebe, assim como o nível de qualidade da interação e pontos de desenvolvimento necessários.

🔬 E no nível organizacional, para além dessa estratégia reforçar o posicionamento da organização em desenvolver pessoas e times mais autônomos, a implementação de um modelo prático de desenvolvimento que promove a autonomia é um marco e um sinal relevante para as pessoas participantes.

🔬 A organização também se beneficia da análise de dados, gerando uma capacidade maior de entender o seu público, mapear os sistemas de atividade relacionados ao tema do desenvolvimento e ter maior clareza com recortes dos grupos e suas necessidades específicas. Além de um feedback sobre como os times se avaliam a avaliam a cultura organizacional com relação ao tema trabalhado.

💬 O questionário de autoavaliação é uma peça-chave da seção Incluir, nos diferentes níveis e utilizações e funções que ele pode ser ter. Deve-se ter um zelo grande na produção da autoavaliação e dos processos eletrônicos de gestão dos dados para que esses objetivos possam ser cumpridos com sucesso.

 

  1. Instrumentalizar – premissa iii: intervenções curtas e práticas mantém engajamento.

 

💡 Nesta etapa do framework, é proposta uma intervenção na forma de palestra interativa, on-line ou presencial, deve ser curta e disponibilizar uma ferramenta simples e aplicável para uso imediato pelas participantes. O intuito é fomentar a autonomia e protagonismo das colaboradoras em sua jornada de desenvolvimento.

🔍 A sessão de instrumentalização visa ser uma intervenção breve e centrada na competência a ser aprimorada. Esta palestra interativa de 90 minutos é dividida em quatro partes: os primeiros 10 minutos são dedicados ao contexto, 20 minutos ao conteúdo fundamental e 30 minutos à apresentação e aplicação conjunta da ferramenta com as participantes. Os últimos 30 minutos são reservados para perguntas e respostas:

  1. Contexto: o objetivo da contextualização é defender a importância do conteúdo, preferencialmente de forma impactante para criar surpresa e conexão com a audiência, o modelo das TED talks pode ser um caminho de construir o storytelling. Sua estrutura deve conter (ANDERSON, 2016):
    1. relevância;
    2. objetivos;
    3. cronograma.
  2. Conteúdo: renuncie a profundidade em prol da acessibilidade. O objetivo é criar curiosidade e entregar o necessário para a ferramenta poder ser aplicada. Nosso objetivo é a prática;
  3. Ferramenta: utilize ferramentas de baixa complexidade, ou crie modelos no formato de canvas com poucos passos;
  4. Próximos passos: deixe claro os próximos passos que são esperados durante o programa, explicitar que haverá uma segunda aplicação de autoavaliação ao final do programa aumenta o sucesso do programa (SALAS et al., 2012).

     

🔬 O propósito desta intervenção é criar um momento específico que encoraje a participante a prosseguir com seu desenvolvimento de maneira prática, utilizando a ferramenta apresentada no cotidiano laboral. O foco reside na aplicação efetiva da ferramenta, retire todas as camadas de complexidade quanto possível, busque nos resultados das autoavaliações questões pertinentes para o grupo com quem está trabalhando, absorva características e exemplos da cultura da organização para usar em sua palestra interativa.

💬 A combinação da autoavaliação inicial, da palestra interativa, do acompanhamento do processo com pontos de contato preestabelecidos e do compromisso das participantes em realizar uma segunda autoavaliação após 30 dias, abordando aspectos como aplicação da ferramenta, aprendizados, desafios, resultados e impactos percebidos, tende a fortalecer o engajamento dos envolvidos (SALAS et al., 2012). O papel da liderança direta da equipe é crucial para assegurar que o tema continue sendo explorado e que a experiência coletiva seja aproveitada de forma positiva (SITZMANN; ELY, 2021).

💼 É importante ressaltar que as pessoas estão constantemente aprendendo, porém raramente aprendem a mesma coisa simultaneamente. Esta situação representa um cenário propício para a troca de conhecimentos e aprendizado entre as integrantes da equipe.

💡 O foco está em auxiliar as participantes e o grupo como um todo na experimentação de uma ferramenta capaz de impulsionar o desenvolvimento de competências necessárias ao negócio. Simultaneamente, exercitamos um olhar voltado ao sistema de atividade, identificando e mapeando coletivamente as principais contradições do sistema.

 

  1. Implementar

 

💡 As experiências de aprendizagem no local de trabalho envolvem a interação entre a prática social e a agência individual das trabalhadoras. Essa interação é influenciada tanto pela participação em atividades de trabalho cotidiano quanto em atividades de aprendizagem organizadas. Ambas práticas participativas são interdependentes e afetam o processo e os resultados da aprendizagem no local de trabalho (BILLETT, 2004; LAVE; WENGER, 1991).

🔬 A experiência de aprendizagem até este momento o IMPLEMENTAR se dá de forma interativa, porém direcionada pelo desenho da autoavaliação e da palestra interativa, fazer a virada para a prática é desafiador especialmente pela falta de estrutura para sustentar a prática. Algumas estratégias são importantes de serem incorporadas, quando esse tipo de experiência é uma prática nova na organização (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

💡 É preciso mobilização para aumentar a chance das participantes entrarem em modo de prática, para isso os passos a seguir são fundamentais: a) comunicar, b) projetar o potencial “vender”, e c) envolvimento das lideranças (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

💬 Enquanto que em abordagens de desenvolvimento de maior controle as lideranças teriam um papel de fiscalização, neste modelo o papel das lideranças é de ajudar sua equipe a criar sentido sobre o processo que estão vivendo através de conversas, criando assim uma compreensão compartilhada que viabilizará, ou não, combinados e ajustes de ações e comportamentos do grupo (BILLETT, 2004; SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001; WEICK; ROBERTS, 1993).

Também deve-se contemplar no desenho do programa estratégias de suporte e reforço durante esses 30 dias de prática, algumas delas são:

  1. Um encontro de mentoria 7 dias depois da palestra interativa, com o objetivo de formalizar um checkpoint de mensuração da adesão das pessoas participantes e caso necessário implementar junto à organização e a liderança direta intervenções para aumentar a adesão (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001);
  2. Comunicação de reforço, adotar as práticas de comunicação da organização para entregar novos inputs para as pessoas participantes, cards, figuras, e-mails, que agreguem valor e relembrem do processo que estão vivendo (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001);
  3. Assessment de autoconhecimento, disponibilizar questionários e assessments que ajudem as pessoas participantes a refletir de forma estruturada sobre seus padrões de comportamento e como estes podem ou não estar influenciando na experiência de aprendizagem proposta (LANAJ; FOULK; EREZ, 2019);
  4. Gameficação, estratégias de gameficar a experiência de aprendizagem, inclusive fazendo uso dos itens anteriores pode ser uma forma eficiente de envolver as pessoas participantes na proposta (REINERS, 2015).

🔬 A prática coletiva, relacionada à implementação de um novo artefato seguindo o conceito de single loop de Argyris (1977), desempenha um papel crucial ao possibilitar a desestabilização controlada e produtiva da ordem estabelecida no Sistema de Atividade (ENGESTRÖM, 2001). A desestabilização ocorre quando as pessoas, incentivadas a adotar uma ferramenta – inédita ou já conhecida – de maneira coletiva e coordenada, visam atingir um objetivo específico com expectativas claras de resultado.

💡 Essa ação introduz a “atenção presente” ao ambiente de trabalho, elevando a consciência das colaboradoras em relação às suas ações e ao contexto organizacional (WEICK; SUTCLIFFE, 2006). Nesse enfoque, o processo de sensemaking coletivo é fomentado, permitindo às participantes compartilhar experiências e interpretar, colaborativamente, o ambiente organizacional (WEICK; SUTCLIFFE; OBSTFELD, 2005). Desse modo, a prática coletiva apoia a aprendizagem no trabalho e impulsiona o desenvolvimento de competências individuais e organizacionais, criando oportunidades para a aprendizagem expansiva (ENGESTROM, 2016) ou, conforme a perspectiva de Argyris, a aprendizagem em double loop.

 

  1. Interpretar – premissa iv: reflexão estruturada pavimenta espaço para aprendizagem expansiva.

 

💡 A reflexão estruturada no ambiente de trabalho possui um impacto significativo no desenvolvimento de habilidades e conhecimentos das colaboradoras (COOK; DUPRAS, 2004; COPE; WATTS, 2000). A importância da reflexão estruturada reside em sua capacidade de ajudar as colaboradoras a extrair sentido das experiências vividas no ambiente de trabalho de forma a viabilizar o processo de construção de sentido individual e coletivo (KOO, 1999).

🔍 Engeström (2001) destaca que as contradições surgem quando as ideias antigas de uma participante encontram novos pensamentos ou informações que contradizem essas ideias. No ambiente de trabalho, isso pode ocorrer quando um sistema de atividade (ou grupo de colaboradoras) se depara com um novo artefato externo ao sistema de atividade, gerando contradições à medida que as abordagens antigas entram em conflito com as novas.

📚 Além disso, a reflexão estruturada favorece a aprendizagem e a reflexão como processos coletivos, permitindo que as pessoas compartilhem suas experiências e perspectivas em um ambiente colaborativo (Holman et al., 1997). A consideração de aspectos sociais e políticos no processo de aprendizagem e reflexão é fundamental para desenvolver uma compreensão mais profunda das dinâmicas organizacionais e promover a aprendizagem expansiva e o sensemaking coletivo (Lave, 1990; Weick et al., 2005).

📚 A CHAT é uma lente teórica que ajuda na concepção e interpretação das respostas de um processo de reflexão estruturada, pelo fato de a teoria considerar os fatores histórico-culturais presentes, que deve ser expresso durante todo o processo de implementação deste framework, desde o Incluir até o Interpretar (ENGESTROM, 2014). Mas, especialmente na concepção das perguntas e do relatório individual do processo de reflexão estruturada. Além da contextualização histórico-cultural o Sistema de Atividade organiza e facilita a compreensão de um processo complexo como o proposto (SANNINO; ENGESTRÖM; LEMOS, 2016).

💡 O modelo propõe que a introdução de um novo artefato desestabiliza o Sistema de Atividade, e possibilita uma experiência de aprendizagem coletiva, que apoiada por um processo de reflexão estruturada permite às pessoas participantes refletir criticamente sobre diferentes perspectivas para processos que estavam normalizados, abrindo espaço para avaliar não só a eficácia do artefato proposto como todo o Sistema de Atividade em que estão inseridos.

Figura 41 – Modelo Sistema de Atividade

Fonte: Autor inspirado em (Engeström, 2001)

 

💬 Essa dupla camada de reflexão não é óbvia, e por isso um processo e estrutura para a reflexão é fundamental para ajudar as pessoas participantes a significar a experiência em diferentes níveis e sobre diferentes perspectivas.

Tabela 2 – Exemplo questionário

Pergunta

Sistema de Atividade

Quão frequentemente você adota uma abordagem estratégica na gestão de um determinado aspecto?

Objetivo

Quais das seguintes competências você acredita serem as mais importantes para uma gestão eficaz em um determinado contexto?

Artefatos

Em uma escala de 1 a 5, quão eficaz você considera sua habilidade em construir relacionamentos sólidos em um determinado contexto?

Sujeito

Em sua experiência, quais fatores são mais importantes para exercer uma influência maior em determinadas situações e tomadas de decisão?

Regras

Quão bem você acredita que sua organização promove a capacidade de consultoria entre seus profissionais em um determinado aspecto?

Comunidade

Quão eficaz você considera a divisão de atividades e responsabilidades relacionadas à gestão de um determinado aspecto em sua equipe ou organização?

Divisão de Trabalho

Com base em sua experiência, quão positivo você considera o impacto das habilidades e ações de gestão em um determinado aspecto nos resultados dos projetos ou iniciativas em que trabalhou?

Resultados

Fonte: Autor

 

🔬 A aprendizagem e a reflexão como processos coletivos, são viabilizados pela reflexão estruturada, permitindo que as pessoas compartilhem suas experiências e perspectivas em um ambiente colaborativo (Holman et al., 1997). A consideração de aspectos da cultura, sociais e políticos no processo de aprendizagem e reflexão é fundamental para desenvolver uma compreensão mais profunda das dinâmicas organizacionais e promover a aprendizagem expansiva e o sensemaking coletivo (Lave, 1990; Weick et al., 2005).

  1. Conexões

📚 A CHAT destaca a aprendizagem como um processo social e colaborativo, no qual as participantes coletivamente resolvem problemas e criam novos conhecimentos (ENGESTROM, 2014). Sendo uma teoria interventiva de aprendizagem, inovação e mudança em condições de complexidade, pode ser usada como uma ferramenta de desenvolvimento (ENGESTROM; KEROSUO; KAJAMAA, 2007).

📚 Engeström (2001) destaca cinco princípios fundamentais da teoria da atividade. O sistema de atividade é a unidade de análise e interage com redes de outros sistemas (VIRKKUNEN; KUUTTI, 2000). A atividade é coletiva, focada em um “objeto” e mediada (por exemplo, por regras ou normas culturais). Além disso, um sistema de atividade possui multivocalidade, caracterizado pela presença de diversos pontos de vista, tradições e interesses individuais e coletivos. Essa multivocalidade se intensifica nas redes de sistemas interativos. Um sistema de atividade também é resultado de evolução histórica, e sua compreensão total requer análise de seu passado.

📚 As contradições são fundamentais para o desenvolvimento, representando tensões estruturais profundas entre os elementos do sistema, e não simplesmente problemas ou conflitos. As contradições atuam como força motriz da mudança na Teoria da Atividade Histórico-Cultural, e como Engeström (2000) salienta, o potencial para inovação é percebido quando o foco se desloca das ações individuais para o sistema coletivo de atividade.

💡 O desafio consiste em encontrar maneiras de representar e tornar visível essa dinâmica coletiva, permitindo que as pessoas resolvam problemas juntas e criem soluções sistêmicas inovadoras (HILL et al., 2007). Assim, o objetivo é buscar formas eficazes de representação e visibilidade dessa dinâmica, possibilitando que as pessoas trabalhem em conjunto na resolução de problemas e na elaboração de soluções inovadoras para os sistemas em questão.

🔬 A introdução de um novo artefato através de um programa de treinamento pontual pode desestabilizar um Sistema de Atividade e criar oportunidades para que as pessoas se tornem mais conscientes (mindful) sobre o sistema e identifiquem contradições (WEICK; SUTCLIFFE, 2006). A quebra do fluxo contínuo dos processos automatizados pode levar a um aumento na atenção plena e permitir que as pessoas diferenciem, criem e apreciem suas experiências conscientemente, conforme mencionado por (WEICK; SUTCLIFFE; OBSTFELD, 2005).

💬 O framework proposto adota uma série de estratégias para ajudar a pessoa participante a abrir esse espaço de reflexão, especialmente a adoção de instrumentos e estímulos para uma reflexão estruturada (COOK; DUPRAS, 2004), e a ativação e suporte ao papel da liderança em facilitar e estimular tanto a prática, quanto a reflexão por parte de seu time (SMITH-JENTSCH; BRANNICK; SALAS, 2001).

📚 Ao adotar uma abordagem mais consciente em resposta a um novo artefato, as pessoas são capazes de identificar contradições e áreas de melhoria no Sistema de Atividade. Levinthal e Rerup (2006) descrevem a atenção plena (mindfulness) como alta sensibilidade de percepção e alta flexibilidade de comportamento para responder a estímulos diversos e mutáveis. Ao abordar um novo artefato e seu respectivo treinamento com uma perspectiva mais consciente, as pessoas podem reconhecer a necessidade de reconfigurar suposições, estruturas e ações em resposta às mudanças no sistema (LEVINTHAL; RERUP, 2006).

🔍 Já é antiga a busca por modelos de desenvolvimento mais colaborativos e que gerem maior autonomia na participantes (BURKE; HUTCHINS, 2007), no contexto de organizações menos hierárquicas e com a necessidade de maior adaptabilidade como em especial as organizações híbridas (ADLER, 2001; BATTILANA; DORADO, 2010) cultivar uma cultura de aprendizado constante e de maior autonomia em seus processos de aprendizagem e desenvolvimento é uma questão de sobrevivência (ANNOSI et al., 2018). No entanto, essa construção de uma cultura com aprendizes protagonistas não é algo tão simples de se construir.

📚 Estudos mostraram que as pessoas tendem a preferir a aprendizagem ativa, mas quando confrontadas com ela, podem enfrentar dificuldades para se adaptar (WYLIE; SHIH, 2009). Tradicionalmente, aprender tem sido uma experiência passiva, na qual espera-se que as participantes absorvam informações sem interagir ativamente com elas. No entanto, estudos recentes mostraram que a aprendizagem ativa pode melhorar a competência das participantes e suas atitudes em relação a um assunto (REDMOND et al., 2020). É importante reconhecer que a adaptação à aprendizagem ativa pode exigir tempo e esforço, mas os benefícios são significativos a longo prazo.

📚 Autores como Billett, Goller, Harteis defendem a agência pessoal como sendo o fator determinante para a transformação do comportamento, explicam que fatores situacionais e contextuais moldam em grande parte as atividades e interações dos funcionários, mas a agência pessoal também desempenha um papel importante, afetando como as pessoas se envolvem nessas atividades (BILLETT, 2006; ETELÄPELTO et al., 2013; GOLLER; BILLET, 2014; HARTEIS; GOLLER, 2014). A agência pessoal no trabalho permite que as colaboradoras influenciem seus próprios processos de desenvolvimento profissional, como participar ou rejeitar práticas de trabalho, alterar descrições de trabalho ou buscar feedback sobre o desempenho (GOLLER; BILLET, 2014).

🔬 A proposta metodológica desse framework faz uso de recursos de reflexão estruturada, para que a pessoa participante possa refletir sobre a forma como ela atua e interage com os assuntos tratados, facilitando a construção de sentido individual sem julgamentos (WEICK, 1997). Ao mesmo tempo que, preservando o anonimato das pessoas participantes explora e explicita as características da cultura que reforçam ou são obstáculos para a transformação de seus comportamentos, para isso fazemos uso essencialmente da estrutura do Sistema de Atividade e da CHAT como lente teórica e de análise sobre os dados coletados (BLACKLER; REGAN, 2009).

 

  1. Considerações sobre o Framework

🔍 A prática coletiva é fundamental para desestabilizar a ordem estabelecida no Sistema de Atividade de forma controlada e produtiva, o que, por sua vez, promove o desenvolvimento de competências individuais e organizacionais e gera informações e insights para o time e a organização planejarem seus próximos passos com base em dados. Esse foco na prática coletiva e na interação entre as colaboradoras reflete a compreensão de que a aprendizagem organizacional é um processo social (ARGYRIS; SCHON, 1978; ENGESTRÖM, 2001), que ocorre através da interação, comunicação e colaboração entre as integrantes da organização. A etapa de interpretação embasa a importância da reflexão estruturada no desenvolvimento de habilidades das colaboradoras no ambiente de trabalho.

🔍 A reflexão estruturada permite que as colaboradoras extraiam significado das experiências vividas e facilitem a construção de sentido individual e coletivo (WEICK, 1997), especialmente quando se lida com contradições que surgem quando ideias antigas entram em conflito com novos pensamentos potencializados pela aplicação prática da ferramenta introduzida (ARGYRIS, 1976). A Teoria da Atividade (CHAT) de Engeström (2014) é utilizada como uma lente teórica para conceber os questionários e interpretar as respostas de um processo de reflexão estruturada, levando em consideração os fatores histórico-culturais presentes.

📚 A consideração de aspectos histórico-culturais é crucial para desenvolver uma compreensão mais profunda das dinâmicas organizacionais e promover a aprendizagem expansiva e o sensemaking coletivo, conforme proposto por Weick (1995). Isso implica que a aprendizagem organizacional não é apenas um processo técnico e racional, mas também é influenciada por fatores contextuais e emocionais que afetam a maneira como as integrantes e grupos interpretam e respondem às mudanças no ambiente de trabalho.

💡O modelo proposto tem por objetivo avançar no desenvolvimento de competências de forma a estimular a autonomia e protagonismo das participantes. Ao mesmo tempo que seria capaz de construir e apontar as contradições do Sistema de Atividade. Além do desafio das pessoas automatizarem seus processos e acabarem normalizando Sistemas de Atividade ineficientes ou prejudiciais. Da mesma forma a Organização, representada pelas áreas de apoio e suas lideranças passam pelo mesmo desafio.

🔬 A construção de uma interpretação da realidade baseada em dados, com inputs quantitativos e qualitativos, deve servir de pistas para que aprofundamento seja feito para entendimento da realidade. A aplicação do framework deveria ser capaz de produzir o Sistema de Atividade e os Roteiros Sociais implicados no mesmo. Expondo as dinâmicas da cultura organizacional e podendo expor inconsistências mais fundantes para a Organização.

 

  1. Outros pontos de saída da proposta

💡 As implicações práticas deste framework incluem a necessidade de as organizações investirem em processos de aprendizagem e desenvolvimento de competências que sejam abrangentes, integrados e sensíveis às dinâmicas organizacionais, culturais e sociais (ENGESTROM; KEROSUO, 2007). Isso significa que as lideranças deve estar atentas às contradições presentes nos Sistemas de Atividade e estar dispostas a promover a Aprendizagem Expansiva.

💡 As lideranças organizacionais devem também reconhecer a importância da reflexão estruturada e apoiar a criação de espaços e oportunidades para que as pessoas colaboradoras compartilhem suas experiências e perspectivas (WEICK; SUTCLIFFE; OBSTFELD, 2005). Isso pode incluir a realização de sessões de aprendizagem em grupo, workshops e seminários, onde possam discutir e analisar suas experiências e ideias de forma crítica e construtiva.

🔍 Além disso, o desenvolvimento de competências e a aprendizagem organizacional devem ser abordados como processos contínuos e adaptativos, que exigem monitoramento e ajustes constantes (ARGYRIS, 2009; ENGESTROM; KEROSUO; KAJAMAA, 2007). Isso implica que as organizações devem estar abertas a repensar e revisar suas abordagens e estratégias de aprendizagem à medida que o contexto e as necessidades das colaboradoras mudam ao longo do tempo (SALAS et al., 2012).

🔬 A aplicação eficaz do framework proposto neste artigo pode auxiliar as Organizações Híbridas a abordarem os desafios associados à mudança organizacional, ao desenvolvimento de competências e à inovação de forma mais eficiente e eficaz. Ao mesmo tempo, pode contribuir para a criação de um ambiente de trabalho mais inclusivo, participativo e orientado ao aprendizado, no qual as colaboradoras possam desenvolver suas habilidades e competências de forma contínua e colaborativa, e as organizações possam se adaptar e prosperar em um mundo cada vez mais complexo e incerto.

💬 Além disso, o framework proposto pode servir como um guia útil para profissionais de aprendizagem e desenvolvimento organizacional, que buscam implementar intervenções de aprendizagem eficazes e adaptáveis. Ao se concentrar no engajamento das participantes e na aplicação prática das ferramentas e estratégias, o framework pode ajudar a garantir que os objetivos de aprendizagem sejam alcançados e que as colaboradoras estejam melhor preparados para enfrentar os desafios em um ambiente de trabalho dinâmico.

➡️ No entanto, é importante ressaltar que o sucesso do framework depende, em grande parte, do compromisso das colaboradoras e das lideranças em participar e apoiar o processo de aprendizagem. O envolvimento das lideranças, em particular, é fundamental para garantir a eficácia das intervenções de aprendizagem e para criar um ambiente propício à aprendizagem e ao desenvolvimento contínuo.

Vamos à próxima seção verificar o processo de aplicação do framework na Tango.

 

  1. APLICAÇÃO DO FRAMEWORK

💼 Identificamos a possibilidade de aplicação do framework em um dos times da Tango. Aproximadamente 25 pessoas integrantes de 3 times que atuam em um mesmo cliente.

  1. Setup

➡️ A correta adaptação de um modelo para uma aplicação requer atenção, para garantir que todas as premissas sejam cumpridas. Aqui, apresentamos uma estrutura de como tal aplicação pode ser realizada:

💬 A criação conjunta de uma intervenção, utilizando o framework proposto, deve ser considerada como um espaço de construção coletiva. Esse espaço deve estar aberto a adaptações conforme as necessidades detectadas. A seguir, oferecemos um modelo que pode servir como ponto de partida para futuras aplicações:

  1. Conectar o objeto do desenvolvimento ao Sistema de Atividade:
    1. Identificação do problema que se deseja resolver;
    2. Mapeamento do processo e identificação de onde a capacitação solicitada terá impacto;
    3. Identificação dos principais obstáculos que impedem as colaboradoras de atuar como desejado;
    4. Compreensão das iniciativas passadas para tratar a questão;
    5. Construção da trajetória histórica do time e da organização na questão em questão;
    6. Mapeamento das características dos membros do time.,
  2. Estudo documental sobre a organização
    1. Estrutura adotada para o desenvolvimento de pessoas;
    2. Documentos relacionados à história e cultura da organização;
    3. Conteúdos já utilizados para trabalhar no desenvolvimento da competência em questão;
    4. Padrões e formatos das apresentações e requisitos necessários;
    5. Requisitos e formatação para contemplar a acessibilidade da apresentação
  3. Formatação do Questionário Insights (autoavaliação):
  4. Construção do conteúdo da Palestra Interativa e do Canvas de Aplicação:
  5. Desenho do encontro de Mentoria:
  6. Formatação do Questionário de Impacto
  7. Construção do Relatório de Devolutiva

     

  1. Aplicação

    1. Conectando o objeto ao sistema de atividade

 

💡 O desafio inerente à interação entre quem demanda e quem aplica, especificamente no contexto de interesses individuais capazes de influenciar ou até mesmo causar a desistência de premissas projetuais, é acentuado. Isso é particularmente relevante na tese em questão, onde a pessoa líder de Treinamento e Desenvolvimento (L&D) da Tango precisa coletar informações e, frequentemente, estimular uma reflexão mais profunda sobre a demanda.

📚 Contudo, quem aplica também busca garantir a realização da atividade, que pode ser cancelada sob certas condições. Nesse cenário, a efetividade de um modelo é notória, atuando como um artefato mediador, conforme Engeström (2001) postula. Este modelo vai além do simples sucesso técnico, operando como um instrumento que medeia a relação entre as interagentes. O modelo desempenha um papel fundamental ao oferecer uma estrutura objetiva que mantém o foco estabelecido, prevenindo que interesses individuais comprometam o progresso do projeto.

🔍 Ele funciona como uma referência comum, promovendo uma comunicação e negociação mais eficientes entre quem demanda e quem aplica. Além disso, facilita a criação de um espaço de reflexão e questionamento, onde a informação é coletada de forma abrangente, ao estimular uma reflexão mais aprofundada sobre a solicitação, permitindo uma melhor compreensão das necessidades e expectativas de quem demanda, garantindo que a atividade proposta seja de fato relevante e eficaz.

 

  1. Alinhamento da demanda:

💬 Usou-se um instrumento intermediário, um questionário apoiado em um deck de slides do powerpoint para apresentar o modelo e coletar as informações necessárias:

  1. Qual é o público-alvo e qual é a atividade principal que ele realiza? Como eles estão atualmente envolvidos e como deveriam estar idealmente envolvidos? (sujeito)
  2. Quais são os principais desafios ou dificuldades que você percebe na atividade da sua equipe? Como você acredita que um programa ou projeto específico ajudaria a superar esses desafios? (contradições)
  3. Quais são os principais processos ou atividades que estão envolvidos nesta demanda? Como eles são realizados atualmente e como deveriam ser idealmente realizados? (artefatos)
  4. Que situações ou contextos específicos na sua organização exigem habilidades mais eficazes por parte da sua equipe? (motivação / objeto)
  5. Ao final deste projeto ou programa, qual é o resultado esperado? Como você medirá o sucesso deste projeto? (foco do trabalho)
  6. Quais são os recursos (humanos, técnicos, financeiros) disponíveis e necessários para este projeto? Como eles estão sendo usados atualmente e como deveriam ser usados idealmente? (recursos)
  7. Como você avalia o impacto das habilidades de sua equipe na performance e nos resultados da organização? Quais são os indicadores de desempenho chave que você gostaria de rastrear? (indicadores de sucesso)
  8. Quais são as regras, diretrizes ou normas que governam esta atividade ou projeto? Como elas são aplicadas atualmente e como deveriam ser aplicadas idealmente? (Regras)
  9. Além das pessoas do time, quem são outras partes envolvidas nesta atividade? (Comunidade)
  10. Você já tentou outras abordagens ou soluções para melhorar a eficácia da equipe no passado? Se sim, quais foram os resultados e por que você acredita que este programa ou projeto seria mais eficaz? (história)
  11. Quais são as principais dificuldades ou desafios que você prevê neste projeto ou programa? Como eles podem ser superados? (restrições)

     

  1. Co-construção do conteúdo e da trajetória

 

📚 É fundamental para a eficácia do projeto que este seja co-construído entre a pessoa aplicadora e a equipe de projeto. A fim de atingir este objetivo, sugerimos a formação de uma equipe de projeto composta por uma Head de L&D, um especialista em desenvolvimento de pessoas, e a liderança dos times que participarão do programa. Essa equipe central atuará diretamente com as partes necessárias para a tomada de decisões, assim proporcionando uma maior agência ao programa (ENGESTRÖM, 2008)ð.

💼 Anteriormente, já havia realizado uma imersão na Tango para a parte anterior desta tese, o que facilitou o processo de compreensão dos aspectos histórico-culturais. No entanto, a fim de gerar valor para as partes interessadas, foi necessário aprofundar minha imersão nos conteúdos especializados da organização, nos processos de desenvolvimento e nas estratégias de implementação. Isso me permitiu ter acesso à documentação interna da empresa, o que possibilitou a tradução de como as competências se relacionam entre si e como elas contribuem para capacitar as equipes e as colaboradoras a atender às capacidades organizacionais identificadas como necessárias para o negócio.

🔬 A abordagem adotada nos permitiu desenvolver um mapa de conexões mais acurado e alinhado à realidade, aprofundando nossa compreensão das interconexões entre as diversas competências Figura 42 – Integração do Objeto de desenvolvimento. Esta investigação meticulosa evidenciou a relevância de explicitar as interdependências para o time, servindo como uma ferramenta valiosa para fomentar um senso de propósito coletivo, algo que já se mostrou efetivo para a equipe de projeto.

🔍 A partir da construção de uma visão clara e ampla sobre como as competências se interrelacionam, pudemos entender como elas impactam diretamente na capacidade de consultoria e, consequentemente, nos objetivos da organização. A análise detalhada, combinada com a adoção de descrições mais exatas, gerou uma fundação robusta para a execução do programa, garantindo que este esteja integrado e alinhado às necessidades da organização, ao invés de parecer um elemento isolado.

📚 A Teoria da Atividade desempenha um papel fundamental nesse processo de transformação, desde a co-construção do briefing até o desenho da jornada. Ela auxilia na estruturação dos inputs, facilitando a compreensão do Sistema de Atividade e, principalmente, do objeto que estamos tratando. Além disso, permite que as pessoas na organização revisitem e compreendam sua própria realidade sob uma nova perspectiva.

💡 Esse processo de compreensão e tradução enriquece tanto a equipe de projeto quanto a organização como um todo, e foi recebido de forma positiva pela equipe, que se surpreendeu com a capacidade de adaptação do framework às necessidades e características específicas da organização.
Portanto, a Teoria da Atividade não apenas facilita a compreensão de uma nova realidade, mas também promove uma análise reflexiva e uma abordagem personalizada, beneficiando todas as envolvidas.

 

Figura 42 – Integração do Objeto de desenvolvimento


Fonte: Autor

 

  1. Construção da autoavaliação

 

📚 A autoavaliação é uma peça central do projeto. Pois, além de ser a primeira interação da pessoa participante com o conteúdo, é também ali que podemos criar ou perder engajamento(BOUD; SOLER, 2016). Preferencialmente o questionário deve durar 7 minutos para ser preenchido. Para tal o assessment deve obter 3 grandes grupos de informações:

  1. nível de domínio da pessoa respondente;
  2. comportamentos característicos de seus pares (cultura na prática);
  3. presença ou ausência de processos, sistemas e características organizacionais que promovam ou não a competência e os comportamentos decorrentes de seu uso.

💡 Para que o questionário auxilie na construção do sistema de atividade, deve ser correlacionado com as partes do sistema de atividade desde sua concepção. Além de capturar informações práticas, os dados nos ajudarão a criar conexão com as necessidades do grupo e as demandas da organização.

💬 Houve predileção por perguntas de escala e de múltipla escolha para diminuir o esforço da pessoa respondente. E aumentarmos o engajamento delas em completá-lo.

 

Questionário aplicado:

Quadro 12 – Questionário relacionando perguntas e Teoria da Atividade

#

Pergunta

Tipo de pergunta

Sistema de Atividade

1

Quão frequentemente você adota uma abordagem estratégica na gestão de stakeholders?

Escala

Objeto

2

Quão eficaz você considera sua habilidade em identificar e analisar as partes interessadas em projetos, iniciativas ou organizações?

Escala

Objeto

3

Quais das seguintes competências você acredita serem as mais importantes para uma gestão eficaz dos stakeholders? (Selecione até 3)

Múltipla escolha

Instrumentos

4

Em uma escala de 1 a 5, quão eficaz você considera sua habilidade em construir relacionamentos sólidos com stakeholders?

Escala

Sujeito

5

Em uma escala de 1 a 5, quão eficaz você considera sua habilidade em garantir cooperação e apoio dos stakeholders?

Escala

Sujeito

6

Em sua experiência, quais fatores são mais importantes para exercer uma influência maior nos projetos e nas tomadas de decisão? (Selecione até 3)

Múltipla escolha

Regras

7

Quão bem você acredita que sua organização promove a capacidade de xxx entre seus profissionais?

Escala

Comunidade

8

Comente: Quão bem você acredita que sua organização promove a capacidade de xxx entre seus profissionais?

Texto curto

Comunidade

9

Descreva uma situação em que você aplicou com sucesso suas habilidades de gestão de stakeholders para influenciar um projeto ou tomada de decisão.

Texto curto

Sujeito

10

Quão importante você considera sua habilidade em gerenciar stakeholders para o sucesso dos projetos nos quais está envolvida?

Escala

Objeto

11

Quais dos seguintes recursos ou ferramentas você já utilizou ou considera útil na gestão de stakeholders? (Selecione todos que se aplicam)

Múltipla escolha

Artefatos

12

Com base em sua experiência, quais são os maiores desafios que você enfrenta na gestão de stakeholders?

Texto curto

Objeto

13

Quão bem você acredita que sua organização apoia e capacita as colaboradoras na gestão de stakeholders?

Escala de opinião

Comunidade

14

Avalie seu nível de conhecimento e experiência em relação à gestão de stakeholders.

Múltipla escolha

Sujeito

15

Quão importante você acredita que seja desenvolver e melhorar continuamente suas habilidades de gestão de stakeholders?

Escala de opinião

Sujeito

16

Quão satisfeita você está com o treinamento e desenvolvimento disponíveis em sua organização para aprimorar suas habilidades de gestão de stakeholders?

Escala de opinião

Comunidade

17

Quais dos seguintes métodos você considera mais eficazes para melhorar suas habilidades de gestão de stakeholders?

Múltipla escolha

Instrumento

18

Quão frequentemente você utiliza habilidades de gestão de stakeholders em seu trabalho atual?

Escala de opinião

Sujeito

19

Quão importante você acredita que é a gestão de stakeholders para o sucesso do seu trabalho e da organização em geral?

Escala de opinião

Objeto

20

Qual a prioridade que a gestão de stakeholders tem em seu planejamento de desenvolvimento pessoal?

Escala de opinião

Sujeito

21

Quão claras e compreensíveis são as regras e políticas relacionadas à gestão de stakeholders em sua organização?

Escala de opinião

Regras

22

Quais dos seguintes aspectos das regras e políticas de sua organização você acredita que precisam ser aprimorados para facilitar a gestão de stakeholders?

Múltipla escolha

Regras

23

Quão consistente é a aplicação das regras e políticas relacionadas à gestão de stakeholders em sua organização?

Escala de opinião

Regras

24

Quão eficaz você considera a divisão de atividades e responsabilidades relacionadas à gestão de stakeholders em sua equipe ou organização?

Escala de opinião

Divisão de Trabalho

25

Quais dos seguintes aspectos da divisão de trabalho e responsabilidades você acredita que precisam ser aprimorados para melhorar a gestão de stakeholders em sua equipe ou organização?

Múltipla escolha

Divisão de Trabalho

26

Quão satisfeita você está com o nível de autonomia e autoridade que você tem em relação à gestão de stakeholders em sua função atual?

Escala de opinião

Divisão do trabalho

37

Com base em sua experiência, quão positivo você considera o impacto das habilidades e ações de gestão de stakeholders nos resultados dos projetos ou iniciativas em que trabalhou?

Escala de opinião

Resultado

38

Quais dos seguintes resultados você observou como consequência direta de uma gestão eficaz de stakeholders em sua organização ou em projetos específicos?

Múltipla escolha

Resultado

Fonte: Autor

O potencial de captura dos dados não pode transformar a autoavaliação em um questionário sem adesão. O objetivo do programa nas primeiras etapas: a) kick-off, b) autoavaliação, e c) talk interativa é manter alto nível de engajamento e participação.

 

 

  1. Engajamento é determinante

 

📚 No processo de desenvolvimento de pessoas adultas, não podemos assumir total responsabilidade por seu desenvolvimento, mas podemos auxiliá-las em sua jornada individual (KNOWLES; HOLTON III; SWANSON, 2005). Com base nessa compreensão, foi considerado crucial fornecer às participantes uma resposta rápida em relação aos resultados de sua autoavaliação, estabelecendo assim uma relação de confiança e garantindo que seu investimento de tempo seja recompensado.

💡 Para atender a esse objetivo, foi desenvolvido um sistema automatizado que processa o questionário, gera relatórios personalizados e os envia para o e-mail fornecido pela participante. Esses relatórios foram referenciados em diferentes momentos, tanto pela equipe do projeto quanto pelas próprias participantes. Aqueles que não receberam seus relatórios entraram em contato conosco para solicitá-los.

💼 No total, tivemos 23 respondentes, sendo que 2 deles optaram por não fornecer seu endereço de e-mail ao responder ao questionário. A adoção de um relatório individualizado automatizado e de envio imediato são para que as participantes tenham acesso fácil e descomplicado aos seus dados, e ao mesmo tempo recebam inputs, provocações e um espaço de conexão ágil. Essa abordagem ágil e responsiva contribuiu para estabelecer um ambiente de confiança e valorização mútua entre a pesquisadora intervencionista o grupo de projeto e as participantes(BOUD; SOLER, 2016). Fato que se confirmou nos feedbacks, momentos de troca ao vivo e avaliação formal do programa.

🔬 A Figura 43 é um exemplo das 10 páginas que compõem o relatório individual utilizado na Tango. A premissa de limpeza dos slides, com design que fosse elegante e convidativo para a leitura. Em especial, dando destaque para imagens que podem ser compreendidas rapidamente, apoiadas por um roteiro de perguntas norteadoras, para o segundo momento em que a pessoa participante resolve aprofundar no conteúdo apresentado(ILLERIS, 2007).

 

 

 

 

Figura 43 – Exemplo relatório individual


Fonte: Autor

 

💬 Alguns cuidados são tomados no relatório, como referenciar ao nome da pessoa participante no texto. Ainda que seja um recurso tecnológico simples, os processos de personalização ajudam a constituir esse sentimento de proximidade e melhorando a experiência da pessoa participante (PINE; GILMORE, 1998). Os dados foram agrupados e processados no processo de automação para facilitar a compreensão da pessoa participante, e ao mesmo tempo para que ela possa refletir sobre os grandes grupos de conteúdo a cada momento.

O relatório cumpre uma série de funções para que o programa seja bem-sucedido:

  1. introduz o tema que será trabalhado, possibilitando a pessoa participante chegue no dia da talk interativa sabendo do que se trata, e o que precisará fazer durante o encontro (HALTTUNEN; KOIVISTO; BILLETT, 2014);
  2. centraliza documentação, e informações do programa e do processo de desenvolvimento, através do relatório individual a participante encontra datas, contexto, conteúdo básico, informações adicionais desejadas pela organização, expectativas para o programa e atitude esperada dela como participante;
  3. inicia o processo de reflexão estruturada, um processo central para o programa, a reflexão sobre o conteúdo a ser trabalhado, mas também a reflexão sobre os comportamentos individuais, os traços da cultura e os padrões do Sistema de Atividade. Algumas características são destacadas desse processo (PARTANEN, 2019):
    1. a pessoa respondente tende a se avaliar de forma mais positiva do que as outras pessoas a avaliariam, e tende a avaliar as outras pessoas de forma mais rigorosa que elas se avaliariam (DUNNING; HEATH; SULS, 2004);
    2. a dissociação cognitiva evidenciada é usada para mexer nas autopercepções e no objeto de análise adotado. Essas informações são apresentadas na Talk Interativa de forma transparente e direta, chamando as participantes para refletir sobre os dados e sobre os padrões compartilhados de comportamentos e modelos mentais do grupo(DUNNING; HEATH; SULS, 2004);
    3. em suma, usamos as evidências objetivas das avaliações, assim como as contradições possíveis de serem destacadas, como no item b, para evidenciar a necessidade de um esforço coletivo na operacionalização do programa.
  4. o relatório faz uso dos resultados da autoavaliação como matéria-prima para propor um roteiro de perguntas que estimulam a pessoa participante a refletir de uma forma estruturada sobre suas respostas.
    1. O caráter situado do conhecimento (ENGESTRÖM, 2001) é reforçado, construindo em cima das respostas dadas, e provocando para que mais conexões entre os dados possam ser feitas.
    2. Poucas participantes irão refletir sobre todas as perguntas, novamente esse é um posicionamento que se alinha com a proposta desse programa, mais do que forçar as pessoas a passar por um processo queremos convidá-las a andar pelo trajeto e entender, quem explorou, como foi, quem não explorou, por que não (GOLLER; BILLET, 2014).
  5. no relatório foi incluído um convite para que as pessoas participantes compartilhassem suas histórias, reflexões, comentários e/ou percepções individuais de forma anônima através de áudio (infelizmente não tivemos nenhum compartilhamento).
    1. a proposta alinha-se com os aspectos Histórico-Culturais da Teoria da Atividade, de entendimento e valorização das histórias das partes envolvidas. Coletou-se informações em diferentes momentos da pesquisa, e gostaríamos de aqui também testar um modelo de capturar essas histórias de forma assíncrona.
    2. em um momento de feedback informal me foi dito “achei o convite muito estranho, não saberia muito bem o que compartilhar. Não faz parte do nosso dia a dia esse tipo de interação. “. Reforçando a importância do fator humano no processo de conexão entre as partes, e possibilidade de entender, conectar e valorizar os aspectos da história e da cultura situados no grupo.
  6. no relatório deu-se o destaque para o papel ativo no processo de aprendizagem esperado das participantes:
    1. no caso da Tango, esse ponto passou como algo já conhecido e esperado pelas participantes, no entanto em organizações com cultura de aprendizagem menos autônoma, a postura e atitude das pessoas participantes deve ser um ponto reforçado durante todo o programa(KENNEDY et al., 2015a);
    2. usamos o relatório para explicar o conceito de “on the job learning”, onde evidenciamos que não haverá atividades extras, o convite e o desafio é fazer uso da ferramenta apresentada no dia a dia do trabalho(RAELIN, 2008).
  7. por último apresentamos as datas e o cronograma do programa para a participante conferir se está agendada para tal.

 

  1. Macro visão do processo de autoavaliação:

 

💬 Abaixo segue uma descrição do processo tecnológico de operacionalização da autoavaliação e das respostas individuais produzidas:

  1. O questionário é produzido em formato de texto, importado para a plataforma Typeform onde é configurado e tratado para que possa ser respondido.
  2. O questionário é validado pela equipe de projeto, e editado se necessário.
  3. É feita a automação do questionário (as automações são feitas pela plataforma zapier),
    1. linkando-o ao google sheets, onde os dados serão processados por meio de fórmulas gerando os gráficos e as interpretações de grupos de respostas.
    2. os dados produzidos são exportados para o google slides, onde são aplicados em um modelo pronto para receber as informações.
    3. o relatório é exportado em um formato pdf, anexado em um e-mail e enviado da caixa de e-mail do autor para a participante.

 

  1. A talk interativa

 

📚 A palestra interativa tem como metas principais: fornecer contexto, transmitir conteúdo e equipar a participante com ferramentas para implementar no cotidiano. No entanto, o principal desafio é persuadir a participante a adotar uma abordagem de aprendizagem baseada na prática e a implementar efetivamente as ferramentas aprendidas.

🔍 Porém o principal desafio está em ser capaz de convencer a participante a adotar o processo de aprendizagem pela prática, e colocar a ferramenta em prática.

Observando esse processo pela perspectiva da Teoria da Atividade Cultural-Histórica (CHAT), ele é visto como um sistema de múltiplas atividades com um objetivo compartilhado:

  1. Sistema 1:
    1. Sujeito: autor;
    2. Objeto: aplicação do modelo;
    3. Artefato: muitos (comunicação, construção de conhecimento, captura de dados, processamento de dados, produção de conteúdo: questionário, relatório, apresentação etc.;);
    4. Regras: cultura da organização;
    5. Comunidade: colegas pesquisadores, equipe de projeto;
    6. Divisão do trabalho: operação do processo, validação do conteúdo, aprovação do método.
  2. Sistema 2:
    1. Sujeito: área de L&D e Liderança do time;
    2. Objeto: busca de metodologias de desenvolvimento que atendam a necessidade dos times e pessoas da organização;
    3. Artefato: documentos internos, pesquisas, referências externas, demandas dos times;
    4. Regras: processos, sistemas e normas da organização;
    5. Comunidade: pares, outras lideranças da organização;
    6. Divisão do trabalho: acompanhamento e validação do material, mobilização do time de participantes, comunicação interna e venda da ideia do projeto para as lideranças diretas, coleta de dados e avaliação do resultado.
  3. Sistema 3:
    1. Sujeito: pessoa participante / time;
    2. Objeto: desenvolvimento de competências e habilidades técnicas e não técnicas alinhadas com seu plano de desenvolvimento e objetivos de carreira;
    3. Artefato: PDI, ferramentas tecnológicas de apoio, (modelo mental referente ao seu processo de aprendizagem e necessidades de desenvolvimento);
    4. Regras: o programa é indicado, mas é por adesão, a pessoa não é obrigada a participar;
    5. Comunidade: pares, comunidade da organização, referências externas;
    6. Divisão do trabalho: participação no programa, avaliação do programa.

Abaixo sugerimos uma figura representativa dessa relação

 

Figura 44 – Sistema de Atividade compartilhado


Fonte: Autor

 

💬 O propósito do processo anterior a talk é capturar o máximo de informações sobre o Sistema de Atividade em formação, seu histórico e as percepções dos envolvidos, aumentando assim a probabilidade de uma intervenção bem-sucedida.

🔍 Contudo, muitas vezes as pessoas envolvidas não dispõem de informações exatas sobre os Sistemas de Atividade. Elas tendem a ter visões altamente subjetivas ao invés de dados objetivos, resultando em percepções distorcidas, minimizadas, esquecidas ou até mesmo sem uma compreensão clara do assunto, o que as coloca no papel de espectadoras passivas de um processo aparentemente incontrolável, em vez de agentes ativos.

Para diminuir esse impacto de desinformação é que o modelo segue os passos propostos pelo framework:

  1. Competência precisa estar ligada a uma capacidade/objetivo do negócio;
  2. Dar protagonismo no processo de aprendizado aumenta o engajamento;
  3. Intervenções curtas e práticas mantem engajamento;
  4. Reflexão estruturada pavimenta espaço para Aprendizagem Expansiva.

🔬 O processo desenhado aumenta as chances de sucesso, porém o objetivo não é ser bem-sucedido em sua aplicação. Mas sim, utilizar da experiencia de aplicação para coleta de dados e construção de uma interpretação dos Sistemas de Atividade que possam gerar insights para as partes envolvidas, independentemente do nível de maturidade e consciência em que estejam. Por essa razão, o modelo proposto é projetado para ser conciso, fornecendo informações e dados relevantes a todas as partes envolvidas.

💡 O modelo visa não apenas resolver o Sistema de Atividade, mas também criar de forma controlada e coordenada, um desequilíbrio no sistema pela introdução de um artefato e identificar contradições negligenciadas. Essa premissa se baseia na ideia de chamar a atenção para processos que se tornaram rotineiros e automatizados, transformando-os em artefatos no contexto da CHAT (ENGESTRÖM, 2001; WEICK; SUTCLIFFE, 2006).

💼 No caso da Tango o Sistema de Atividade em questão concentra-se em melhorar a capacidade das pessoas em atuar em seus projetos. Por meio do desenvolvimento da competência de gestão de stakeholders.

➡️ Ao mesmo tempo que isso é feito, as pessoas são desenvolvidas em uma ou mais competências que são estratégicas para a organização e ajudarão as pessoas, o time e a organização a se aproximar de seus objetivos organizacionais.

 

  1. Dados para adaptação do modelo

 

💬 A partir do instante inicial, o objetivo da intervenção é apresentado para a organização, fortalecendo a compreensão de que será executado um processo duplo. A proposta está em harmonia com os valores ágeis, a gestão baseada em dados e os ciclos curtos de implementação (WISE; ROUBEN, 2015), permitindo a contínua correção da trajetória do processo de desenvolvimento, seja por meio de intervenções similares, ou trabalhando as contradições identificadas com recursos mais precisos (HODA, 2011).

🔬 Quando este procedimento foi aplicado e os dados foram coletados, foram identificadas duas questões relevantes, ilustradas nas Figura 45 e Figura 46. Este é um grupo heterogêneo, composto por pessoas com e sem expertise técnica em gestão de stakeholders, o que justifica a execução do programa. Contudo, os dados destacam a demanda das equipes por maior clareza de papéis, responsabilidades e resultados esperados a respeito desse tema.

🔍 Portanto, um programa de desenvolvimento técnico que fornece ferramentas irá tratar parte do problema. No entanto, a menos que as líderes atuem para esclarecer as questões apontadas, os objetivos não serão atingidos e possivelmente teremos uma equipe frustrada por não saber onde e como aplicar o conhecimento adquirido.

💡 O questionário inicial nos proporciona um rico leque de informações, fundamentais para a nossa efetiva interação com o público-alvo. O modelo de Laboratório de Mudança, proposto por Engeström (2001), utiliza instrumentos etnográficos e de vídeo para construir um caso sólido e comunicá-lo de maneira convincente às participantes.

💬 Em nosso método, empregamos uma abordagem que une o mapeamento do sistema de atividade à análise de comportamentos observáveis. Isso nos permite identificar e expor as contradições (ENGESTRÖM, 2001), que, embora muitas vezes já estejam presentes no grupo, tendem a estar dispersas nas necessidades particulares dos indivíduos, baseadas em suas experiências, necessidades e urgências. Com essa estratégia, conseguimos organizar essas contradições dispersas e torná-las visíveis, facilitando o seu mapeamento e impulsionando o processo de aprendizado e desenvolvimento.

 

 

Figura 45 – Slide Talk Interativa


Fonte: Autor

 

💬 Podemos com base nos dados explicar a diversidade do grupo, com relação ao grau de maturidade do conteúdo que será trabalhado. Justificando para os avançados o porquê da abordagem intermediária, e para os menos experientes o porquê de não trabalharmos apenas o básico.

 

 

Figura 46 – Slide Talk Interativa


Fonte: Autor

 

🔬 Os dados coletados indicaram uma ausência de clareza quanto a papéis e responsabilidades, não apenas em relação à aplicação ou ao exercício da competência de gestão de stakeholders, mas também em relação à capacidade guarda-chuva.

🔍Essa é uma situação que demanda uma condução cuidadosa na organização onde o modelo é aplicado. Portanto, é essencial que os dados sejam meticulosamente trabalhados e organizados para demonstrar que aprofundamos no problema inicial e que agora somos capazes de identificar padrões e contradições anteriormente não mapeados para este grupo.

💬 Talvez seja exagero afirmar que a abordagem com base na Teoria da Atividade, ao mesmo tempo que buscamos entender o contexto e buscar sinais fracos de contradições que não são evidenciadas seja uma integração da CHAT e da Cartografia. Porém, ao produzir o modelo, estando embebido em ambas, sem dúvida, as premissas ficaram presentes (ENGESTRÖM, 2001; KASTRUP; PASSOS, 2013).

📚A análise de um time não pode ser transposta para outros times da organização, pelo caráter situado do conhecimento (ENGESTRÖM, 2001). Porém, representam pistas importantes. Já que há uma cultura compartilhada na organização e o comportamento das lideranças tende a seguir um padrão. Portanto, se o objetivo for desenvolver o papel das pessoas colaboradoras em determinada capacidade, é recomendável que essa hipótese seja confirmada antes de ser considerada como verdade.

💬 Deve-se ter cuidado na forma de apresentar os resultados. Há, em muitos casos expectativas e compromissos não declarados que podem fazer com que os resultados e a análise dos dados sejam vistos como uma ameaça e desqualificados.

 

  1. A palestra interativa

 

💼 No dia 5 de abril, tivemos uma palestra interativa superinteressante. O objetivo? Convencer o maior número de pessoas a usar a ferramenta que apresentamos. Mas aí vem a pergunta: por que essa prática é tão crucial para o nosso modelo?

💼 Bem, estamos falando sobre aprendizagem expansiva, que envolve dois processos paralelos. O primeiro é a evolução do sistema de atividade, representado como um círculo de 7 passos, conforme explicado por Engeström em seu vídeo de 2020. Mesmo que essa representação pareça simples e direta, na realidade o processo sempre tem seus desafios. O segundo processo é o aprendizado e desenvolvimento pessoal.

💼 Depois de explicar essa parte teórica, vamos para a parte prática da nossa palestra interativa, que dura 90 minutos e é dividida em quatro partes:

  1. Contextualização (10 min): vamos explicar por que esse tópico é importante para você e como ele se conecta com as necessidades do seu negócio.
  2. Conceitos (20 min): vamos falar sobre a teoria e o modelo que apoiam a abordagem que estamos propondo.
  3. Ferramenta (30 min): vamos apresentar e aplicar a ferramenta juntos, seja em uma plataforma virtual ou fornecendo um arquivo PPTX ou PDF para que você possa usar no seu próprio computador.
  4. Perguntas e Respostas (30 min): esta é a hora de responder às suas dúvidas que podem te impedir de usar a ferramenta. Vamos abordar questões que derivam da pergunta: “Em uma escala de 0 a 10, o quanto você está pronta para colocar a ferramenta em prática? Quais são seus obstáculos, dúvidas ou inseguranças?”

💬 Nossa estratégia de trabalho é usar poucos slides e focar mais na prática. Após a palestra, mantemos um canal de comunicação aberto com o grupo onde, dependendo do caso, podemos compartilhar materiais para aprofundamento teórico e prático, embora isso geralmente não seja recomendado.

🔬 Ao inverter o ciclo de aprendizado, fazendo com que as participantes sejam as principais personagens do próprio processo de aprendizagem e atendendo às demandas de conteúdo conforme elas aparecem.

💡 Com o fácil acesso à informação e a popularização das inteligências artificiais, entregar conteúdo não é mais a principal preocupação. Agora, o desafio é capacitar indivíduos e grupos a trabalhar de forma coletiva e coordenada para alcançar objetivos comuns.

➡️ No final da Palestra Interativa, lembramos as participantes da importância de colocar a ferramenta em prática e abrimos um canal de comunicação com o facilitador, no caso, eu, para esclarecer dúvidas e questões.

🔍 Sobre a aplicação da palestra: notei que maior parte das participantes mantiveram suas câmeras desligadas, o que é uma característica da organização, com base no respeito às individualidades e necessidades específicas. Embora seja um desafio para a pessoa aplicadora, que perde o contato visual e as expressões faciais, reconhecemos a importância desse recurso nos processos de ensino e aprendizagem, seja presencial ou virtual.

🔍 Houve pouca interação das participantes, com apenas um pequeno grupo de cerca de 5 das 23 pessoas que participaram do encontro interagindo ativamente. Também notamos que nem todos as participantes permaneceram durante todo o encontro, o que é comum em processos de ensino e aprendizagem, especialmente em um ambiente virtual.

 

 

  1. Mentoria

 

💼 Após 7 dias da Palestra Interativa tivemos o encontro de mentoria. Dos 23 participantes tivemos a presença de 16 pessoas. Desde pessoas que não puderam participar ou tiveram que sair mais cedo no primeiro encontro, junto com pessoas que aplicaram a ferramenta e queriam compartilhar suas impressões.

💼 Foram 60 minutos de trocas, onde não havia uma pauta pronta e fomos interagindo e tratando das questões individuais à medida que emergiram. Ao menos 5 pessoas não haviam aplicado a ferramenta até então e usaram o momento da mentoria para fazer o exercício. E tivemos 3 pessoas que apresentaram dúvidas sobre a pertinência da ferramenta em sua atuação.

💬 “Entendo que a ferramenta de Gestão de Stakeholders é uma ferramenta mais estratégica, e meu trabalho é técnico operacional. Ainda não entendi bem como aplicá-la me ajudará.” Comentou uma das participantes. Outras duas reforçaram essa percepção.

🔬 O que corroborou os dados coletados no questionário inicial que apontaram uma necessidade de maior clareza dos papéis e de o que se espera dele com relação à competência e a capacidade guarda-chuva que estava sendo trabalhada em conjunto.

💬 A sessão foi bem avaliada pela equipe de projeto, e posteriormente foi citada nas avaliações sobre o programa como um momento importante de solidificação do conteúdo, envolvimento das partes e troca com a pessoa aplicadora

 

  1. Interações assíncronas

 

💼 A equipe de projeto criou um grupo no Google Chat, para que servisse de meio para trocas e pedidos de ajuda, tirar dúvidas e agilizar o processo de envio de informações. Houve pouca adesão à proposta, fato que foi recebido como naturalidade pela equipe de projeto e pela liderança direta das pessoas participantes.

 

  1. Conectando com a teoria

 

📚 A aprendizagem individual é interpretada na CHAT como o processo através do qual um indivíduo adquire novas habilidades e conhecimentos ao participar de uma atividade. Este processo de aprendizagem é mediado por artefatos culturais, ferramentas, processos e linguagem, e é ainda influenciado pelo contexto social e cultural em que a atividade ocorre (ENGESTROM, 2014).

🔍 Por outro lado, no nível coletivo, a aprendizagem é vista como um processo de co-construção na CHAT. As participantes de um sistema de atividade colaboram na realização de uma tarefa comum, processo este que envolve a construção e negociação de significados/conceitos, a coordenação de ações e a resolução de contradições. Tais contradições, quando resolvidas, levam a uma mudança tanto no nível individual (aprendizagem) quanto no nível coletivo (desenvolvimento) (ENGESTROM, 2014).

📚 A aprendizagem expansiva, já discutida anteriormente na seção de lente teórica, é um conceito central na CHAT. Trata-se de um tipo de aprendizagem que provoca a transformação do sistema de atividade como um todo. A proposta é que as pessoas, ao participarem de uma atividade, não apenas aprendam dentro dos limites desta atividade, mas também sejam capazes de questionar e reconfigurar o próprio sistema de atividade.

💡 Para tanto, é necessário identificar e resolver as contradições dentro do sistema, criar ferramentas e práticas (artefatos), e redefinir os objetivos da atividade. Por isso, a aprendizagem expansiva é vista como um processo de inovação e mudança coletiva que contribui para o desenvolvimento tanto do indivíduo quanto da equipe ou organização (comunidade).

 

  1. Contrastes entre processos de desenvolvimento orientados exclusivamente para habilidades e competências e abordagens sistêmicas

 

🔬 Em uma visão simplificada, é possível relacionar a abordagem de desenvolvimento focada em competências e habilidades ao modelo econômico mecanicista, ou de produção em massa, representado na Figura 20. Neste modelo, o foco está em capacitar indivíduos para aplicar conhecimentos e habilidades em processos previamente desenhados por um grupo restrito de gestores ou engenheiros(ENGESTRÖM, 2008).

🔍 Essa abordagem ainda é utilizada em muitos processos de desenvolvimento contemporâneos. No entanto, uma versão mais avançada dessa abordagem pode ser descrita como vivências ou estudos de caso. Aqui, reconhece-se que a aquisição de conhecimento puro não é mais suficiente. Logo, são utilizados processos que ajudam as participantes a construir conhecimento e aprender a aplicá-lo, preparando as lideranças das organizações para retornar à sua realidade e promover a transformação necessária (ENGESTRÖM; SANNINO, 2020).

📚 Os estudos de caso geralmente são baseados em ideais, permeados por crenças e construções que podem não estar completamente alinhadas com a realidade da organização onde a liderança irá aplicá-los. Esta é uma crítica às abordagens que não consideram o conhecimento situado como relevante ou fundamental para a efetivação das transformações esperadas.

💬 A abordagem de desenvolvimento individual, que se concentra na melhoria das habilidades, competências e atitudes do indivíduo, assume que, ao capacitar as pessoas, elas serão proativas na modificação de sistemas e processos que as impedem de mudar seu comportamento e da organização evoluir (KENNEDY et al., 2015b).

📚 No entanto, essa visão é criticada por aqueles que adotam uma perspectiva mais sistêmica, argumentando que a ênfase deve ser na mudança dos sistemas e processos, e não nas pessoas. Esses autores sustentam que não podemos mudar as pessoas diretamente, mas que as pessoas se adaptam aos sistemas e processos existentes como uma estratégia de “sobrevivência” (HAMEL, 2020).

Quadro 13 – Tipos históricos de trabalho vs aprendizagem

Tipo histórico de trabalho

Método de desenvolvimento de pessoas

Motivo da abordagem

Tomada de decisão

Modelo de Desenvolvimento

Exemplo

Craft Work

🎓 Aprendizado situado e aprendizagem em prática como aprendiz e prática individual subsequente

A necessidade de produzir produtos artesanais tradicionais ou únicos e novos, com uma forte dependência do conhecimento e das habilidades do indivíduo.

Individual ou pequenos grupos

🧑🎓 Modelo de aprendizado mestre-aprendiz

Oficinas de artesanato

Mass Production

📚 Instrução de trabalho formal e treinamento para realizar tarefas específicas (Taylor, 1911/1998)

A necessidade de produzir em grande escala e padronizada, com muita especialização e divisão funcional do trabalho.

Hierárquica e centralizada

🏭 Modelo de treinamento baseado em instruções de trabalho

Fábricas de linha de montagem do início do século XX

Process Enhancement (Mass Production 2.0)

🔄 Aprimoramento contínuo do processo e aprendizagem colaborativa para eliminar perturbações e desperdícios

A necessidade de lidar com a variação na qualidade dos produtos devido ao erro humano e mudanças qualitativas na demanda.

Equipe focada no processo

🔄 Modelo de aprendizado baseado em melhoria contínua do processo

Fábrica da Toyota

Mass Customization

💻 Treinamento no uso de tecnologia da informação e comunicação (TIC) e no entendimento dos módulos do produto

A necessidade de atender às necessidades específicas dos clientes, produzindo uma variedade de versões de um produto.

Compartilhada entre produção e cliente

🖥️ Modelo de aprendizado baseado em TIC e modularização de produtos

Empresas de software personalizado

Co-Configuration Work

🤝 Aprendizado e desenvolvimento contínuos, com foco na análise das necessidades dos clientes e na negociação do conteúdo do produto ou serviço

A necessidade de lidar com mudanças tanto nas necessidades do cliente quanto no conhecimento e capacidades do produtor.

Compartilhada entre produtor, cliente e produto

🌟 Modelo de aprendizado e desenvolvimento contínuos, centrado no cliente

Empresas de tecnologia modernas, como empresas de SaaS

Fonte: inspirado em Virkunnen e Newnham (2013), complementado pelo autor.

 

🔍 Esta visão torna-se ainda mais relevante em uma economia dinâmica e em rápida mudança, onde as tecnologias estão continuamente transformando o trabalho e os objetos de atividade das organizações. Com essa realidade, a descentralização dos processos de gestão se torna necessária, permitindo que equipes autônomas criem soluções adequadas para a realidade encontrada. Isso favorece um modelo de rede em vez de um modelo hierárquico tradicional (DIGNAN, 2019).

💡 Nesse contexto, a capacitação das equipes não deve se limitar às competências identificadas como necessárias, mas também deve incluir a capacidade de mapear contradições, entender os sistemas de atividade e evoluir seus processos de maneira autônoma através da aprendizagem expansiva. Ou seja, desenvolver as capacidades para que os times sejam capazes de evoluir de forma autônoma e não dependentes de agentes externos (DIGNAN, 2019).

🔬 Como Heifetz aponta em sua abordagem de problemas adaptativos, que são semelhantes aos problemas complexos no modelo Cynefin de David Snowden, o desafio é que esses problemas não podem ser “resolvidos” no sentido tradicional. Eles podem apenas ser estabilizados, uma vez que a relação de causa e efeito não é direta e as variáveis que influenciam o problema estão em constante mudança (HEIFETZ; GRASHOW, 2009; SNOWDEN, 2005)

💬 Portanto, ao lidar com um problema adaptativo, o principal desafio é comunicar, influenciar e envolver a equipe na compreensão de que esse é um problema atual, relevante e que precisa ser abordado (HEIFETZ; KANIA; KRAMER, 2004).

💡 Nesse sentido, a capacidade de mapear contradições, baseadas em uma necessidade do negócio e em uma experiência prática e situada, pode servir para coletar dados e alertar o grupo envolvido sobre o assunto a ser abordado. Isso pode abrir espaço para a evolução do sistema de atividade e, consequentemente, para a aprendizagem expansiva (ENGESTROM, 2001; HEIFETZ; GRASHOW, 2009).

 

 

 

  1. Resultados

    A análise dos resultados vai seguir os seguintes passo:

    1. 7.9.1 Análise quantitativa pré-aplicação:
      1. entender como as informações do questionário inicial ajudaram no processo de adaptação do programa para o grupo;
    2. 7.9.2 Análise quantitativa pós-aplicação
      1. verificar os principais resultados e obstáculo na aplicação do programa;
      2. explorar as correlações entre os dados;
    3. 7.9.3 Correlações e achados
    4. 7.9.4 Achados da análise quantitativa
    5. 7.9.5 Achados dos dados qualitativos
    6. 7.9.6 Análise das contradições

Houve aplicação de dois questionários, que são as principais fontes de dados para as análises quantitativas e qualitativas desta seção, abaixo alguns dados de participação.

Dados da Participação:

Participantes: 23 pessoas

Respostas ao questionário inicial: 23

Respostas ao questionário final: 12

Avaliação interna da Tango: 6 respostas

 

 

 

 

 

  1. Análise quantitativa pré-aplicação

 

💬 A partir do questionário inicial, pudemos identificar a necessidade do time em aumentar a clareza sobre o que se espera deles, e na forma como a capacidade a ser desenvolvida deve ser expressa no dia a dia de trabalho.

 

🚧 Necessidades:

🧩 70% (16 em 23) melhoria na capacidade a ser desenvolvida

💡 65% (15 em 23) precisam de mais clareza nas responsabilidades e papéis

🎯 42% melhorar comunicação interna e clareza da comunicação

⚙️ 51% (12 em 23) consideram a divisão de atividades eficaz

🔍 50% (11 em 23) apontaram clareza nas responsabilidades como aspecto a ser melhorado

 

💬 Reconheceu-se também a necessidade de desenvolver a capacidade como um todo, para além da competência específica de Gestão de Stakeholders

 

💥 Avaliação sobre importância da gestão de stakeholders*:

🛠️ 44% (10 em 23) melhoria na qualidade do projeto ou produto importante

😊 35% (8 em 23) aumento na satisfação do cliente ou usuário

🔄 31% (7 em 23) maior agilidade na tomada de decisões

 

🔬A expansão do objeto do programa à capacidade, e não vinculação estrita à competência abre espaço para incluir as pessoas que entendem que já dominam o artefato e fazem uso dele em seu dia a dia. De outra sorte, teríamos uma não adesão deste público, por entender que o programa não geraria valor, e perderíamos o espaço de trocas e de explicitação das contradições do Sistema de Atividade.

 

💥 Outros dados pré-programa:

🎯 Importância do tema avaliada entre 3 e 4 (média de 3,6 de 5)

🎓 Avaliação das ofertas de desenvolvimento ofertadas, (média de 3,1)

📚 (3,7 de 5) o nível médio de aprendizado e desenvolvimento pessoal

🤝 Habilidades iniciais variando entre 2 e 5 (média de 3,5)

🏫 74% (17 em 23) utilizam gestão de stakeholders em seu trabalho

🔄 52% Frequentemente adotam abordagem estratégica na gestão de stakeholders

🔬 53% Eficazes em identificar e analisar stakeholders

 

💬 Através das perguntas de reflexão do questionário inicial, ajudamos as participantes a visualizar as relações e correlações entre as perguntas. Especialmente entre o valor do artefato, os resultados que proporciona, e a frequência em que é usado. Gerando curiosidade por parte das pessoas mais experientes sobre o programa e o que há de novo.

 

  1. Análise quantitativa pós-aplicação

 

Resultados Positivos:

📈 Resultados da aplicação:

💼 92% (11 em 12) se sentem mais preparados para ajudar as clientes

➡️ 92% (11 em 12) indicaria o programa para outro time da Tango

🗺️ 84% (10 em 12) desenvolveram habilidade de mapeamento de stakeholders

📢 75% (9 em 12) indicaram melhorias na comunicação após o programa

🚀 50% (6 em 12) mencionam aceleração na tomada de decisão

👥 42% (5 em 12) apontaram aumento na colaboração e aprendizado coletivo

🛠️ 42% (5 em 12) notam melhoria na comunicação entre a equipe e as clientes

🔄 33% (4 em 12) afirmam aumento na colaboração na equipe

 

Obstáculos 🚧:

⏱️ 42% (5 em 12) apontou falta de tempo como principal obstáculo

 

Análise do gráfico da Figura 47:

Destaco 7 pontos abaixo como complementares aos dados já apresentados na lista anterior:

🔬 Construção do mapa de stakeholders: Aproximadamente 84% das pessoas participantes do programa construíram seu mapa de stakeholders, indicando uma alta taxa de adoção desta ferramenta. Constitui-se uma relação direta entre “construir o mapa de stakeholder” e a percepção de desenvolver a habilidade.

🔬 Aplicação da ferramenta no dia a dia: 62% das participantes aplicaram a ferramenta no seu dia a dia.

🔬 Desenvolvimento de habilidades: As habilidades mais frequentemente citadas foram “Mapeamento de stakeholders” (85% das participantes) e “Construção de relacionamentos” (54% das participantes).

🔬 Resolução de desafios: 100% das participantes que responderam a esta pergunta indicaram que discutiram internamente e buscaram soluções em equipe para enfrentar os desafios.

🔬 Competências para desenvolver: “Comunicação eficaz” e “Articulação do valor dos negócios” foram as competências mais frequentemente citadas para desenvolver, ambas mencionadas por 46% das participantes.

🔬
Avaliação do programa: a avaliação média do programa foi de aproximadamente 3,83 em uma escala de 5.

 

 

Figura 47 – Gráficos Análise 1


Fonte: Autor

 

 

  1. Correlações e achados:

 

  1. As participantes que aplicaram a ferramenta no dia a dia se sentem mais preparados para ajudar as clientes. Além disso, essas participantes indicaram melhorias significativas na comunicação e estariam dispostas a recomendar o programa para outra equipe:

    1. 🎯 92% se sentem mais preparados para ajudar as clientes após o treinamento:

    2. 🛠️ 8% que não se sentem mais preparados, 100% não aplicaram a ferramenta no dia a dia;
    3. 💬 92% que se sentem mais preparados, 100% indicaram melhorias na comunicação;

    4. 👍 Das participantes que se sentem mais preparadas, 85% indicariam o programa para outro time;

    5. 🗺️ Das participantes que se sentem mais preparadas, 82% construíram seu mapa de stakeholders.

       

  2. Construir um mapa de stakeholders é essencial para o sucesso do programa (aplicar a ferramenta). Aquelas que o fizeram se sentem mais preparados e apresentam uma aceleração significativa na tomada de decisão:

    1. 🗺️ 77% construíram seu mapa de stakeholders;

    2. 🛠️ 23% que não construíram seu mapa, 75% não aplicaram a ferramenta no dia a dia;
    3. 💬 Das 77% que construíram seu mapa, todas discutiram o assunto com a equipe;
    4. 🎯 Das participantes que construíram o mapa, 100% se sentem mais preparadas para ajudar as clientes;
    5. 👍 Das participantes que construíram o mapa, 67% indicaram aceleração na tomada de decisão.

       

  3. A discussão sobre o treinamento com a equipe é um aspecto crucial para a aplicação bem-sucedida das ferramentas aprendidas. Aquelas que discutiram o assunto se sentem mais preparados e estariam dispostas a recomendar o programa para outros times:

    1. 💬 77% discutiram o assunto com a equipe;

    2. 🛠️ 23% que não discutiram o assunto, 75% não aplicaram a ferramenta no dia a dia;

    3. 🗺️ Das 77% que discutiram o assunto, todas construíram seu mapa de stakeholders;
    4. 🎯 Das participantes que discutiram o assunto, 100% se sentem mais preparadas para ajudar as clientes;
    5. 👍 Dos participantes que discutiram o assunto, 88% indicariam o programa para outro time.

       

  4. A aplicação da ferramenta é essencial para maximizar os benefícios do programa. Aquelas que a aplicam, discutem o assunto com a equipe, construíram um mapa de stakeholders e estão dispostas a recomendar o programa:
    1. 🛠️ 69% aplicaram a ferramenta no dia a dia;
    2. 🎯 31% que não aplicaram a ferramenta, 67% não se sentem mais preparadas;
    3. 💬 Das 69% que aplicaram a ferramenta, 100% discutiram o assunto com a equipe;
    4. 🗺️ Das participantes que aplicaram a ferramenta, 100% construíram seu mapa de stakeholders;

    5. 👍 Das participantes que aplicaram a ferramenta, 88% indicariam o programa para outro time.

       

  5. Aquelas que indicariam o programa para outro time da Tango são as que mais se beneficiaram do treinamento, aplicando as ferramentas aprendidas e participando ativamente nas discussões em equipe:
    1. 👍 85% indicariam o programa para outro time:
    2. 🎯 Das 15% que não indicariam o programa, todas não se sentem mais preparados;
    3. 💬 Das 85% que indicariam o programa, 100% discutiram o assunto com a equipe;
    4. 🗺️ Das participantes que indicariam o programa, 82% construíram seu mapa de stakeholders;

    5. 🛠️ Das participantes que indicariam o programa, 76% aplicaram a ferramenta no dia a dia.

       


  6. A falta de tempo foi um limitador para algumas participantes, embora muitas delas ainda conseguissem aplicar a ferramenta e se sentir mais preparadas. Aquelas que não mencionaram falta de tempo tiveram resultados particularmente positivos, com todas construindo um mapa de stakeholders e dispostas a recomendar o programa:
    1. 50% apontaram falta de tempo como limitador;
    2. 🛠️ Das 50% que apontaram falta de tempo, 80% aplicaram a ferramenta em seu dia a dia;
    3. 🎯 Das 50% que mencionaram falta de tempo, 60% se sentem mais preparadas para ajudar os clientes;
    4. 🗺️ Das 50% que não apontaram falta de tempo como limitador, 100% construíram seu mapa de stakeholders;
    5. 👍 Das 50% que não mencionaram falta de tempo, todas indicariam o programa para outro time da Tango.

       

       

  7. A melhoria na comunicação ou colaboração foi um dos principais resultados do treinamento. Aquelas que observaram essa melhoria aplicaram a ferramenta diariamente e estão dispostas a recomendar o programa para outros times:

    1. 📢 90% apontaram melhoria na comunicação ou colaboração;

    2. 💬 Das 90% que apontaram melhoria na comunicação ou colaboração, 100% discutiram o assunto com a equipe;

    3. 🗺️ Das 10% que não apontaram melhoria na comunicação ou colaboração, 50% construíram seu mapa de stakeholders;

    4. 🛠️ Das 90% que apontaram melhoria na comunicação ou colaboração, todas aplicaram a ferramenta no dia a dia;

    5. 👍 Das 90% que apontaram melhoria na comunicação ou colaboração, todas indicariam o programa para outro time da Tango.

       

  8. A falta de clareza nas expectativas foi um desafio para algumas participantes, mas aquelas que discutiram o assunto com a equipe se sentem mais preparadas. Aquelas que não viram isso como um problema tiveram resultados positivos, indicando o programa para outras e aplicando a ferramenta diariamente:
    1. 50% apontaram falta de clareza nas expectativas da organização;
    2. 💬 Das 50% que apontaram falta de clareza nas expectativas da organização, 83% discutiram o assunto com a equipe;
    3. 🎯 Das 50% que mencionaram falta de clareza nas expectativas da organização, 83% se sentem mais preparados para ajudar as clientes;
    4. 👍 Das 50% que não apontaram falta de clareza nas expectativas como um problema, 86% indicariam o programa para outro time da Tango;
    5. 🛠️ Das 50% que não mencionaram falta de clareza nas expectativas, 83% aplicaram a ferramenta em seu dia a dia.

       


  9. Aquelas que apontaram ações para resolução de desafios se sentem mais preparadas para ajudar as clientes e têm maior probabilidade de discutir o assunto com a equipe e aplicar a ferramenta diariamente. Aquelas que não apontaram ações para resolução de desafios ainda veem valor no programa, com metade delas dispostas a recomendar para outro time:
    1. 🎲 80% apontaram ações para resolução de desafios;
    2. 🎯 Das 80% que apontaram ações para resolução de desafios, 100% se sentem mais preparados para ajudar as clientes;
    3. 👍 Das 20% que não apontaram ações para resolução de desafios, 50% indicariam o programa para outro time da Tango;
    4. 💬 Das 80% que apontaram ações para resolução de desafios, 88% discutiram o assunto com a equipe;
    5. 🛠️ Das 80% que apontaram ações para resolução de desafios, 88% aplicaram a ferramenta em seu dia a dia.

 

Vamos explorar agora algumas correlações, em busca de padrões sobre o grupo de respondentes, nas análises das figuras 48.49 e 50.

 

Figura 48 – Correlações 1


Fonte: Autor

 

💼 Prontidão pós programa x NPS x avaliação do aprendizado x aplicou a ferramenta x construiu o mapa.

💬 Não há nenhuma correlação direta entre ter aplicado a ferramenta e o nível de prontidão e avaliação do aprendizado. As participantes que aplicaram a ferramenta têm uma percepção de aprendizado e de valor mais alta que a média, mas pelo fato de termos pessoas que não aplicaram a ferramenta e mesmo assim avaliam bem o programa a correlação não é verdadeira.

 

Figura 49 – Correlações 2


Fonte: Autor

💼 Clareza de papéis x aplicação de regras x divisão do trabalho x NPS x aplicou a ferramenta x construiu o mapa.

💬Buscamos explorar a correlação entre as questões de regras, e divisão do trabalho (aspectos sociais), e a participação ativa no programa e percepção de valor atribuída ao mesmo.

Não identificamos nenhuma relação direta entre esses itens.

 

Figura 50 – Correlações 3


Fonte: Autor

💼 Nível de domínio da competência (pré-programa) x eficácia da habilidade (pré-programa) x habilidade em construir relações (pré-programa) x Prontidão pós-programa x NPS x aplicou a ferramenta x construiu o mapa.

💬 Buscamos entender se havia relação entre a autopercepção de domínio da competência (pré-programa) e a aplicação da ferramenta e percepção de valor. Não houve correlação direta, demonstrando que houve pessoas que já se percebiam com grande domínio da competência e participaram ativamente do programa.

📚 A busca de correlações é importante para dar visibilidade para padrões do grupo de trabalho, que podem gerar insights e caminhos para próximos passos. Porém na análise das correlações propostas não se evidenciou essas correlações.

🔍 Também exploramos correlações entre as participantes que não responderam o segundo questionário, se havia algum padrão entre elas. E, também não foi possível identificar nenhum padrão com base no questionário inicial que “agrupasse” o grupo que não respondeu a segunda parte do questionário.

💡 Em exploração com equipe de projeto, identificamos que esse é um padrão da organização, de não imposição às pessoas, nem da participação do programa, tampouco em responder questionários relativos aos programas.

➡️ Dessa forma as relações apresentadas nos itens 1 a 9 desta seção, são as projeções e relações possíveis sobre os dados coletados.

 

  1. Achados da análise quantitativa

 

🔬 É preciso aplicar: Alinhada com a teoria e com a concepção do framework, verificamos que a aplicação prática (da ferramenta) é fator determinante para a percepção de valor, o desenvolvimento de habilidades, a percepção de prontidão e a predisposição em indicar o programa (ARGYRIS; SCHON, 1978; ENGESTRÖM, 2001).

🔬 Aprendizagem é um processo social: a discussão sobre a prática com a equipe, além de influenciar a percepção de valor das pessoas que aplicaram a ferramenta na prática, exerceram influência nas pessoas que não aplicaram a ferramenta, mas tiveram a percepção de valor, e ganho de habilidades com o programa (ENGESTRÖM, 2001).

🔬 Discussão em grupo constrói clareza compartilhada: o processo de construção de sentido compartilhado na abordagem de Weick, ou construção de concepção de Engeström é um processo social, que é acelerado pela experiência e pela estrutura de reflexão. Fatores que são contemplados no modelo proposto, e quando um grupo toma a iniciativa de abrir espaços de conversa e discussão sobre a experiencia os impactos são aumentados.

🔬 Contradições movem o aprendizado: as pessoas que buscaram soluções para os problemas encontrados na aplicação da ferramenta, são as pessoas com maior percepção de valor do programa. E o processo de buscar soluções se concentrou no grupo que discutiu o assunto com seu time.

💡Os achados dessa seção reforçam as premissas adotadas no framework, com base na literatura e no estudo de campo da Tango. Que partem do pressuposto fundamental de que a aplicação prática é chave para a aprendizagem, a construção de sentido compartilhado, e a evolução do Sistema de Atividade.

💡
Colocar as participantes em prática: deve-se fazer todo o necessário para ajudar e viabilizar o caminho para que as pessoas participantes entrem em prática. E, tanto quanto possível, estimular lideranças que promovam espaços coletivos de discussão da experiencia para facilitar e acelerar a construção de sentido coletiva.

➡️ Vamos agora olhar para as contradições apontadas sobre o Sistema de Atividade.

 

 

  1. Análise dos dados qualitativos

 

💼 Desafios no desenvolvimento da capacidade trabalhada: As respostas do questionário inicial indicam que, enquanto a organização promove a capacitação na capacidade em questão através de treinamentos e palestras, muitas participantes sentem que essas iniciativas podem não estar totalmente alinhadas com seu nível de experiência e necessidades individuais.

🔍 Algumas respondentes expressaram a percepção de que o treinamento é frequentemente muito genérico, sugerindo a necessidade de estratégias de treinamento mais personalizadas ou segmentadas. Este feedback é relevante porque destaca a importância de adaptar os programas de capacitação às necessidades específicas dos participantes.

🔬 Quando comparamos com os comentários do questionário final: percebemos que algumas participantes relataram melhorias na comunicação com os stakeholders e na gestão dos mesmos após a conclusão do programa. Isto indica que, apesar das preocupações expressas inicialmente, o programa foi capaz de fornecer benefícios tangíveis para as participantes.

💡 Foi apontada a necessidade de criar um programa e palestra interativa que considerem as questões de acessibilidade na sua concepção.

💼 Habilidades de Gestão de Stakeholders: No questionário inicial, várias participantes forneceram exemplos concretos de como elas aplicaram com sucesso suas habilidades de gestão de stakeholders para influenciar projetos e decisões. Estas histórias indicam que, apesar dos desafios no desenvolvimento da capacidade trabalhada, muitas profissionais já possuem uma forte compreensão e habilidades na gestão de stakeholders.

🔬 Ao cruzar com as respostas do questionário final: pudemos verificar uma melhora ainda maior em sua capacidade de lidar com stakeholders após o programa. Além disso, algumas mencionam uma capacidade melhorada para antecipar riscos e focar na entrega de valor para os stakeholders mais importantes. Isso sugere que o treinamento foi bem-sucedido em reforçar e expandir as habilidades de gestão de stakeholders já existentes das participantes.

🔬 A análise das respostas qualitativas sugere que, embora os participantes já tenham fortes habilidades de gestão de stakeholders, eles também veem espaço para melhorias na capacitação da capacidade trabalhada. Os participantes valorizam a personalização e acessibilidade do treinamento, bem como a aplicabilidade prática do conteúdo do treinamento às suas necessidades reais.

 

  1. Análise das contradições

 

📚 Abaixo, conforme Engeström (2001), organizo nos níveis primário, secundário e terciário, as contradições mapeadas durante o programa, assim como quatro principais itens que expressam as contradições mais relevantes identificadas durante a jornada de aplicação:

  1. Contradições primárias:
    1. Falta de tempo para aplicação
      1. Equilibrar a aplicação da ferramenta com outras demandas do trabalho
      2. Falta de tempo no dia a dia para fazer a gestão de stakeholders
  2. Contradições secundárias (entre dois nós):
    1. Falta de clareza do papel e expectativas (Sujeito – Objeto – Divisão do Trabalho – Artefatos):
      1. A falta de clareza reflete em não se entender como uma agente de interação com a cliente, e ter dificuldade de identificar valor ou aplicação da ferramenta em seu dia a dia;
      2. Confusão sobre limites e responsabilidades, e como agir quando não tem colaboração da outra parte.
  3. Contradições terciária (ao implementar a ferramenta, identifica-se outras contradições):
  1. Dúvidas sobre a eficácia da ferramenta, e dificuldade de influenciar as outras partes. Após aplicar a ferramenta, identificaram outras dificuldades na construção das relações e da sua capacidade de influenciar pessoas. Apontando para contradições até então não mapeadas pelo time e organização. E, onde as relações não estavam tão aparentes desde o início;
  2. Também foi apontada, em linha com a demanda por maior clareza, a falta de métricas e indicadores que ajudem a colaboradora a identificar se está evoluindo e se está cumprindo com as expectativas do time e da organização.

Figura 51 – Contradições mapeadas do Sistema de Atividade


Fonte: Autor

  1. Cruzamento com os Objetivos da Tese

 

💼 Esta tese evolui a partir do questionamento: Quais estratégias e práticas são empregadas pelas Organizações Híbridas para promover o desenvolvimento organizacional e o potencial humano de seus membros simultaneamente?

Tendo esta como pergunta geradora constitui o Objetivo Geral da Tese, como segue: Investigar e compreender as estratégias e práticas adotadas por Organizações Híbridas para harmonizar o desenvolvimento do potencial humano de seus membros e a realização dos objetivos organizacionais.

Ao que foi complementado por 4 Objetivos específicos:

  • Identificar e compreender o contexto organizacional, os elementos analíticos (artefatos, sujeito, objeto, regras, comunidade e divisão do trabalho) e compor sistemas de atividade das organizações estudadas;
  • Construir e analisar os sistemas de atividade de cada micro prática realizada pelas organizações para este fim, constatando as contradições inerentes a estes sistemas;
  • Compreender se ocorrem e como se dão os processos de Aprendizagem Expansiva nas micro práticas analisadas;
  • Propor um framework teórico-analítico destas práticas baseado na teoria da atividade.

🔬 Posso afirmar que o Objetivo Geral foi atendido de forma completa, através do mapeamento feito com a Teal Brasil, e posteriormente o mergulho na Tango e a oportunidade de explorar e descrever seus processos internos de desenvolvimento de pessoas. Já os objetivos específicos, vamos contemplá-los individualmente:

  1. Ainda que a Teal Brasil não tenha sido utilizada como o campo principal, a partir da vivência na organização, pude descrever seu funcionamento e ilustrá-lo através das lentes da CHAT. Da mesma forma pude fazê-lo com a Tango, aprofundando as análises, e descrevendo diferentes processos sistemas à luz da CHAT.
  2. Construí e analisei através da CHAT a área de RH(People), de forma ampla, e os processos a área de Treinamento e Desenvolvimento (L&D) as comparando com as mesmas áreas de organizações tradicionais, a partir da literatura de clássica de RH.
  3. Evidenciamos que a diferenciação não se concentra nas micro práticas, ou adoção de artefatos específicos, mas sim na expressão da cultura organizacional, em especial a utilização da sua causa como “cola” para constituir as capacidades necessárias para a Aprendizagem Expansiva ocorrer.

    Verificamos o processo de aprendizagem expansiva como prática recorrente na Tango, em especial no redesenho de processos e combinados dos times, potencializado pelo caráter de organização em rede, e a rotatividade de pessoas em times distintos.

  4. Propus na Figura 38 um framework teórico-analítico explicitando a conexão entre os desafios das Organizações Híbridas, a utilização da sua causa como alavanca como cola para propiciar uma organização preparada para viver o contraditório e construir caminhos coletivos.

💬 As características da Cartografia propiciaram que pudesse seguir avançando. Apoiado na sistemática análise de dedos e reflexividade, pude identificar durante o campo necessidades e oportunidades de uma proposição metodológica original.

💡Gerando a Seção 6 – PROPOSIÇÃO FRAMEWORK, onde é proposto um modelo de aprendizagem pela prática, conectando a Teoria da Atividade as proposições de Weick relativas à construção de sentido compartilhada.

💡 Seguindo as possibilidades do campo, vivenciando a construção do trajeto ao percorrê-lo, adaptou-se o Framework à necessidade da própria Tango e aplicamos o modelo em um de seus times. Geramos dados, acompanhamos a aplicação, medimos o impacto e analisamos a efetividade e os impactos da aplicação do framework.

💡A seção 7 encerra aqui, e avançamos para a seção 8, onde serão feitas as considerações finais, e indicações de estudos futuros.

  1. Considerações finais e próximos passos

 

💬 A construção de clareza coletiva situada: ou como tratado no tema da tese, o desafio de construir sentido compartilhado é um processo contínuo, que deve ser atualizado conforme os desafios evoluem. A construção de conceitos, ou de sentido compartilhado, defendida aqui e alinhada com Engeström (2020) é o processo em que um time se apropria de um conceito geral, cria seu próprio entendimento e define aplicação do mesmo para sua realidade.

💡 Embora a Tango possua um processo de desenvolvimento pessoal, que potencializa autonomia e protagonismo de suas colaboradoras, se mostrou insuficiente para as demandas apresentadas. Evidenciamos a necessidade das pessoas integrantes do time em compreender as expectativas sobre sua performance, mais especificamente com relação à forma como a capacidade trabalhada neste estudo deveria ser expressa por elas no trabalho. O desafio em questão tem a característica situada, que neste caso “extrapola” a construção de alinhamento em nível organizacional e exige uma adaptação em nível do time.

📚O processo de construção de sentido compartilhado é facilitado quando adotamos uma linguagem comum (artefato) (ENGESTRÖM; SANNINO, 2012b; WEICK; ROBERTS, 1993). A Tango já utiliza de uma abordagem similar (metodologias ágeis) aplicada às necessidades e capacidades técnicas exigidas pelo projeto. Assim como uma visualização das capacidades instaladas no time, viabilizando trocas e complementariedades específicas para o atingimento dos objetivos do projeto.

📚 O modelo, consiste em estabelecer um planejamento de atividades e entregas, que são tornadas públicas e acompanhadas tanto pela equipe quanto pelo cliente. Ao adotar esta metodologia na gestão do projeto, cria-se uma linguagem comum, permitindo que as partes envolvidas possam acompanhar, contribuir e sugerir melhorias no processo, modificando, atualizando e reajustando decisões e cronogramas conforme necessário para alcançar os objetivos propostos (LEMAY, 2019).

🔬 Contudo, quando tratamos de habilidades e competências não técnicas, essa visualização é, ainda, inexistente. Limitando, tanto a equipe quanto a cliente, no entendimento dos recursos disponíveis, do nível de maturidade, dos pontos de desenvolvimento, e de qual será a estratégia conjunta para o desenvolvimento do sob o aspecto humano e comportamental.

💬 Isso se dá por uma série de fatores, principalmente pela novidade e falta de referências de como esse processo pode ser otimizado. Especialmente pela característica da Tango de ser uma Organização em Rede (BAKER; NOHRIA; ECCLES, 1992).

💡 A fronteira ainda não superada com relação às capacidades não técnicas, é a de construir conexão direta que elas e as necessidades do negócio. A dificuldade de métrica, e expressão do impacto da falta destas capacidades afasta o seu uso de forma aplicada (HECKMAN; KAUTZ, 2012). Apoiando a justificativa do desenvolvimento em situações empíricas ou teóricas genéricas.

📚 No livro “New Work Needs Inner Work”, as autoras destacam a importância do crescimento individual em ambientes onde a estrutura hierárquica e os processos são minimizados, criando assim um ambiente de autogestão ou maior autonomia para os envolvidos. Argumentam que, com a redução dos processos, torna-se necessário que as pessoas se conectem com a sua autenticidade, valores e premissas, tanto pessoais quanto organizacionais, para os processos decisórios necessários nessa forma de atuação (BREIDENBACH; ROLLOW, 2019).

Figura 52 – The OS Canvas


Fonte: Dignan (2019)

💡 No estudo conduzido na Tango, verificamos que essas são capacidades já presentes ou em desenvolvimento nas colaboradoras da empresa. No entanto, um aspecto não contemplado no livro é a habilidade e os recursos necessários para acelerar a formação de um time.

📚 De forma similar, Dignan (2019) trata a necessidade de reconfigurar os Sistemas Operacionais das Organizações. Para que possam ser expressas através dos sistemas e processos organizacionais, sinais e indicativos alinhados com as expectativas projetadas pela Organização.

🔬 Tanto Dignan (2019) como Breidenbach e Rollow (2019) se baseiam na premissa de times autogeridos intactos, onde o time permanece o mesmo e, através do tempo de trabalho conjunto e fortalecimento das relações, tanto as “diretrizes” organizacionais como o mapeamento das capacidades individuais e os processos de construção de sentido se tornam possíveis e constituídos ao longo do tempo.

🔬 Porém, ao falarmos de uma organização em rede, caracterizada pela renovação de equipes e alta rotatividade entre as integrantes dos times, torna-se essencial dispor de recursos que ajudem tanto as integrantes quanto as lideranças a terem uma linguagem comum para tratar das competências não-técnicas e como serão traduzidas para o projeto. Assim, pode-se estabelecer acordos e processos específicos da equipe, para que as competências necessárias possam ser desenvolvidas ou expressas quando necessário.

💡 A aplicação do framework proposto pode contribuir tanto para a visualização das capacidades do time, através dos assessments específicos. Como para o mapeamento e entendimento dos desafios situados no projeto em questão ao construir o Sistema de Atividade e dar luz às contradições.

Popularização da Teoria da Atividade

📚 A utilização da Teoria da Atividade como lente teórica, e método organizador (artefato mediador) para a mapeamento, expressão e linguagem comum entre o time de projeto para que se possa tratar e evoluir, o Sistema de Atividade, já se mostrou viável na aplicação do Laboratório de Mudança (ENGESTRÖM, 2001).

🔍 Neste estudo, pudemos avançar na utilização de uma abordagem menos dependente da pessoa pesquisadora-interventora. Comprovando que, através da utilização de recursos tecnológicos, da produção, análise e utilização dos dados é possível simplificar a aplicação da Teoria na prática:

  1. utilizamos lógicas de dupla estimulação;
  2. introduzimos uma ferramenta prática, que ao mesmo tempo que cumpriu um papel de desenvolvimento, foi também um artefato de desestabilização do Sistema de Atividade;
  3. o grupo foi capaz não só de aplicar de forma individual o artefato, e refletir sobre sua influência no Objeto do Sistema de Atividade principal, mas também articulou espaços de troca, aprendizado coletivo, recombinados e construção de conceito coletivo
  4. conectamos o desenvolvimento de uma competência relacional intermediária com a necessidade do negócio;
  5. capturar sinais fracos do grupo, abrindo espaço para visões minoritárias e as utilizando para provocar e desestabilizar o Sistema de Atividade. As utilizando como inputs na Talk Interativa e nas trocas com a Equipe de projeto;
  6. criamos um processo de fácil replicação, e, portanto, de possível escala dentro de uma organização.
  7. a experiencia de adaptação do modelo ao conteúdo e aplicação necessários, também se mostrou rápido, e que pode ser otimizada com estruturas intermediárias;

💬 No desenho original deste estudo, co-criado com a equipe de projeto da Tango, não foi prevista uma capacitação do time no modelo da Teoria da Atividade. Complemento que se mostra com potencial, pelos pontos recém expostos que permitiriam que o time avançasse na hipótese construída de que a Teoria da Atividade pode ser um modelo estruturante para times evoluírem seus Sistemas de Atividade de forma autônoma.

Paralelos entre os ODSs e a CHAT

📚 O movimento indicado por Engeström e Sannino como as proposições da 4ª geração da CHAT demonstram o interesse em utilizar a CHAT como linguagem e estrutura para que os diferentes níveis da Sociedade possam colaborar e atuar nos problemas globais (ENGESTRÖM; SANNINO, 2021). Dessa forma indicam que vão evoluir a teoria para que ocupe esse espaço importante de articulação e mobilização de atores importantes para as definições estruturantes de nossa sociedade.

💡 A provocação e proposição desta tese está para a CHAT, assim como os IDGs estão para os ODSs. Não são propostas competidoras, mas complementares. O laboratório de Mudanças já mostrou seu potencial de influenciar políticas públicas e criar sinergias entre diferentes entes para solucionar problemas estruturais (SANNINO, 2020). Dessa forma abrindo espaço para que evolua nessa direção.

🔬 Fato que não impede que, também, se democratize o acesso a Teoria da Atividade, e possamos avançar na capacidade de times autogeridos evoluírem suas práticas de forma autônoma.

💡 Organizações Híbridas podem atingir seus objetivos organizacionais através do desenvolvimento de suas pessoas e de seus times, e não apesar de. Para isso devem criar sistemas e processos que promovam a autonomia e o protagonismo de suas pessoas, apoiando-se e utilizando como alavanca, sua causa/motivo.

💡 Times podem ser capazes de identificar pontos de desenvolvimento e contradições de forma autônoma, construindo combinados e atualizando seu Sistema de Atividade com objetivo de perseguir um Objeto de Atividade em fuga e manter-se um veículo de expressão dos Objetos de Atividade de suas pessoas.

💡 Pessoas autônomas são a base fundante de times autônomos e de Organizações Híbridas. Sua autonomia é constituída diariamente ao equilibrar-se entre múltiplas contradições que as atravessam e contestam suas práticas.

💡 O elemento conector entre esses 3 níveis é a expressão de uma causa, através de valores e premissas evolutivas, porém inegociáveis.

 

  1. Limitações e estudos futuros

💼 Esta é uma pesquisa de caráter exploratório qualitativo que teve como objetivo entender, mapear e extrair informações que possam inspirar e auxiliar outras Organizações Híbridas em seu desafio de equilibrar o atingimento de seus objetivos organizacionais e o desenvolvimento de suas pessoas.

💡 Dentre as possibilidades de estudos futuros, a aplicação do framework em outras organizações e o avanço na hipótese e construção de caminhos que habilitem times a se tornarem mais autônomos, inclusive através da aplicação deste modelo sem a dependência de uma pessoa pesquisadora ou consultora.

💬 Passando pelo entendimento e desenvolvimento de um método para criar acessibilidade à pessoas não acadêmicas à aplicação da Teoria da Atividade como ferramental para evolução de seus Sistemas de Atividade. Fiz um primeiro exercício apresentado no Apêndice 1 deste trabalho, a utilização de ferramentas tecnológicas parecem ser a forma mais rápida de criar um modelo que possa fazer a conversão das respostas de perguntas simples para a tradução e projeção no modelo da Teoria da Atividade.

➡️ Adiciono como recurso complementar à tese escrita o site: https://publish.obsidian.md/rogeriogonzales/Home

💬 Este é um site produzido a partir da minha base de dados, constituída ao longo da produção desta tese, e que foi, na medida do possível, concentrada neste programa chamado Obsidian.

 

 

 

 

 

 

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  1. Apêndice a:

[APRENDIZAGEM PELA PRÁTICA – Teoria da Atividade Aplicada para não Acadêmicos]

Introdução e Convite

Você já parou para pensar nas atividades que você realiza em seu dia a dia no trabalho, especialmente aquelas que parecem não estar funcionando tão bem quanto deveriam? Todos nós temos tarefas que nos desgastam, não funcionam como gostaríamos ou apresentam problemas recorrentes. Convidamos você a explorar uma dessas tarefas por meio da lente da Teoria da Atividade. Vamos abordar essa atividade passo a passo, de uma maneira que vai além do simples “quem”, “o que” e “por que”, para considerar aspectos mais profundos como as ferramentas e regras envolvidas, o contexto cultural, e até mesmo a história dessa atividade. Pronto(a) para começar?

Parte 1: Sistema de Atividade Básico (Primeira Geração)

  1. Pense em si mesmo e no papel que desempenha em sua organização ou trabalho. Quem é você nesse contexto? (Sujeito)
  2. Agora, pense em uma tarefa que você faz regularmente e que tem apresentado desafios ou problemas. Qual é essa tarefa? (Objeto)
  3. Quais são os objetivos ou resultados que você espera alcançar com essa tarefa? (Resultado)
  4. Que ferramentas ou recursos você usa para realizar essa tarefa? Pode ser algo físico como um computador ou software, ou algo menos tangível como um conjunto de habilidades ou conhecimentos que você possui. (Artefato Mediador)
  5. Para compreender melhor essa atividade, é importante considerar o contexto em que ela ocorre. Como o ambiente de trabalho, as normas e valores da sua organização, e o ambiente social e cultural mais amplo influenciam a forma como você realiza essa tarefa? (Contexto Histórico-Cultural)

Parte 2: Aprofundando-se na Atividade (Segunda Geração)

Contexto

Vamos dar um passo atrás e entender o Sistema em que essa ação está presente, também conhecido como Sistema de Atividade. Dentro desse sistema, as coisas que você faz de forma automática são chamadas de operações. As tarefas que você realiza como parte de uma entrega maior são chamadas de ações. E a entrega maior é conhecida como Atividade. Por exemplo, você pode estar envolvida na Atividade “Fechamento Mensal”, que inclui várias ações, como “verificar o status do projeto em relação ao planejamento”. Durante essa ação, você realiza várias operações, como digitar informações na tabela de controle. Com essa estrutura em mente, vamos explorar mais profundamente sua tarefa.

  1. Pense na ação que você descreveu na Parte 1. Quando você dá um passo atrás e olha para a Atividade maior da qual essa ação faz parte, o que você vê? Que Atividade é essa? (Atividade)
  2. Por que você precisa realizar a ação descrita? Qual é o propósito coletivo ou objetivo comum da sua equipe ao realizar esta Atividade? (Motivo / Objeto)
  3. Qual é o resultado esperado da Atividade? Como vocês saberiam se alcançaram o objetivo? (Resultado)
  4. Quais são as ferramentas, processos, estruturas usadas para realizar esta Atividade? (Artefatos)
  5. Existem regras ou normas específicas que devem ser seguidas ao realizar esta Atividade? Quais são elas? (Regras)
  6. Quem são as pessoas envolvidas nesta Atividade, mesmo que indiretamente? Como suas funções se relacionam com a Atividade? (Comunidade)
  7. Como as tarefas e responsabilidades para essa Atividade são divididas entre os membros da equipe? (Divisão do Trabalho)
  8. Você pode identificar algum problema ou dificuldade na forma como esta Atividade é realizada atualmente? (Contradições)

 

Parte 3: Princípios da Teoria da Atividade

  1. Existem diferentes opiniões ou abordagens para a tarefa entre você e os outros envolvidos? Se sim, poderia nos dar alguns exemplos? (Multivocidade do Sistema de Atividade)
  2. Como essa tarefa ou atividade mudou ao longo do tempo? Ela foi influenciada por mudanças em sua vida, tecnologia, cultura ou sociedade? (Histórico do Sistema de Atividade)
  3. Considerando as dificuldades ou frustrações mencionadas anteriormente, que mudanças você acha que poderiam resolver esses problemas? Você poderia sugerir algumas soluções possíveis? (Resolução de Contradições)

Parte 4: Aprendizagem Expansiva

  1. Considerando as mudanças que você propôs, como você acha que poderia começar a implementá-las? Quais passos você poderia tomar?
  2. Como você poderia envolver outras pessoas nesse processo? Quem são as pessoas que você precisaria para apoiar e implementar essas mudanças?
  3. Como você acha que a aprendizagem expansiva poderia acontecer a partir deste processo?

Este questionário visa ajudar você a refletir profundamente sobre suas atividades, compreendê-las dentro de um contexto maior e, possivelmente, identificar maneiras de melhorar.

 

APENDICE B: